Presidência da República
Casa Civil
Secretaria Especial para Assuntos Jurídicos

DESPACHO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA

ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO

Processo nº 10951.008020/2024-19. Parecer nº JM-07 de 7 de fevereiro de 2025, do Advogado-Geral da União, que adotou, nos termos estabelecidos no Despacho do Consultor-Geral da União nº 00054/2025/GAB/CGU/AGU, o Parecer nº 00004/2025/CONSUNIAO/CGU/AGU. Aprovo. Publique-se, para os fins do disposto no art. 40, § 1º, da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993. Em 7 de fevereiro de 2025.

PROCESSO ADMINISTRATIVO Nº: 10951.008020/2024-19

INTERESSADO: ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL. SERVIDORAS PÚBLICAS FEDERAIS.

ASSUNTO: MOVIMENTAÇÃO DE SERVIDORAS PÚBLICAS FEDERAIS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. 

PARECER Nº JM - 07

ADOTO, para fins do art. 41 da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, nos termos do Despacho do Consultor-Geral da União nº 00054/2025/GAB/CGU/AGU, de 5 de fevereiro de 2025, o Parecer nº 00004/2025/CONSUNIAO/CGU/AGU, de 24 de janeiro de 2025, e submeto-o ao EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DA REPÚBLICA, para os efeitos do art. 40, § 1.º, da referida Lei Complementar, tendo em vista a relevância da matéria versada.

Brasília, 7 de fevereiro de 2025.

JORGE RODRIGO ARAÚJO MESSIAS

Ministro Chefe da Advocacia-Geral da União

DESPACHO Nº 00054/2025/GAB/CGU/AGU

NUP: 10951.008020/2024-19

INTERESSADOS: ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL. SERVIDORAS PÚBLICAS FEDERAIS.

ASSUNTO: MOVIMENTAÇÃO DE SERVIDORAS PÚBLICAS FEDERAIS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA.

Excelentíssimo Senhor Advogado Geral da União,

Aprovo, nos termos do DESPACHO n. 00024/2025/CONSUNIAO/CGU/AGU, o PARECER n. 00004/2025/CONSUNIAO/CGU/AGU, da lavra da Advogada da União Alessandra Lopes da Silva Pereira.

Nestes termos, submeto as manifestações da Consultoria-Geral da União à análise de Vossa Excelência, para que, sendo acolhidas, sejam encaminhadas à elevada apreciação do Excelentíssimo Senhor Presidente da República, para os fins dos artigos 40, §1.º, e 41 da Lei Complementar n.º 73, de 10 de fevereiro de 1993.

Brasília, 5 de fevereiro de 2025

ANDRÉ AUGUSTO DANTAS MOTTA AMARAL

Advogado da União

Consultor-Geral da União

DESPACHO n. 00024/2025/CONSUNIAO/CGU/AGU

NUP: 10951.008020/2024-19

INTERESSADAS: ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL. SERVIDORAS PÚBLICAS FEDERAIS. 

ASSUNTO: MOVIMENTAÇÃO DE SERVIDORAS PÚBLICAS FEDERAIS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA.

Estou de acordo com o PARECER nº 00004/2025/CONSUNIAO/CGU/AGU, elaborado pela Advogada da União Dr.ª Alessandra Lopes da Silva Pereira.

Submeto-o à consideração do Senhor Consultor-Geral da União

Brasília, 27 de janeiro de 2025.

Maria Helena Martins Rocha Pedrosa

Advogada da União

Consultora da União

PARECER n. 00004/2025/CONSUNIAO/CGU/AGU

NUP: 10951.008020/2024-19

INTERESSADOS: ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL. SERVIDORAS PÚBLICAS FEDERAIS. 

ASSUNTO: MOVIMENTAÇÃO DE SERVIDORAS PÚBLICAS FEDERAIS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. 

EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. ESTATUTO DOS SERVIDORES PÚBLICOS FEDERAIS. REMOÇÃO. SERVIDORAS PÚBLICAS FEDERAIS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. DIVERGÊNCIA DE INTERPRETAÇÃO NORMATIVA NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL. VIABILIDADE DE CONCESSÃO DE REMOÇÃO POR MOTIVO DE SAÚDE. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE LESÃO À INTEGRIDADE FÍSICA OU MENTAL PERANTE JUNTA MÉDICA OFICIAL. REMOÇÃO A PEDIDO, A CRITÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO. POSSIBILIDADE DE DEFERIMENTO PARA HIPÓTESES DE RISCO À INTEGRIDADE FÍSICA OU PSÍQUICA DA SERVIDORA. DEFERIMENTO DE MEDIDA PROTETIVA JUDICIAL DE AFASTAMENTO DO AGRESSOR COMO INSTRUMENTO A DEMONSTRAR O INTERESSE PÚBLICO NA REMOÇÃO, HIPÓTESE EM QUE O ATO DEVE SER CONSIDERADO VINCULADO. COMPATIBILIDADE SUBSIDIÁRIA DE ACIONAMENTO DE TODAS AS FORMAS DE MOVIMENTAÇÃO, MEDIANTE ANÁLISE DO CONJUNTO PROBATÓRIO. PRIORIDADE ABSOLUTA NA TRAMITAÇÃO DOS PEDIDOS DE MOVIMENTAÇÃO DE SERVIDORAS PÚBLICAS FEDERAIS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. AUSÊNCIA DE DIREITO A AJUDA DE CUSTO NOS CASOS DE REMOÇÃO A PEDIDO. SUGESTÃO DE VINCULAÇÃO DE TODA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL AOS TERMOS DESTE PARECER.

I. A violência contra a mulher, como drama social transversal e enraizado em nossa cultura que é, não pode e não está sendo ignorada pelo Estado brasileiro, o qual tem o dever de conferir respostas contundentes ao seu resistente e lamentável avanço. 

II. Às servidoras públicas federais vítimas de violência doméstica é garantido o direito à remoção por motivo de saúde, previsto no artigo 36, parágrafo único, inciso III, alínea "b", da Lei nº 8.112/1990, quando comprovada por junta médica oficial a efetiva lesão à sua integridade física ou mental.

III. Às servidoras públicas federais vítimas de violência doméstica é garantido o direito à remoção a pedido, a critério da Administração, consagrado no artigo 36, parágrafo único, inciso II, da Lei nº 8.112/1990, quando constatada a existência de risco à sua integridade física ou mental, demonstrado pelo deferimento de medida protetiva judicial de afastamento do agressor, hipótese em que o ato deve ser considerado vinculado.

IV.  A inexistência do parâmetro objetivo para a concessão da remoção a que alude o item "III" não afasta a possibilidade de análise administrativa, caso a caso, da subsunção da hipótese da servidora pública federal vítima de violência doméstica a todos os instrumentos de movimentação de pessoal previstos na legislação de regência.

V. Em atenção à vontade legislativa expressa no artigo 9º, § 2º, inciso I, da Lei nº 11.340/2006, e com o objetivo de conferir a celeridade que a situação de vulnerabilidade que as vítimas de violência doméstica enfrentam, os pedidos de movimentação realizados por servidoras públicas federais nesta condição deverão ser processados, no âmbito da Administração Pública federal, com absoluta prioridade, sem prejuízo da necessária regulamentação acerca dos procedimentos internos de tramitação.

VI. A concessão das remoções, por motivo de saúde ou a critério da administração, referidas nos itens "II" e "III" acima, uma vez que atribuídas a pedido da servidora pública federal, não implicam direito a ajuda de custo em razão da mudança de domicílio, conforme previsto no artigo 53, § 3º, da Lei nº 8.112/1990.

VII. Caso as conclusões acima declinadas sejam acolhidas, sugere-se a Sua Excelência o Senhor Advogado-Geral da União o encaminhamento do presente parecer ao Excelentíssimo Senhor Presidente da República, para que os seus termos vinculem, consoante determinam os artigos 40 e 41 da Lei Complementar nº 73/1993, toda a Administração Pública federal, cujos órgãos e entidades ficarão obrigados a lhe dar fiel cumprimento, a partir da data de sua publicação.

Senhor Consultor-Geral da União,

I - RELATÓRIO

1. Em 28 de agosto de 2024, diversas entidades representativas (Comissão de Mulheres do Sindireceita, Comissão de Mulheres do Sindifisco, Tributos a Elas, Fisco com Elas, Elas no Orçamento, Instituto Empoderar, MPT Mulheres, Rede Equidade, ANAFE Mulheres, Carf com Elas, Aconcarf, ISP Brasil, CONDSEF/FENADSEF, Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional, Sindicato Nacional dos Analistas-Tributários da Receita Federal do Brasil, Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil, Associação Nacional dos Advogados Públicos Federais e Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional do Distrito Federal) encaminharam à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional pedido de parecer jurídico que contemplasse a possibilidade de remoção, a pedido, de servidoras vítimas de violência doméstica por motivo de saúde (artigo 36, parágrafo único, inciso III, alínea "b", da Lei nº 8.112/1990), "quando sua permanência no local de lotação ofereça risco para a sua integridade física e psicológica" (fl. 01 da seq. 1). 

2. De acordo com as entidades requerentes, embora a Lei nº 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) preveja o acesso prioritário à remoção (artigo 9º, § 2º, inciso I, da Lei nº 11.340/2006[1]), a referida proteção não tem sido suficiente para resguardar o acesso ao benefício. Além disso, aduzem que, conquanto a Lei nº 8.112/1990 estabeleça hipóteses taxativas para a concessão de remoção, a Administração Pública não tem conferido interpretação uníssona quanto à equiparação da remoção de servidora em situação de violência doméstica àquela atribuída por motivo de saúde. Acrescentam, neste sentido, que o cenário de insegurança jurídica e a morosidade para a decisão do Poder Público são incompatíveis com a urgência que marca as situações de violência doméstica, o que subsidiaria a necessidade de pacificação da matéria no âmbito da Administração Pública federal. Por fim, informam que o artigo 17 da Portaria RFB nº 340/2023[2] autoriza a remoção ou a alteração de localização física de unidade na hipótese em que comprovado risco excepcional e efetivo à integridade de servidores ou seus familiares.

3. Com fundamento nas aludidas razões, as entidades referidas solicitam (fl. 06 da seq. 1):

Diante de todo esse quadro de incertezas, as entidades e os coletivos objetivam que o Parecer Jurídico da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional possa contribuir positivamente para fornecer segurança jurídica ao tema. Solicita-se também que o tema seja encaminhado para a Advocacia-Geral da União - AGU, diante do parecer da PGFN, para vinculação de todos os órgãos da Administração Pública Federal e atenda aos critérios abaixo:

. Conceder remoção para outra localidade da vítima e dependentes em situação de risco à integridade física e psicológica;

. Estabelecer que a remoção é uma medida cautelar prioritária, equiparável às situações de risco à saúde, ou seja, independente do interesse da Administração, e que deve ser implementada imediatamente;

. Avaliar a possibilidade de criação protocolos específicos para a análise e concessão da remoção, garantindo que os pedidos das vítimas sejam tratados com a devida celeridade e que a proteção às vítimas seja a prioridade máxima;

. Manter em sigilo as informações sobre a remoção para garantia da segurança da vítima e de seus dependentes;

. Afastar a configuração de infração quando do inevitável abandono do cargo para fugir do seu agressor.

4. Em atenção à referida demanda, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional elaborou o Parecer SEI nº 4113/2024/MF (seq. 2), aprovado pelo DESPACHO nº 385/2024/PGFN-MF (seq. 3) e encaminhado pelo OFÍCIO SEI Nº 71882/2024/MF (seq. 4). O parecer da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional encontra-se delimitado pelos seguintes fundamentos e conclusões:

PESSOAL. REMOÇÃO. REMOÇÃO POR MOTIVO DE SAÚDE. SERVIDORA VÍTIMA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. ART. 9º, §2º, I, DA LEI Nº 11.340, DE 7 DE AGOSTO DE 2006. ENQUADRAMENTO NO ART. 36, PARÁGRAFO ÚNICO, INCISO III, ALÍNEA B, DA LEI Nº 8.112, DE 11 DE DEZEMBRO DE 1990. POSSIBILIDADE, DESDE QUE DEMONSTRADO QUE A LOTAÇÃO ATUAL OFERECE RISCOS À SAÚDE FÍSICA E/OU MENTAL DA SERVIDORA. NECESSIDADE DE PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. ATO VINCULADO.

A Lei nº 8.112, de 1990, ao prever o art. 36, parágrafo único, inciso III, alínea “b”, consagrou a prevalência da tutela ao direito subjetivo à saúde sobre o interesse público, visto que a remoção nessa hipótese legal deverá ocorrer independentemente da vontade da Administração ou da existência de vaga.

