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Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos

LEI DE 18 DE SETEMBRO DE 1828.

 

Crêa o Supremo Tribunal de Justiça e declara suas attribuições.

     D. Pedro, por Graça de Deus, e unanime acclamação dos povos, Imperador Constitucional e Defensor Perpetuo do Brazil: Fazemos saber a todos os nossos subditos que a Assembléa Geral decretou, e Nós queremos a Lei seguinte:

CAPITULO I

DO PRESIDENTE E MINISTROS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

     Art. 1º O Supremo Tribunal de Justiça será composto de dezasete Juizes letrados, tirados das Relações por suas antiguidades, e serão condecorados com o titulo do Conselho; usarão de béca, e capa; terão o tratamento de excellencia, e o ordenado de 4:000$000 sem outro algum emolumento, ou propina. E não poderão exercitar outro algum emprego, salvo de membro do Poder Legislativo, nem accumular outro algum ordenado. Na primeira organização poderão ser empregados neste Tribunal os Ministros daquelles, que se houverem de abolir, sem que por isso deixem de continuar no exercicio desses Tribunaes, em quanto não forem extinctos. 

     Art. 2º O Imperador elegerá o Presidente d'entre os membros do Tribunal, que servirá pelo tempo de tres annos. No impedimento, ou falta do Presidente, fará suas vezes o mais antigo, e na concurrencia de dous de igual antiguidade a sorte decidirá. 

    Art. 3º O Presidente prestará nas mãos do Imperador, e os outros membros nas do Presidente o seguinte juramento - Juro cumprir exactamente os deveres do meu cargo. 

    Art. 4º Ao Presidente compete: 

    1º Dirigir os trabalhos dentro do Tribunal, manter a ordem, e fazer executar este regimento. 

    2º Distribuir os processos. 

    3º Fazer lançar em livro proprio, e por elle rubricado a matricula de todos os magistrados, que ora servem, ou de novo forem admittidos, e seguidamente o tempo de serviço, que forem vencendo, com declaração dos lugares, e qualidades do serviço, notando se servirão bem ou mal, referindo-se em tudo a registros, ou documentos existentes na Secretaria. Todos os magistrados para serem matriculados apresentarão ao Presidente por si, ou seus procuradores, as cartas dos lugares, que actualmente servirem, e dos que forem servindo, para serem registrada, pena de se lhes não contar a antiguidade. 

    4º Informar ao Governo dos magistrados, que estiverem nas circumstancias de serem membros do Tribunal, e dos oppositores aos outros lugares de magistratura. 

    5º Informar ao Governo de pessoa idonea para Secretario do Tribunal, e nomear quem sirva interinamente na sua falta ou impedimento. 

    6º Advertir os Officiaes do Tribunal, quando faltarem ao cumprimento dos seus deveres, e multal-os, bem como ao Secretario, até á decima parte dos ordenados de seis mezes. 

    7º Mandar colligir os documentos, e provas para se verificar a responsabilidade dos empregados, de cujos delictos, e erros de officio deve o Tribunal conhecer. 

    8º Conceder a algum membro licença para não ir ao Tribunal até oito dias em cada anno. Por mais tempo, só o Governo a poderá conceder. 

    9º Expedir portarias para a execução das resoluções e sentenças do Tribunal, e mandar fazer as necessarias notificações, excepto no que estiver a cargo do Juiz da culpa. 

    10. Determinar os dias de conferencia extraordinaria. Nos casos dos §§ 3º, 4º, 5º e 6º deve o Presidente ouvir primeiramente o Tribunal.

CAPITULO II

DAS FUNCÇÕES DO TRIBUNAL

     Art. 5º Ao Tribunal compete: 

    1º Conceder ou denegar revistas nas causas, e pela maneira, que esta lei determina. 

    2º Conhecer dos delictos, e erros de officio, que commetterem os seus Ministros; os ilegível Relações, os empregados no Corpo Diplomatico, e os Presidentes das provincias. 

    3º Conhecer, e decidir sobre os conflictos de jurisdicção, e competencia das Relações das provincias. 

    Art. 6º As revistas sómente serão concedidas nas causas civeis, e crimes, quando se verificar um dos dous casos: manifesta nullidade, ou injustiça notoria nas sentenças proferidas em todos os Juizos em ultima instancia. 

    Art. 7º As revistas não suspendem a execução das sentenças, excepto nas causas crimes, quando é imposta a pena de morte natural, degredo, ou galés; sendo os réos os recorrentes. 

    Art. 8º A parte, que quizer usar do recurso da revista, fará disso manifestação por si ou por seu procurador ao Escrivão, que a reduzirá a termo assignado pela parte, ou seu procurador, e duas testemunhas. 

