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Presidência
da República |
DESPACHO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA
ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
Processo nº 00688.001946/2024-97. Parecer nº JM-09 de 17 de fevereiro de 2025, do Advogado-Geral da União, que adotou, nos termos estabelecidos no Despacho do Consultor-Geral da União nº 00907/2024/GAB/CGU/AGU, o Parecer nº 00024/2024/CONSUNIAO/CGU/AGU. Aprovo. Publique-se, para os fins do disposto no art. 40, § 1º, da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993. Em 17 de fevereiro de 2025.
PROCESSO ADMINISTRATIVO Nº: 00688.001946/2024-97
INTERESSADO: CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO – CGU
ASSUNTO: LICENÇAS / AFASTAMENTOS.
PARECER Nº JM - 09
ADOTO, para fins do art. 41 da Lei Complementar n.º 73, de 10 de fevereiro de 1993, nos termos do Despacho do Consultor-Geral da União nº 00907/2024/GAB/CGU/AGU, de 6 de fevereiro de 2025, o Despacho nº 00395/2024/CONSUNIAO/CGU/AGU, e o Parecer nº 00024/2024/CONSUNIAO/CGU/AGU, datados de 17 de dezembro de 2024, e submeto-o ao EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DA REPÚBLICA, para os efeitos do art. 40, § 1º, da referida Lei Complementar, tendo em vista a relevância da matéria versada.
Brasília, 17 de fevereiro de 2025.
JORGE RODRIGO ARAÚJO MESSIAS
Ministro Chefe da Advocacia-Geral da União
DESPACHO n.º 00907/2024/GAB/CGU/AGU
NUP: 00688.001946/2024-97
INTERESSADOS: CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO – CGU
ASSUNTOS: LICENÇAS / AFASTAMENTOS
Excelentíssimo Senhor Advogado Geral da União,
Aprovo, nos termos do DESPACHO n.º 00395/2024/CONSUNIAO/CGU/AGU, o PARECER n.º 00024/2024/CONSUNIAO/CGU/AGU, da lavra da Advogada da União Yasmin de Moura Dias.
Nestes termos, submeto as manifestações desta Consultoria-Geral da União à vossa análise, para que, sendo acolhidas, sejam encaminhadas à elevada apreciação do Excelentíssimo Senhor Presidente da República, para os fins dos artigos 40, §1.º, e 41 da Lei Complementar n.º 73, de 10 de fevereiro de 1993.
Brasília, 6 de fevereiro de 2025.
ANDRÉ AUGUSTO DANTAS MOTTA AMARAL
Advogado da União
Consultor-Geral da União
DESPACHO n. 00395/2024/CONSUNIAO/CGU/AGU
NUP: 00688.001946/2024-97
INTERESSADOS: CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO - CGU
ASSUNTOS: LICENÇAS / AFASTAMENTOS
Estou de acordo com o PARECER n. 00024/2024/CONSUNIAO/CGU/AGU, elaborado pela Advogada da União Dr.ª Yasmin de Moura Dias.
Submeto-o à consideração do Senhor Consultor-Geral da União.
Brasília, 17 de dezembro de 2024.
Maria Helena Martins Rocha Pedrosa
Advogada da União
Consultora da União
PARECER n. 00024/2024/CONSUNIAO/CGU/AGU
NUP: 00688.001946/2024-97
INTERESSADOS: CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
ASSUNTOS: TEMA 1.072 DE REPERCUSSÃO GERAL
EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 1.211.446 COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. TEMA 1.072. LICENÇA-MATERNIDADE À SERVIDORA OU TRABALHADORA NÃO GESTANTE EM UNIÃO HOMOAFETIVA. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO. CONDIÇÕES.
1. Apreciando o Tema 1.072 da Repercussão Geral, o Supremo Tribunal Federal negou provimento ao Recurso Extraordinário nº 1.211.446 e, por maioria, fixou a seguinte tese: “A mãe servidora ou trabalhadora não gestante em união homoafetiva tem direito ao gozo de licença-maternidade. Caso a companheira tenha utilizado o benefício, fará jus à licença pelo período equivalente ao da licença-paternidade”.
2. A licença-maternidade (art. 7º, XVIII, e art. 39, §3º, ambos da CF/1988) é direito cujo objeto de tutela é plural, de modo que as suas dimensões contemplam (i) a proteção do mercado de trabalho feminino, irradiando efeitos sobre as esferas previdenciária e assistencial (arts. 7º, XX; 201, II, e 203, I, todos da CF/1988); (ii) o melhor interesse do infante; e (iii) a sua proteção integral (arts. 1º, III; 227, caput e §3º, da CF/1988).
3. A posição seguida pela Suprema Corte prestigia não só a concepção plural de família (ADI 4.277), mas também a proteção à maternidade e à infância como direito social inderrogável (art. 6º, caput, da Carta Política), cujo cumprimento demanda ações positivas do Estado.