Nesse contexto, e considerando que a mulher em situação de violência doméstica e familiar sofre prejuízos diretos à sua saúde, seja física e/ou metal, parece-nos possível, com fundamento no princípio da dignidade da pessoa humana, e no dever geral do Estado de garantir assistência à mulher vítima de violência doméstica, enquadrar essa hipótese no art. 36, parágrafo único, inciso III, alínea “b”, da Lei nº 8.112, de 1990, garantindo-lhe a remoção por motivo de saúde.

Caberá à servidora, no entanto, apresentar o requerimento de remoção por motivo de saúde ao seu órgão de pessoal, acompanhado de documentos que evidenciem os prejuízos à sua saúde e a necessidade de remoção, demonstrando, portanto, à junta médica oficial que a sua permanência no local de lotação oferece risco a sua integridade física e psicológica.

A despeito do entendimento acima exposto, em pesquisa no sistema Sapiens, localizou-se manifestações divergentes ao aqui apresentado.

Diante disso, e considerando a necessidade de se dar um tratamento uniforme a todas as servidoras públicas federais, tendo em vista que a questão abrange toda a Administração Pública federal, sugere-se o encaminhamento da matéria à Consultoria-Geral da União da Advocacia-Geral da União, para que, no exercício de suas atribuições, verifique a possibilidade de se enquadrar no art. 36, parágrafo único, inciso III, alínea “b”, da Lei nº 8.112, de 1990, o pedido de remoção de servidoras que se encontram em situação de violência doméstica, notadamente quando comprovada que sua permanência no local de lotação ofereça risco a sua integridade física e psicológica.

5. Considerando a sugestão da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional de pacificação do tema em destaque no âmbito da Administração Pública federal, com o objetivo de subsidiar o posicionamento desta Consultoria-Geral da União, foram expedidos ofícios à Consultoria Jurídica junto ao Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (seq. 7), à Procuradoria-Geral Federal (seq. 8), à Consultoria Jurídica junto ao Ministério das Mulheres (seq. 9), à Secretaria-Geral de Administração da Advocacia-Geral da União (seq. 10) e à Diretoria de Projetos Especiais desta Consultoria-Geral da União (seq. 11).

6. Em atenção aos referidos expedientes, a Diretoria de Projetos Especiais desta Consultoria-Geral da União esclareceu não ter localizado manifestação jurídica antecedente que tratasse do tema e pontuou que, em matéria de pessoal, tem orientado a observância das manifestações emanadas pelo órgão central do Sistema de Pessoal Civil (SIPEC). Informou, ainda, ter localizado a Nota Técnica SEI nº 28290/2024/MGI (seq. 17), aprovada pela Secretaria de Gestão de Pessoas do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, a qual concluiu pela possibilidade de movimentação de servidor ou empregado público que se declare vítima de assédio moral ou sexual, discriminação e violência doméstica. E, por fim, destacou a existência da Portaria nº 468/2014, que disciplina o procedimento de remoção ou exercício provisório na Advocacia-Geral da União, e do PARECER n. 00033/2020/DECOR/CGU/AGU, que conclui que a remoção por motivo de saúde, em princípio, reveste-se de natureza provisória (seq. 14/16).

7. A Secretaria-Geral de Administração desta Advocacia-Geral da União, por sua vez, indicou que, até o momento, não registrou nenhum pedido de movimentação fundado na ocorrência de violência doméstica. Afirmou que entrou em contato com a Procuradoria-Geral Federal e com a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, as quais esclareceram também não terem recebido pedidos similares aos ora abordados. Informou, além disso, a existência do Projeto de Lei nº 4.688/2024, que propõe alterações na Lei nº 8.112/1990, para garantir o direito à remoção e à licença remunerada a mulheres vítimas de violência doméstica, bem como da Nota Técnica nº 28290/2024/MGI (seq. 17), a qual concluiu pela possibilidade de movimentação da servidora vítima de violência doméstica. Pontuou, ainda, que o artigo 9º, § 2º, inciso I, da Lei nº 11.340/2006, prevê o acesso prioritário à remoção quando a vítima de violência doméstica for servidora pública, e ressaltou a existência da Central de Atendimento à Mulher, a qual pode ser acessada, via telefone, pelo número 180 (seq. 18).

8. Já a Consultoria Jurídica junto ao Ministério das Mulheres destacou que a Secretaria Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres considerou que "a regulamentação efetiva e eficaz de remoção das servidoras, sem prejuízo para suas carreiras ou remuneração, é uma forma eficiente de assegurar seus direitos e preservar suas vidas". Indicou, ainda, que a unidade técnica considera a necessidade de que sejam aceitos documentos que registrem a violência, e não apenas o atestado médico. Ressaltou, nesta linha, a imprescindibilidade de elaboração de protocolo específico e célere para a elaboração dos pedidos de remoção fundados na caracterização de violência doméstica, tendo em vista o potencial risco à integridade física e à vida da vítima. Ressaltou que o Estado tem o dever de assegurar a assistência e coibir a violência no âmbito das relações familiares, nos termos do artigo 226, § 8º, da Constituição Federal [3], e do artigo 7º, alíneas "b" e "f", da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher [4]. Enfatizou, além disso, que, conforme a jurisprudência firmada pelo Superior Tribunal de Justiça, a palavra da vítima possui especial relevância probatória nos contextos de violência doméstica e familiar. Por fim, informou que dados recentemente divulgados pelo Atlas da Violência 2024 e pelo Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2024 apontam para o crescente número de casos de violência doméstica no Brasil (seq. 21/23).

9. A Procuradoria-Geral Federal, por seu turno, pontuou que a competência para orientação jurídica em assuntos relacionados a pessoal pertence ao órgão central do SIPEC, nos termos do Parecer GQ-46, ou seja, a Secretaria de Gestão de Pessoas do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos. Acrescentou também que a Lei nº 11.340/2006 não assegura um direito automático à remoção, mas apenas o acesso prioritário, o que subordina a hipótese às leis que disciplinam o regime jurídico de cada servidora pública. Contra-argumentou que, embora seja pertinente classificar a remoção ora discutida como aquela prevista no artigo 36, parágrafo único, inciso III, alínea "b", da Lei nº 8.112/1990, tal abordagem pode não ser suficiente para solver a questão, uma vez que: i) o procedimento respectivo, que implica perícia médica, pode ser incompatível com a urgência que a situação eventualmente requer; ii) a referida remoção só pode ocorrer no mesmo quadro de pessoal, o que pode dificultar a solução do problema em órgãos que possuam uma ou poucas sedes próximas geograficamente; iii) o Manual de Perícia Oficial em Saúde do Servidor Público Federal estabelece diversos requisitos para o deferimento da respectiva remoção. Nada obstante, concluiu pela possibilidade de adesão às razões expostas pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, no sentido de que a violência doméstica pode ser considerada, após avaliação do caso concreto, como motivo para a remoção a pedido, independentemente do interesse da Administração Pública, por motivo de saúde. Entendeu, destarte, que a questão ora vertida demanda solução legislativa, no sentido de garantir que as situações de violência doméstica sejam contempladas como hipótese de remoção (seq. 27/28).

10. Por fim, a Consultoria Jurídica junto ao Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos esclareceu que, em 10 de dezembro de 2024, a convite da Diretora de Provimento e Movimentação de Pessoal da Secretaria de Gestão de Pessoas, fora realizada reunião, com a participação de integrante desta Consultoria-Geral da União, para apresentação de minuta de portaria que visa a regulamentar a movimentação de servidoras vítimas de violência doméstica, na qual se concluiu pela necessidade de aprofundamento dos estudos acerca da hipótese. Acrescentou que, ao serem consultadas, as unidades técnicas da pasta (SGP/MGI e SRT/MGI) apresentaram opinativo do órgão central do SIPEC  (Nota Informativa SEI nº 47983/2024/MGI), o qual concluiu pela possibilidade de aplicação dos institutos de movimentação para o acolhimento de pedidos de vítimas de assédio, discriminação e violência doméstica, nos termos da Nota Técnica Referencial nº 28290/2024/MGI, porém, ressaltaram que a remoção por motivo de saúde demanda o reconhecimento por perícia oficial do acometimento da saúde, física ou mental, da servidora. Assim, pontuaram que a referida análise tem por objetivo avaliar a necessidade de tratamento de saúde e não necessariamente os riscos à segurança da servidora, o que demonstra que a remoção por motivo de saúde pode ser insuficiente para atender plenamente às demandas de proteção que os casos impõem. O referido cenário, concluem, reclama que os órgãos e entidades integrantes do SIPEC avaliem a aplicação de outras formas de movimentação da servidora, destacando que "o uso de instrumentos previstos em legislações e normas, como o Decreto nº 12.122, de 2024 e a Portaria MGI nº 6.719, de 2024, possibilita ações mais abrangentes, que incluem o acolhimento e a transferência da servidora para localidade segura". A partir das considerações técnicas acima, a Consultoria Jurídica junto ao Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos ponderou entender que a melhor alternativa para solucionar a questão ora posta à apreciação seria a edição de norma regulamentadora, a qual, segundo reforça, está sendo atualmente idealizada pelo Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, em parceria com o Ministério das Mulheres (seq. 29/31).

11. Concluída a instrução necessária, os autos seguiram conclusos para manifestação jurídica desta Consultoria da União.

II - FUNDAMENTAÇÃO

II.I - CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS

12. A análise sobre o arcabouço normativo que envolve a possibilidade de concessão de remoção para servidoras públicas federais vítimas de violência de doméstica pressupõe o exame do contexto constitucional e social em que está implicada a discussão. 

13. Sob o referido ponto de vista, é preciso reconhecer, preambularmente, que o dever de proteção das vítimas de violência doméstica decorre da própria institucionalização do estado democrático de direito pelo artigo 1º da Constituição Federal, o qual pressupõe a assunção pelo Estado brasileiro da obrigação de concretizar a justiça. Mas não é só. Decorre, igualmente, do objetivo fundamental fixado no artigo 3º da Carta Constitucional de promover o bem de todos, sem qualquer tipo de preconceito. Sucede, na mesma medida, da consagração da igualdade entre todos e, especificamente, daquela existente entre homens e mulheres: nos termos do artigo 5º, inciso I, da Constituição Federal, "homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações". Ainda em consonância com a Constituição Republicana, o legislador tem por compromisso punir qualquer discriminação atentatória aos direitos e liberdades fundamentais (artigo 5º, inciso XLI). Homens e mulheres são detentores dos mesmos deveres e devem exercê-los em igualdade quando em uma relação conjugal (artigo 226, § 5º). E, por fim, cabe ao Estado assegurar, conforme comanda o artigo 226, § 8º, da Lei Maior, a assistência à família, de modo a criar mecanismos que coíbam, efetivamente, a violência no âmbito de suas relações. 

14. O viés constitucional protetivo acima alinhavado encontra-se, ademais, reforçado por normativos de natureza internacional. Além dos padrões de igualdade capitaneados pela Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, é possível observar que o artigo 7, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, promulgada pelo Decreto nº 1.973/1996, não apenas reconhece que os Estados signatários condenam todas as formas de violência contra a mulher, mas também se comprometem a adotar diversas condutas de prevenção e punição do referido comportamento. Confira-se: 

Deveres dos Estados

Artigo 7

Os Estados Partes condenam todas as formas de violência contra a mulher e convêm em adotar, por todos os meios apropriados e sem demora, políticas destinadas a prevenir, punir e erradicar tal violência e a empenhar-se em:

a) abster-se de qualquer ato ou prática de violência contra a mulher e velar por que as autoridades, seus funcionários e pessoal, bem como agentes e instituições públicos ajam de conformidade com essa obrigação;

b) agir com o devido zelo para prevenir, investigar e punira violência contra a mulher;

c) incorporar na sua legislação interna normas penais, civis, administrativas e de outra natureza, que sejam necessárias para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher, bem como adotar as medidas administrativas adequadas que forem aplicáveis;

d) adotar medidas jurídicas que exijam do agressor que se abstenha de perseguir, intimidar e ameaçar a mulher ou de fazer uso de qualquer método que danifique ou ponha em perigo sua vida ou integridade ou danifique sua propriedade;

e) tomar todas as medidas adequadas, inclusive legislativas, para modificar ou abolir leis e regulamentos vigentes ou modificar práticas jurídicas ou consuetudinárias que respaldem a persistência e a tolerância da violência contra a mulher;

f) estabelecer procedimentos jurídicos justos e eficazes para a mulher sujeitada a violência, inclusive, entre outros, medidas de proteção, juízo oportuno e efetivo acesso a tais processos;

g) estabelecer mecanismos judiciais e administrativos necessários para assegurar que a mulher sujeitada a violência tenha efetivo acesso a restituição, reparação do dano e outros meios de compensação justos e eficazes;

h) adotar as medidas legislativas ou de outra natureza necessárias à vigência desta Convenção.

15. Conquanto sob o ponto de vista da igualdade formal a equiparação entre homens e mulheres, e, portanto, a proteção normativa entre os gêneros, esteja plenamente consagrada pela Carta de 1988 já no primeiro inciso do dispositivo que assegura os direitos e garantias fundamentais, bem como em compromissos internacionais de que o Brasil é signatário, infelizmente, sob o ponto de vista material, o referido postulado constitucional ainda demanda intervenções estatais e sociais para sua plena efetivação.

