Brasão das Armas Nacionais da República Federativa do Brasil

Presidência da República
Secretaria-Geral
Subchefia para Assuntos Jurídicos

MENSAGEM Nº 314, DE 1º DE JULHO DE 2021

Senhor Presidente do Senado Federal, 

Comunico a Vossa Excelência que, nos termos previstos no § 1o do art. 66 da Constituição, decidi vetar parcialmente, por contrariedade ao interesse público, o Projeto de Lei no 1.805, de 2021 (nº  3.515/15 na Câmara dos Deputados), que “Altera a Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor), e a Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003 (Estatuto do Idoso), para aperfeiçoar a disciplina do crédito ao consumidor e dispor sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento”.

Ouvido, o Ministério da Economia manifestou-se pelo veto aos seguintes dispositivos do Projeto de Lei:

Inciso XIX do art. 51, da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, alterado pelo art. 1º do Projeto de Lei

XIX - prevejam a aplicação de lei estrangeira que limite, total ou parcialmente, a proteção assegurada por este Código ao consumidor domiciliado no Brasil.”

Razões do veto

“A propositura legislativa estabelece que seriam nulas de pleno direito as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de serviços e produtos que previssem a aplicação de lei estrangeira que limitasse, total ou parcialmente, a proteção assegurada por este Código.

Entretanto, apesar da boa intenção do legislador, a propositura contrariaria interesse público tendo em vista que restringiria a competitividade, prejudicando o aumento de produtividade do País, ao restringir de forma direta o conjunto de opções dos consumidores brasileiros, especialmente quanto à prestação de serviços de empresas domiciliadas no exterior a consumidores domiciliados no Brasil, o que implicaria restrição de acesso a serviços e produtos internacionais. Em virtude de a oferta de serviços e de produtos ser realizada em escala global, principalmente, por meio da internet, é impraticável que empresas no exterior conheçam e se adequem às normas consumeristas nacionais.”

Inciso I do caput e parágrafo único do art. 54-C, da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, alterado pelo art. 1º do Projeto de Lei

“I - fazer referência a crédito ‘sem juros’, ‘gratuito’, ‘sem acréscimo’ ou com ‘taxa zero’ ou a expressão de sentido ou entendimento semelhante;”

“Parágrafo único. O disposto no inciso I do caput deste artigo não se aplica à oferta de produto ou serviço para pagamento por meio de cartão de crédito.”

Razões do veto

“A propositura legislativa estabelece que seria vedado expressa ou implicitamente, na oferta de crédito ao consumidor, publicitária ou não, fazer referência a crédito ‘sem juros’, ‘gratuito’, ‘sem acréscimo’ ou com ‘taxa zero’ ou expressão de sentido ou entendimento semelhante.

Entretanto, apesar da boa intenção do legislador, a propositura contrariaria o interesse público ao tentar solucionar problema de publicidade enganosa ou abusiva com restrição à oferta, proibindo operações que ocorrem no mercado usualmente e sem prejuízo ao consumidor, em que o fornecedor oferece crédito a consumidores, incorporando os juros em sua margem sem necessariamente os estar cobrando implicitamente, sem considerar que existem empresas capazes de ofertar de fato ‘sem juros’, para o que restringiria as formas de obtenção de produtos e serviços ao consumidor.

O mercado pode e deve oferecer crédito nas modalidades, nos prazos e com os custos que entender adequados, com adaptação natural aos diversos tipos de tomadores, o que constitui em relevante incentivo à aquisição de bens duráveis, e a Lei não deve operar para vedar a oferta do crédito em condições específicas, desde que haja regularidade em sua concessão, pois o dispositivo não afastaria a oferta das modalidades de crédito referidas, entretanto, limitaria as condições concorrenciais nos mercados.

Por fim, impõe-se veto por arrastamento ao parágrafo único deste artigo.”

Art. 54-E, da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, alterado pelo art. 1º e art. 4º do Projeto de Lei

“Art. 54-E. Nos contratos em que o modo de pagamento da dívida envolva autorização prévia do consumidor pessoa natural para consignação em folha de pagamento, a soma das parcelas reservadas para pagamento de dívidas não poderá ser superior a 30% (trinta por cento) de sua remuneração mensal, assim definida em legislação especial, podendo o limite ser acrescido em 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente à amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito ou a saque por meio de cartão de crédito.

§ 1º O descumprimento do disposto neste artigo dá causa imediata à revisão do contrato ou à sua renegociação, hipótese em que o juiz poderá adotar, entre outras, de forma cumulada ou alternada, as seguintes medidas:

I - dilação do prazo de pagamento previsto no contrato original, de modo a adequá-lo ao disposto no caput deste artigo, sem acréscimo nas obrigações do consumidor;

II - redução dos encargos da dívida e da remuneração do fornecedor;

III - constituição, consolidação ou substituição de garantias.

