Presidência
da República |
Concede ao Coronel George E. Church, privilegio exclusivo pelo tempo de 50 annos para a construcção de uma estrada de ferro que evitando as quedas ou cachoeiras dos rios Madeira e Mamoré partindo do ponto mais vantajoso nas proximidades e abaixo da Cachoeira de Santo Antonio ao ponto mais vantajoso nas proximidades e acima da Cachoeira de Guajará-mirim. |
Tendo em attenção o que Me representou o Coronel de Engenheiros George E. Church, dos Estados-Unidos da America do Norte, ácerca da utilidade de uma estrada de ferro que, evitando as quedas ou cachoeiras dos rios Madeira e Mamoré, desembarace o commercio fluvial do Brasil e da Bolivia, e desejando promover quanto fôr possivel o desenvolvimento e prosperidade das provincias do Amazonas e Mato Grosso pela facilidade de communicações e protecção da industria de seus habitantes, Hei por bem, de conformidade com a Lei de 26 de Junho de 1852, Conceder-lhe privilegio exclusivo pelo tempo de 50 annos para, por meio de uma companhia que organizará, construir, custear e gozar uma estrada de ferro que, partindo do ponto mais vantajoso nas proximidades e abaixo da cachoeira de Santo Antonio, se prolongue pela margem direita do rio Madeira até o ponto mais vantajoso nas proximidades e acima da cachoeira do Guajará-mirim, extensão esta de pouco mais ou menos 300 kilometros, tudo de accôrdo com as clausulas que com este baixão, assignadas por Diogo Velho Cavalcanti de Albuquerque, do Meu Conselho, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Agricultura, Commercio e Obras Publicas, que assim o tenha entendido e faça executar.
Palacio do Rio de Janeiro, em vinte de Abril de mil oitocentos e setenta, quadragesimo nono da Independencia e do Imperio.
Com a rubrica de Sua Magestade o Imperador.
Diogo Velho Cavalcanti de Albuquerque.
Este texto não substitui o original publicado na CLBR, de 31.12.1870
CLAUSULAS A QUE SE REFERE O DECRETO Nº 4509 DESTA DATA
1ª O Governo Imperial concede ao Coronel de Engenheiros George E. Church autorização a fim de organizar uma companhia para a construcção de uma estrada de ferro na margem direita dos rios Madeira e Mamoré, pelo systema mais apropriado.
A empreza se denominará Madeira and Mamoré Railway.
2ª A estrada de ferro, tendo por fim evitar as cachoeiras dos rios Madeira e Mamoré, será construida pela companhia no melhor traço praticavel, e estender-se-ha do ponto mais vantajoso nas proximidades e abaixo da cachoeira de Santo Antonio ao ponto mais vantajoso nas proximidades e acima da quéda do Guajará-mirim.
A estrada poderá ramificar-se até o ponto fronteiro á embocadura do rio Buri no Madeira.
3ª A companhia terá o privilegio exclusivo pelo tempo de 50 annos para a construcção, custeamento e gozo dessa estrada de ferro.
4ª A incorporação da companhia deverá verificar-se dentro do prazo de um anno, a contar da promulgação do Decreto da concessão, e não se considerará feita sem que os seus Estatutos sejão registrados no Tribunal do Commercio competente: as obras começaráõ dentro do prazo de dous annos, e ficaráõ terminadas no de sete, contados da mesma data, em condições de poder funccionar a estrada regularmente; salvos em qualquer das hypotheses os casos de força maior, que serão allegados e provados perante o Governo, e por este decididos por Decreto, precedendo audiencia do conselho de Estado.
5ª Provado em qualquer hypothese o caso de força maior, os prazos serão prorogados como o Governo Imperial entender conveniente.
Finda qualquer prorocação sem que a companhia tenha cumprido as condições estipuladas, caducará a concessão sem mais formalidade.
6ª Seis mezes antes de terem começado os trabalhos da via ferrea, ou de qualquer de suas secções, a companhia submetterá á approvação do Governo os respectivos planos, que se consideraráõ approvados, se dentro de tres mezes da entrega não forem impugnados.
