Presidência da República

Casa Civil

Subchefia para Assuntos Jurídicos

EM nº 75/2006 - MF

Brasília, 28 de junho de 2006.

Excelentíssimo Senhor Presidente da República,

Trago à elevada consideração de Vossa Excelência proposta de Medida Provisória que trata da infra-estrutura e dos controles aduaneiros para movimentação e armazenagem de mercadorias importadas ou desnacionalizadas.

2. A presente Medida Provisória tem por objetivos principais a reestruturação do modelo jurídico de organização dos recintos aduaneiros de zona secundária, hoje chamados Portos Secos (PS), e da forma de custeio da fiscalização aduaneira executada pela Secretaria da Receita Federal. Essas modificações visam a:

a) aperfeiçoar a legislação sobre os recintos aduaneiros de zona secundária, adequando suas regras de instalação e funcionamento às necessidades do comércio exterior brasileiro;

b) estabelecer condições de equilíbrio concorrencial entre os recintos alfandegados sob exploração empresarial, no que toca à sistemática de contribuição para o custeio das despesas de controle e fiscalização aduaneira, hoje desequilibrada em desfavor dos recintos em zona secundária; e

c) viabilizar a oferta de serviços de logística aduaneira em pontos de fronteira, quando a iniciativa privada não se interesse por explorá-los.

3. A Medida Provisória introduz, ainda, uma série de modificações na legislação aduaneira com o objetivo de simplificar controles e eliminar entraves burocráticos, agilizando a logística do comércio exterior e reduzindo custos.

4. Atualmente, os Portos Secos estão subordinados ao regime de permissão e concessão de serviços públicos, sem que seus serviços, sequer, estejam arrolados no art. 21, XII da Constituição Federal.

5. Esse modelo jurídico encontra-se em profunda crise, impedindo a ampliação da oferta dos serviços de movimentação e armazenagem de mercadorias para importadores e exportadores, pois esse modelo, baseado em concessões e permissões de serviço público, não se coaduna com a natureza própria daquelas atividades, que são tipicamente de exploração privada, que além de demandarem rápidas modificações na capacidade operacional dos recintos e até mesmo mudanças locacionais para atender a demanda, incompatíveis com o atual modelo jurídico.

6. Para se verificar a gravidade da situação, tome-se a situação do Porto de Santos, onde as áreas alfandegadas somam atualmente 1,5 milhão de m 2 e a movimentação de contêineres atingiu 1,3 milhão de TEU no longo curso. Projetado um crescimento de 10% para os próximos anos (o crescimento atual é de mais de 20% ao ano), em seis anos a demanda por áreas alfandegadas atingirá 2,6 milhões de m 2 (1,28 TEU por ano por m 2 segundo a Global Container Terminals). Dessa forma, a oferta de áreas alfandegadas precisará crescer, apenas em relação ao Porto de Santos, mais de 1 milhão de m 2 nos próximos anos. No modelo atual, mercê de seus defeitos que o impedem de responder prontamente às demandas do mercado, o atendimento dessa oferta estará comprometido.

7. Além desses aspectos, nos pontos de fronteira com menor movimento de cargas, o modelo atual não consegue atrair interessados nas licitações, deixando a Secretaria da Receita Federal em precárias condições para operar os controles aduaneiros.

8. Em adição, cabe observar que os serviços delegáveis, outorgados a terceiros, em recintos alfandegados, não devam ser objeto de permissão ou concessão, inadequadas a esse fim; o instrumento mais adequado é a licença, que segundo os doutrinadores brasileiros é o ato administrativo unilateral e vinculado pelo qual a Administração faculta a todos os que preencham os requisitos legais o exercício de determinada atividade.

9. Por tais razões, o presente projeto de Medida Provisória, em seus arts. 1º , e 6º ao 12, abandona o modelo baseado em concessão/permissão de serviço público, propondo um modelo de livre concorrência entre os recintos alfandegados de zona secundária, com liberdade de entrada e saída do mercado. Ao mesmo tempo, nos arts. 13 e 14, é a Administração autorizada a organizar os serviços nas fronteiras terrestres sob outras formas, inclusive para viabilizar seu funcionamento nas localidades onde o movimento aduaneiro não é atrativo para a exploração privada.

10. Não obstante o novo modelo fundar-se nos princípios da livre iniciativa e livre concorrência, o projeto resguarda os interesses do Fisco ao exigir garantias por parte dos recintos alfandegados em geral (arts. 4º e 5º ), proporcionalmente à sua responsabilidade fiscal como depositários de mercadorias importadas. Ademais, a Medida Provisória proposta também resguarda as necessidades do controle aduaneiro, permitindo que a administração aduaneira estabeleça requisitos atinentes à segurança e à operacionalidade aduaneiras dos recintos (art.2º ), e exigindo dos depositários o cumprimento de uma série de obrigações fundamentais para a efetividade da fiscalização aduaneira (art. 3º ).