4. Tem-se especial destaque ao bem-estar do recém-nascido e à sua peculiar condição, propiciando circunstâncias benéficas ao seu saudável desenvolvimento no seio familiar, sobretudo pela maior disponibilidade de cuidados no período de afastamento laboral, o que é essencial à harmonia da família (arts. 226 e 227 da Constituição Federal).
5. A vinculação da Administração Pública Federal ao quanto decidido pelo Supremo Tribunal Federal é medida que confere maior segurança jurídica à aplicação da tese e que reflete o esforço de pautar uma atuação mais racional, justa e eficaz do Poder Público.
6. Há, ainda, impactos positivos na redução da litigiosidade enfrentada pela AGU, o que reforça a atuação consensual e dialógica deste órgão em prol dos interesses públicos compartilhados pela sociedade.
7. Viabilidade de, em caso de acolhimento das presentes conclusões, submeter este opinativo à apreciação do Advogado-Geral da União e à aprovação do Exmo. Sr. Presidente da República, a fim de vincular a Administração Pública Federal a seus termos (arts. 40 e 41 da Lei Complementar nº 73/1993), a partir da data de sua publicação.
Senhor Consultor-Geral da União,
I - RELATÓRIO
1. Conforme noticiado no Despacho nº 776/2024/GAB/CGU/AGU (seq. 1), o Supremo Tribunal Federal firmou, sob a sistemática da repercussão geral, tese segundo a qual “A mãe servidora ou trabalhadora não gestante em união homoafetiva tem direito ao gozo de licença-maternidade. Caso a companheira tenha utilizado o benefício, fará jus à licença pelo período equivalente ao da licença-paternidade” (Tema 1.072).
2. Foi questionada, diante do trânsito em julgado do leading case, a “viabilidade da aplicação administrativa” do enunciado, pois não imediatamente dotado de eficácia geral e vinculante com relação à Administração Pública (art. 927, III, do CPC).
3. Via Despacho nº 348/2024/CONSUNIAO/CGU/AGU (seq. 3), os autos foram encaminhados a uma série de órgãos para exame e manifestação, com o fim de reunir elementos para a avaliação da conveniência e da oportunidade da extensão ao Poder Executivo da aplicação da tese transcrita.
4. Ato contínuo, manifestaram-se a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (seq. 22), a Consultoria Jurídica junto ao Ministério das Mulheres (seqs. 23 e 24), a Consultoria Jurídica junto ao Ministério da Defesa (seqs. 25 e 26), o Ministério da Previdência Social (seqs. 28 a 30), a Consultoria Jurídica adjunta ao Comando da Marinha, a Consultoria Jurídica adjunta ao Comando da Aeronáutica, a Secretaria-Geral de Contencioso (seqs. 41 a 45) e a Procuradoria-Geral da União (seq. 49). Posteriormente, pronunciaram-se a Subprocuradoria Federal de Consultoria Jurídica, unidade da Procuradoria-Geral Federal (NUP 00407.055334/2024-2 e seqs. 57 a 59) e o Comando do Exército (seqs. 51 a 56).
5. Retornaram os autos a esta unidade consultiva com encaminhamento a esta subscritora “para análise quanto à viabilidade de elaboração de parecer vinculante, nos termos do DESPACHO n. 00776/2024/GAB/CGU/AGU (seq. 1)” (seq. 50), após a devida análise das manifestações referidas no item anterior.
6. É o relato do essencial. Passo a fundamentar.
II - FUNDAMENTAÇÃO
a) Viabilidade de edição de parecer vinculante sobre a matéria, de acordo com a sistemática dos arts. 40 e 41 da Lei Complementar nº 73/1993
7. O parecer jurídico elaborado pela Advocacia-Geral da União possui, como regra, caráter essencialmente opinativo, servindo como uma manifestação técnica sobre questões jurídicas específicas. Esse tipo de parecer oferece uma análise fundamentada e orientações sobre a aplicação e a interpretação de normas jurídicas, não possuindo, por si, o poder de obrigar a Administração a adotar uma determinada posição ou a seguir uma orientação específica.
8. No entanto, em conformidade com o rito estabelecido pelos arts. 40 e 41 da Lei Complementar nº 73/1993, é juridicamente admissível que um parecer jurídico vincule a atuação da Administração Federal, devendo, para tanto, seguir um procedimento formal que passa (i) pela aprovação do Advogado-Geral da União, com a sua subsequente (ii) remessa para a aquiescência do Excelentíssimo Presidente da República, com o intuito de que seja, finalmente, (iii) publicado no Diário Oficial da União.
9. Devido ao seu status de decisão governamental oficial, devidamente publicizada na imprensa, os órgãos e entidades da Administração Pública Federal passam a ser obrigados a seguir e a cumprir o disposto no parecer, como uma norma com efeito vinculante. O seu cumprimento fiel assegura a uniformidade na aplicação das normas e a coerência das decisões administrativas.