A companhia attenderá ás alterações que o governo determinar, sob pena de serem estas executadas á custa della.
Os planos devem comprehender não só o traçado da linha, como as obras d'arte, estações e o respectivo orçamento.
7ª Além dos terrenos devolutos precisos para o leito da estrada e suas dependencias, o Governo concede á companhia, mais 32 leguas quadradas kilometricas, em lotes alternados nunca maiores de quatro leguas quadradas, ao longo da estrada de ferro, ou nas suas immediações, e designadamente nos dous extremos da linha, e em frente á barra do Buri. A legua kilometrica é a que corresponde a 6,6 kilometros.
A demarcação dos terrenos assim cedidos á companhia será effectuada á sua custa.
8ª E' igualmente concedido á companhia o direito de dessapropriar, na fórma da Lei nº 816 de 10 de Julho de 1855, os terrenos de dominio particular, que, não havendo devolutos, forem indispensaveis para o leito da estrada e suas dependencias.
9ª O Governo concede á companhia isenção de direitos de importação, durante o prazo do privilegio, em favor dos materiaes destinados á construcção da estrada, sua conservação, custeio, e quaesquer outros trabalhos da empreza, ficando esta sujeita aos regulamentos fiscaes.
10ª O Governo solicitará dos poderes competentes, isenção de taxas e impostos do qualquer natureza para as propriedades da companhia durante o tempo do privilegio.
11ª Os nacionaes empregados nos trabalhos da estrada, e em quaesquer outros serviços da empraza, durante a existencia della, serão isentos do recrutamento, como tambem dispensados do serviço da guarda nacional.
12ª A companhia terá o direito de cortar e tirar nos terrenos do Estado as madeiras de que precisar para o combustivel dos seus vapores e construcção de suas obras.
13ª A companhia, durante o tempo do seu privilegio, terá igualmente o direito de explorar dentro de uma zona de cinco leguas da margem da estrada, e no seu prolongamento, minas de quaesquer metaes preciosos e productos chimicos, devendo, quando as descobrir, requerer ao Governo para na fórma das leis em vigor serem-lhe demarcadas as datas, e estipuladas as condições do seu gozo.
14ª A companhia perceberá o preço dos transportes de mercadorias e passageiros á vista de uma tarifa por ella organizada de accôrdo com o Governo.
As tarifas serão provisorias durante os 10 primeiros annos, e posteriormente sujeitas á revisão de cinco em cinco annos.
15ª Trinta annos depois de estar aberta ao trafego a estrada de ferro, a companhia deverá formar um fundo de amortização do seu capital por meio de uma taxa addicional no transporte de passageiros e mercadorias que transitarem pela estrada de ferro e suas dependencias.
A referida taxa será opportunamente fixada pelo Governo de accôrdo com a companhia.
Amortizado o capital reverterá para o Estado a estrada de ferro e suas dependencias, sem indemnização alguma.
16ª Durante a construcção da estrada, e emquanto não estiver ella funcionando regularmente, terá a companhia o direito de, sem prejuízo da navegação actual, emprehender os melhoramentos que forem necessarios, para facilitar a passagem dos barcos pelas cachoeiras, submettendo previamente ao conhecimento do Governo qualquer projecto, que para este fim tenha de ser posto em execução.
17ª As embarcações, não pertencentes á companhia, que se utilisarem desses melhoramentos, pagaráõ uma taxa sobre tonelagem que será fixada em uma tarifa, que a companhia de accôrdo com o Governo deverá organizar. A tarifa será provisoria durante os 10 primeiros annos.
18ª A cobrança da taxa, de que falla a clausula antecedente, não cessará pelo facto de ser declarada livre a todas as bandeiras, na conformidade do Decreto de 7 de Setembro de 1867, a navegação de todo o curso do Madeira; mas será regulada de modo a favorecer o commercio e a navegação no interesse da companhia, sem offensa dos tratados existentes.