    Art. 9º Esta manifestação será feita dentro de dez dias da publicação da sentença, e logo intimada á parte confraria; salvo nas causas crimes, nas quaes poderá ser feita, não só em quanto durar a pena, mas ainda mesmo depois de executadas as sentenças, quando os punidos quizerem mostrar sua innocencia, allegando, que lhes não foi possivel fazel-o antes. 

    Art. 10. Interposto o recurso da revista, as partes, no termo de quinze dias, arrazoarão por escripto sobre a nullidade, ou injustiça, que servir de fundamento ao dito recurso, sem novos documentos; e juntas as razões aos autos, serão estes, ficando o traslado, remettidos ao Secretario do Tribunal Supremo, onde serão apresentados, na Côrte, e Provincia do Rio de Janeiro, dentro de quatro mezes; de um anno nas Provincias de Goyaz, Mato Grosso, Ceará, Piauhy, Maranhão, e Pará: e de oito mezes nas demais provincias, contados do dia da interposição do recurso. 

    Art. 11. Recebendo o Secretario os autos, os apresentará na primeira conferencia ao Tribunal, e se distribuirão á um dos magistrados, que será o relator. 

    Art. 12. O Ministro, á quem fôr distribuida a revista, examinará os autos, e allegações das partes, e pondo no processo uma simples declaração de o ter visto, o passará ao Ministro, que immediatamente se lhe seguir, o qual procederá da mesma fórma, e assim por diante até o numero de tres. 

    Art. 13. Quando o ultimo tiver visto o processo, o apresentará na mesa no dia, que o Presidente designar, e a portas abertas, illustrado o Tribunal pelos tres Juizes, que viram os autos, e debatida a questão por todos os membros presentes, decidir-se-ha á pluralidade de votos, se se deve, ou não, conceder a revista: o resultado se lançará nos autos com as razões, em que elle se fundou. 

    Art. 14. Em um e outro caso, a decisão ficará constando no Tribunal, para o que será registrada litteralmente em livro, para esse fim destinado, e se publicará pela imprensa. 

    Art. 15. Denegada a revista, serão remettidos os autos ex-officio ao Juizo, onde foram sentenciados, e o recorrente condemnado nas custas. E se a sentença tiver imposto pena de morte se observará a Lei de 11 de Setembro de 1826, antes da sua execução. 

    Art. 16. Concedida a revista, serão os autos remettidos ex-officio a uma Relação, que o Tribunal designar, tendo em vista a commodidade das partes. Se a causa tiver sido julgada em Relação, ou em outro corpo collegial, será revista por tantos Juizes, quantos foram os da sentença recorrida, com tanto que não sejam da mesma Relação; e se fôr de Juizes singulares, serão os autos igualmente remettidos a uma Relação, e ahi julgados por tres Juizes. Em um e outro caso as partes não serão novamente ouvidas. 

    Art. 17. Proferida a sentença da revista, serão ex-officio remettidos os autos pelo Presidente do Tribunal, revisor da sentença, ao Juizo, em que se proferiu a sentença recorrida, fazendo officialmente ao Supremo Tribunal participação da remessa. 

    Art. 18. O Procurador da Corôa, e Soberania Nacional, póde intentar revista das sentenças proferidas entre partes, tendo passado o prazo, que lhes é concedido para a intentarem; mas neste caso a sentença da revista não aproveitará áquelles, que pelo silencio approvaram a decisão anterior. 

    Art. 19. O Tribunal Supremo da Justiça enviará todos os annos ao Governo uma relação das causas, que foram revistas, indicando os pontos, sobre que a experiencia tiver mostrado vicio, insufficiencia da legislação, as suas lacunas, e incoherencias, para o Governo propôr ao Corpo Legislativo, a fim de se tomar a resolução, que fôr conveniente. 

    Art. 20. Quando o Tribunal conhecer dos delictos, e erros de officio, cujo conhecimento lhe confere a Constituição, o Ministro, a quem tocar por distribuição, ordenará o processo, fazendo autuar pelo Secretario as peças instructivas; e procedendo ás diligencias necessarias, o apresentará á mesa, aonde, por sorte se escolherão tres Ministros, os quaes, depois de instruidos do processo, e tendo ouvido o indiciado, o pronunciarão, ou não, segundo a prova. 

    Art. 21. Podem porém as proprias partes offendidas apresentar as suas queixas contra os Presidentes das provincias, e Ministros das Relações, aos Juizes territoriaes, aos quaes competirá sómente neste caso verificar o facto, que faz o objecto da queixa; inquirir sobre elle as testemunhas, que lhes forem apresentadas; e facilitar ás mesmas partes todos os meios, que ellas exigirem, para bem a instruirem. Ainda que não haja parte offendida, compete ao Tribunal a requisição do Procurador da Corôa, e Soberania Nacional formar o processo, ou mandal-o preparar pelo Juiz territorial do crime. 