10. O rito descrito, reitere-se, assegura que haja um entendimento homogêneo sobre questões jurídicas relevantes, evitando decisões contraditórias e promovendo a coesão nas práticas administrativas do governo.
11. Com apoio nos elementos informativos que instruem estes autos, bem como tendo-se em mente a argumentação construída em linhas vindouras, entende-se que a conclusão assentada no Tema 1.072 de Repercussão Geral, para além dos efeitos típicos projetados na seara judicial, encontra-se dotada de suficiente maturidade para a sua incorporação na prática administrativa.
12. A bem da verdade, a tese se alinha com posicionamento já admitido por vários dos órgãos consultados, o que permite avançar na vinculação definitiva da Administração Pública Federal ao quanto decidido pela Suprema Corte.
13. A tempo, não se ignora a dissonância manifestada por alguns dos órgãos interessados, o que não impede, todavia, que se consolide a posição do Poder Público no mesmo sentido do verbete vinculante em exame.
14. Tal posicionamento se justifica no fato de que as objeções, no mais das vezes — ilação não imune a exceções —, não atingem o cerne da conclusão obtida pelo STF, preservando o núcleo essencial de admissibilidade de concessão da licença-maternidade em relacionamentos homoafetivos.
15. A definição assertiva de uma resposta sobre o tema, nesta trilha, é útil à estabilização da práxis administrativa em determinado sentido, contribuindo, de mais a mais, com o reconhecimento de direitos, com a eficiência administrativa e com a redução da litigiosidade sobre o tema.
16. A postura acaba por afirmar, ainda, o Poder Público como agente garantidor das variadas — e multifacetadas — promessas constitucionais, assegurando a força normativa1 da Carta Política e a máxima efetividade de direitos fundamentais indisponíveis.
b) O Tema 1.072 e o compromisso constitucional de proteção à família, à maternidade e infância
17. A Constituição Federal de 1988, ao dedicar um capítulo próprio à família, “não limitou a sua formação a casais heteroafetivos nem a formalidade cartorária, celebração civil ou liturgia religio”2, tratando de ampliar a sua leitura pelo prisma da reunião voluntária de indivíduos mediante laços afetivos e recíprocos3 4.
18. Conforme compreensão corrente, os elos familiares se formam através de arranjos plurais e complexos que reclamam especial sensibilidade interpretativa, haja vista se estar diante, acima de mero instituto jurídico, de conceito social que espelha os “núcleos naturais e fundamentais da sociedade” (art. 16, item 3, da Declaração Universal dos Direitos Humanos).
19. O art. 226 da CF/1988, refletindo o entendimento acima, afirma que “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”, prescrição que contém evidente mandado direcionado à Administração para que atue, de um lado, no sentido de promover políticas públicas que protejam tais conformações sob uma perspectiva coletiva, mas também para que, por outro, não interfira na realização de projetos pessoais dos cidadãos.
20. Convém ressaltar, por pertinência, que o raciocínio perfilhado segue o resultado do julgamento da ADI 4.277, de relatoria do Min. Ayres Britto, responsável por dar interpretação conforme à Constituição ao art. 1.723 do Código Civil, excluindo “do dispositivo em causa qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família”.
21. As premissas acima compõem o cenário de fundo do RE 1.211.446, leading case do Tema 1.072 de Repercussão Geral, cuja controvérsia foi assim sumarizada: “Possibilidade de concessão de licença-maternidade à mãe não gestante, em união estável homoafetiva, cuja companheira engravidou após procedimento de inseminação artificial”.
22. A ementa do julgado, que retrata as suas razões de decidir, possui o seguinte teor:
EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. LICENÇA-MATERNIDADE. ARTIGOS 7º, XVIII, E 201, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. UNIÃO ESTÁVEL HOMOAFETIVA. INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL. SILÊNCIO LEGISLATIVO. CONCEITO PLURAL DE FAMÍLIA. MULTIDIVERSIDADE. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO INSTITUÍDO PRIMORDIALMENTE NO INTERESSE DA CRIANÇA. FUNDAMENTALIDADE DA CONVIVÊNCIA PRÓXIMA COM A GENITORA NA PRIMEIRA INFÂNCIA. PROTEÇÃO INTEGRAL À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. NECESSIDADE DE EXTENSÃO DO BENEFÍCIO À MÃE NÃO GESTANTE. IMPOSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE DOIS BENEFÍCIOS IDÊNTICOS EM UM MESMO NÚCLEO FAMILIAR. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. O sobreprincípio da dignidade da pessoa humana e a realidade das relações interpessoais no seio de nossa sociedade impõem regime jurídico que protege diversos formatos de família que os indivíduos constroem a partir de seus vínculos afetivos. Esta concepção plural de família resta patente no reconhecimento constitucional da legitimidade de modelos familiares independentes do casamento, como a união estável e a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, cognominada família monoparental (art. 226, §§ 3º e 4º da CF de 1988).