11. No novo modelo, o recinto alfandegado de zona secundária, denominado Centro Logístico e Industrial Aduaneiro (CLIA), pode configurar-se como um simples armazém, um complexo armazenador compartilhando instalações com estabelecimento de armazenagem de mercadorias nacionais, e até como um "distrito industrial", oferecendo serviços de armazenagem e áreas para a instalação e funcionamento de estabelecimentos industriais para operar no regime aduaneiro especial de Entreposto Aduaneiro.

12. Dessa forma, o modelo combina livre iniciativa e livre concorrência, com garantia fiscal, plasticidade logística e vocação industrial, e condições para o exercício efetivo do controle aduaneiro.

13. A fiscalização e o controle aduaneiros executados pela Secretaria da Receita Federal contam hoje com as contribuições ao Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização (Fundaf), criado pela Lei nº 1.437, de 17 de dezembro de 1975, pagas por alguns tipos de recintos alfandegados, que o fazem segundo diferentes critérios.

14. Pela nova forma proposta (alteração do art. 22 do Decreto-lei nº 1.455, de 7 de abril de 1976, pelo art. 29), todos os recintos sob exploração empresarial onde são exercidos o controle e a fiscalização aduaneiros, excetuados aqueles em que o próprio Estado, por meio do administrador portuário ou aeroportuário, se incumbe da prestação dos serviços de movimentação e armazenagem de cargas, estarão sujeitos à mesma regra de ressarcimento das despesas da fiscalização aduaneira para o Fundaf. Dessa forma, nivelam-se as condições de concorrência entre os recintos e distribui-se de maneira igualitária os custos do controle aduaneiro.

15. A nova forma de custeio também permite uma distribuição mais justa do custeio da fiscalização e controle aduaneiro sobre aqueles que efetivamente demandam essa atuação do Estado.

16. Os arts. 15 ao 23 trazem outras disposições sobre recintos aduaneiros: o art. 15 expande as exigências presentes na Medida Provisória proposta aos atuais recintos alfandegados - medida necessária para garantir a segurança dos controles e a efetividade do crédito fiscal; o art. 16 admite a migração voluntária dos atuais Portos Secos sob o regime de concessão e permissão para o regime de exploração com base em licença, por meio de rescisão não onerosa de seus contratos; o art. 17 também permite que os atuais Portos Secos que operem em regime de concessão rescindam seus contratos nas mesmas condições dos Portos Secos permissionários; o art. 18 dispõe sobre a revogação da licença de Porto Seco por solicitação do interessado, a qualquer tempo; o art. 19 estabelece o regime de sanções administrativas para garantir as disposições dos arts. 2º , 3º , 4º e 6º ; o art. 20 sistematiza hipótese legal que hoje se encontra esparsa na legislação aduaneira; e o art. 21 oferece os meios para se permitir o comércio internacional nas pequenas e isoladas comunidades de fronteira, onde não existam repartições aduaneiras, completando as disposições contidas no art. 30, que altera a redação do art. 7º do Decreto-Lei nº 2.472, de 1988.

17. As demais alterações da legislação aduaneira simplificam controles aduaneiros e proporcionam maior agilidade logística aos fluxos do comércio exterior, sanam dúvidas sobre a aplicação de dispositivos legais, suprem lacunas normativas e aperfeiçoam os instrumentos de prevenção às fraudes no comércio exterior.

18. O art. 22 introduz importante simplificação procedimental ao dispensar a tradução do manifesto de carga no idioma espanhol (Mercosul) e nos idiomas oficiais da Organização Mundial do Comércio (francês e inglês). Essa vetusta exigência é responsável por grande atraso na logística aduaneira, não mais se justificando nos dias de hoje.

19. O art 23 funda a base legal que permitirá eliminar o instituto da vistoria aduaneira na importação, simplificando os procedimentos aduaneiros e evitando enorme entrave ao fluxo logístico do comércio exterior, pois a responsabilização pelo extravio de mercadorias pode ser feita por meio de lançamento de ofício, prescindindo dos demorados trâmites burocráticos hoje aplicados. É importante lembrar que o importador não é onerado, pois a lei já lhe confere o direito de excluir do despacho aduaneiro as mercadorias avariadas, por meio de destruição.