16. Nada obstante nosso arcabouço normativo seja robusto no sentido de enaltecer a proibição a qualquer tratamento discriminatório entre homens e mulheres e de coibir qualquer violação aos direitos à vida, à liberdade, à integridade física e psicológica, à intimidade e à honra, a violência doméstica e familiar é uma realidade trágica e crescente no Brasil, que atinge, indiscriminadamente, todas as camadas sociais.

17. A referida afirmação encontra-se respaldada em dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2024, publicado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública [5], e citado na NOTA n. 00013/2024/GAB-CONJUR-MM/CONJUR-MM/CGU/AGU.

18. O referido reporte aponta que, considerando os registros de homicídio, feminicídio, agressões no contexto de violência doméstica, ameaça, perseguição, violência psicológica e estupro, 1.238.208 mulheres foram vítimas dos referidos crimes no ano de 2023, número este que aponta para uma escalada crescente nos últimos anos.

19. Reportando-nos, ainda, a 2022, 1.410 mulheres foram vítimas de feminicídio no Brasil [6], patamar que cresceu para 1.467 em 2023, maior soma desde a tipificação, em 2015, do ilícito penal. Em outras palavras, este número significa que pelo menos 4 mulheres foram vítimas de feminicídio por dia no Brasil em 2023. Perdemos, portanto, 1 mulher a cada seis horas, a maioria delas negras, entre 18 e 44 anos, sendo 49,6% dos feminicídios cometidos com armas brancas e 64,3% praticados no interior das residências das próprias vítimas. Os companheiros, atuais ou anteriores, foram autores dos feminicídios em 84,2% dos casos. Por fim, 12,7% das vítimas de feminicídio em 2023 tinham uma medida protetiva de urgência ativa no momento do óbito.

20. Ainda segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2024, em 2023, registramos 8.372 tentativas de homicídio contra mulheres, desse total, 33,4% foram tentativas de feminicídio. Os números correspondentes aos demais crimes cometidos no âmbito da violência doméstica seguem a mesma tendência alarmante até aqui destacada: 

Também, as agressões em contexto de violência doméstica aumentaram: foram 258.941 vítimas mulheres, o que indica um crescimento de 9,8% em relação à 2022. O número de mulheres ameaçadas subiu 16,5%: foram 778.921 as mulheres que vivenciaram essa situação e registraram a ocorrência junto à polícia. O aumento dos registros de violência psicológica também foi grande, de 33,8%, totalizando 38.507 mulheres. O crime de stalking (perseguição) também subiu, com 77.083 mulheres passando por isso, um aumento de 34,5%.

No mesmo sentido caminharam os crimes sexuais com vítimas mulheres: o estupro (incluindo o estupro de vulnerável, que acontece quando a vítima é menor de 14 anos ou quando, sendo maior de 14 anos, não está em condições de consentir) cresceu 5,3% no período, vitimando pelo menos 72.454 mulheres e crianças do sexo feminino. Lembramos que, quando o tema é estupro, estamos falando especialmente de vítimas meninas, em sua maioria de 13 anos, a idade que concentra os maiores registros, como será explorado mais a fundo no capítulo sobre Violência Sexual.

Além dos dados dos crimes em si, a dimensão da gravidade do fenômeno da violência contra a mulher, em suas múltiplas formas, pode ser ilustrada com os dados de acionamento da Polícia Militar em razão de violência doméstica e com os dados do Poder Judiciário sobre Medidas Protetivas de Urgência. Foram 848.036 ligações para o 190 – serviço da PM utilizado para casos de emergência e pedidos de ajuda –, 663.704 novos processos na justiça com pedidos de medidas protetivas, dos quais 81,4% tiveram a medida (ou medidas) concedida. (fl. 135 do Anuário).

21. Apesar dos números acima refletidos demonstrarem o crescimento da violência doméstica no Brasil nos últimos anos, e embora seja possível reconhecer que eles espelham apenas parte do problema, tendo em vista a grande quantidade de casos não reportados ao Estado, é preciso assentir que os mecanismos estatais de coibição dessa prática tão perversa também têm sido robustecidos.

22. Após a condenação do Brasil, em 2001, pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos pela omissão na instituição de mecanismos de prevenção e combate à violência doméstica e familiar [7], o país editou, em 2006, a Lei nº 11.340 (Lei Maria da Penha) [8]. Em 2015, tipificou o feminicídio, tornando-o crime autônomo em 2024[9], ano em que a Lei nº 14.994/2024[10] também reconheceu que os processos que apuram a prática de violência contra a mulher terão prioridade de tramitação em todas as instâncias e robusteceu as penas do crime de lesão corporal no âmbito das relações domésticas.

23. Conforme bem pontuado por Maria Berenice Dias, "optou o legislador pelo uso do Direito, com seu reconhecido poder contrafático, apostando em que, longe de ser mero consectário dos costumes de uma sociedade, o Direito pode ser um instrumento de transformação da realidade, prenhe de desigualdades e injustiças"[11].

24. O Poder Judiciário também tem sido atento ao combate do avanço da violência doméstica. Tanto é assim que o Supremo Tribunal Federal, após impulso do então Presidente da República, reafirmou a constitucionalidade da Lei Maria da Penha em 2012, com o reconhecimento da impossibilidade de submissão dos casos de violência doméstica aos Juizados Especiais Criminais, o que implica a proibição de aplicação de medidas despenalizadoras, como a transação penal e a suspensão condicional do processo [12]. Também em 2012, o Supremo Tribunal Federal reconheceu natureza incondicionada da ação penal em caso de crime de lesão, ainda que de natureza leve, praticado contra a mulher no ambiente doméstico [13].  E, mais recentemente, em progressos interpretativos relevantes, a Suprema Corte brasileira também considerou inconstitucional a alegação da tese da legítima defesa da honra nas hipóteses de feminicídio [14] e explicitou que a perquirição quanto ao modo de vida da vítima nos processos apuratórios e julgamentos de crimes contra a dignidade sexual ofende os princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana [15]

25. No âmbito do Poder Executivo, por outro lado, destaca-se a criação do Ministério das Mulheres[16], no âmbito do qual instituída a Secretaria Nacional de Enfrentamento à Violência Contra Mulheres, que conduz, dentre outros programas, a Central de Atendimento à Mulher (Ligue 180), responsável por receber renúncias, reclamações e prestar informações sobre violência doméstica, bem como pela implementação, em parceria com estados e Municípios, de Casas da Mulher Brasileira, instituições de acolhimento e atendimento multidisciplinar de mulheres vítimas de violência doméstica.  

26. O Brasil, portanto, tem laborado no sentido de prevenir e coibir a violência doméstica. Os dados estatísticos acima indicados, contudo, demonstram a necessidade de avanços, os quais, considerados os limites imanentes ao presente instrumento, podem ser eficazmente adotados por este parecer, especialmente quanto à possibilidade de prevenção de que tais condutas se perpetuem, ou sigam se concretizando, contra servidoras públicas federais. 

II.II - DO DIREITO À MOVIMENTAÇÃO DE SERVIDORAS PÚBLICAS CIVIS DA UNIÃO, DAS AUTARQUIAS E DAS FUNDAÇÕES PÚBLICAS FEDERAIS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

27. As entidades que subscreveram o Ofício nº 01/2024 (seq. 1) solicitaram, como visto, a fixação de entendimento vinculante à Administração Pública federal, no sentido de que as servidoras públicas federais vítimas de violência doméstica possuem o direito de solicitar remoção por motivo de saúde. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, por sua vez, ao corroborar o pedido descrito, concluiu pela possibilidade de subsunção da hipótese ao artigo 36, parágrafo único, inciso III, alínea "b", da Lei nº 8.112/1990, desde que a servidora realize o pedido de remoção e comprove à junta médica que sua permanência no local de lotação atual oferece risco à sua integridade física e psicológica. 

28. Nos termos dos artigos 5º e 6º da Lei nº 11.340/2006[17], a violência doméstica e familiar é considerada modalidade de violação dos direitos humanos, a qual se concretiza mediante ação ou omissão, baseada no gênero, perpetrada no âmbito da unidade doméstica, da família ou em qualquer relação íntima de afeto, que cause à mulher morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico, dano moral ou patrimonial. 

29. Ainda de acordo com a Lei Maria da Penha [18], são formas de violência doméstica, entre outras, a violência física, psicológica, sexual, patrimonial e moral, assim compreendidas:

I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;

II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; (Redação dada pela Lei nº 13.772, de 2018)

III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;

IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;

V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.

30. Por outro lado, conforme os artigos 2º e 3º da Lei nº 11.340/2006[19], além da salvaguarda dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, às mulheres são asseguradas as condições ao exercício efetivo dos direitos à vida, à segurança, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, à moradia, o acesso à justiça, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária. A proteção legislativa referida, no mais, é seguida do comando ao Poder Público de desenvolver políticas públicas que visem a garantir os direitos humanos das mulheres no âmbito das relações domésticas e familiares, resguardando-as de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (artigo 3º, § 1º, da Lei 11.340/2006). 

31. O ordenamento jurídico impõe ao Poder Público, deste modo, um dever contundente de proteger e reprimir as ações e omissões cometidas contra mulheres vítimas de violência doméstica, bem como uma obrigação relevante de acolhê-las integralmente, de modo que possam exercer livremente seus direitos. Essas responsabilidades, quando replicadas ao regime jurídico que disciplina a relação entre o Estado e os seus servidores, podem ser consideradas qualificadas. Isso porque, nesta esfera, além da incidência  do dever de assegurar as condições para o exercício efetivo dos direitos fundamentais previstos na Constituição Federal e replicados no artigo 3º da Lei nº 11.340/2006, dentre os quais destaca-se o direito ao livre exercício da profissão, existe também a obrigação específica do Estado de zelar pelo bem estar de seus servidores, com o intuito de assim possibilitar, em atenção ao princípio da eficiência (artigo 37, "caput", da Constituição Federal[20]), as melhores condições para que o trabalho seja exercido da maneira mais profícua possível.

32. Tanto assim o é que a Lei nº 8.112/1990 reconhece aos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais não apenas o direito à retribuição pecuniária pela prestação dos respectivos serviços (artigos 40 a 48), mas também uma série de vantagens - como indenizações, gratificações e adicionais (artigos 49 a 76-A) -, licenças (artigos 81 a 92), afastamentos (artigos 93 a 96-A) e seguridade social (artigos 183 a 230). Na mesma direção, ao dispor sobre a remoção, mais uma vez a Lei nº 8.112/1990 demonstrou a prioridade na atenção aos seus servidores, ao possibilitar a movimentação para outra localidade, independentemente do interesse da administração, nas hipóteses que elenca o seu artigo 36, parágrafo único, inciso III, alíneas "a", "b" e "c".

33. Portanto, ao tratar especificamente acerca dos referenciais normativos atinentes à hipótese submetida a exame pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, é importante destacar que a Lei nº 11.340/2006, ao dispor sobre a assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar, prevê a possibilidade de concessão, pelo juiz, de acesso prioritário à remoção quando a vítima for servidora pública, com o fim de preservar-lhe a integridade física e psicológica. Vejamos, na literalidade, o comando da lei protetiva:

Art. 9º A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar será prestada em caráter prioritário no Sistema Único de Saúde (SUS) e no Sistema Único de Segurança Pública (Susp), de forma articulada e conforme os princípios e as diretrizes previstos na Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993 (Lei Orgânica da Assistência Social), e em outras normas e políticas públicas de proteção, e emergencialmente, quando for o caso.

(...)

§ 2º O juiz assegurará à mulher em situação de violência doméstica e familiar, para preservar sua integridade física e psicológica:

I - acesso prioritário à remoção quando servidora pública, integrante da administração direta ou indireta; (Grifou-se).

34. O artigo 9º, § 2º, inciso I, da Lei nº 11.340/2006, objetiva, nesta medida, conferir segurança à servidora pública, possibilitando-lhe o afastamento físico do agressor, sem prejuízo do exercício regular de suas atividades laborais.

35. Ocorre que, embora a Lei Maria da Penha estabeleça o acesso prioritário à remoção às servidoras públicas vítimas de violência doméstica, não é possível deduzir de seus comandos a existência de um direito subjetivo da servidora pública a uma nova modalidade de remoção, vinculada especificamente à existência da condição de vulnerabilidade, decorrente violência doméstica. A regra contemplada pela Lei nº 11.340/2006, deste modo, consagra apenas a alocação prioritária da servidora pública no eventual deslocamento, o qual deverá ser regido, de consequência, pelas disposições atinentes presentes nos regimes jurídicos a que submetidas as servidoras públicas vítimas de violência doméstica. Por conseguinte, somente após o reconhecimento do direito à remoção prevista no estatuto jurídico de pessoal a que submetida a servidora é que poderá a vítima de violência doméstica, nos termos do artigo 9º, § 2º, inciso I, da Lei nº 11.340/2006, ser contemplada por decisão judicial que lhe assegure o acesso prioritário à movimentação.