2. O Supremo Tribunal Federal assentou, no histórico julgamento da ADI 4.227 (Rel. Min. Ayres Britto, Tribunal Pleno, DJe 14/10/2011), o novel conceito de família, como instituição que também se forma por vias distintas do casamento civil e que abrange, com igual dignidade, uniões entre casais heteroafetivos e pares homoafetivos, a partir de uma exegese não reducionista.
3. A licença-maternidade constitui benefício previdenciário destinado, em conjunto com outras previsões, a concretizar o direito fundamental social de proteção à maternidade e à infância, mencionado no caput do art. 6º da CF. A temática relaciona-se à inserção da mulher no mercado de trabalho, que conduziu os Estados a promoverem políticas públicas que conciliassem a vida familiar e o melhor interesse dos filhos com a atividade laboral, para o desenvolvimento pessoal e profissional da mulher.
4. A proteção à maternidade constitui medida de discriminação positiva, que reconhece a especial condição ou papel da mulher no que concerne à geração de filhos e aos cuidados da primeira infância, tendo como ratio essendi primordial o bem estar da criança recém-nascida ou recém-incorporada à unidade familiar.
5. O convívio próximo com a genitora na primeira infância é de fundamental importância para o desenvolvimento psíquico saudável da criança. É que a garantia de períodos estendidos de licença-maternidade está associada, na literatura médica, entre outras coisas à redução da mortalidade infantil em países de todos os níveis de renda (HEYMANN et al. Paid parental leave and family wellbeing in the sustainable development era. Public Health Reviews, 2017, 38:21).
6. A ratio essendi primordial de proteção integral das crianças do instituto da licença-maternidade, tem diversos precedentes no sentido da extensão deste benefício a genitores em casos não expressamente previstos na legislação. Nesse sentido, a jurisprudência consagrou que a duração do benefício deve ser idêntico para genitoras adotivas e biológicas (RE 778.889, Tribunal Pleno, Rel. Min. Roberto Barroso, DJe 01/08/2016); reconheceu-se o gozo da licença a servidores públicos solteiros do sexo masculino solteiro que adotem crianças (RE 1.348.854, Tribunal Pleno, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe 24/10/2022); e garantiu-se o direito à licença também às servidoras públicas detentoras de cargos em comissão (RE 842.844, Tribunal Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 06/12/2023).
7. As normas constitucionais relativas ao direito à licença-maternidade à mãe não gestante em união homoafetiva não podem ser interpretadas fora do contexto social em que o ordenamento jurídico brasileiro se insere, impondo-se opção por interpretação que confira máxima efetividade às finalidades perseguidas pelo Texto Constitucional.
8. O direito à igualdade, expresso no art. 5º, caput, da Constituição Federal, pressupõe a consideração das especificidades indevidamente ignoradas pelo Direito, especialmente aquelas vinculadas à efetivação da autonomia individual necessária à autorrealização dos membros da sociedade. Na linha da definição formulada por Ronald Dworkin, a igualdade equivale a tratar a todos com o mesmo respeito e consideração (DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério, São Paulo: Martins Fontes, 2010, p. 419).
9. À luz da isonomia, não há que se falar exclusão da licença-maternidade às mães não gestantes em união homoafetiva. A Constituição Federal de 1988 concede à universalidade das mulheres a proteção constitucional à maternidade, independentemente do prévio estado de gravidez.
10. O reconhecimento da condição de mãe à mulher não gestante, em união homoafetiva, no que concerne à concessão da licença-maternidade tem o condão de fortalecer o direito à igualdade material e, simbolicamente, de exteriorizar o respeito estatal às diversas escolhas de vida e configuração familiares existentes.
11. À luz do princípio da proporcionalidade, verifica-se a impossibilidade da concessão do benefício na hipótese abstrata de concorrência entre as mães a ambas simultaneamente em virtude de uma única criança, devendo a uma delas ser concedida a licença-maternidade e à outra afastamento por período equivalente ao da licença-paternidade. Saliente-se no ponto que o Plenário desta Corte declarou, recentemente, no julgamento da ADO 20, a existência de omissão inconstitucional do Congresso Nacional no que concerne à regulamentação da licença-paternidade, assinalando prazo de 18 meses ao Poder Legislativo Federal para a colmatação da lacuna normativa.
12. In casu, tem-se quadro fático em que o direito de trabalhadora não gestante em união homoafetiva ao gozo de licença-maternidade foi reconhecido, em contexto em que sua companheira, a mãe gestante, não usufruiu do benefício, de sorte que a decisão recorrida se adéqua perfeitamente à melhor interpretação constitucional.