    Art. 22. Os ditos Juizes enviarão as referidas queixas, por cópia, aos querelados, que responderão dentro do termo de quinze dias, e dirigirão as suas respostas, ou aos mesmos Juizes, ou directamente ao Tribunal pelo primeiro Correio, participando-o áquelles. 

    Art. 23. Findo o termo, os Juizes pelo primeiro Correio remetterão o processo informatorio, que houverem organizado, na fórma do art. 21 com a resposta dos querelados, ou sem ella, ao Supremo Tribunal, que procederá sem mais audiencia dos querelados, na fórma do art. 20, e nos mais termos prescriptos por esta lei. 
     Art. 24. São effeitos da pronuncia: 

    1º Sujeição á accusação criminal. 

    2º Suspensão do exercicio de todas as funcções publicas, e de metade do ordenado, que vencer, e inhabilidade para empregos até final sentença, e prisão, quando a accusação fôr de crimes, em que não tem lugar a fiança. 

    Art. 25. Depois da pronuncia feita pelo Supremo Tribunal de Justiça, ou por elle sustentada, dar-se-ha vista do processo ao Promotor da Justiça, que será o mesmo da Relação da Côrte, para este formar o libello, derivado das provas autuadas. O réo será logo notificado por ordem do Presidente do Tribunal para comparecer nelle por si, ou seu procurador, no caso do nº 2º do art. 24, e produzir ahi a sua defesa dentro do prazo, que lhe será marcado, com attenção ás circumstancias, que occorrerem. 

    Art. 26. Comparecendo o réo por si, ou seu procurador, no termo, que lhe fôr assignado, e offerecido pelo Promotor o libello accusatorio, se lhe dará vista para deduzir a sua defesa no termo de oito dias, que será prorogavel ao prudente arbitrio do Juiz do Feito. 

    Art. 27. Findo este termo, e na primeira conferencia do Tribunal, presentes o Promotor, a parte accusadora, o réo, os seus procuradores, Advogados, e defensores, o mesmo Juiz do Feito, fazendo ler pelo Secretario o libello, a contrariedade, e todas as mais peças do processo, procederá á inquirição das testemunhas, que se houverem de produzir, ás quaes poderão tambem o Promotor, e as partes fazer as perguntas, que lhes parecer. 

    Art. 28. Findas as inquirições, e perguntas, o mesmo Juiz, na conferencia seguinte do Tribunal, apresentará por escripto um relatorio circumstanciado de todo o processo, que nunca poderá ser julgado por menos de seis Juizes livres, e ahi será lido, podendo ser contestado pelo Promotor, e pelas partes, ou seus Procuradores, quando fôr inexacto, ou não tiver a precisa clareza. 

    Art. 29. Em seguimento, a sessão se tornará secreta, e se discutirá a materia, no fim do que, declarando os Ministros, que estão em estado de votar, continuará a sessão em publico; proceder-se-ha á votação, não estando presentes o accusador, o réo, nem seus procuradores, Advogados, e defensores, nem tendo voto o Ministro, que formou o processo, nem os que intervieram na pronuncia. Em caso de empate, quér sobre a condemnação, quér sobre o gráo de pena, seguir-se-ha a parte mais favoravel ao réo. Esta sentença poderá ser uma só vez embargada.

    Art. 30. O Promotor da Justiça intervirá sempre na accusação de todos os crimes, ainda havendo parte accusadora. 

    Art. 31. O interrogatorio das testemunhas, e todos os actos do processo, depois da pronuncia, serão publicos. 

    Art. 32. As pessoas, que forem processadas neste Tribunal, poderão recusar dous Juizes, e o accusador um, sem motivarem a sua recusação. 

    Art. 33. Quando forem dous os réos, cada um recusará seu Juiz sendo mais de dous, concordarão entre si nos dous, que hão de exercer este direito; e não concordando, a sorte decidirá. O mesmo se observará, quando houver mais de um accusador, com a differença de que em lugar de dous será nomeado um para exercer a recusarão. 

    Art. 34. No caso de conflicto de jurisdicção, ou questão de competencia das Relações Provinciaes, entre si ou com qualquer outra autoridade, as autoridades competidoras darão immediatamente ao Tribunal uma parte por escripto acompanhada dos necessarios documentos. 

    Art. 35. O Tribunal julgará qualquer destes casos pela fórma estabelecida para a concessão, ou denegação das revistas, ouvindo porém o Procurador da Corôa, e Soberania Nacional, e lançada a sentença, que explicitamente contenha a decisão, e seus fundamentos. 