36. Assim, especificamente quanto ao regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais, é preciso destacar que a Lei nº 8.112/1990 consagra o instituto da remoção como o deslocamento do servidor, a pedido ou de ofício, no âmbito do mesmo quadro, com ou sem mudança de sede (artigo 36). A referida modalidade de movimentação do servidor público federal pode ocorrer, essencialmente, de duas maneiras: i) de ofício, no interesse da administração; e ii) a pedido, a critério da Administração ou independentemente do interesse do Poder Público. Neste último caso, ou seja, nas remoções a pedido, independentemente do interesse da Administração, o Estatuto dos Servidores Públicos Federais elenca três hipóteses taxativas que possibilitam a remoção: a) para acompanhamento de cônjuge ou companheiro; b) por motivo de saúde; e c) em razão da aprovação em processo seletivo. Vejamos:

Art. 36. Remoção é o deslocamento do servidor, a pedido ou de ofício, no âmbito do mesmo quadro, com ou sem mudança de sede.

Parágrafo único. Para fins do disposto neste artigo, entende-se por modalidades de remoção:

I - de ofício, no interesse da Administração;

II - a pedido, a critério da Administração;

III - a pedido, para outra localidade, independentemente do interesse da Administração:

a) para acompanhar cônjuge ou companheiro, também servidor público civil ou militar, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, que foi deslocado no interesse da Administração;

b) por motivo de saúde do servidor, cônjuge, companheiro ou dependente que viva às suas expensas e conste do seu assentamento funcional, condicionada à comprovação por junta médica oficial;

c) em virtude de processo seletivo promovido, na hipótese em que o número de interessados for superior ao número de vagas, de acordo com normas preestabelecidas pelo órgão ou entidade em que aqueles estejam lotados.

37. A análise quanto aos desdobramentos dos pedidos de remoção subscritos por servidoras públicas federais vítimas de violência doméstica, no entanto, demonstra a presença de certa divergência na compreensão da Administração Pública federal quanto à possibilidade de enquadramento dos referidos pleitos no artigo 36, parágrafo único, inciso III, alínea "b", da Lei nº 8.112/1990, ou seja, na hipótese de remoção a pedido, independente de interesse da Administração, por motivo de saúde da servidora. 

38. A pesquisa à base de dados do Sapiens espelha, assim, certa oscilação na compreensão de alguns órgãos acerca da hipótese. Isso porque, por vezes, é possível observar a presença de entendimentos que possibilitaram a concessão da remoção, com fundamento do artigo 36, parágrafo único, incisos II ou III, alínea "b", da Lei nº 8.112/1990, outros no sentido da inexistência de lastro normativo a respaldar o pedido e, ainda, aqueles que compreenderam pela necessidade de precedência de ordem judicial, com o intuito de atender ao comando previsto no artigo 9º, § 2º, inciso I, da Lei nº 11.340/2006. Confira-se [21]:

4- A requerente embasa seu pedido de remoção com mudança de sede, invocando, em especial, as disposições da Lei n. 11.340, de 2006 (Lei Maria da Penha), anexando aos autos documentos comprobatórios da concessão de Medida Protetiva (nº xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx) válida por 90 dias com vigência a partir de 03/04/2024.

8-  Assim,  a conduta do  Instituto Federal do Maranhão,  instituição pública nos termos da Lei n. 11.892, de 2008, deve primar pela tutela dos bens jurídicos de proteção à vida, à segurança, à liberdade e à dignidade de todas as servidoras que integram seu quadro de pessoal, que, ora  se traduz  na ação  permanente  para  preservar a integridade física e psicológica da  requerente, assegurando-lhe  a remoção com mudança de sede do Campus xxxxxxxx para o Campus xxxx, fundamentada  na  Lei n. 8.112, de 1990,   art. 36, inciso II  c/c a Resolução CONSUP n. 112, de 26 de junho de  2017 e na Lei n. 11.340, de 2006,  art. 9º, inciso I, com base no princípio constitucional de proteção à dignidade humana. NOTA JURÍDICA n. 00100/2024/PROJUR/PFIFMARANHÃO/PGF/AGU.  NUP: 23249.028960/2024-11.

DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. ESTATUTO DO SERVIDOR PÚBLICO CIVIL. REMOÇÃO A PEDIDO. SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÊSTICA. ACESSO PRIORITÁRIO À REMOÇÃO, QUE NÃO SE CONFUNDE COM REMOÇÃO A PEDIDO, INDEPENDENTEMENTE DO INTERESSE DA ADMINISTRAÇÃO. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DE REQUISITOS LEGAIS. ALTERNATIVAS.

(...) Assim, cabe observar que o Estatuto prevê duas categorias de remoção. A primeira é a remoção de ofício, fundamentada na supremacia do interesse público sobre o particular. Da conjugação dos dispositivos da Lei Maria da Penha com o presente, tem-se que, havendo interesse público na remoção de algum servidor da APS xxxxxxxxx, onde está lotada a servidora, ela terá a preferência, em havendo outros interessados. Entretanto, do despacho do consulente, não se observa fundamentação no sentido do interesse da Administração em removê-la, mas na aceitação de um pedido inspirado no interesse da própria servidora em proteger-se.

Tampouco pode haver a incidência do inciso III, uma vez que tratam de situações bem específicas (remoção para acompanhar cônjuge, por motivo de saúde ou em virtude de concurso de remoção), nenhuma delas aplicável ao caso. 

Na hipótese do inciso II, consta a possibilidade de deferimento da remoção a pedido, a critério da Administração. Ou seja, trata-se de decisão discricionária, que, em que pese não seja diretamente fundamentada na supremacia do interesse público, o deferimento no pedido não o prejudique de nenhuma forma.

(...) Assim, diante de todo o exposto, as três remoções referidas pelo consulente terão como fundamento o inciso II do art, 36 da Lei 8.112/1990, devendo ser formalizadas como remoções a pedido, a critério da Administração, o que, por não legitimar o pagamento de ajuda de custo, nos termos do art 53, §3º, do mesmo estatuto, retira o óbice levantado pelo consulente, no sentido da falta de dotação orçamentária. PARECER n. 00044/2016/SCONS/PSFE/INSS/SSA/PGF/AGU. NUP: 35013.000119/2016-93.

I- CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. INSTITUIÇÃO FEDERAL DE ENSINO SUPERIOR. SERVIDORA PÚBLICA. ALEGAÇÃO DE SOFRIMENTO DE VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA, PERPETRADA POR EX-COMPANHEIRO, TAMBÉM SERVIDOR DA MESMA IFE E EM EXERCÍCIO NA MESMA UNIDADE.

II- PEDIDO DE REMOÇÃO FORMULADO PELA SERVIDORA, A PRIORI POR MOTIVO DE SAÚDE, PORÉM ALUDINDO AO ART. 9⁰, § 2⁰, INC. I, DA LEI N. 11.340/2006 (LEI MARIA DA PENHA) E JUSTIFICADO NA NECESSIDADE DE MEDIDA PROTETIVA CONTRA O EX-COMPANHEIRO. APRESENTAÇÃO DE BOLETIM DE OCORRÊNCIA, RELATANDO À AUTORIDADE POLICIAL INJÚRIAS E VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA.

III- MEDIDA PROTETIVA NÃO OBTIDA, CONTUDO, NO PROCEDIMENTO JUDICIAL DA SERVIDORA CONTRA O EX-COMPANHEIRO. ADEMAIS, AUSÊNCIA DE PREVISÃO, NA LEI N. 8.112/1990, DE REMOÇÃO POR MOTIVO ESPECÍFICO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR, EMBORA A LEI MARIA DA PENHA) RESERVE EXPRESSAMENTE AO JUIZ A POSSIBILIDADE DE DETERMINAR EXCEPCIONALMENTE MEDIDA DE TAL NATUREZA.

IV- POSSIBILIDADE, NÃO OBSTANTE, DE CONCESSÃO DE REMOÇÃO POR MOTIVO DE SAÚDE, NOS TERMOS DO ART. 36, PARÁGRAFO ÚNICO, INC. III, “B”, DA LEI N. 8.112/1990, SE ATESTADO POR JUNTA MÉDICA OFICIAL O COMPROMETIMENTO DA SAÚDE EMOCIONAL DA SERVIDORA, PRESUMIVELMENTE RELACIONADO À IMINÊNCIA DE ENCONTROS COM O AUTOR DA ALEGADA VIOLÊNCIA, NO AMBIENTE DE TRABALHO. PARECER n. 00027/2022/CONSU/PFFUA/PGF/AGU.  NUP: 23105.016691/2022-12.

1. ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. PARECER. SERVIDORA. REMOÇÃO A PEDIDO. INDEPENDENTE DO INTERESSE DA ADMINISTRAÇÃO [ARTIGO 36, INCISO III, DA LEI N° 8.112/90]. NÃO SE APLICA. 2. MEDIDAS INTEGRADAS DE PREVENÇÃO [ARTIGO 9º, § 2º, INCISO I, DA LEI Nº 11.340/2006]. AUTORIDADE COMPETENTE. ÓRGÃO JUDICIAL. PROGEPE. INCOMPETENTE. 3. SERVIDORA. INTEGRIDADE FÍSICA E PSICOLÓGICA. MEDIDAS ADMINISTRATIVAS. EFEITOS LIMITADOS. REMOÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. MEDIDA QUE SE IMPÕE. PARECER n° 00011/2018/GAB/PF-UFERSA/PGF/AGU. NUP: 23091.015180/2017-12.

Remoção de Servidor – Medida Protetiva Judicial - Lei 11.340/2006 - Incidência no Âmbito Administrativo – Possibilidade.

(...) 11. Em face do exposto, é o presente parecer pelo acolhimento do pleito formulado pela Servidora xxxxxxx, a fim de que seja procedida a sua remoção para a Universidade Federal xxxxxxxxxxxxxxxxxx, na forma da lei, condicionado à juntada da ordem judicial respectiva, nos termos do artigo 9º, § 2º inciso I da Lei 11.340/2006. PARECER n. 00002/2018/GAB/PFUTFPR/PGF/AGU. NUP: 23064.026942/2017-25.

39. Como se nota, a análise quanto aos precedentes registrados nesta Advocacia-Geral da União denota a presença de divergência de compreensão jurídica acerca do âmbito normativo das disposições legais pertinentes. A instabilidade quanto à leitura legal, nesta medida, tem por efeito não apenas incutir insegurança jurídica nos gestores quanto à possibilidade de concessão de remoção às servidoras públicas federais, como também de resultar na insuficiência da necessária tutela estatal a possibilitar o pleno exercício dos direitos fundamentais de vítimas de violência doméstica.

40. O referido cenário atrai, por conseguinte, o acionamento do artigo 4º, incisos IX e X, da Lei Complementar nº 73, o qual estabelece como atribuição do Advogado-Geral da União "sugerir ao Presidente da República medidas de caráter jurídico reclamadas pelo interesse público", bem como "fixar a interpretação da Constituição, das leis, dos tratados e demais atos normativos, a ser uniformemente seguida pelos órgãos e entidades da Administração Federal", funções que poderão ser assistidas pela Consultoria-Geral da União, nos termos do artigo 10 da mesma Lei Complementar.

41. Observa-se, nesta medida, que o requerimento formulado no Ofício n. 01/2024 (seq. 1), que pleiteia a elaboração de parecer vinculante que contemple a interpretação das normas em destaque, aliado à constatação de divergência de compreensões jurídicas acerca do quadro normativo incidente à hipótese - o que tem o condão de causar não apenas mais sofrimento, mas também o agravamento do risco efetivo à vida e à integridade física e psíquica das servidoras públicas federais -, impõem o acionamento dos mecanismos à disposição da Administração Pública federal para sanar o cenário de insegurança e instabilidade jurídica. E isso se faz não por liberalidade, mas por imprescindibilidade de se resguardar a atuação segura do gestor, bem como de cumprir o dever de preservação dos direitos fundamentais das servidoras públicas federais vítimas de violência doméstica. 

42. Partindo de tal pressuposto, nota-se que o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos firmou, recentemente, a Nota Técnica SEI nº 28290/2024/MGI (seq. 17), a qual conclui, para fins de orientação dos órgãos e entidades integrantes do Sistema de Pessoal Civil da Administração Pública federal, pela pertinência da remoção como medida eficaz à proteção da vítima, bem como pela desnecessidade de alteração da Lei nº 8.112/1990 com a finalidade de assegurar à servidora pública federal vítima de violência doméstica a referida movimentação. Por sua pertinência e relevância, confira-se o trecho da manifestação da referida pasta:  

Nesse sentido, entende-se que a remoção de servidora pública é uma medida eficaz no caso de violência doméstica ou familiar, conjugada com outras medidas já proporcionadas pela Lei nº 11.340, de 2006, pois tem o condão de afastar a servidora do local onde ocorreram os fatos e permitir que ela continue trabalhando, trazendo certa normalidade à vida cotidiana.