13. Recurso extraordinário a que se NEGA PROVIMENTO, com a fixação da seguinte tese vinculante: “A servidora pública ou a trabalhadora regida pela CLT não gestante em união homoafetiva têm direito ao gozo da licença-maternidade. Caso a companheira tenha usufruído do benefício, fará jus a período de afastamento correspondente ao da licença-paternidade”. (grifei)
23. Perceptível, a partir da leitura do sumário reproduzido supra, que a posição encampada pela Suprema Corte prestigia não só a concepção plural de família, mas também a proteção à maternidade e à infância como direito social inderrogável (art. 6º, caput, da Carta Política), cujo cumprimento demanda ações positivas do Estado — visto que verdadeiro direito fundamental de segunda dimensão.
24. Deve-se compreender a licença-maternidade (art. 7º, XVIII, e art. 39, §3º, ambos da CF/1988), outrossim, como direito cujo objeto de tutela é plural: recai, a um só tempo, “sobre a mãe, o nascituro e o infante, para além de proteger a própria sociedade”5. Suas dimensões contemplam, portanto, (i) a proteção do mercado de trabalho feminino, irradiando efeitos sobre as esferas previdenciária e assistencial (arts. 7º, XX; 201, II, e 203, I, todos da CF/1988); (ii) o melhor interesse do infante; e (iii) a sua proteção integral (arts. 1º, III; 227, caput e §3º, da CF/1988).
25. Para a Convenção nº 102 da Organização Internacional do Trabalho6, subscrita pelo Brasil e incorporada na ordem jurídica interna via Decreto nº 58.820/1966, os Estados Partes “devem assegurar prestações de maternidade às pessoas amparadas”, contexto que engloba “a gravidez, o parto e suas consequências” (arts. 46 e 47), redação que caminha no sentido de uma interpretação sistemática e teleológica do instituto.
26. Consoante estabelecido pelo STF, a tutela dos laços maternais, na espécie, encontra justificativa no fato de que a “mãe não gestante em união homoafetiva, apesar de não vivenciar as alterações típicas da gravidez, arca com todos os demais papeis e tarefas que lhe incumbem após a formação do novo vínculo familiar”. Dado o rol de direitos inscritos no corpo da Constituição Federal e que são pertinentes ao tema, o Supremo declarou que é “dever do Estado assegurar especial proteção ao vínculo maternal, independentemente da origem da filiação ou da configuração familiar que lhe subjaz” (grifei).
27. Em outras palavras, protege-se a maternidade em uma concepção ampla, dissociada necessariamente do ato de gestar, visando à proteção daqueles que assumem tarefas inerentes ao dever de cuidado característico da primeira infância.
28. Confere-se especial destaque, igualmente, ao bem-estar do recém-nascido e à sua peculiar condição, propiciando circunstâncias benéficas ao seu saudável desenvolvimento no seio familiar, sobretudo pela maior disponibilidade de cuidados maternais no período de afastamento laboral, o que é essencial à harmonia da família (arts. 226 e 227 da Constituição Federal).
29. Como razões de decidir, também foram utilizados os princípios da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF/1988), da isonomia (art. 5º, caput, da CF/1988), da proporcionalidade sob o viés da vedação à proteção insuficiente e da proibição do retrocesso social.
30. Anote-se que o decisório em comento segue uma linha, já tracejada há muito pelo STF, de proteção às multiformes entidades familiares7, cabendo citar como exemplos os Temas 542 (RE 842.844)8, 782 (RE 778.889)9 e 1.182 (RE 1.348.854)10 de repercussão geral.
31. Especificamente quanto aos Temas 542 e 782, esta Advocacia-Geral da União já possui pareceres vinculantes incorporando as suas razões à praxe da Administração Federal11, o que robustece as razões favoráveis à adoção de postura idêntica quando ao Tema 1.072.
32. Não é demais acautelar que a interpretação de um precedente não pode se dar de forma decomposta dos fatos relevantes que lhe são subjacentes12, no que, caso ausente(s) alguma(s) de suas premissas, não há que se cogitar em sua imediata incidência. No mesmo sentido, Marinoni13 esclarece que “a própria interpretação constitucional se rendeu à realidade e aos fatos”, de modo que as Cortes perceberam que “a elaboração interpretativa não poderia deixar de considerar fatos para a concretização das normas constitucionais”.
33. Mediante análise casuística, porém, é possível que a tese vinculante seja utilizada em controvérsias semelhantes o suficiente para atrair a ratio decidendi14.
34. Também deve ser frisado que inexiste amparo jurisprudencial ou legal, ao menos no momento de subscrição deste opinativo, para a dupla concessão da licença-maternidade, sob pena de vulneração ao equilíbrio financeiro e atuarial que rege o sistema previdenciário (art. 40, caput, da CF/1988) e aos princípios da isonomia (art. 5º, caput, da CF/1988) e da proporcionalidade, a teor da parte final da tese firmada.
