Presidência da República
Casa Civil
Secretaria Especial para Assuntos Jurídicos

EMI n° 00002/2023 MIR  MM

Brasília, 6 de Março de 2023.

Excelentíssimo Senhor Presidente da República,

Submetemos à vossa apreciação o anexo projeto de lei, que cria o Dia Nacional Contra a Violência Política de Gênero e Raça.

O presente Projeto de Lei visa criar o “Dia Nacional Marielle Franco de Enfrentamento a Violência Política de Gênero e Raça”, a ser comemorado, anualmente, em 14 de março, com o objetivo de conscientizar a sociedade a respeito das violências sofridas pelas mulheres no ambiente político, em especial, mulheres negras.

No Brasil, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral, as mulheres representam 53% do eleitorado (BRASIL, 2022b). No entanto, seguem numericamente sub-representadas na política, como pode ser percebido nas eleições de 2022, em que apenas: (i) 17,7% dos representantes eleitos da Câmara dos Deputados eram mulheres (BRASIL, 2022a); e (ii) 4 entre os 27 dos representantes eleitos do Senado eram mulheres (BRASIL, 2022c).

Para além do fato de estarem sub-representadas, existe uma questão central que atravessa o ambiente político e a vivência das mulheres nesse espaço de poder: a violência política contra mulheres.

Conforme documento da iniciativa ATENEA - elaborado, conjuntamente, pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), pela Entidade das Nações Unidas para a Igualdade de Gênero e o Empoderamento das Mulheres (ONU Mulheres) e pelo Instituto Internacional para a Democracia e Assistência Eleitoral (IDEA Internacional) - intitulado “Violência Política contra Mulheres: Roteiro para Prevenir, Monitorar, Punir e Erradicar”:

A violência política contra as mulheres é um problema de direitos humanos que atinge as democracias e impede o progresso em direção à igualdade efetiva e, portanto, ao desenvolvimento humano sustentável. Trata-se de um problema latente em nível mundial, que repercute na dinâmica democrática em termos de gênero e se manifesta diariamente, embora com mais intensidade durante os processos eleitorais, no exercício da cidadania política das mulheres” (PNUD; ONU MULHERES; INTERNATIONAL IDEA, 2020, p. 20).

Diante de todo o cenário apresentado, percebe-se a importância do combate e de políticas públicas mais efetivas no combate à violência política contra mulheres.

No Brasil, um caso de violência política contra uma mulher negra marcou. A brutal execução de Marielle Franco, vereadora da Câmara Municipal do Rio de Janeiro, democraticamente eleita com 46.502 votos, em 14 de março de 2018, consiste em violência política. O assassinato de Marielle Franco colocou no centro da luta política o debate sobre a visibilidade, representatividade e segurança de mulheres nos espaços de poder.

Na Câmara Municipal, Marielle presidiu a Comissão de Defesa da Mulher e integrou uma comissão composta por quatro pessoas, cujo objetivo era monitorar a intervenção federal no Rio de Janeiro, sendo escolhida como sua relatora em 28 de fevereiro de 2018. Era crítica da intervenção federal, assim como criticava e denunciava constantemente abusos policiais e violações aos direitos humanos.

O assassinato dela motivou reações nacionais e internacionais, como a organização de diversos protestos em todo o território brasileiro e oposição de parte dos eurodeputados à negociação econômica entre União Europeia e Mercosul.

Em julho de 2018, a ALERJ aprovou a Lei 8054/2018 que consolidou 14 de março ao Calendário Oficial do Estado do Rio de Janeiro como o "Dia Marielle Franco – Dia de Luta contra o genocídio da Mulher Negra". Em novembro de 2018, a Anistia Internacional incluiu o nome de Franco em sua campanha para aqueles que escreveram pelos direitos humanos e perderam suas vidas.

Em março de 2019, Marielle foi postumamente agraciada pelo Congresso Nacional do Brasil com o Diploma Bertha Lutz, concedido a mulheres que tenham oferecido relevante contribuição na defesa dos direitos da mulher e questões do gênero no Brasil. No mesmo mês, o auditório II do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) recebeu o nome de Marielle Franco.

Marielle também foi homenageada pela escolas de samba Vai-Vai e Estação Primeira de Mangueira durante os desfiles do Carnaval de São Paulo e do Carnaval do Rio de Janeiro de 2019, respectivamente.Em setembro de 2019, a cidade de Paris, na França, inaugurou um jardim suspenso de 2,6 mil m² e mais de 70 árvores em homenagem a Marielle Franco no 10° distrito da cidade.

