SUBCHEFIA DE ASSUNTOS PARLAMENTARES

MJ MPOG SEDH 00191 2008 PROGRAMA DE PROTEÇÃO AOS DEFENSORES DOS DIREITOS HUMANOS AMEAÇADOS

 Brasília, 30 DE OUTUBRO DE 2008

Excelentíssimo Senhor Presidente da República,

 

            Submetemos à elevada consideração de Vossa Excelência o anexo Anteprojeto de Lei, que “institui o Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos Ameaçados - PPDDH, no âmbito da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República”.

             A matéria em exame originou-se de discussões e debates desenvolvidos pelos membros do Grupo de Trabalho criado pelas Portarias de nºs 66 e 89, ambas de 2003, da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, com a finalidade de apresentar propostas de políticas, ações e medidas destinadas a garantir a proteção dos defensores de direitos humanos.

             O Grupo de Trabalho, coordenado pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, foi composto por representantes da Secretaria Nacional de Segurança Pública, da Polícia Federal, da Polícia Rodoviária Federal, do Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais de Justiça, do Conselho Nacional dos Comandantes Gerais das Polícias e Bombeiros Militares, da Associação Nacional dos Delegados de Polícia, o Ministério Público Federal, da Câmara dos Deputados, da Associação dos Magistrados do Brasil, da Unicef, da Ordem dos Advogados do Brasil, das organizações não-governamentais Terra de Direitos, Movimento Nacional de Direitos Humanos e Centro de Justiça Global.

             Como produto do Grupo de Trabalho e tendo em vista as normativas internacionais, nomeadamente a Resolução nº 53/144, da Assembléia Geral das Nações Unidas de 1998 e as formatações de Representações Especiais, tanto do sistema ONU quanto do interamericano, no cerne da Resolução 1.842 da OEA, o Governo brasileiro, depois de grandes incursões com a sociedade civil lança, oficialmente, em outubro de 2004, o Programa Nacional de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, como ação a ser desenvolvida no âmbito da SEDH.

             Esse Programa subsidiou a elaboração dos Projetos de Lei nº 2980, de 2004, que institui o Programa Nacional de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos e dá outras providências, da lavra do Deputado Eduardo Valverde, e nº 3616, de 2004, que insere capítulo na Lei do Programa de Vítimas e Testemunhas Ameaçadas, Lei nº 9807/99 e dá outras providências, proposto pela Deputada Iriny Lopes. O Projeto de nº 3.616, de 2004, foi apensado ao de nº 2.980, de 2004, e, atualmente, tramitam na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, sob a relatoria do Deputado Nelson Pellegrino, designado em 17 de junho de 2004.

             Pode-se afiançar que o processo de elaboração das iniciativas parlamentares objetivou atender às demandas sociais pela constituição formal de um Programa que venha a proteger a integridade, liberdade e dignidade dos defensores dos direitos humanos. Trata-se, obviamente, de iniciativas meritórias. 

             Ocorre que as proposições apresentadas pelos eminentes deputados dispõem sobre matérias de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo e padecem, portanto, do denominado vício de origem. Senão vejamos: o artigo 1º do PL 2.980, de 2004, visa a instituir o Programa Nacional de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos no âmbito da Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Já o artigo 5º do PL 3616, de 2004, atribui novas funções à Polícia Federal e à Polícia Rodoviária Federal.

             Tais dispositivos padecem, portanto, do vício de inconstitucionalidade, consoante o disposto no artigo 2º da Constituição Federal, segundo o qual os Poderes da União são independentes e harmônicos entre si e, artigo 84, VI, a, também da Carta Política, que atribui ao Presidente da República dispor, mediante decreto, sobre a organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos, casos em que a iniciativa se dará por lei ordinária.

             Ressalta-se que, diante do quadro de vulnerabilidade e ameaças sofridas pelos nossos defensores dos direitos humanos e da demanda social pela institucionalização de garantias e proteção a esses cidadãos, em 2007, com amplos debates sociais, o Programa avançou na construção do seu marco legal.

             Assim, foi determinada a criação da Política Nacional de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos, por meio do Decreto Presidencial nº 6.044/2007, que consignou a valorização do trabalho do defensor, pontuando os princípios gerais de respeito à dignidade da pessoa humana, de não-discriminação por motivo de gênero, orientação sexual, origem étnica ou social, deficiência, procedência, nacionalidade, atuação profissional, raça, religião, faixa etária, situação migratória ou outro status; promoção e garantia da cidadania e dos direitos humanos; respeito a tratados e convenções internacionais de direitos humanos e universalidade das dimensões dos direitos humanos.