35. Cabe citar, por oportuno, o resultado do julgamento da ADI 751815, que decidiu de forma semelhante pela impossibilidade de dupla fruição da licença-maternidade em situações congêneres:
Ação direta de inconstitucionalidade. 2. Licença-parental. Arts. 137, caput, 139, parágrafo único, da Lei Complementar 46/1994; arts. 3º, caput, 4º, parágrafo único, da Lei Complementar 855/2017. 3. Inadmissibilidade de diferenciação entre filhos biológicos e adotivos. Equiparação das licenças. 4. Licença-parental aos pais solo. Ausência de norma estadual. Proteção insuficiente. Violação à isonomia, à proteção integral e à vedação à discriminação. 5. Licença-maternidade às servidoras civis temporárias e em comissão. Precedente. 6. Licença-maternidade à mãe não gestante em união homoafetiva. Possibilidade, desde que não usufruída idêntica licença pela companheira. 7. Livre compartilhamento da licença parental entre o casal. Ausência de obrigação constitucional. Liberdade de conformação do legislador. 8. Pedido julgado parcialmente procedente. (destaquei)
c) O dever da Administração Pública de observar as decisões do Supremo Tribunal Federal: Decreto nº 2.346/1997. Necessário reconhecimento de direitos e redução da cultura de litigiosidade, especialmente ante a formação de precedentes qualificados
36. Ressalta-se que o Supremo Tribunal Federal, como órgão máximo do Poder Judiciário brasileiro, recebeu das mãos do Poder Constituinte originário a nobre missão de guardar a Constituição Federal e de assegurar a sua supremacia em face das demais normas e dos atos do Poder Público (art. 102, caput).
37. Sendo assim, as suas decisões influenciam não apenas os casos concretos sob julgamento, mas também a interpretação e aplicação do direito brasileiro de forma ampla. No desenho trazido pela Carta Magna, essas decisões podem ter caráter vinculante ou não vinculante.
38. As decisões com caráter vinculante e efeitos erga omnes são aquelas que, uma vez proferidas, devem ser obrigatoriamente seguidas por todas as demais instâncias judiciais, bem como pela Administração Pública direta e indireta, em casos semelhantes. Esse efeito vinculante busca promover uniformidade na interpretação da Constituição Federal, evitando decisões contraditórias sobre uma mesma questão constitucional, como ocorre nas ações de controle concentrado de constitucionalidade.
39. Noutro giro, as decisões sem caráter vinculante são aquelas proferidas pelo STF em casos que não produzem automaticamente obrigatoriedade de observância por outras instâncias ou pela Administração Pública. Estas decisões são importantes para o caso concreto analisado, mas não estabelecem uma regra prospectiva obrigatória. É o que ocorre nos recursos extraordinários, os quais, muito embora firmem importantes precedentes, não possuem efeito vinculante. Ou seja, aplicam-se ao caso específico, servindo de orientação jurisprudencial para casos semelhantes, mas sem obrigar sua observância.
40. Sobre a importância do efeito vinculante, adverte Roger Stiefelmann Leal16:
A vinculação dos órgãos e poderes do Estado aos motivos, princípios e interpretações acolhidos pelos órgãos de jurisdição constitucional em suas decisões privilegia a estabilidade das relações sociais e políticas em relação a uma pretensa necessidade de flexibilizar a interpretação da Constituição de modo a adotá-la à realidade de cada momento e corrigir eventuais equívocos ou injustiças. A sujeição dos demais poderes à Constituição e, por conseguinte, ao sentido que lhe empresta a jurisdição constitucional atua no sentido de eliminar eventuais divergências hermenêuticas, em nome dos princípios da segurança jurídica, da igualdade e da unidade da Constituição.
41. Da vinculação da decisão tomada pelo STF decorre a proibição de os demais órgãos e entidades do Poder Judiciário e da Administração Pública direta e indireta das três esferas federativas adotarem via interpretativa diversa da acolhida pelo órgão encarregado da jurisdição constitucional.
42. Ocorre que, como visto, as decisões proferidas em sede de recursos extraordinários, mesmo com repercussão geral reconhecida, não vinculam tecnicamente a Administração Pública, compreensão extraída da interpretação conjunta dos arts. 927, III; 1.036 e 1.040, todos do Código de Processo Civil.
43. Nesse cenário, foi editado o Decreto nº 2.346, de 10 de outubro de 1997, o qual consolida normas de procedimentos a serem observadas pela Administração Pública federal em razão de decisões judiciais do STF, que permanece vigente até os dias atuais. Editado em uma época na qual ainda não existiam os institutos da repercussão geral e da súmula vinculante, bem como sequer havia as Leis nº 9.868 e nº 9.882, ambas do ano de 1999, suas normas visam precipuamente implementar, no âmbito da Administração Pública federal, uma cultura jurídica em torno do dever funcional de observar, respeitar e fazer aplicar as decisões do Supremo Tribunal Federal. Em seu art. 1º, deixa-se explícito que:
Art. 1º As decisões do Supremo Tribunal Federal que fixem, de forma inequívoca e definitiva, interpretação do texto constitucional deverão ser uniformemente observadas pela Administração Pública Federal direta e indireta, obedecidos aos procedimentos estabelecidos neste Decreto.