Dessa forma, considerando a previsão já existente na Lei nº 11.340, de 2006, quanto à remoção da servidora pública, integrante da administração direta ou indireta, nos casos de violência doméstica, comprovados judicialmente, entende-se não ser necessária a alteração na Lei 8.112, de 1990, apenas para essa finalidade. Além disso, a alteração na Lei nº 8.112, de 1990 não traria proteção de servidoras de outros entes federativos.

43. Conforme bem apontado pelo Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, de fato, os institutos de movimentação, previstos na Lei nº 8.112/1990, já são suficientes para resguardar a integridade física e mental da servidora pública federal vítima de violência doméstica. Isso porque, embora a Lei nº 11.340/2006 contemple somente a prioridade na remoção, a Lei nº 8.112/1990 antevê diversas hipóteses de deslocamento. Logo, caso a lotação da servidora pública federal configure risco ou possibilite dano efetivo à integridade física ou psíquica da vítima de violência doméstica, é possível acionar as alternativas de movimentação de pessoal previstas na Lei nº 8.112/1990, para viabilizar o seu afastamento do agressor. 

44. Avançando nos mecanismos de proteção disponibilizados pela legislação de regência, reputa-se que a remoção configura-se como instrumento adequado para as circunstâncias que exigem o distanciamento físico da vítima de seu algoz. Isso porque, como visto, o referido deslocamento pode ocorrer a pedido ou de ofício, no âmbito do mesmo quadro, com ou sem mudança de sede. É preciso, no entanto, subsumir os casos em que constatada a presença de violência doméstica às hipóteses previstas no artigo 36 da Lei nº 8.112/1990.

45. Por se tratar de deslocamento que decorrerá especificamente de uma circunstância pessoal da servidora pública federal, que a conduz a um quadro de vulnerabilidade física e emocional, a remoção de ofício, no interesse da Administração Pública, prevista no artigo 36, parágrafo único, inciso I, da Lei nº 8.112/1990, pode ser excluída, em princípio, como alternativa à solução ora rastreada. Resta-nos, sob tal perspectiva, as remoções a pedido, a critério da Administração ou independentemente do interesse do Poder Público, esta última impulsionada por motivo de saúde da requerente (incisos II e III, alínea "b", do parágrafo único do artigo 36 da Lei nº 8.112/1990), já que as relacionadas ao acompanhamento de cônjuge (artigo 36, parágrafo único, inciso III, alínea "a", da Lei nº 8.112/1990) ou em virtude de processo seletivo (artigo 36, parágrafo único, inciso III, alínea "c", da Lei nº 8.112/1990) não encontram adesão estrita à circunstância fática imposta.

46. Sobre o enquadramento na hipótese de remoção a pedido por motivo de saúde, não há dúvidas de que a violência doméstica tem o potencial de afetar o equilíbrio físico e emocional da mulher.

47. Conforme já anotado, "configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial" (artigo 5º, "caput", da Lei nº 11.340/2006). Por sua vez, segundo o Manual de Perícia Oficial em Saúde do Servidor Público Federal, doença "é a alteração do estado clínico do indivíduo, independentemente de origem ou fonte, que represente ou possa representar dano físico ou mental significativo para o ser humano"[22].

48. A violência doméstica contra a mulher tem o condão não apenas de causar lesão à integridade física das vítimas, as quais enfrentam hematomas pelo corpo, membros e dentes quebrados, quando não perdem a própria vida, mas também pode provocar violação à liberdade sexual, perturbações de ordem emocional - quando mulheres são atingidas e ou paralisadas pelo medo, pela insegurança, pela ansiedade e pela depressão - , e, não raro, tem a capacidade de acarretar violência patrimonial e moral. 

49. Sobre este aspecto, precisas foram as ponderações realizadas pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional no Parecer SEI nº 4113/2024/MF:

19. Registre-se que a OMS reconhece a violência doméstica contra a mulher como uma questão de saúde pública [3], tendo em vista que afeta negativamente a integridade física e emocional da vítima, seu senso de segurança, e atinge seu papel de mãe, esposa, e geradora de rendimentos na família.

20. Nesse sentido, vale destacar que, em 2020, a então Secretaria Nacional de Políticas para Mulheres do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, publicou a Cartilha “Enfrentando a violência doméstica e familiar contra a mulher”[4], segundo a qual, de acordo com pesquisas realizadas pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), há evidências de que a saúde mental da mulher fica significativamente comprometida quando ela está exposta à violência doméstica, levando-a a apresentar, na maior parte das vezes, sintomas como baixa autoestima, transtorno de estresse pós-traumático e depressão.

21. Com base nesse mesmo entendimento, no sentido de que a violência - em todas as suas formas - pode ter um impacto na saúde e no bem-estar da mulher, vale citar excerto de artigo [5] publicado na Revista Research, Society and Development, publicado em 2020, vejamos:

(...)

Danos e intervenção na saúde da mulher vítima

A violência doméstica provoca sérias consequências psicológicas na vida das vítimas. Sabe-se que tal fenômeno se caracteriza por brigas, ofensas, empurrões e vergonha. Dentro disso, além das marcas físicas que são frequentes no âmbito dessa violência, o sofrimento afeta a autoestima das mulheres, apresentando, assim, efeitos negativos na saúde mental da mesma (Soares [6], 2005). Segundo Ludermir [7] (2008), a discriminação, os insultos verbais, os sentimentos de perda, os maus tratos e a humilhação, características da violência contra a mulher, interferem na autoestima feminina e na sua capacidade de reação, mantendo o sentimento de inferioridade.

Ludermir[8] (2008) destaca que os sintomas psicológicos encontrados nas vítimas de violência doméstica são: insônia, pesadelos, falta de concentração, irritabilidade, falta de apetite, e até surgimento de transtornos mentais como a depressão, ansiedade, síndrome do pânico, estresse pós-traumático, além de comportamentos que causam prejuízo a vida como o uso de álcool e drogas ou tentativas de suicídio. Estes estados emocionais quando não são imediatamente amparados, podem colaborar para ampliar as dificuldades no conflito à situação vivida e até desenvolver quadros psiquiátricos (Oliveira [9], 2007).

Nesse sentido, a literatura é ampla em relatar as condições da violência e seus possíveis efeitos para a saúde e o bem-estar. Diante disso, estudos da Organização Pan Americana de Saúde (OPAS) relativo a uma pesquisa realizada em 2003 afirmam que as mulheres que sofrem violência estão em maior risco de desenvolver transtornos alimentares, abuso de álcool e drogas, além de estresse pós-traumático, depressão, ansiedade, fobias e pânico (Fonseca, Ribeiro, & Leal [10], 2012).

Entretanto, já que a experiência da violência deixa a mulher exposta a um risco mais elevado de sofrer problemas mais graves, como depressão, ansiedade, estresse pós-traumático, tendência ao suicídio e consumo abusivo de álcool e drogas, ainda não é suficiente para falar sobre a causa e efeito da violência doméstica no surgimento de transtornos mentais em mulheres, mas sim do episódio de tal situação em mulheres que enfrentam desse tipo de transtorno. Dessa forma, a violência doméstica tem sido reconhecida como um fator de risco que traz diversos danos à saúde da mulher, tanto física como mental. Além disso, essa temática tem sido relacionada como a pior qualidade de vida e maior procura por serviços de saúde e internações psiquiátricas. (Adeodato, dos Reis Carvalho, de Sigueira, & de Matos e Souza [11], 2005). 

22. De igual forma, o Guia para o manejo de situações de violência doméstica contra a mulher na Atenção Primária à Saúde (APS), elaborado em parceria pela Universidade Federal de Santa Catarina e o Ministério da Saúde, em 2022 [12], sobre o assunto, destacou que:

Cada tipo de violência gera prejuízos nas esferas do desenvolvimento físico, cognitivo, social, moral, emocional ou afetivo. Krug et al. (2002) investigaram as consequências da violência na saúde e concluíram que os efeitos podem persistir muito tempo após terem cessado, sendo que quanto mais severa a violência, maior o impacto sobre a saúde física e mental da mulher. Também afirmam que o impacto de diferentes tipos de violência e de vários episódios parecem ter efeito cumulativo.

Uma intervenção resolutiva a essa problemática não pode prescindir de uma conduta clínica.

No entanto, não é o suficiente; a atenção precisa ir além, buscando medidas que promovam a conservação da saúde e a recuperação da qualidade de vida. 

50. Também nesta direção, a Coordenação-Geral de Desenvolvimento e Movimentação de Pessoal da Diretoria de Gestão de Pessoal da Secretaria de Serviços Compartilhados, do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, em considerações bastante pertinentes alinhavadas no Despacho SEI nº 46972134 (seq. 29), ponderou que a concessão de remoção por motivo de saúde de servidora pública vítima de violência doméstica não apenas se qualifica como juridicamente pertinente, mas também como socialmente relevante. Confira-se, por sua precisão, a literalidade das referidas colocações: 

Não obstante a ausência de experiência na situação narrada, entendemos que a aplicação da hermenêutica pela Administração Pública no sentido de garantir o enquadramento de situação de violência doméstica como motivo de remoção a pedido, para outra localidade, independente do interesse da administração, revela-se não apenas juridicamente pertinente, mas também socialmente relevante. Ao oferecer uma resposta que prioriza a proteção da integridade da vítima, a Administração reafirma seu compromisso com os direitos humanos e com a construção de um ambiente institucional que não tolere quaisquer formas de violência. Quando comprovado que a permanência da pessoa agredida no local de exercício representa abalo à sua integridade física ou psicológica, essa medida contribui para o reestabelecimento de sua saúde e bem-estar. Adicionalmente, a adoção de tal postura pode prevenir absenteísmo, evitar afastamentos prolongados e minimizar o impacto negativo sobre a produtividade das equipes. Além disso, possibilita melhores condições para o exercício de suas funções, com reflexos positivos na qualidade dos serviços prestados. Trata-se, portanto, de uma ação que combina o cumprimento de princípios legais com a promoção de um ambiente de trabalho mais seguro e humano, reforçando o papel da Administração como promotora de proteção e dignidade.

51. Ocorre, no entanto, que a modalidade de remoção prevista no artigo 36, inciso III, alínea "b", da Lei nº 8112/1990, possui filtros bastante estritos, tais como: i) a necessidade de efetivo dano à integridade física ou psicológica da vítima; ii) a comprovação da existência do dano à saúde física e mental perante junta médica; iii) a demonstração de impossibilidade de permanência física na atual unidade de lotação, sob pena de prejuízo à saúde do servidor ou da servidora; e iv) a prova de que a remoção acarretará benefícios à saúde do requerente. Os referidos padrões mínimos para a concessão da remoção por motivo de saúde constam expressamente do Manual de Perícia Oficial em Saúde do Servidor Público Federal, aprovado pela Portaria SEGRT/MP nº 19/2017. Vejamos [23]:

O servidor, munido de parecer do profissional de saúde assistente que indique necessidade de remoção por motivo de saúde, deverá requerer a sua remoção à área de recursos humanos no seu local de lotação.

O laudo, emitido por junta oficial, é indispensável à análise do pedido de remoção e deverá, necessariamente, atestar a existência da doença ou motivo de saúde que fundamenta o pedido.

Ressalta-se que a avaliação pericial para concessão de remoção do servidor por motivo de doença em pessoa de sua família deverá ser realizada no familiar.

A avaliação pericial poderá basear-se em:

- Razões objetivas para a remoção;

- Se a localidade onde reside o servidor ou seu dependente legal é agravante de seu estado de saúde ou prejudicial à sua recuperação;

- Se na localidade de lotação do servidor não há tratamento adequado;

- Se a doença é preexistente à lotação do servidor na localidade e, em caso positivo, se houve evolução do quadro que justifique o pedido;

- Quais os benefícios do ponto de vista de saúde que advirão dessa remoção;

- Quais as características das localidades recomendadas;

- Se o tratamento sugerido é de longa duração e se não pode ser realizado na localidade de exercício do servidor.

É importante destacar que o laudo deverá ser conclusivo quanto à necessidade da mudança de exercício. Reserva-se à APF, no resguardo de seus interesses, indicar qualquer localidade de exercício, desde que satisfaça às necessidades de saúde e tratamento do servidor, de pessoa de sua família ou dependente. Os servidores sem vínculo efetivo com a União, os contratados temporários e os empregados públicos não fazem jus à remoção.   

