Presidência
da República |
MENSAGEM Nº 730, DE 10 DE JULHO DE 2001.
Senhor Presidente do Senado Federal,
Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do parágrafo 1o do artigo 66 da Constituição Federal, decidi vetar parcialmente, por inconstitucionalidade e contrariedade ao interesse público, o Projeto de Lei no 181, de 1989 (no 5.788/90 na Câmara dos Deputados), que "Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências".
O Ministério da Justiça propôs veto aos seguintes dispositivos:
Inciso V do art. 43
"Art. 43. ........................................................
........................................................
V referendo popular e plebiscito."
Razões do veto:
"Tais instrumentos de exercício da soberania popular estão disciplinados na Lei no 9.709, de 18 de novembro de 1998, que, em seu art. 6o, admite a sua convocação por parte de Estados e Municípios, na forma determinada pela Constituição Estadual ou Lei Orgânica Municipal. Há, portanto, no ordenamento jurídico pátrio, permissivo legal para a utilização destes mecanismos por parte dos Municípios, desde que observados os ditames da Lei Orgânica Municipal, instrumento constitucionalmente habilitado a regular o processo político em âmbito local.
Instituir novo permissivo, especificamente para a determinação da política urbana municipal, não observaria a boa técnica legislativa, visto que a Lei no 9.709/98 já autoriza a utilização de plebiscito e referendo popular em todas as questões de competência dos Municípios."
Inciso II do § 1o do art. 5o
"Art. 5o ........................................................
§ 1o ........................................................
........................................................
II utilizado em desacordo com a legislação urbanística ou ambiental.
........................................................"
Razões do veto:
"O inciso II do § 1o do art. 5o do projeto equipara ao imóvel subutilizado aquele "utilizado em desacordo com a legislação urbanística ou ambiental". Essa equiparação é inconstitucional, porquanto a Constituição penaliza somente o proprietário que subutiliza o seu imóvel de forma a não atender ao interesse social, não abrangendo aquele que a seu imóvel deu uso ilegal, o qual pode, ou não, estar sendo subutilizado.
Vale lembrar que, em se tratando de restrição a direito fundamental direito de propriedade , não é admissível a ampliação legislativa para abarcar os indivíduos que não foram contemplados pela norma constitucional."
Seção VI, compreendendo os arts. 15 a 20
"Seção VI
Da concessão de uso especial para fins de moradia
Art. 15. Aquele que possuir como sua área ou edificação urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados situada em imóvel público, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, tem o direito à concessão de uso especial para fins de moradia em relação à referida área ou edificação, desde que não seja proprietário ou concessionário de outro imóvel urbano ou rural.
§ 1o A concessão de uso especial para fins de moradia será conferida de forma gratuita ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.
§ 2o O direito de que trata este artigo não será reconhecido ao mesmo concessionário mais de uma vez.
§ 3o Para os efeitos deste artigo, o herdeiro legítimo continua, de pleno direito, a posse de seu antecessor, desde que já resida no imóvel por ocasião da abertura da sucessão.
Art. 16. Nas áreas urbanas com mais de duzentos e cinqüenta metros quadrados situadas em imóvel público, ocupadas por população de baixa renda para sua moradia, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, onde não for possível identificar os terrenos ocupados por cada possuidor, a concessão de uso especial para fins de moradia será conferida de forma coletiva, desde que os possuidores não sejam concessionários de outro imóvel urbano ou rural.
Parágrafo único. Aplicam-se no caso de que trata o caput, no que couber, as disposições dos §§ 1o a 5o do art. 10 desta Lei.
Art. 17. No caso de ocupação em área de risco, o Poder Público garantirá ao possuidor o exercício do direito de que tratam os arts. 15 e 16 desta Lei em outro local.
Art. 18. O título de concessão de uso especial para fins de moradia será obtido pela via administrativa perante o órgão competente da Administração Pública ou, em caso de recusa ou omissão deste, pela via judicial.
§ 1o Em caso de ação judicial, a concessão de uso especial para fins de moradia será declarada pelo juiz, mediante sentença.
§ 2o O título conferido por via administrativa ou a sentença judicial servirão para efeito de registro no cartório de registro de imóveis.
§ 3o Aplicam-se à concessão de uso especial para fins de moradia, no que couber, as disposições estabelecidas nos arts. 11, 12 e 13 desta Lei.
Art. 19. O direito à concessão de uso especial para fins de moradia é transferível por ato inter vivos ou causa mortis.
Art. 20. O direito à concessão de uso especial para fins de moradia extingue-se, retornando o imóvel ao domínio público, no caso de:
I o concessionário dar ao imóvel destinação diversa da moradia para si ou sua família;
II os concessionários remembrarem seus imóveis.
Parágrafo único. A extinção de que trata este artigo será averbada no cartório de registro de imóveis, por meio de declaração consubstanciada do Poder Público concedente."
Razões do veto:
"O instituto jurídico da concessão de uso especial para fins de moradia em áreas públicas é um importante instrumento para propiciar segurança da posse fundamento do direito à moradia a milhões de moradores de favelas e loteamentos irregulares. Algumas imprecisões do projeto de lei trazem, no entanto, riscos à aplicação desse instrumento inovador, contrariando o interesse público.
O caput do art. 15 do projeto de lei assegura o direito à concessão de uso especial para fins de moradia àquele que possuir como sua área ou edificação urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados situada em imóvel público. A expressão "edificação urbana" no dispositivo visaria a permitir a regularização de cortiços em imóveis públicos, que no entanto é viabilizada pela concessão a título coletivo, prevista no art. 16. Ela se presta, por outro lado, a outra leitura, que poderia gerar demandas injustificadas do direito em questão por parte de ocupantes de habitações individuais de até duzentos e cinqüenta metros quadrados de área edificada em imóvel público.