§ 1º Transitada em julgado decisão do Supremo Tribunal Federal que declare a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, em ação direta, a decisão, dotada de eficácia ex tunc, produzirá efeitos desde a entrada em vigor da norma declarada inconstitucional, salvo se o ato praticado com base na lei ou ato normativo inconstitucional não mais for suscetível de revisão administrativa ou judicial.
§ 2º O disposto no parágrafo anterior aplica-se, igualmente, à lei ou ao ato normativo que tenha sua inconstitucionalidade proferida, incidentalmente, pelo Supremo Tribunal Federal, após a suspensão de sua execução pelo Senado Federal.
§ 3º O Presidente da República, mediante proposta de Ministro de Estado, dirigente de órgão integrante da Presidência da República ou do Advogado-Geral da União, poderá autorizar a extensão dos efeitos jurídicos de decisão proferida em caso concreto. (destaquei)
44. Com isso, tem-se a consolidação de um modo de atuar da Administração Federal que não descuida do relevante papel atribuído ao STF pelo constituinte de 1988, destacando igualmente o papel da Advocacia-Geral da União como órgão que zela pela higidez da ordem constitucional.
45. Dessa maneira, a vinculação da Administração Pública Federal ao quanto decidido pelo Supremo Tribunal Federal sobre a concessão de licença-maternidade à mulher não gestante, em relacionamento homoafetivo, é medida que confere maior segurança jurídica à aplicação da tese e que reflete o esforço de pautar uma atuação mais racional, justa e eficaz do Poder Público.
46. Tem-se a oportunidade de fixar entendimento que harmoniza o direito à licença-maternidade (art. 7º, XVIII, e art. 39, §3º, ambos da CF/1988) com aqueles relacionados à proteção da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF/88), à maternidade e à infância (art. 6º, caput, da Carta Política), e à promoção do bem de todos (art. 3º, IV, da CF/1988).
47. Conserva-se, ademais, a racionalidade na aplicação do direito e a unidade que adjetiva o sistema, decorrência da adoção reiterada da mesma solução jurídica a casos congêneres.
48. Há, ainda, impactos positivos na redução da litigiosidade enfrentada pela AGU, o que reforça a atuação consensual e dialógica deste órgão em prol dos interesses públicos compartilhados no seio social17.
49. Por tudo isso, considerando que o STF pacificou o assunto analisado no presente parecer, bem como a racionalidade de que a Administração Pública siga as decisões do Supremo Tribunal Federal que fixem, de forma inequívoca e definitiva, a interpretação do Texto Constitucional, deve ser observada a tese fixada no Tema 1.072 da Repercussão Geral, no sentido de que “A mãe servidora ou trabalhadora não gestante em união homoafetiva tem direito ao gozo de licença-maternidade. Caso a companheira tenha utilizado o benefício, fará jus à licença pelo período equivalente ao da licença-paternidade”.
III - CONCLUSÃO
50. Por todo o exposto, conclui-se que a Administração Pública Federal deve observar, respeitar e dar efetivo cumprimento à decisão do Supremo Tribunal Federal que, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 1.211.446 (Tema 1.072 de Repercussão Geral), fixou a seguinte tese:
A mãe servidora ou trabalhadora não gestante em união homoafetiva tem direito ao gozo de licença-maternidade. Caso a companheira tenha utilizado o benefício, fará jus à licença pelo período equivalente ao da licença-paternidade.
51. Em caso de acolhimento da conclusão acima, este parecer poderá ser submetido à aprovação do Exmo. Presidente da República, e, uma vez publicado juntamente com o despacho presidencial, passará a vincular a Administração Pública Federal, cujos órgãos e entidades ficarão obrigados a lhe dar fiel cumprimento (arts. 40 e 41 da Lei Complementar nº 73/1993), a partir da data da publicação.
52. É o parecer. À consideração superior.
Brasília, 17 de dezembro de 2024.
Yasmin de Moura Dias
Advogada da União
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Notas
1. Para Canotilho (Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 1997. p. 1224), a “solução dos problemas jurídico-constitucionais deve dar prevalência aos pontos de vista que, tendo em conta os pressupostos da constituição (normativa), contribuem para uma eficácia ótima da lei fundamental. Consequentemente, deve dar-se primazia às soluções hermenêuticas que, compreendendo a historicidade das estruturas constitucionais, possibilitam a atualização normativa, garantindo, do mesmo pé, a sua eficácia e permanência”.