52. Além disso, nos termos do Ofício Circular SEI nº 1282/2024/MGI [24], subscrito pela Secretaria de Relações de Trabalho do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, firmado em 07 de agosto de 2024, o laudo pericial que avalia as condições da servidora ou servidor público federal que requer remoção por razões de saúde deve atentar-se aos seguintes parâmetros:

O laudo pericial é o documento emitido pela junta oficial indispensável para a instrução do processo administrativo do pedido de remoção com fundamento na alínea b, inciso III, do art. 36 da Lei nº 8.112, de 19990 e deverá atestar tão somente:

a) a existência da doença;

b) a necessidade de tratamento especializado e continuado;

c) se há ou não a possibilidade de tratamento especializado da enfermidade na localidade de exercício da servidora ou do servidor para a própria saúde ou de seu dependente;

a conclusão expressa pela concessão ou não concessão.

O laudo deverá ser conclusivo quanto à necessidade da mudança de exercício, inclusive no tocante a inexistência de tratamento na localidade, não devendo conter a indicação da localidade para qual a servidora ou o servidor será removido, bem como a CID ou descrição da enfermidade da servidora, do servidor ou do seu dependente.

Os quesitos constantes do Manual de Perícia Oficial em Saúde - 3ª Edição - ano 2017, são orientadores para a análise da junta oficial referente a remoção por motivo de saúde. As respostas aos quesitos podem configurar informações pessoais restritas à análise da junta oficial e não devem ser descritas no campo "observações" do laudo do SIAPE-Saúde ou anexadas fisicamente ao processo, sob risco de inobservância à Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais - LGPD - Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018.

O laudo pericial do SIAPE-Saúde emitido pela junta oficial é o documento bastante para a concessão ou não da remoção por motivo de saúde de que trata a alínea b, inciso III, do art. 36 da Lei nº 8.112, de 1990.

53. Como se nota, o procedimento de concessão de remoção por motivo de saúde demanda procedimento prévio a ser instruído por laudo de perícia oficial, o qual impõe a coexistência de diversos requisitos para autorizar a movimentação de servidores públicos federais. No entanto, é preciso observar que o referido traço característico à remoção prevista no artigo 36, parágrafo único, inciso III, alínea "b", da Lei nº 8.112/1990, pode, por vezes, não corresponder à urgência e celeridade que a intervenção nos casos marcados pela violência doméstica demanda. 

54. Além disso, embora seja comum vislumbrar violação específica à integridade física e ou psíquica das vítimas, também não é possível concluir que os casos de violência doméstica acarretarão, invariavelmente, lesão aos referidos bens jurídicos. É factível, portanto, que embora afetada por uma circunstância de violência doméstica que exige a mudança de domicílio para preservar sua integridade física e mental, a servidora não esteja necessariamente adoecida de maneira clinicamente auferível por tal circunstância, de modo que é imprescindível conferir alternativa normativa e procedimental também para os referidos casos.

55. Assim, conquanto se reconheça que a violência doméstica e familiar pode afetar não apenas a saúde física da mulher, mas também o seu equilíbrio emocional, circunstâncias que são capazes de viabilizar a concessão da remoção por motivo de saúde, nos termos do artigo 36, parágrafo único, inciso III, alínea "b", da Lei nº 8.112/1990, entende-se que a referida alternativa pode não ser suficiente para preservar, integralmente, a servidora pública federal vítima de violência doméstica.

56. É de se notar, assim, que a análise dos casos em que não caracterizado o dano físico ou mental das servidoras públicas federais recairá sobre os riscos, potenciais ou efetivos, que o fato de ser vítima de violência doméstica acarretaram à servidora pública federal que eventualmente pleiteia sua movimentação para que a mudança de domicílio robusteça seus mecanismos de proteção frente ao agressor. 

57. Quanto a este aspecto, a Secretaria de Gestão de Pessoas e a Secretaria de Relações de Trabalho do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (seq. 29) destacaram a necessidade de acionamento de outros instrumentos de movimentação previstos na legislação específica. Confira-se:

10. No entanto, para os casos de violência doméstica, em que o impacto na saúde da vítima pode ser atestado por junta médica, sua análise volta-se à avaliação da necessidade de tratamento de saúde e não aborda, necessariamente, os riscos à segurança da servidora. Por conseguinte, a remoção por motivo de saúde pode ser insuficiente para atender plenamente às demandas de proteção necessárias nesses casos.

11. Assim, considerando as especificidades dos casos de violência doméstica e a insuficiência, em alguns cenários, da remoção por motivo de saúde para garantir a proteção integral da vítima, é recomendável que os órgãos e entidades integrantes do SIPEC avaliem também a aplicação de outras formas de movimentação, conforme expressamente autorizado no item 18 da supracitada Nota Técnica Referencial nº 28290/2024/MGI. O uso de instrumentos previstos em legislações e normas, como o Decreto nº 12.122, de 2024 e a Portaria MGI nº 6.719, de 2024, possibilita ações mais abrangentes, que incluem o acolhimento e a transferência da servidora para localidade segura. 

58. Entende-se, nesta linha, que a remoção a pedido, no interesse da Administração Pública, contemplada pelo artigo 36, parágrafo único, inciso II, da Lei nº 8.112/1990, pode configurar uma das alternativas para as hipóteses em que esteja presente o risco à integridade física e psíquica da vítima

59. A pacificação da referida compreensão pelo presente parecer, deste modo, terá o condão de ofertar possibilidade de salvaguarda à servidora pública federal vítima de violência doméstica que enfrente risco à sua integridade física e mental, reduzindo, por consequência, o nível de discricionariedade administrativa.  

60. Nesta hipótese, por se tratar de remoção a pedido, mas a critério da Administração, reputa-se que a União, suas autarquias e fundações públicas federais devem exigir a comprovação do risco à integridade física ou emocional da servidora vítima de violência doméstica, o qual deve estar estritamente relacionado à sua permanência no local de sua lotação. A conduta da Administração Pública, ao avaliar a presença do interesse do Poder Público na concessão da remoção, estará pautada nos deveres impostos pelo artigo 226, § 8º, da Constituição Federal, bem como no artigo 3º, § 1º, da Lei nº 11.340/2006, e terá por objetivo precípuo tutelar a servidora pública federal do risco decorrente da proximidade física com o seu agressor.

61. Nada obstante se destaque a possibilidade de comprovação da condição de perigo à integridade física e mental da servidora pública vítima de violência doméstica por todos os meios de prova admitidos em direito[25], os quais deverão ser fundamentadamente apreciados pelos órgãos competentes para a concessão da remoção, entende-se que o deferimento de medida protetiva judicial de afastamento do agressor configura fundamento suficiente a demonstrar, de forma inequívoca, a presença do interesse público apto a vincular o ato administrativo a que alude o artigo 36, parágrafo único, inciso II, da Lei nº 8.112/1990.

62. Isso porque as medidas protetivas estabelecidas pela Lei nº 11.340/2006 representam instrumentos normativos de resguardo à integridade física, psicológica, sexual, patrimonial e moral das vítimas de violência doméstica, as quais pressupõem deferimento judicial, a ser apreciado no prazo de 48 horas, a partir de pedido da vítima ou do Ministério Público, e serão concedidas independentemente da tipificação penal da violência, do ajuizamento de ação penal ou cível, da existência de inquérito policial ou do registro de boletim de ocorrência (artigos 18 e 19 da Lei 11.340/2006[26]). Assim, caso constatada a prática de violência doméstica, poderá o juiz determinar, dentre outras medidas em desfavor do agressor, o afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida, a proibição de aproximação da vítima, bem como a vedação de comparecimento a determinados lugares (artigo 22 da Lei nº 11.340/2006[27]). Ainda nos termos da Lei Maria da Penha, o descumprimento das imposições constantes de medida protetiva acarreta a caracterização do crime específico previsto em seu artigo 24-A [28].   

63. O deferimento judicial da medida protetiva configura, nesta medida, análise estatal acerca das circunstâncias específicas que marcam o cenário de violência doméstica, o qual pressupõe o exame quanto aos riscos a que submetida a ofendida. O prazo de 48h para a apreciação do requerimento da vítima ou do Ministério Público, ademais, assegura a agilidade da resposta estatal que os referidos casos exigem. 

64. Nota-se, nestes termos, que o deferimento da medida protetiva judicial caracteriza-se como elemento suficiente a substituir a análise administrativa quanto aos riscos enfrentados pela vítima de violência doméstica, bem como a indicar de maneira inequívoca o interesse da Administração Pública em promover a remoção da servidora pública, com o intuito de lhe conceder condições de segurança que resguardem sua integridade física e mental.

65. A associação entre a concessão da medida protetiva e o deferimento da remoção, no interesse da Administração, terá por objetivo fortalecer a resposta estatal à violência no âmbito das relações afetivas, de modo a integrar o Estado na rede de apoio imprescindível ao fortalecimento da mulher no desafio da superação da situação de vulnerabilidade inerente às vítimas de violência doméstica [29]

66. Nesta hipótese, em que o pedido de remoção da servidora pública estiver instruído com o deferimento de medidas protetivas que contemplem o afastamento do agressor da ofendida, o âmbito de discricionariedade da Administração Pública estará reduzido, uma vez que já constatada pelo Estado a necessidade de distanciamento entre algoz e vítima, como medida indispensável ao resguardo da integridade física e ou psicológica da mulher.

67. O referido estreitamento da discricionariedade administrativa, operado em tese pelo presente parecer, caso aprovado pelo Excelentíssimo Senhor Presidente da República, tem por finalidade conferir critério objetivo à análise do pedido de remoção, bem como conceder ao procedimento a celeridade demandada pela condição de risco enfrentada pela servidora pública federal. 

68. Assim, reputa-se que o pedido de remoção da servidora pública federal, quando instruído com o deferimento de medida protetiva judicial de afastamento do agressor deverá ser concedido pelo órgão competente, no interesse da Administração Pública, com fulcro no artigo 36, parágrafo único, inciso II, da Lei nº 8.112/1990, configurando a decisão judicial a demonstração do interesse público na autorização do aludido deslocamento.

69. Ademais, cumpre ainda ressaltar que a ausência da medida protetiva em favor da vítima de violência doméstica servidora pública federal não representará a impossibilidade de concessão de remoção ou de quaisquer dos demais instrumentos de movimentação previstos na legislação de regência, desde que atendidos os respectivos requisitos normativos.

70. Em outras palavras, nas hipóteses em que a servidora pública federal tenha se beneficiado de medida protetiva de afastamento do agressor, observa-se a existência de direito à remoção, a pedido, a critério da Administração, com a finalidade de resguardar sua integridade física e mental dos riscos advindos da situação de violência doméstica. Porém, na ausência de deferimento de medida protetiva, à servidora pública federal restarão ainda disponíveis todos os instrumentos de movimentação de pessoal, dentre os quais incluída a remoção por motivo de saúde (quando precedida de laudo pericial que conclua por sua pertinência), a remoção a critério da Administração (mediante análise e avaliação, caso a caso, de todas as provas admitidas em direito); assim como, atendidos os requisitos normativos e presentes conveniência e oportunidade, outros mecanismos como a redistribuição, a cessão, a alteração de exercício para composição de força de trabalho ou até mesmo o deferimento de teletrabalho, os quais poderão ser conjugados com providências acauteladoras, nos termos do artigo 45 da Lei nº 9.784/1999[30].

71. Esta conclusão quanto à pertinência de acionamento das demais formas de movimentação de pessoal nos casos em que constatada a presença de violência doméstica e familiar contra a servidora pública federal encontra-se também amparada na Nota Técnica SEI nº 28290/2024/MGI (seq. 17), que assim se posicionou: 

8. Quanto à movimentação da servidora ou do servidor, resguardadas as vantagens percebidas, entende-se que seria um dos instrumentos aplicáveis aos casos de assédio moral ou sexual ou mesmo de violência doméstica ou familiar e discriminação. Ressalte-se que a aplicação do instituto de movimentação que melhor se adeque à situação, independe da alteração das leis específicas ou mesmo da Lei 8.112, de 1990, e pode ser efetivado a partir das medidas adotadas para a apuração do caso no âmbito dos órgãos e entidades. Dentre os institutos de movimentação previstos na Lei 8.112, de 1990, têm sido citados a remoção, a redistribuição, a cessão e a alteração de exercício para composição da força de trabalho. Assim, considerando que pretende-se conjugar o interesse público, a partir da melhor alocação das pessoas num ambiente de trabalho seguro ou em localidade diversa da de seu agressor que lhe permita desempenhar suas atribuições com segurança, a medida resultará em ganho para a Administração Pública e para a sociedade.

72. O Ministério das Mulheres, igualmente, ao se manifestar favoravelmente à possibilidade de remoção de servidoras vítimas de violência doméstica (seq. 21), ressalvou a necessidade de possibilitar a comprovação do risco à integridade física e psicológica da vítima por meios diversos, e não apenas atestados por motivo de saúde. Ademais, considerou relevante conferir celeridade ao procedimento, com vistas a resguardar a efetividade da medida de afastamento do agressor.