             O PPDDH tem por escopo proporcionar proteção e assistência à pessoa ou grupo, organização ou movimento social que tenha como objeto a promoção ou proteção dos direitos humanos e se encontre em situação de risco ou de vulnerabilidade, em decorrência do desenvolvimento de suas atividades.

             Como premissa primária de compreensão dessa política, relevante é destacar que todo o esforço da rede de proteção aos defensores se consome em garantir sua integridade enquanto agentes que promovem e protegem os direitos humanos e denunciam atrocidades, morosidade no enfrentamento das questões sociais e impunidades.

             Oportuno, ainda é explicitar que o PPDDH dispõe de três eixos de atuação: a prevenção, que se resume na articulação de políticas, combatendo as causas das violações dos direitos dos defensores e de suas denúncias, a investigação das ameaças e das violações aos direitos humanos e a articulação, integração das políticas públicas locais e federais para atuar e enfrentar as causas das violações relatadas. Para tanto, urge dispor de uma Lei que estabeleça as normas para a organização, condução e manutenção da proteção aos defensores e defensoras de direitos humanos, instituindo o Programa e o compromisso dos atores envolvidos.

             Nacionalmente, o PPDDH conta com três Coordenações estaduais e uma Coordenação-Geral, um arranjo institucional compromissado em garantir e proteger 45 (quarenta e cinco) defensores e defensoras ameaçadas ou sob situação de vulnerabilidade.

             Finalmente, cabe mencionar a triste lembrança dos defensores dos direitos humanos que tiveram sua luta aniquilada e com sua morte tornaram pública a urgência de soluções para os problemas sociais e econômicos vivenciados em situações de vulnerabilidade.

             Símbolo da luta pelos direitos humanos, Dorothy Stang, missionária da Congregação Notre Dame e reconhecida defensora das causas ambientais e dos agricultores sem-terra contra madeireiros e fazendeiros que recebeu, em 2004, da Assembléia Legislativa do Estado do Pará o título de Cidadã Paraense e o prêmio “José Carlos Castro”, outorgado pela Ordem dos Advogados do Brasil. Irmã Dorothy, que trabalhava no Pará desde 1966, morreu em 2005, aos 73 anos, assassinada com seis tiros, numa emboscada, quando caminhava por uma estrada de terra na companhia de dois trabalhadores rurais.

             Senhor presidente, não pode haver democracia sem que o Estado e a sociedade garantam a todos os cidadãos, o efetivo respeito ao direito à segurança própria. É imprescindível para a consolidação desta jovem democracia brasileira, para além do atendimento às normativas internacionais do sistema de proteção dos direitos humanos, a concretização de uma política pública assecuratória da dignidade dos defensores e defensoras dos direitos de todos. Os defensores dos direitos humanos cumprem papel essencial na consolidação do Estado democrático de direito, sustentado pelos pilares da separação dos poderes, da supremacia constitucional e da garantia dos direitos humanos fundamentais.

             Membros de organizações de direitos humanos, advogados, jornalistas, lideranças rurais e indígenas que protegem vítimas e outros que atuam em defesa e promoção dos direitos humanos muitas vezes se tornam as próprias vítimas. Reconhecer que muitos se encontram em natureza precária de trabalho é imperativo para a proteção de sua luta. Os direitos concedidos e garantidos a todos os cidadãos, como a liberdade de pensamento, de consciência e de religião, o direito de livre manifestação e reunião, o direito à propriedade, à integridade, à segurança são especiais para os defensores dos direitos humanos. Ao defender nossa dignidade, recusamo-nos a ser humilhados e excluídos.

             São essas, Senhor Presidente, as razões pelas quais submetemos à elevada apreciação de Vossa Excelência o anexo Projeto de Lei.

 Respeitosamente,

 

Tarso Fernando Herz Genro
Ministro de Estado da Justiça
Paulo Bernardo Silva
Ministro de Estado do Planejamento,
Orçamento e Gestão
Paulo de Tarso Vannuchi
Ministro de Estado da Secretaria Especial dos
Direitos Humanos