Marielle lutou em vida por um fazer político plural, diverso e democrático. Seu assassinato é um retrato de um contexto de violência contra corpos de mulheres negras em todo o país. Seu legado fala por si só.

Diante de todo o arcabouço legal apresentado, e da trajetória de Marielle Franco e seu assassinato brutal como representante politica, o projeto de lei em questão seria mais um passo normativo concreto para garantir a participação das mulheres na política, de maneira livre e segura.

Diante do exposto, submete-se a Minuta do Projeto de Lei para sua apreciação.

REFERÊNCIAS CITADAS

BRASIL. Decreto nº 1.973, de 1 de agosto de 1996. Promulga a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, concluída em Belém do Pará, em 9 de junho de 1994. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1996/d1973.htm. Acesso em: 17 fev. 2023.

BRASIL. Decreto nº 4.377, de 13 de setembro de 2002. Promulga a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, de 1979, e revoga o Decreto no 89.460, de 20 de março de 1984. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4377.htm. Acesso em: 17 fev. 2023.

BRASIL. Lei nº 12.345, de 9 de dezembro de 2010. Fixa critério para instituição de datas comemorativas. 2010. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12345.htm. Acesso em: 16 fev. 2023.

BRASIL. Lei nº 14. 192, de 4 de agosto de 2021. Estabelece normas para prevenir, reprimir e combater a violência política contra a mulher; e altera a Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965 (Código Eleitoral), a Lei nº 9.096, de 19 de setembro de 1995 (Lei dos Partidos Políticos), e a Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997 (Lei das Eleições), para dispor sobre os crimes de divulgação de fato ou vídeo com conteúdo inverídico no período de campanha eleitoral, para criminalizar a violência política contra a mulher e para assegurar a participação de mulheres em debates eleitorais proporcionalmente ao número de candidatas às eleições proporcionais. 2021. Disponível em:https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/Lei/L14192.htm. Acesso em: 17 fev. 2023.

BRASIL. Bancada feminina aumenta 18,2% e tem duas representantes trans. 2022a. Disponível em: https://www.camara.leg.br/noticias/911406-bancada-feminina-aumenta-18-e-tem-2-representantes-trans/. Acesso em: 16 fev. 2023.

BRASIL. Estatísticas do eleitorado – Por sexo e faixa etária. 2022b. Disponível em: https://www.tse.jus.br/eleicoes/estatisticas/estatisticas-de-eleitorado/estatistica-do-eleitorado-por-sexo-e-faixa-etaria. Acesso em: 16 fev. 2023.

BRASIL. 23 homens e 4 mulheres são eleitos para o Senado. 2022c. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/radio/1/noticia/2022/10/03/24-homens-e-3-mulheres-sao-eleitos-para-o-senado. Acesso em: 16 fev. 2023.

OEA/CIM. Ley Modelo Interamericana para Prevenir, Sancionar y Erradicar la Violencia contra las Mujeres en la Vida Política. 2017. Disponível em: https://www.oas.org/es/mesecvi/docs/LeyModeloViolenciaPolitica-ES.pdf. Acesso em: 17 fev. 2023.

OEA/CIM. Protocolo Modelo para partidos políticos: Prevenir, Atender, Sancionar y Erradicar la Violencia contra las Mujeres en la Vida Política. 2019. Disponível em: https://www.oas.org/en/cim/docs/ViolenciaPolitica-ProtocoloPartidos-ES.pdf. Acesso em: 17 fev. 2023.

PNUD; ONU MULHERES; INTERNATIONAL IDEA. Violência contra as Mulheres: Roteiro para Prevenir, Monitorar, Prevenir e Erradicar. 2020. Disponível em: http://www.onumulheres.org.br/wp-content/uploads/2021/12/Roteiro_HojadeRuta.pdf. Acesso em: 17 fev. 2023.

WikiFavelas. Marielle Franco (PSOL/RJ) Maré-RJ. Disponível em: https://wikifavelas.com.br/index.php/Marielle_Franco_(PSOL/RJ)_-_Mar%C3%A9_-_RJ#Assassinato

Respeitosamente, 

Anielle Francisco da Silva
Ministra de Estado da Igualdade Racial

Aparecida Gonçalves
Ministra de Estado das Mulheres