73. Assim, em atenção à vontade legislativa expressa no artigo 9º, § 2º, inciso I, da Lei nº 11.340/2006, e com o objetivo de conferir a celeridade que a situação de vulnerabilidade que as vítimas de violência doméstica enfrentam, os pedidos de movimentação realizados por servidoras públicas federais nesta condição deverão ser processados, no âmbito da Administração Pública federal, com absoluta prioridade, sem prejuízo da necessária regulamentação acerca dos procedimentos internos de tramitação.

74. Nesta linha de raciocínio, nada obstante as conclusões contempladas por este parecer, que está limitado a conduzir a pacificação da interpretação jurídica a ser conferida à legislação aplicável às hipóteses aqui aludidas, reputa-se também pertinente destacar a importância da regulamentação que está sendo gestada no Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, em parceria com o Ministério das Mulheres (seq. 29), com o intuito de contemplar procedimentos que viabilizem a concessão de medidas efetivas ao amparo de servidoras públicas federais em situação de violência doméstica e familiar, inclusive de natureza cautelar e que evitem eventuais configurações de abandono de cargo.  

75. Por fim, em atenção aos impactos que o presente parecer pode alcançar, caso seja acolhido e passe a vincular toda a Administração Pública federal, cumpre esclarecer que tanto na hipótese de deferimento da remoção por motivo de saúde (artigo 36, parágrafo único, inciso III, alínea "b", da Lei nº 8.112/1990) quanto naquela correspondente ao deslocamento a critério da Administração (artigo 36, parágrafo único, inciso II, da Lei nº 8.112/1990), não caberá à União, suas autarquias e fundações públicas federais a incumbência de arcar com quaisquer custos suportados pela servidora pública federal com a respectiva mudança de domicílio. Isso porque, por se tratar de deslocamento a pedido, o artigo 53, § 3º, da Lei nº 8.112/1990[31], é expresso ao determinar a inexistência de direito a ajuda de custo nas hipóteses de remoção previstas nos incisos II e III do parágrafo único do artigo 36 do Estatuto dos Servidores Públicos Federais.

III - CONCLUSÕES

76. Ante todo o exposto, concluiu-se que a violência contra a mulher, como drama social transversal e enraizado em nossa cultura que é, não pode e não está sendo ignorada pelo Estado brasileiro, o qual tem o dever de conferir respostas contundentes ao seu resistente e lamentável avanço. Assim, com o objetivo de cumprir o papel do Poder Público de assegurar a higidez física e mental das servidoras públicas federais vítimas de violência doméstica, no âmbito das atribuições declinadas pelos artigos 4º, incisos X e XI; e 10, da Lei Complementar nº 73, conclui-se que: 

I. às servidoras públicas federais vítimas de violência doméstica é garantido o direito à remoção por motivo de saúde, previsto no artigo 36, parágrafo único, inciso III, alínea "b", da Lei nº 8.112/19900, quando comprovada por junta médica oficial a efetiva lesão à sua integridade física ou mental;

II. às servidoras públicas federais vítimas de violência doméstica é garantido o direito à remoção a pedido, a critério da Administração, consagrado no artigo 36, parágrafo único, inciso II, da Lei nº 8.112/1990, quando constatada a existência de risco à sua integridade física ou mental, demonstrado pelo deferimento de medida protetiva judicial de afastamento do agressor, hipótese em que o ato deve ser considerado vinculado;

III. a inexistência do parâmetro objetivo para a concessão da remoção a que alude o item "II" não afasta a possibilidade de análise administrativa, caso a caso, da subsunção da hipótese da servidora pública federal vítima de violência doméstica a todos os instrumentos de movimentação de pessoal previstos na legislação de regência;

IV. em atenção à vontade legislativa expressa no artigo 9º, § 2º, inciso I, da Lei nº 11.340/2006, e com o objetivo de conferir a celeridade que a situação de vulnerabilidade que as vítimas de violência doméstica enfrentam, os pedidos de movimentação realizados por servidoras públicas federais nesta condição deverão ser processados, no âmbito da Administração Pública federal, com absoluta prioridade, sem prejuízo da necessária regulamentação acerca dos procedimentos internos de tramitação; e

V. a concessão das remoções, por motivo de saúde ou a critério da administração, referidas nos itens "I" e "II" acima, uma vez que atribuídas a pedido da servidora pública federal, não implicam direito a ajuda de custo em razão da mudança de domicílio, conforme previsto no artigo 53, § 3º, da Lei nº 8.112/1990.  

77. Caso as conclusões acima declinadas sejam acolhidas, sugere-se a Sua Excelência o Senhor Advogado-Geral da União o encaminhamento do presente parecer ao Excelentíssimo Senhor Presidente da República, para que os seus termos vinculem, consoante determinam os artigos 40 e 41 da Lei Complementar nº 73/1993, toda a Administração Pública federal, cujos órgãos e entidades ficarão obrigados a lhe dar fiel cumprimento, a partir da data de sua publicação.

À consideração superior.

Brasília, 24 de janeiro de 2025.

ALESSANDRA LOPES DA SILVA PEREIRA

Advogada da União

Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em https://supersapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 10951008020202419

Notas

1. ^ "Art. 9º A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar será prestada em caráter prioritário no Sistema Único de Saúde (SUS) e no Sistema Único de Segurança Pública (Susp), de forma articulada e conforme os princípios e as diretrizes previstos na Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993 (Lei Orgânica da Assistência Social), e em outras normas e políticas públicas de proteção, e emergencialmente, quando for o caso. (...) § 2º O juiz assegurará à mulher em situação de violência doméstica e familiar, para preservar sua integridade física e psicológica: I - acesso prioritário à remoção quando servidora pública, integrante da administração direta ou indireta;"

2. ^ "Art. 17. Na hipótese de comprovado risco excepcional e efetivo à integridade de servidores ou seus familiares, não decorrente do exercício do cargo, mediante autorização do Secretário Especial da Receita Federal do Brasil, e após aferição em procedimento específico, poderá ser deferida remoção ou alteração de localização física de unidade de localização física a pedido, com ou sem alteração de exercício." Documento disponível em: <http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?idAto=132715>. Acesso em 27 de dezembro de 2024.

3. ^ "Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.(...)§ 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações."

4. ^ "Artigo 7 Os Estados Partes condenam todas as formas de violência contra a mulher e convêm em adotar, por todos os meios apropriados e scan demora, políticas destinadas a prevenir, punir e erradicar tal violência e a empenhar-se em:(...) b) agir com o devido zelo para prevenir, investigar e punira violência contra a mulher; (...) f) estabelecer procedimentos jurídicos justos e eficazes para a mulher sujeitada a violência, inclusive, entre outros, medidas de proteção, juízo oportuno e efetivo acesso a tais processos;" 

5. ^ Informações disponíveis em: <https://apidspace.forumseguranca.org.br/server/api/core/bitstreams/1d896734-f7da-46a7-9b23-906b6df3e11b/content>. Acesso em 10 de janeiro de 2025.

6. ^ Informação disponível em: <https://nev.prp.usp.br/noticias/8-3-23-nev-na-midia-monitor-da-violencia-g1-brasil-bate-recorde-de-feminicidios-em-2022-com-uma-mulher-morta-a-cada-6-horas/>. Acesso em 23 de janeiro de 2025.

7. ^ Informações detalhadas disponíveis em: <https://cidh.oas.org/annualrep/2000sp/CapituloIII/Fondo/Brasil12.051a.htm>. Acesso em 10 de janeiro de 2025.

8. ^ Texto disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm>. Acesso em 10 de janeiro de 2025.

9. ^ "Art. 121-A. Matar mulher por razões da condição do sexo feminino: Pena – reclusão, de 20 (vinte) a 40 (quarenta) anos. § 1º Considera-se que há razões da condição do sexo feminino quando o crime envolve:   I – violência doméstica e familiar II – menosprezo ou discriminação à condição de mulher.    § 2º A pena do feminicídio é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime é praticado: I – durante a gestação, nos 3 (três) meses posteriores ao parto ou se a vítima é a mãe ou a responsável por criança, adolescente ou pessoa com deficiência de qualquer idade; II – contra pessoa menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos, com deficiência ou portadora de doenças degenerativas que acarretem condição limitante ou de vulnerabilidade física ou mental;    III – na presença física ou virtual de descendente ou de ascendente da vítima;    IV – em descumprimento das medidas protetivas de urgência previstas nos incisos I, II e III do caput do art. 22 da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha);   V – nas circunstâncias previstas nos incisos III, IV e VIII do § 2º do  art. 121 deste Código.      Coautoria     § 3º Comunicam-se ao coautor ou partícipe as circunstâncias pessoais elementares do crime previstas no § 1º deste artigo."

10. ^ Texto disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2023-2026/2024/Lei/L14994.htm#art9>. Acesso em 10 de janeiro de 2025.

11. ^ DIAS, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na justiça: a efetividade da Lei 11.340/2006 de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. 3 ed. rev., atual., e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012, p. 35.

12. ^ VIOLÊNCIA DOMÉSTICA – LEI Nº 11.340/06 – GÊNEROS MASCULINO E FEMININO – TRATAMENTO DIFERENCIADO. O artigo 1º da Lei nº 11.340/06 surge, sob o ângulo do tratamento diferenciado entre os gêneros – mulher e homem –, harmônica com a Constituição Federal, no que necessária a proteção ante as peculiaridades física e moral da mulher e a cultura brasileira. COMPETÊNCIA – VIOLÊNCIA DOMÉSTICA – LEI Nº 11.340/06 – JUIZADOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER. O artigo 33 da Lei nº 11.340/06, no que revela a conveniência de criação dos juizados de violência doméstica e familiar contra a mulher, não implica usurpação da competência normativa dos estados quanto à própria organização judiciária. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER – REGÊNCIA – LEI Nº 9.099/95 – AFASTAMENTO. O artigo 41 da Lei nº 11.340/06, a afastar, nos crimes de violência doméstica contra a mulher, a Lei nº 9.099/95, mostra-se em consonância com o disposto no § 8º do artigo 226 da Carta da República, a prever a obrigatoriedade de o Estado adotar mecanismos que coíbam a violência no âmbito das relações familiares. (ADC nº 19, Relator: Ministro Marco Aurélio, Órgão Julgador: Tribunal Pleno, Julgamento em 09/02/2012, Publicação em 29/04/2014).

13. ^ AÇÃO PENAL – VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER – LESÃO CORPORAL – NATUREZA. A ação penal relativa a lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher é pública incondicionada – considerações. (ADI nº 4424, Relator: Ministro Marco Aurélio, Órgão Julgador: Tribunal Pleno, Julgamento em 09/02/2012, Publicação em 01/08/2014).

14. ^ Arguição de descumprimento de preceito fundamental. Interpretação conforme à Constituição. Artigo 23, inciso II, e art. 25, caput e parágrafo único, do Código Penal e art. 65 do Código de Processo Penal. “Legítima defesa da honra”. Não incidência de causa excludente de ilicitude. Recurso argumentativo dissonante da dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso III, da CF), da proteção à vida e da igualdade de gênero (art. 5º, caput, da CF). Procedência parcial da arguição. 1. A “legítima defesa da honra” é recurso argumentativo/retórico odioso, desumano e cruel utilizado pelas defesas de acusados de feminicídio ou agressões contra a mulher para imputar às vítimas a causa de suas próprias mortes ou lesões. Constitui-se em ranço, na retórica de alguns operadores do direito, de institucionalização da desigualdade entre homens e mulheres e de tolerância e naturalização da violência doméstica, as quais não têm guarida na Constituição de 1988. 2. Referido recurso viola a dignidade da pessoa humana e os direitos à vida e à igualdade entre homens e mulheres (art. 1º, inciso III, e art. 5º, caput e inciso I, da CF/88), pilares da ordem constitucional brasileira. A ofensa a esses direitos concretiza-se, sobretudo, no estímulo à perpetuação do feminicídio e da violência contra a mulher. O acolhimento da tese teria o potencial de estimular práticas violentas contra as mulheres ao exonerar seus perpetradores da devida sanção. 3. A “legítima defesa da honra” não pode ser invocada como argumento inerente à plenitude de defesa própria do tribunal do júri, a qual não pode constituir instrumento de salvaguarda de práticas ilícitas. Devem prevalecer a dignidade da pessoa humana, a vedação de todas as formas de discriminação, o direito à igualdade e o direito à vida, tendo em vista os riscos elevados e sistêmicos decorrentes da naturalização, da tolerância e do incentivo à cultura da violência doméstica e do feminicídio. 4. Na hipótese de a defesa lançar mão, direta ou indiretamente, da tese da “legítima defesa da honra” (ou de qualquer argumento que a ela induza), seja na fase pré-processual, na fase processual ou no julgamento perante o tribunal do júri, caracterizada estará a nulidade da prova, do ato processual ou, caso não obstada pelo presidente do júri, dos debates por ocasião da sessão do júri, facultando-se ao titular da acusação apelar na forma do art. 593, inciso III, alínea a, do Código de Processo Penal. 5. É inaceitável, diante do sublime direito à vida e à dignidade da pessoa humana, que o acusado de feminicídio seja absolvido, na forma do art. 483, inciso III, § 2º, do Código de Processo Penal, com base na esdrúxula tese da “legítima defesa da honra”. Há de se exigir um controle mínimo do pronunciamento do tribunal do júri quando a decisão de absolvição se der por quesito genérico, de forma a avaliar, à luz dos atos processuais praticados em juízo, se a conclusão dos jurados se deu a partir de argumentação discriminatória, indigna, esdrúxula e inconstitucional referente ao uso da tese da legítima defesa da honra. 6. Arguição de descumprimento de preceito fundamental julgada parcialmente procedente para (i) firmar o entendimento de que a tese da legítima defesa da honra é inconstitucional, por contrariar os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso III, da CF), da proteção da vida e da igualdade de gênero (art. 5º, caput, da CF); (ii) conferir interpretação conforme à Constituição ao art. 23, inciso II, ao art. 25, caput e parágrafo único, do Código Penal e ao art. 65 do Código de Processo Penal, de modo a excluir a legítima defesa da honra do âmbito do instituto da legítima defesa; (iii) obstar à defesa, à acusação, à autoridade policial e ao juízo que utilizem, direta ou indiretamente, a tese de legítima defesa da honra (ou qualquer argumento que induza à tese) nas fases pré-processual ou processual penais, bem como durante o julgamento perante o tribunal do júri, sob pena de nulidade do ato e do julgamento; e (iv) diante da impossibilidade de o acusado beneficiar-se da própria torpeza, fica vedado o reconhecimento da nulidade referida no item anterior na hipótese de a defesa ter-se utilizado da tese da legítima defesa da honra com essa finalidade. 7. Procedência do pedido sucessivo apresentado pelo requerente, conferindo-se interpretação conforme à Constituição ao art. 483, inciso III, § 2º, do Código de Processo Penal, para entender que não fere a soberania dos vereditos do tribunal do júri o provimento de apelação que anule a absolvição fundada em quesito genérico, quando, de algum modo, possa implicar a repristinação da odiosa tese da legítima defesa da honra.(ADPF nº 779, Relator: Ministro Dias Toffoli, Órgão Julgador: Tribunal Pleno, Julgamento em 01/08/2023, Publicação em 06/10/2023).