Para melhor execução desta clausula o Governo Imperial fará habilitar na linha do Madeira os portos de embarque e desembarque, que julgar convenientes, expedindo para este fim os precisos regulamentos.
19ª A companhia, sob garantia de seus accionistas, da sua propriedade particular e da renda liquida da estrada, poderá contrahir emprestimos por meio da emissão de titulos negociaveis, para maior facilidade de suas operações economicas; sendo obrigada a publicar semestralmente os balanços da receita e despeza nas Provincias onde abrir suas operações, e a transmittil-os ao Governo nas mesmas épocas.
20ª O Governo fiscalisará, como julgar conveniente, a construcção das obras, o serviço do trafego, e a execução das estipulações desta concessão.
21ª Serão observadas nesta estrada de ferro, na parte que lhe fôr applicavel as disposições dos regulamentos em vigor nas actuaes estradas de ferro, e quaesquer outros que pelo Governo Imperial forem decretados, uma vez que não offendão as clausulas da presente concessão.
22ª Se o Governo Imperial entender conveniente effectuar o resgate da presente concessão poderá fazel-o em qualquer tempo depois de 30 annos de duração do privilegio.
O preço do resgate será regulado de modo que reduzido a apolices da divida publica, produza uma renda equivalente a média da receita liquida da estrada de ferro nos tres ultimos annos; e delle será deduzido o fundo de amortização que houver, conforme a clausula 15ª
23ª Não se verificando a hypothese da clausula antecedente, terminado o prazo do privilegio, a companhia continuará na posse e gozo da estrada e suas dependencias, deixando porém de cobrar qualquer taxa que perceba pelo trafego fluvial.
24ª As malas do correio e seus conductores, e quaesquer sommas de dinheiro pertencentes ao thesouro geral ou provincial, serão conduzidas gratuitamente pela companhia, com as necessarias garantias de segurança.
25ª Se o Governo precisar transportar forças para qualquer ponto da linha ou seus extremos, fica a companhia obrigada a pôr á sua disposição os meios de transporte que possuir, quér terrestres, quér fluviaes, pagando-lhe o Governo o serviço com 20 % de abatimento nos preços das suas tarifas. Igual abatimento se fará quanto á conducção de cargas pertencentes ao Governo geral ou ao provincial, de colonos e de suas bagagens.
26ª A companhia, será preferida em igualdade de condições nas concessões e favores que o Governo Imperial houver do conceder para a navegação do Guaporé e Mamoré, na parte que pertence ao Brasil, quando entender conveniente estabelecer essa navegação.
27ª A companhia poderá ter sua séde no paiz ou fóra delle, com tanto que, para decisão dos assumptos relativos á empreza, tenha no Brasil um representante, habilitado com os necessarios poderes para tratar e resolver directamente com o Governo Imperial, as questões emergentes, ficando entendido que quantas apparecerem entre ella e o Governo, ou entre ella e os particulares serão tratadas e resolvidas no Brasil.
28ª Podendo, não obstante a clareza das estipulações desta concessão, haver desaccôrdo entre o Governo e a companhia sobre os direitos e obrigações de ambas as partes na execução da mesma concessão, será o ponto controvertido sujeito á decisão de Juizes arbitros.
O arbitramento terá sempre lugar no Brasil, e se regulará nomeando livremente cada uma das partes o seu arbitro, quando não convierem n'um só.
Se os dous arbitros divergirem, a companhia nomeará para desempatador um Conselheiro de Estado, cujo voto será definitivo.
Quando por qualquer circumstancia uma das partes contractantes appellar para o arbitramento, dará aviso a outra declarando o seu arbitro. Se dentro de 30 dias a outra parte não communicar a sua nomeação, entender-se-ha que aceita o proposto.
29ª Fica entendido que a companhia não terá direito de exigir garantia de juros sobre o capital empregado nas suas obras, nem prestação ou subvenção alguma do Thesouro Nacional, nem quaesquer favores além dos que vão expressados nas presentes clausulas.
Palacio do Rio de Janeiro, em 20 de Abril de 1870. - Diogo Velho Cavalcanti de Albuquerque.
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