E.M. nº 42 - MAPA
Em 14 de outubro de 2004.
Excelentíssimo Senhor Presidente da República,
É inegável a importância da cultura de soja para o País. Com efeito, soja é a principal cultura agrícola do País, respondendo por parcela considerável do PIB agropecuário, e suas exportações lideram a pauta comercial brasileira.
No entanto, as expectativas de mercado do produto para 2005 são de queda nos preços e aumento nos custos de produção; externalidades negativas nesta atividade podem gerar empobrecimento no campo e recrudescer o êxodo rural. A produtividade dos cultivos de soja é significativamente afetada pelo calendário de plantio e atrasos neste fatalmente reduzem a produtividade a patamares antieconômicos.
A semente de soja é insumo agrícola de caráter indispensável, sem a qual é impossível efetivar o plantio de qualquer cultura agrícola anual. O índice de utilização de sementes reservadas para uso próprio é maior entre os agricultores de pequena e média escala. No Estado do Rio Grande do Sul, por exemplo, 95% dos plantadores de soja têm área de cultivo inferior a 50 hectares (IBGE, 1996) e, segundo dados do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, mais de 80% dos agricultores gaúchos utilizaram sementes próprias de soja na última safra, as quais, presume-se, em escala significativa, transgênicas.
De acordo com estimativa do MAPA, foram cultivados no ano safra 2003/2004 cerca de 2,78 milhões hectares de soja geneticamente modificada, o que corresponde a uma produção estimada de 4,1 milhões de toneladas.
O plantio de soja geneticamente modificada foi autorizado aos agricultores que reservaram sementes próprias da safra de 2002/2003 para o plantio da safra 2003/2004, pela Medida Provisória nº 131, de 25 de setembro de 2003, posteriormente convertida na Lei nº 10.814, de 15 de dezembro de 2003.
Na ocasião, buscou-se disciplinar, em regime de excepcionalidade, uma situação, evidente, pré-constituída e de razões econômicas e culturais complexas, cuja ausência de intervenção do Poder Público poderia gerar uma crise social impactante, sobretudo no Estado do Rio grande do Sul, onde milhares de agricultores reservaram grãos de soja geneticamente modificada para plantio, à revelia de uma decisão judicial em contrário.
Essa medida foi adotada, naquela ocasião, num contexto onde se buscava a definição de um novo arcabouço jurídico relativo à pesquisa e produção de organismos geneticamente modificados no País, que viesse superar definitivamente as dúvidas suscitadas em relação à Lei de Biossegurança de demais legislações relacionadas com o tema. Nesse sentido, Vossa Excelência encaminhou ao Congresso Nacional, em 8 de outubro de 2003, com a Mensagem nº 579, dando início à tramitação do Projeto de Lei nº 2.401 (na Câmara dos Deputados), que "Estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados e seus derivados; cria o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS; reestrutura a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBIO; dispõe sobre a Política Nacional de Biossegurança; e dá outras providências".
O referido projeto restou aprovado na Câmara dos Deputados, após longa negociação na forma do Substitutivo do Deputado Renildo Calheiros, refletindo acordo entre a posição do Governo em relação à política nacional de biossegurança de organismos geneticamente modificados e a visão daquela Casa do Congresso Nacional. O Senado Federal, todavia, na condição de Casa revisora, aprovou novo texto substitutivo, ora em fase de nova apreciação pela Câmara dos Deputados.
Embora o Congresso Nacional tenha manifestado disposição em disciplinar o plantio de soja geneticamente modificada para a próxima safra, conforme o artigo 43 do texto aprovado na Câmara dos Deputados e os artigos 34, 35 e 36 do texto aprovado no Senado Federal, não foi possível estabelecer o novo marco legal ao tempo do calendário agrícola do ano, o que demanda, neste momento, nova ação assertiva do Poder Público para garantir amparo legal e segurança para a produção e comercialização de soja geneticamente modificada na safra de 2004/2005, para aqueles agricultores que optarem por tal tipo de semente.
Assim, a presente proposta de medida provisória visa atender a situação específica vivenciada por número expressivo de agricultores que reservaram, para uso próprio, grãos da soja geneticamente modificada das safras anteriores e que, por motivos econômicos e culturais diversos, pretendem realizar o plantio da safra de 2004/2005, com risco de perderem integralmente, se não houver dispositivo legal que lhes garanta o plantio, a colheita e posterior comercialização desse produto.
Em síntese, propõe-se na forma da presente proposta de medida provisória, de forma objetiva e compatível com a realidade da produção agrícola nacional, a autorização de plantio de grãos de soja geneticamente modificada, reservados pelos agricultores para uso próprio, na safra de 2004/2005, bem assim renova-se a autorização para multiplicar as sementes registradas provisoriamente no Registro Nacional de Cultivares do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, sob a égide da Lei nº 10.711, de 5 de agosto de 2003. Com isso, busca-se assegurar o plantio de grãos reservados pelos agricultores por mais uma safra e a comercialização da produção daí resultante, ao passo que se permite a multiplicação de sementes de soja geneticamente modificadas adaptadas às diferentes regiões do País.
Renova-se, ainda, a validade de dispositivos da Lei nº 10.814, de 15 de dezembro de 2003, cuja aplicação à mencionada situação é indispensável, renovando-se para a safra de soja geneticamente modificada de 2005 as exigências e restrições particulares para a produção e comercialização de soja geneticamente modificada aplicadas à safra de 2004, incluindo o Termo de Compromisso, Responsabilidade e Ajustamento de Conduta, e permitindo a rastreabilidade da produção de soja geneticamente modificada no país, fundamental tanto para a rotulagem como para a comercialização
Ademais a proposta de Medida Provisória repete as disposições da Lei nº 10.814/03 no que tange a responsabilidade dos produtores de soja geneticamente modificada que causarem danos ao meio ambiente e a terceiros, inclusive quando decorrente de contaminação por cruzamento.
Pretende-se, assim, Senhor Presidente, mais uma vez, e por razões de ordem imperativa para o País, permitir a regularização e viabilização da utilização das sementes reservadas pelo próprio agricultor, sem se autorizar o comércio ou importação de sementes com a dispensa do cumprimento dos requisitos legais, estabelece-se medidas de desestímulo à continuidade da situação que, em caráter urgente, requer as providências propostas pelo presente projeto de medida provisória. A provável aprovação definitiva, em curto prazo, da proposição legislativa ora em trâmite no Congresso Nacional, permite-nos estimar que, muito em breve, o País poderá contar com uma solução definitiva para o problema. A definitiva revisão do arcabouço jurídico relativo a pesquisa, introdução, produção e comercialização de organismos geneticamente modificados no Brasil, proposta por Vossa Excelência ao Congresso Nacional, dará solução a esta complexa situação, permitindo ao País superar os obstáculos hoje existentes, decorrentes da legislação inadequada e da insuficiência do aparato institucional destinado a assegurar a proteção do interesse público em matéria de biossegurança.
Respeitosamente,
Roberto Rodrigues