SUBCHEFIA DE ASSUNTOS PARLAMENTARES |
EM No 5 SEDH/PR
Brasília, 28 de janeiro de 2007.
Excelentíssimo Senhor Presidente da República,
Temos
a honra de submeter à elevada consideração de Vossa Excelência o anexo
anteprojeto de lei que dispõe sobre os sistemas de atendimento socioeducativo,
bem como regulamenta a execução de medidas destinadas ao adolescente, em razão
da prática de ato infracional, e altera dispositivos da Lei 8.069, de 13 de
julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA).
2. Como é do
conhecimento de Vossa Excelência, o processo de consolidação dos direitos
atinentes à criança e ao adolescente obedeceu a um caminho árduo, iniciado com o
advento do Estatuto da Criança e do Adolescente, que é fruto de mobilização da
sociedade civil, durante o processo constituinte originário, que editou a Carta
Constitucional de 1988.
3. O ECA abandonou a doutrina da situação irregular e
adotou a teoria da proteção integral, garantidora da prioridade absoluta das
crianças e adolescentes no âmbito do Estado, da família e da sociedade.
4. Após quinze anos,
referido Estatuto tornou-se instrumento essencial para a cidadania, figurando
como referência internacional de respeitabilidade dos direitos humanos
relacionados às crianças e aos adolescentes, embora não trate, de forma
satisfatória, das questões atinentes à aplicação das medidas socioeducativas,
traçando, somente, diretrizes genéricas acerca da matéria, o que provoca a
disparidade na execução das medidas socioeducativas pelos diversos órgãos dos
entes federados, ficando a efetividade das medidas de proteção a mercê de cada
componente da federação e de seu grau de responsabilidade com os direitos
ligados ao adolescente.
5. O anteprojeto de lei visa justamente a superar essa
lacuna normativa, e por intermédio da instituição do Sistema Nacional de
Atendimento Socioeducativo, coordenado pela União, com a participação dos
Estados, Distrito Federal e Municípios, afastando a simplória idéia de redução
da imputabilidade penal, que não é suficiente para produzir resultados positivos
no combate à criminalidade.
6. O sistema em questão tem como finalidade precípua
estabelecer conjunto ordenado de princípios, regras e critérios que devem ser
observados no processo de apuração de ato infracional, assim como quando da
execução das medidas socioeducativas.
7. O redesenho proposto pela futura lei tem como escopo a
uniformidade na política de atendimento socioeducativo, traçando preceitos
minuciosos que serão observados pelos entes da federação.
8. A proposta prevê, inicialmente, direitos e garantias aos
adolescentes infratores consagrados na Convenção sobre os Direitos da Criança,
aprovada pela Assembléia Geral das Nações Unidas e ratificada pelo Brasil, em 20
de setembro de 1990.
9. Num segundo momento, regulamenta a execução da medida
socioeducativa, eventualmente aplicada ao adolescente infrator e estabelece a
instituição de um processo singular para cada espécie de medida aplicada,
levando-se em conta as particularidades dos adolescentes a ela sujeitos.
10. O modelo, por outro lado, institui regras normativas e
explicativas atinentes aos programas de atendimento e fixa preceitos
estritamente relacionados às entidades governamentais e não-governamentais que
pretendam executar medidas socioeducativas, além de subdividir os programas em
programas de meio aberto e de privação de liberdade, com requisitos específicos
para cada espécie.
11. Com a finalidade de elaborar proposta que significasse
não apenas o redesenho institucional, mas a efetiva solução dos problemas
atinentes aos adolescentes infratores, o anteprojeto em comento cria um plano
individual de cumprimento das medidas socioeducativas, que figura como um forte
instrumento de tutela do adolescente infrator, na medida em que individualiza,
ao máximo, a aplicação da medida, e leva em conta as singularidades do
adolescente, servindo como meio de gerenciamento e registro de todas as
atividades por ele desempenhadas.
12. Cumpre salientar
que o plano individual contará com a participação de diversos órgãos, além da
direção do programa de atendimento, órgão responsável pela sua confecção, do
Ministério Público, do defensor do adolescente e da autoridade judiciária que,
acompanhando a sua implantação, levará em conta a opinião do adolescente, bem
como dos pais e responsável.
13. O anteprojeto regulamenta, ainda, a situação de
adolescentes submetidos à medida socioeducativa que sejam portadores de doença
ou deficiência mental, ou dependência química.
14. Registre-se que o
Estatuto da Criança e do Adolescente trata de forma demasiadamente abstrata da
matéria, na medida em que apenas preceitua que os adolescentes portadores de
doença ou deficiência mental receberão tratamento individual e especializado, em
local adequado à suas condições.
15. O texto faz menção da necessidade da presença de um grupo
intersetorial, formado por equipes técnicas do programa de atendimento e da rede
de assistência à saúde, para elaboração e execução dos atos terapêuticos a serem
aplicados, segundo as singularidades do adolescente.
16. O anteprojeto altera, também, artigos do Estatuto,
conferindo maior celeridade ao andamento de recursos processuais atinentes à
criança e ao adolescente.
17. Registre-se que o
texto não é uma aspiração isolada, mas, sim, fruto de amplo processo de
construção coletiva (seminários regionais, seminário nacional, reuniões e
oficinas técnicas), sob a coordenação da Secretaria Especial dos Direitos
Humanos, do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, da
Associação Brasileira de Magistrados e Promotores de Justiça da Infância e do
Fórum Nacional de Organizações Governamentais de Atendimento à Criança e ao
Adolescente, além de juízes, promotores, conselheiros de direitos tutelares e
técnicos que desenvolvem trabalhos com adolescentes que cumprem medidas
socioeducativas, e com o apoio institucional do Fundo das Nações Unidas para a
Infância e do Instituto Latino Americano das Nações Unidas para a Prevenção do
Delito.
18. Ressalte-se,
ainda, que a implantação do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo tem
previsão orçamentária para o ano de 2005 (Programa 0152 – Atendimento
Socioeducativo do Adolescente em conflito com a lei), e, além disso, o Plano
Plurianual (2004-2007) prevê os seguintes valores para o atendimento
socioeducativo do adolescente em conflito com a lei: 2005: R$ 25.369.549,00;
2006: R$ 27.610.002,00; 2007: R$ 29.079.368,00; 2008: R$ 30.717.094,00.
19. A iniciativa representa avanço no tratamento dos
adolescentes infratores e não rompe com as bases ideológicas da proteção
integral consagradas na Constituição Federal de 1988 e no Estatuto da Criança e
do Adolescente.
20. Cumpre
salientar, finalmente, que se faz necessária a urgência constitucional na
tramitação do anteprojeto no Congresso Nacional, quer pela relevância da
matéria, quer pela realidade que norteia o cumprimento das medidas de proteção.
São estas, Senhor Presidente, as razões que nos levaram a submeter o texto à
apreciação de Vossa Excelência, e que, se transformado em lei, regulamentará e
reestruturará a execução das medidas socioeducativas.
Paulo Vannuchi
Secretário Especial de Direitos Humanos