20. As disposições do art. 24, similares às de outros países, eliminam despesas da Administração com armazenagem e destruição de mercadorias importadas que entram no País em desacordo com as normas ambientais, de saúde pública, sanitárias, fito e zoosanitárias. A proposta também libera os contêineres que hoje estão sendo ocupados para armazenar essas mercadorias.

21. A restrição imposta pelo art. 25 vem a propósito de dificultar a interposição fraudulenta, pois o endosso gratuito de conhecimento é, por excelência, artifício utilizado por fraudadores para se evadir dos controles fiscais, pois essa forma permite interpor pessoa jurídica - "laranja" - para promover despacho aduaneiro, ocultando o verdadeiro importador.

22. O art. 26 é medida de eqüidade, pois permite aos herdeiros no País receberem como bagagem desacompanhada os bens, caracterizáveis como bagagem, da pessoa que falece no exterior. Hoje esses bens são submetidos à tributação como as mercadorias importadas, pois não há previsão legal para serem tratados como são efetivamente - bagagem.

23. A alteração do texto do § 3º da Lei nº 4.302, de 30 de novembro de 1964, introduzida pelo art. 27, simplesmente exclui do texto do parágrafo em questão o termo "mercadoria avariada", pois, nesse caso, não haverá mais apuração de responsabilidade pela autoridade fiscal. Ou seja, essa alteração harmoniza o texto legal desse dispositivo da Lei nº 4.502, de 30 de novembro de 1964, com as disposições do art. 23, acima comentadas.

24. O art. 28 faz duas alterações nos arts. 60 e 111 do Decreto-Lei nº 37, de 18 de novembro de 1966. Com a alteração da redação do inciso II do art. 60, aperfeiçoa-se o conceito de extravio de mercadorias, para excluir a responsabilidade fiscal no caso de erro de expedição.

25. Já a alteração no parágrafo único do art. 111 do referido Decreto-Lei visa a possibilitar o alcance da norma contida em seu art. 104 aos veículos que se colocarem nas proximidades de outro, na zona primária, ou às embarcações que se atracarem a navio, para fins de prática de contrabando, descaminho, tráfico, e outros crimes, também, em operações internas no País, e não somente quando proceder do exterior ou a ele se destinar.

26. No art. 29 são introduzidas modificações nos arts. 22 e 23 do Decreto-Lei nº 1.455, de 7 de abril de 1976, sendo que a alteração no art. 22 já foi objeto de comento no parágrafo 14 acima, e a alteração no art. 23 medida moralizadora e saneadora de situações muito comuns nos aeroportos e fronteiras do País, onde pessoas, mesmo flagradas em suas bagagens com quantidades comerciais de mercadorias não declaradas, podem mantê-las mediante o simples pagamento dos impostos. A legislação atual, se não for modificada, continuará sendo um grande estímulo ao descaminho feito sob o "manto" de bagagem pois, na pior das hipóteses, o infrator terá que pagar apenas o que a lei já exige se declarasse as mercadorias.

27. As alterações no art. 7º do Decreto-Lei nº 2.472, de 1988, introduzidas pelo art. 30, criam facilidades para o tráfego e comércio fronteiriço, absolutamente necessárias para atender às demandas de pequenas e isoladas comunidades das regiões Norte e Centro-Oeste, principalmente, cujas potencialidades econômicas e sociais estão limitadas em razão da inexistência de controles aduaneiros, cuja pesada estrutura não se justifica nessas localidades, e melhores condições para o combate ao contrabando e outros ilícitos.

28. O art. 31 promove alterações no art. 36 da Lei nº 8.630, de 25 de fevereiro de 1993, para compatibilizar o seu inciso VI com as modificações introduzidas por esta Medida Provisória em seu art. 23.

29. O art. 32 da Medida Provisória ao alterar a redação do art. 7º da Lei nº 9.019, de 30 de março de 1995, supre a lacuna legal que existe sobre a competência para decidir os contenciosos administrativos que envolvam a exigência de direitos comerciais.

30. Mediante o art. 33 são introduzidas duas importantes modificações no art. 65 da Lei nº 9.069, de 29 de junho de 1995. Em primeiro lugar, permite-se ao Conselho Monetário Nacional alterar o limite para o porte de valores livres de declaração na entrada no País, e na saída dele, atualmente fixado em R$ 10.000,00, lembrando que à época da edição dessa lei, o valor expresso em reais equivalia a dez mil dólares dos EUA, aproximadamente. Passa-se, também, a permitir a conversão dos valores apreendidos pela autoridade administrativa, pois até hoje a custódia dos mesmos é onerosa e administrativamente muito complexa.