15. ^ ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. ALEGADA CONDUTA OMISSIVA E COMISSIVA DO PODER PÚBLICO NO COMBATE À VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER. PROCESSOS DE APURAÇÃO E JULGAMENTO DE CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL. QUESTIONAMENTOS QUANTO AO MODO DE VIDA E À VIVÊNCIA SEXUAL PREGRESSA DA VÍTIMA. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA IGUALDADE E DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. ARGUIÇÃO JULGADA PROCEDENTE. 1. Ofende os princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana a perquirição da vítima, em processos apuratórios e julgamentos de crimes contra a dignidade sexual, quanto ao seu modo de vida e histórico de experiências sexuais. 2. A despeito da atuação dos Poderes da República, pela análise dos argumentos postos na presente arguição de descumprimento de preceito fundamental, é de se concluir necessário que este Supremo Tribunal, no exercício de sua competência constitucional, interprete os dispositivos impugnados pelo arguente conforme a Constituição da República, para conferir máxima efetividade aos direitos constitucionalmente postos e coibir a perpetuação de práticas que impliquem na revitimização de mulheres agredidas sexualmente. 3. Arguição julgada procedente para i) conferir interpretação conforme à Constituição à expressão “elementos alheios aos fatos objeto de apuração” posta no art. 400-A do Código de Processo Penal, para excluir a possibilidade de invocação, pelas partes ou procuradores, de elementos referentes à vivência sexual pregressa da vítima ou ao seu modo de vida em audiência de instrução e julgamento de crimes contra a dignidade sexual e de violência contra a mulher, sob pena de nulidade do ato ou do julgamento, nos termos dos arts. 563 a 573 do Código de Processo Penal; ii) fica vedado o reconhecimento da nulidade referida no item anterior na hipótese de a defesa invocar o modo de vida da vítima ou a questionar quanto a vivência sexual pregressa com essa finalidade, considerando a impossibilidade do acusado se beneficiar da própria torpeza; iii) conferir interpretação conforme ao art. 59 do Código Penal, para assentar ser vedado ao magistrado, na fixação da pena em crimes sexuais, valorar a vida sexual pregressa da vítima ou seu modo de vida e iv) assentar ser dever do magistrado julgador atuar no sentido de impedir essa prática inconstitucional, sob pena de responsabilização civil, administrativa e penal.(ADPF nº 1107, Relatora: Ministra Cármen Lúcia, Órgão Julgador: Tribunal Pleno, Julgamento em 23/05/2024, Publicação em 26/08/2024).

16. ^ Vide arts. 17, inciso XX; e 38 da Lei nº 14.600/2023 e Decreto nº 11.351/2023.

17. ^ "Art. 5º Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual. Art. 6º A violência doméstica e familiar contra a mulher constitui uma das formas de violação dos direitos humanos." 

18. ^ "Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras: I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal; II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos; IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades; V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria." 

19. ^ "Art. 4º Na interpretação desta Lei, serão considerados os fins sociais a que ela se destina e, especialmente, as condições peculiares das mulheres em situação de violência doméstica e familiar."

20. ^ "Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:"

21. ^ Algumas informações foram omitidas com a finalidade de impossibilitar a identificação dos envolvidos.

22. ^ Documento disponível em: <https://www.gov.br/anac/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/arquivos/manual-de-pericia-oficial-em-saude-do-servidor-publico-federal-3a-edicao-ano-2017-versao-28abr2017-3.pdf/view>. Página 131. Acesso em 17 de janeiro de 2025.

23. ^ Documento disponível em: <https://www.gov.br/anac/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/arquivos/manual-de-pericia-oficial-em-saude-do-servidor-publico-federal-3a-edicao-ano-2017-versao-28abr2017-3.pdf/view>. Acesso em 15 de janeiro de 2025.

24. ^ Documento disponível em: <https://legis.sigepe.gov.br/legis/detalhar/24492>. Acesso em 16 de janeiro de 2025.

25. ^ Note-se que, em situação paralela a ora tratada, o artigo 9º, § 7º, da Lei Maria da Penha, conferiu às vítimas de violência doméstica prioridade para matricular seus dependentes em instituição de educação básica mais próxima de seu domicílio, ou transferi-los para essa instituição, exigindo, para tanto, a comprovação da circunstância de vulnerabilidade pelo registro de ocorrência policial ou pelo processo de violência doméstica e familiar em curso. Confira-se: "Art. 9º A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar será prestada em caráter prioritário no Sistema Único de Saúde (SUS) e no Sistema Único de Segurança Pública (Susp), de forma articulada e conforme os princípios e as diretrizes previstos na Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993 (Lei Orgânica da Assistência Social), e em outras normas e políticas públicas de proteção, e emergencialmente, quando for o caso. (...) 7º A mulher em situação de violência doméstica e familiar tem prioridade para matricular seus dependentes em instituição de educação básica mais próxima de seu domicílio, ou transferi-los para essa instituição, mediante a apresentação dos documentos comprobatórios do registro da ocorrência policial ou do processo de violência doméstica e familiar em curso."

26. ^ "Art. 18. Recebido o expediente com o pedido da ofendida, caberá ao juiz, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas: I - conhecer do expediente e do pedido e decidir sobre as medidas protetivas de urgência; II - determinar o encaminhamento da ofendida ao órgão de assistência judiciária, quando for o caso, inclusive para o ajuizamento da ação de separação judicial, de divórcio, de anulação de casamento ou de dissolução de união estável perante o juízo competente; III - comunicar ao Ministério Público para que adote as providências cabíveis. IV - determinar a apreensão imediata de arma de fogo sob a posse do agressor. Art. 19. As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida.§ 1º As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas de imediato, independentemente de audiência das partes e de manifestação do Ministério Público, devendo este ser prontamente comunicado.§ 2º As medidas protetivas de urgência serão aplicadas isolada ou cumulativamente, e poderão ser substituídas a qualquer tempo por outras de maior eficácia, sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados.§ 3º Poderá o juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida, conceder novas medidas protetivas de urgência ou rever aquelas já concedidas, se entender necessário à proteção da ofendida, de seus familiares e de seu patrimônio, ouvido o Ministério Público.§ 4º As medidas protetivas de urgência serão concedidas em juízo de cognição sumária a partir do depoimento da ofendida perante a autoridade policial ou da apresentação de suas alegações escritas e poderão ser indeferidas no caso de avaliação pela autoridade de inexistência de risco à integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral da ofendida ou de seus dependentes. § 5º As medidas protetivas de urgência serão concedidas independentemente da tipificação penal da violência, do ajuizamento de ação penal ou cível, da existência de inquérito policial ou do registro de boletim de ocorrência. § 6º As medidas protetivas de urgência vigorarão enquanto persistir risco à integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral da ofendida ou de seus dependentes."   

27. ^ "Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras: I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003 ;II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida; III - proibição de determinadas condutas, entre as quais: a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor; b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação; c) freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida; IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar; V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios. VI – comparecimento do agressor a programas de recuperação e reeducação; e VII – acompanhamento psicossocial do agressor, por meio de atendimento individual e/ou em grupo de apoio. § 1º As medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, devendo a providência ser comunicada ao Ministério Público.§ 2º Na hipótese de aplicação do inciso I, encontrando-se o agressor nas condições mencionadas no caput e incisos do art. 6º da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, o juiz comunicará ao respectivo órgão, corporação ou instituição as medidas protetivas de urgência concedidas e determinará a restrição do porte de armas, ficando o superior imediato do agressor responsável pelo cumprimento da determinação judicial, sob pena de incorrer nos crimes de prevaricação ou de desobediência, conforme o caso.§ 3º Para garantir a efetividade das medidas protetivas de urgência, poderá o juiz requisitar, a qualquer momento, auxílio da força policial.§ 4º Aplica-se às hipóteses previstas neste artigo, no que couber, o disposto no caput e nos §§ 5º e 6º do art. 461 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil)."   

28. ^ "Art. 24-A. Descumprir decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência previstas nesta Lei: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.   § 1º A configuração do crime independe da competência civil ou criminal do juiz que deferiu as medidas.        § 2º Na hipótese de prisão em flagrante, apenas a autoridade judicial poderá conceder fiança.       § 3º O disposto neste artigo não exclui a aplicação de outras sanções cabíveis."

29. ^ Sobre a necessidade de integração entre as medidas de proteção a ser conferidas às vítimas de violência doméstica, confiram-se as precisas colocações expostas no Anuário Brasileiro de Segurança Pública: "As Medidas Protetivas de Urgência (MPUs) são mecanismos legais criados pela Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) e cujo objetivo imediato é garantir a segurança da vítima de violência doméstica e familiar, prevenindo novas agressões e promovendo sua proteção física, psicológica e social. A possibilidade de aplicação das medidas – que são diversas, indo desde o afastamento do agressor do lar, passando pela suspensão do porte de arma, pelo encaminhamento da ofendida e seus dependentes a programa de proteção, entre outras – é considerada um ponto de inflexão no enfrentamento da violência contra a mulher, porque é um instrumento bastante inovador em comparação com o que havia no cenário anterior à lei. (...) O que talvez seja o principal ponto de convergência das pesquisas é o argumento de que as medidas protetivas podem ser efetivas para prevenir novas formas de violência, mas que a concessão, por si só, não é suficiente (Luduvice, Lodello e Zanello, 202418; Machado et al., 202019). Elas precisam ser combinadas com outras estratégias de enfrentamento. Entre elas, o acompanhamento rigoroso e a fiscalização sobre o cumprimento das medidas (como é feito, por exemplo, pelas Patrulhas Maria da Penha20), bem como a integração entre as instituições de segurança e justiça, de modo a prover a mulher de uma rede de apoio." Documento disponível em: <https://apidspace.forumseguranca.org.br/server/api/core/bitstreams/1d896734-f7da-46a7-9b23-906b6df3e11b/content>. Acesso em 18 de janeiro de 2025, fl. 145/146.

30. ^ "Art. 45. Em caso de risco iminente, a Administração Pública poderá motivadamente adotar providências acauteladoras sem a prévia manifestação do interessado."

31. ^ "Art. 53.  A ajuda de custo destina-se a compensar as despesas de instalação do servidor que, no interesse do serviço, passar a ter exercício em nova sede, com mudança de domicílio em caráter permanente, vedado o duplo pagamento de indenização, a qualquer tempo, no caso de o cônjuge ou companheiro que detenha também a condição de servidor, vier a ter exercício na mesma sede. (...) § 3º Não será concedida ajuda de custo nas hipóteses de remoção previstas nos incisos II e III do parágrafo único do art. 36."

Este texto não substitui o publicado no DOU de 12.2.2025