2. ADI 4.277 e ADPF 132, Rel. min. Ayres Britto, j. 5-5-2011, P, DJE de 14-10-2011.
3. DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. - 14. ed. rev. ampl. e atual - Salvador: Editora JusPodivm, 2021, p. 43.
4. Para Sérgio Resende Barros (A ideologia do afeto. Revista Brasileira de Direito de Família, PortoAlegre: Síntese e IBDFAM, v.14, p. 6-7, 2002), cuida-se de “um afeto especial, representado pelo sentimento de duas pessoas que se afeiçoam pelo convívio diuturno, em virtude de uma origem comum ou em razão de um destino comum, que conjuga suas vidas tão intimamente, que as torna cônjuges quanto aos meios e aos fins de sua afeição, até mesmo gerando efeitos patrimoniais”.
5. RE 842844, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 05-10-2023, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-s/n DIVULG 05-12-2023 PUBLIC 06-12-2023.
6. Acessada pelo site https://www.trt2.jus.br/geral/tribunal2/LEGIS/CLT/OIT/OIT_103.html.
7. Nas palavras adotadas pelo Relator, Min. Luiz Fux, “A este Supremo Tribunal Federal incumbe, na ausência de legislação que proteja suficientemente as entidades familiares diversas e, especialmente, as crianças integrantes destas entidades, fornecer, pela via da hermenêutica constitucional, os necessários meios protetivos”.
8. A trabalhadora gestante tem direito ao gozo de licença-maternidade e à estabilidade provisória, independentemente do regime jurídico aplicável, se contratual ou administrativo, ainda que ocupe cargo em comissão ou seja contratada por tempo determinado.
9. Os prazos da licença adotante não podem ser inferiores aos prazos da licença gestante, o mesmo valendo para as respectivas prorrogações. Em relação à licença adotante, não é possível fixar prazos diversos em função da idade da criança adotada.
10. À luz do art. 227 da CF, que confere proteção integral da criança com absoluta prioridade e do princípio da paternidade responsável, a licença maternidade, prevista no art. 7º, XVIII, da CF/88 e regulamentada pelo art. 207 da Lei 8.112/1990, estende-se ao pai genitor monoparental.
11. São, respectivamente, os Pareceres JM-06 (PARECER N. 00003/2024/CONSUNIAO/CGU/AGU) e GMF-01 (Parecer n. 003/2016/CGU/AGU).
12. Para Mitidiero (MITIDIERO, Daniel. Ratio Decidendi: quando uma questão é idêntica, semelhante ou distinta? - São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2023, p. 78), “fatos relevantes são aqueles sobre os quais operam as normas que determinam a solução de uma questão de direito”.
13. MARINONI, Luiz Guilherme. Fatos Constitucionais?: a (des)coberta de uma outra realidade do processo. - São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2024, p. 21.
14. Mitidiero (op. cit., p. 96), explica que “uma questão é semelhante à outra quando as proposições fático-jurídicas relevantes atinentes a posições e bens são congruentes em determinado nível de generalização, abstraídas, em regra, as pessoas, o lugar, o tempo e o valor envolvidos na situação da qual se originaram. [...] Como a questão semelhante é uma questão ainda não decidida, embora vizinda à outra já resolvida, seu terreno não é o do 'settled law', mas do 'case of first impression'. Antes de surgir o dever de decidir o caso de acordo com a ratio da questão semelhante, é preciso enquadrar a questão ainda não decidida em uma categoria capaz de justificar o tratamento dentro dos domínios da questão já resolvida. É preciso justificar, em outras palavras, a semelhança - a analogia entre as questões.”
15. ADI 7518, Relator(a): GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 16-09-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 01-10-2024 PUBLIC 02-10-2024.
16. LEAL, Roger Stiefelmann. O efeito vinculante na jurisdição constitucional. São Paulo: Saraiva, 2006, página 114.
17. Para Daniel Wunder Hachem (A dupla noção jurídica de interesse público em Direito Administrativo. Revista de Direito Administrativo e Constitucional. Belo Horizonte, ano 11, n. 44, Fórum), “não se deve ignorar a função ideológica de legitimação do poder exercida pela locução interesse público. Segundo Jacques Chevallier, a ideologia situada por trás dessa noção constitui a matriz do discurso de legitimação das formas sociais instituídas na modernidade. Muito embora se deva reconhecer esse papel legitimador que cumpre o interesse público, o conceito continua inserido nas diversas Constituições contemporâneas, sendo 'ingênuo pretender prescindir' dele. É o que aduz Alejandro Nieto, para quem 'Ninguém pode certamente desconhecer sua natureza e funções inequivocamente ideológicas; mas tampouco é lícito desconhecer sua presença normativa e operatividade jurídica'”.
Este texto não substitui o publicado no DOU de 19.2.2025