31. O art. 34 estende a Taxa de utilização do Siscomex, hoje cobrada apenas no registro das declarações de importação ao registro de retificações dessas declarações. As retificações são mais onerosas e demandam providências mais complexas em termos de sistema do que o próprio registro, e decorrem, na grande maioria das vezes, de erros perfeitamente evitáveis. A cobrança de taxa pela retificação certamente promoverá uma melhoria na qualidade das declarações, com redução dos erros e das interrupções do despacho aduaneiro, gerando economias para as empresas e para a Administração.

32. O art. 35 promove diversas alterações na Lei nº 10.833, de 29 de dezembro de 2003 - a saber, nos arts. 69 e 76, sendo que:

a) a alteração do art. 69 da referida lei sana dúvida complexa sobre a base de cálculo da multa prevista nesse dispositivo, quando aplicada à exportação;

b) a modificação no § 5º do art. 76 vem a propósito de estabelecer a regra operacional para o conceito de reincidência, reduzindo também o período de referência para a verificação de reincidência, de cinco para um ano; e

c) a alteração no § 8º do art. 76 traz para a autoridade na unidade onde foi apurada a infração a competência para julgar em primeira instância, simplificando o processo administrativo, permitindo também que a autoridade local exerça um controle de qualidade mais eficaz sobre esses processos.

33. O art. 37 autoriza o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento a credenciar entes públicos ou privados para a prestação de serviços de tratamento fitossanitário com fins quarentenários em portos, aeroportos, postos de fronteira, Centros Logísticos e Industriais Aduaneiros e recintos alfandegados, propiciando melhores condições para a defesa dos interesses estratégicos do País em matérias fitossanitárias.

34. Os arts. 36, 38 e 39 contêm as disposições finais e transitórias, necessárias à aplicação desta Medida Provisória.

35. Importante esclarecer que as revogações constantes do art. 40 dizem respeito à incidência tributária sobre mercadorias avariadas (art. 25 do Decreto-Lei nº 37, de 1966) e à vistoria aduaneira, (parágrafo único do art. 60 do Decreto-Lei nº 37, de 1966), que perdem completamente a finalidade em face do disposto no art. 25 dessa Medida Provisória, à organização dos serviços aduaneiros nas fronteiras e ressarcimento de custos administrativos do despacho aduaneiro (respectivamente, arts. 7º e 8º do Decreto-Lei nº 2.472, de 1988), e do regime de permissão e concessão de serviço público dos Portos Secos (inciso VI do art. 1º da Lei nº 9.074, de 1995), profundamente alterados por esta Medida Provisória.

36. Por fim, justifica-se a adoção de Medida Provisória para tratar das matérias aqui descritas pela inquestionável relevância de que se reveste toda e qualquer proposta que objetive melhorar a logística no comércio exterior brasileiro, bem assim a adoção de medidas que aperfeiçoem a legislação aduaneira do País, restringindo e punindo as irregularidades e beneficiando aqueles que corretamente atuam nessa área , com inegáveis ganhos para a economia brasileira como um todo, inclusive por seus reflexos positivos na geração de emprego e renda, fatores que também atribuem às medidas propostas o caráter de urgência, pois a acumulação dos problemas hoje existentes poderá, no curto prazo, comprometer a atuação das empresas nacionais, retirando-lhes competitividade no comércio internacional cada dia mais dinâmico.

37. Especialmente, no tocante à logística, cumpre lembrar a situação de crescente estrangulamento da estrutura portuária brasileira, vis a vis ao crescimento das exportações e importações. Embora o regime tributário especial para incentivo à modernização e à ampliação da estrutura portuária (Reporto) instituído pela Lei nº 11.033, de 21 de dezembro de 2004, venha contribuindo para a ampliação da capacidade portuária, é notório que nos principais portos do País, até por seguirem modelo de engenharia superado, não têm espaços para ampliação de suas áreas de movimentação de contêineres - nesse particular, a situação dos Portos de Santos, Itajaí, Vitória - os principais - é muito grave e se tornou obstáculo ao crescimento do comércio exterior, ou está em situação potencial muito próxima disso.

38. Diante desse quadro - de escassez de infra-estrutura portuária e de esgotamento das áreas de movimentação de carga nos principais portos do País, que vem se agravando dia-a-dia - a proposta contida nesta Medida Provisória surge como solução capaz de agregar grandes áreas próximas aos portos organizados ou aos grandes centros industriais, viabilizando, em curtíssimo prazo, suprir a escassez de infra-estrutura para a movimentação de cargas no comércio exterior, com reduzidos investimentos, pois permite aproveitar toda a estrutura de armazenagem existente que se encontra fora das áreas de porto organizado.

Respeitosamente,
Bernard Appy