    Art. 36. O Tribunal terá duas conferencias por semana, além das extraordinarias, que o Presidente determinar; e para haver conferencia será necessario que se reuna mais de metade do numero dos membros. 

    Art. 37. Os Ministros tomarão assento na mesa á direita, e esquerda do Presidente, contando-se por primeiro o que estiver á direita; e seguindo-se os mais até o ultimo da esquerda. 

    Art. 38. A distribuição será feita entre os Ministros sem outra consideração mais que a do numero dos processos. Para esta distribuição haverá tres livros rubricados pelo Presidente, um para as revistas, outro para o registro das sentenças dos réos, e o terceiro para o dos conflictos de jurisdicção, além dos mais que necessarios forem. O livro da distribuição das revistas será dividido em dous titulos, um para as civis, e outro para as criminaes. 

    Art. 39. Os emolumentos dos papeis que se expedirem serão recolhidos a um cofre, de que se deduzirá a quantia necessaria para as despezas miudas, e o resto será recolhido ao Thesouro, e havendo falta, este a supprirá.

CAPITULO III

DOS EMPREGADOS DO TRIBUNAL

     Art. 40. Para o expediente do Tribunal haverá um Secretario, que será formado em direito, podendo ser; um Thesoureiro, que servirá de Porteiro; e dous Continuos com a denominação de primeiro e segundo. 

    Art. 41. O Secretario escreverá em todos os processos, e diligencias do Tribunal vencendo unicamente o ordenado de 2:000$000. Os emolumentos, que deveria receber, serão recolhidos ao cofre do Tribunal. 

    Art. 42. Haverá um Official de Secretaria com o ordenado de 1:000$000; o qual servirá nos impedimentos repentinos do Secretario. 

    Art. 43. O Thesoureiro, que é tambem Porteiro, terá a seu cuidado a guarda, limpeza, e asseio da casa do Tribunal, todos os utensilios, e tudo quanto ahi fôr arrecadado, terá o ordenado de 800$000, não percebendo mais cousa alguma, nem como Thesoureiro, nem para as despezas do asseio da casa. 

    Art. 44. Os Continuos farão o serviço por semana, e um no impedimento de outro, quando acontecer, ainda que não seja da sua semana. Aquelle, a quem tocar, estará sempre prompto junto ao Porteiro nos dias de Tribunal, para executar tudo o que lhe fôr ordenado á bem do serviço. Os Continuos servirão de Ajudantes do Porteiro nos impedimentos deste; e terão de ordenado 400$000. 

    Art. 45. Todas as despezas miudas do Tribunal, como são papel, pennas, tinta, arêa, lacre, obrêas, nastro, ou fitilho, serão pagas pelo cofre dos emolumentos, em folha, que formará o Thesoureiro todos os mezes, assignada pelo Presidente. 

    Art. 46. As entradas dos emolumentos para o cofre serão lançadas em livro de receita proprio, e serão recenseadas de seis em seis mezes por um dos membros do Tribunal, que por nomeação do mesmo servirá de Juiz das despezas. 

    Art. 47. Ficam revogadas todas as leis, alvarás, decretos e resoluções em contrario. 

    Mandamos portanto a todas as autoridades, a quem o conhecimento, e execução da referida Lei pertencer, que a cumpram, e façam cumprir e guardar tão inteiramente como nella se contém. O Secretario de Estado dos Negocios da Justiça a faça imprimir, publicar e correr.

      Dada no Palacio do Rio de Janeiro aos 18 de Setembro de 1828, 7º da Independencia, e do Imperio.

IMPERADOR com guarda. 
L. S.

José Clemente Pereira.

Este texto não substitui o publicado na CLBR, de 1828

     Carta de Lei, pela qual Vossa Magestade Imperial Manda executar o Decreto da Assembléa Geral, que houve por bem sanccionar, sobre a creação do Supremo Tribunal de Justiça; numero dos Ministros, de que deve ser composto; suas attribuições, e negocios, que ao mesmo Tribunal ficam competindo, tudo na fórma acima declarada.

Para Vossa Magestade Imperial ver. 
Antonio Alvares de Miranda Varejão a fez.

     Registrada nesta Secretaria de Estado dos Negocios da Justiça a fl. 10 do L. 1º de leis. Rio de Janeiro em 8 do Outubro de 1828. - João José da Motta.

Monsenhor Miranda.

     Foi publicada esta Carta de Lei nesta Chancellaria-mór do Imperio do Brazil. Rio de Janeiro, 9 de Outubro de 1828. - Francisco Xavier Rapozo de Albuquerque. 
     Registrada na Chancellaria-mór do Imperio do Brazil a fl. 136 do L. 1º de cartas, leis e alvarás. Rio de Janeiro, 9 de Outubro de 1828. - Manoel de Azevedo Marques.

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