Os arts. 15 a 20 do projeto de lei contrariam o interesse público sobretudo por não ressalvarem do direito à concessão de uso especial os imóveis públicos afetados ao uso comum do povo, como praças e ruas, assim como áreas urbanas de interesse da defesa nacional, da preservação ambiental ou destinadas a obras públicas. Seria mais do que razoável, em caso de ocupação dessas áreas, possibilitar a satisfação do direito à moradia em outro local, como prevê o art. 17 em relação à ocupação de áreas de risco.
O projeto não estabelece uma data-limite para a aquisição do direito à concessão de uso especial, o que torna permanente um instrumento só justificável pela necessidade imperiosa de solucionar o imenso passivo de ocupações irregulares gerado em décadas de urbanização desordenada.
Por fim, não há no art. 18 a definição expressa de um prazo para que a Administração Pública processe os pedidos de concessão de direito de uso que, previsivelmente, virão em grande número a partir da vigência deste instrumento. Isto traz o risco de congestionar o Poder Judiciário com demandas que, num prazo razoável, poderiam e deveriam ser satisfeitas na instância administrativa.
Pelas razões expostas, propõe-se o veto aos arts. 15 a 20 do projeto de lei. Em reconhecimento à importância e validade do instituto da concessão de uso especial para fins de moradia, o Poder Executivo submeterá sem demora ao Congresso Nacional um texto normativo que preencha essa lacuna, buscando sanar as imprecisões apontadas."
Inciso IX do art. 26
"Art. 26. ........................................................
........................................................
IX outras finalidades de interesse social ou de utilidade pública, definidas no plano diretor.
........................................................"
Razões do veto:
"O art. 26, inciso IX, do projeto estabelece que o direito de preempção previsto no art. 25 poderá ser exercido sempre que o Poder Público necessitar de áreas para "outras finalidades de interesse social ou de utilidade pública, definidas no plano diretor".
Ora, o direito de preempção previsto no projeto consubstancia-se em instrumento limitador do direito de propriedade e, como tal, deve ser posto à disposição do Município tão-somente em hipóteses expressamente previstas em lei, de forma a proteger o cidadão contra eventuais abusos do Poder Público.
No caso, como se observa, o inciso IX traz regra genérica e aberta que autoriza a utilização do direito de preempção em casos a serem definidos no plano diretor. Essa norma, portanto, contraria o interesse público de evitar a discricionariedade do Poder Público em matéria de direito fundamental, como o da propriedade."
§ 5o do art. 40
"Art. 40. ........................................................
........................................................
§ 5o É nula a lei que instituir o plano diretor em desacordo com o disposto no § 4o."
Razões do veto:
"Reza o § 5o do art. 40 que é "nula a lei que instituir o plano diretor em desacordo com o disposto no § 4o". Tal dispositivo viola a Constituição, pois fere o princípio federativo que assegura a autonomia legislativa municipal.
Com efeito, não cabe à União estabelecer regras sobre processo legislativo a ser obedecido pelo Poder Legislativo municipal, que se submete tão-somente, quanto à matéria, aos princípios inscritos na Constituição do Brasil e na do respectivo Estado-membro, consoante preceitua o caput do art. 29 da Carta Magna. O disposto no § 5o do art. 40 do projeto é, pois, inconstitucional e, por isso, merece ser vetado."
Inciso I do art. 52
"Art. 52..............................................................................
I impedir ou deixar de garantir a participação de comunidades, movimentos e entidades da sociedade civil, conforme o disposto no § 3o do art. 4o desta Lei;
..............................................................................................."
Razões do veto:
"O art. 52, inciso I, do projeto prevê como improbidade administrativa a conduta de o Prefeito "impedir ou deixar de garantir a participação de comunidades, movimentos e entidades da sociedade civil, conforme o disposto no § 3o do art. 4o desta Lei". Esse parágrafo do art. 4o estabelece o denominado controle social da aplicação dos recursos públicos.
Sabe-se que o chamado controle social dos atos de governo tem natureza muito mais política do que jurídica, sendo certo que o seu preciso significado e alcance sempre ensejam controvérsias, de modo a dificultar sobremaneira a sua real efetivação.
Resulta, então, que fixar como ato de improbidade a conduta de não garantir o controle social dos gastos públicos, de forma a sancionar os Prefeitos com a suspensão de direitos políticos, a perda da função pública e a indisponibilidade de bens em razão daquela conduta, significa incluir no ordenamento legal dispositivo de difícil interpretação e aplicação, em prejuízo da segurança jurídica. Mais uma vez o interesse público ficou contrariado, merecendo ser vetado o referido inciso I do art. 52 do projeto."
Item 38, acrescido ao inciso I do art. 167 da Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973, pelo art. 56 do projeto.
"Art. 56. ........................................................
"Art. 167. ........................................................
I ........................................................
........................................................
38) do contrato de concessão de direito real de uso de imóvel público, independente da regularidade do parcelamento do solo ou da edificação;
........................................................"
Razões do veto:
"O veto a este dispositivo impõe-se em decorrência dos vetos aos arts. 15 a 20."
Estas, Senhor Presidente, as razões que me levaram a vetar os dispositivos acima mencionados do projeto em causa, as quais ora submeto à elevada apreciação dos Senhores Membros do Congresso Nacional.
Brasília, 10 de julho de 2001.