§ 2º O consumidor poderá desistir, em 7 (sete) dias, da contratação de crédito consignado de que trata o caput deste artigo, a contar da data da celebração ou do recebimento de cópia do contrato, sem necessidade de indicar o motivo, ficando a eficácia da rescisão suspensa até que haja a devolução ao fornecedor do crédito do valor total financiado ou concedido que tiver sido entregue, acrescido de eventuais juros incidentes até a data da efetiva devolução e de tributos, e deverá:

I - remeter ao fornecedor ou ao intermediário do crédito, no prazo previsto neste parágrafo, o formulário de que trata o § 4º deste artigo, por carta ou qualquer outro meio de comunicação, inclusive eletrônico, com registro de envio e de recebimento; e

II - devolver o valor indicado neste parágrafo em até 1 (um) dia útil contado da data em que o consumidor tiver sido informado sobre a forma da devolução e o montante a devolver.

§ 3º Não será devida pelo fornecedor a devolução de eventuais tarifas pagas pelo consumidor em razão dos serviços prestados.

§ 4º O fornecedor facilitará o exercício do direito previsto no § 2º deste artigo mediante disponibilização de formulário de fácil preenchimento pelo consumidor, em meio físico ou eletrônico, anexo ao contrato, com todos os dados relativos à identificação do fornecedor e do contrato, e mediante indicação da forma de devolução das quantias.

§ 5º O disposto no § 1º deste artigo não se aplica quando o consumidor houver apresentado informações incorretas.

§ 6º O limite previsto no caput deste artigo poderá ser excepcionado no caso de repactuação de dívidas que possibilite a redução do custo efetivo total inicialmente contratado pelo consumidor e desde que essa repactuação seja submetida à aprovação do Poder Judiciário.”

“Art. 4º O disposto no caput do art. 54-E da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor), não se aplica às operações de crédito consignado e de cartão de crédito com reserva de margem celebradas ou repactuadas antes da entrada em vigor desta Lei com amparo em normas específicas ou de vigência temporária que admitam percentuais distintos de margem e de taxas e encargos, podendo ser mantidas as margens estipuladas à época da contratação até o término do prazo inicialmente acordado.”

Razões do veto

“A propositura legislativa estabelecer que, nos contratos em que o modo de pagamento da dívida envolvessem autorização prévia do consumidor pessoa natural para consignação em folha de pagamento, a soma das parcelas reservadas para pagamento de dívidas não poderia ser superior a trinta por cento de sua remuneração mensal, assim definida em legislação especial. O referido, poderia ainda ser acrescido em cinco por cento, destinados exclusivamente à amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito ou a saque por meio de cartão de crédito. O descumprimento do disposto no referido artigo daria causa imediata à revisão do contrato ou à sua renegociação. Além disso, o consumidor poderia desistir da contratação de crédito no prazo de sete dias, contado da data da celebração ou do recebimento de cópia do contrato, mediante disponibilização de formulário de fácil preenchimento pelo consumidor, em meio físico ou eletrônico, anexo ao contrato. Por fim, não seria devida pelo fornecedor a devolução de eventuais tarifas pagas pelo consumidor em razão dos serviços prestados.

Entretanto, apesar da boa intenção do legislador, a propositura contrariaria interesse público ao restringir de forma geral a trinta por cento o limite da margem de crédito já anteriormente definida pela Lei nº 14.131, de 30 de março de 2021, que estabeleceu o percentual máximo de consignação em quarenta por cento, dos quais cinco por cento seriam destinados exclusivamente para amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito ou de utilização com finalidade de saque por meio do cartão de crédito, para até 31 de dezembro de 2021, nas hipóteses previstas no inciso VI do caput do art. 115 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, no § 1º do art. 1º e no § 5º do art. 6º da Lei nº 10.820, de 17 de dezembro de 2003, e no § 2º do art. 45 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, bem como em outras leis que vierem a sucedê-las no tratamento da matéria, trazendo instabilidade para as operações contratadas no período de vigência das duas legislações.

Mister destacar que o crédito consignado é uma das modalidades mais baratas e acessíveis, só tendo taxas médias mais altas que o crédito imobiliário, conforme dados do Banco Central do Brasil. Assim, a restrição generalizada do limite de margem do crédito consignado reduziria a capacidade de o beneficiário acessar modalidade de crédito, cujas taxas de juros são, devido à robustez da garantia, inferiores a outras modalidades. A restrição acabaria, assim, por forçar o consumidor a assumir dívidas mais custosas e de maior dificuldade de pagamento.

Ademais, em qualquer negócio que envolva a consignação em folha de pagamento, seja no âmbito das relações trabalhistas ou fora delas a informação sobre a existência de margem consignável é da fonte pagadora. Diante disso, a realização de empréstimos em desacordo com o disposto no caput do art. 54-E poderia ocorrer por culpa exclusiva de terceiro, no caso a pessoa jurídica responsável pelo pagamento dos vencimentos do consumidor.”

Essas, Senhor Presidente, as razões que me conduziram a vetar os dispositivos mencionados do Projeto de Lei em causa, as quais submeto à elevada apreciação dos Senhores Membros do Congresso Nacional.

Este texto não substitui o publicado no DOU de 2.7.2021