Decreto nº 88.441, de 29 de Junho de 1983
Promulga o Tratado para o Aproveitamento dos Recursos Hídricos Compartilhados dos Trechos Limítrofes do Rio Uruguai e de seu Afluente o Rio Pepiri-Guaçu, entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Argentina.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA,
CONSIDERANDO que o Congresso Nacional aprovou .pelo Decreto Legislativo nº 82, de 1º de setembro de 1982, o Tratado para o Aproveitamento dos Recursos Hídricos Compartilhados dos Trechos Limítrofes do Rio Uruguai e de seu Afluente e o Rio Pepiri-Guaçu, entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Argentina, concluído em Buenos Aires, a 17 de maio de 1980.
CONSIDERANDO que o referido Tratado entrou em vigor, por troca de Instrumentos de Ratificação, a 1º de junho de 1983, na forma de seu artigo XVI,
DECRETA:
Art . 1º, O Tratado para o Aproveitamento dos Recursos Hídricos Compartilhados dos Trechos Limítrofes do Rio Uruguai e de seu Afluente o Rio Pepiri-Guaçu entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo República Argentina, apenso por cópia ao presente Decreto, será executado e cumprido tão inteiramente como nele se contém.
Art . 2º, Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.
Brasília, em 29 de junho de 1983; 162º da Independência e 95º da República.
JOÃO FIGUEIREDO
R.S. Guerreiro
Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 30.6.1983
O Governo da República Federativa do Brasil
e
O Governo da República Argentina,
CONSIDERANDO:
O espírito de cordialidade existente entre os dois países e os laços de fraterna amizade que os unem;
O interesse comum do Brasil e da Argentina em realizar o aproveitamento dos recursos hídricos compartilhados dos trechos limítrofes do rio Uruguai e de seu afluente o rio Pepiri-Guaçu;
O disposto no Artigo I, Parágrafo Único, e no Artigo VI do Tratado da Bacia do Prata;
O estabelecido na Declaração de Assunção sobre o aproveitamento de rios internacionais, de 3 de junho de 1971;
Os estudos realizados nos termos do Convênio firmado, em Brasília, no dia 14 de março de 1972, entre a “Centrais Elétricas Brasileiras S.A. - ELETROBRÁS”, do Brasil, e “Agua y Energia Eléctrica AyE”, da Argentina;
A Identidade de posições dos dois países, em relação à livre navegação dos rios internacionais da Bacia do Prata;
ACORDAM o seguinte:
As Partes Contratantes, de acordo com os tratados e demais compromissos internacionais vigentes, convém em realizar em comum e segundo o previsto no presente Tratado, o aproveitamento dos recursos hídricos compartilhados nos trechos limítrofes do rio Uruguai e de seu afluente o rio Pepiri-Guaçu. Neste contexto incluem-se, entre outros, aproveitamentos hidrelétricos, melhoria das condições de navegabilidade do rio Uruguai naquele trecho, atenuação dos efeitos das cheias extraordinárias e utilização racional de suas águas para usos consultivos. Os projetos e obras a serem executados terão presente a necessidade de preservar o meio ambiente, a fauna, a flora e a qualidade das águas dos citados rios, evitar sua contaminação e assegurar, como mínimo, as atuais condições de salubridade na área de influência dos aproveitamentos que se projetem.
§ 1º A decisão para a execução de cada projeto específico será tomada por troca de notas entre os dois Governos.
§ 2º Para a execução e operação das obras de aproveitamento dos recursos hídricos compartilhados serão firmados convênios de cooperação entre as entidades competentes designadas pelas Partes Contratantes.
Para os refeitos do presente Tratado entender-se-á por:
a) Partes Contratantes: a República Federativa do Brasil e a República Argentina;
b) Tratado: o presente Instrumento jurídico;
c) Recursos hídricos compartilhados: os recursos hídricos dos trechos limítrofes do rio Uruguai e de seu afluente o rio Pepiri-Guaçu, compartilhados entre o Brasil e a Argentina;
d) ELETROBRÁS: “Centrais Elétricas Brasileiras S.A. ELETROBRÁS”, do Brasil, ou o ente jurídico que a suceda;
e) AyE: “Água y Energia Eléctrica, Sociedad del Estado”, da Argentina, ou o ente jurídico que a suceda;
f) Entidades Executivas: as entidades públicas ou controladas pelo Poder Público de cada país encarregadas de executar e operar as obras de aproveitamento dos recursos hídricos compartilhados;
g) Convênios de Cooperação: os convênios a serem celebrados entre Entidades Executivas com a finalidade de definir ‘ responsabilidade se atribuições na execução e operação das obras de que forem encarregadas.
CONSIDERANDO o estabelecido no Artigo I do Tratado da Bacia do Prata e na Declaração de Assunção, serão levados em conta, na construção e operação das centrais hidrelétricas que vierem a ser executadas em decorrência do presente Tratado, os aspectos relativos aos usos múltiplos dos recursos hídricos compartilhados.
§ 1º O aproveitamento das águas do rio Uruguai e seus afluentes, nos trechos não compartilhados, será feito por cada país conforme suas necessidades sempre que não causar prejuízo sensível ao outra país.
§ 2º Tendo presentes os eventuais efeitos benéficos da regularização nos trechos limítrofes dos rios Uruguai e Pepiri-Guaçu, os eventuais prejuízos sensíveis que se possam produzir a jusante como conseqüência da regularização dos referidos rios deverão prevenir-se, na medida do possível, e sua apreciação e qualificação não poderão definir-se unilateralmente pela Parte em cuja jurisdição presumivelmente se originem, nem pela Parte que alegue a ocorrência dos referidos eventuais prejuízos sensíveis. As reclamações que daí poderiam originar-se serão resolvidas, no prazo mais breve possível, compatível com a natureza de prejuízo e sua análise.
As obras de aproveitamento hidrelétrico a serem realizadas nos trechos limítrofes do rio Uruguai e de seu afluente o rio Pepiri-Guaçu e sua posterior operação serão executadas, segundo o que estabelece o Tratado, pela ELETROBRÁS, por parte do Brasil, e pela AyE, por parte da Argentina, as quais poderão, mediante aprovação dos respectivos Governos, delegar ou transferir tais atribuições a outras Entidades Executivas.
§ 1º A concepção de cada aproveitamento hidrelétrico terá em conta as obras a ele vinculadas e destinadas a cumprir os outros objetivos consignados no Artigo I deste Tratado.
§ 2º Na execução de cada obra hidrelétrica serão observados os seguintes princípios:
a) propriedade exclusiva de cada Entidade Executiva das obras e instalações realizadas no território do seu respectivo país;
b) divisão em partes iguais dos benefícios resultantes do aproveitamento dos recursos hidrelétricos compartilhados, medidos em termos da energia que vier a ser gerada no conjunto da obra;
c) distribuição equitativa das responsabilidades de execução das obras e instalações entre as Entidades Executivas de cada país com vistas atender aos princípios acima mencionados.
§ 3º Os projetos das obras hidrelétricas, suas estimativas de custos, bem como a analise dos benefícios resultantes deverão ser aprovados pelos respectivos Governos.
§ 4º Nas estimativas de custos, nos orçamentos anuais, nos demonstrativos financeiros, bem como na avaliação dos benefícios resultantes da operação das obras e instalações será adotada, como moeda de referência, o dólar dos Estados Unidos da América ou outra moeda que venha a ser acordada mediante troca de notas entre os dois Governos.
A divisão entre o Brasil e a Argentina dos benefícios resultantes dos aproveitamentos hidrelétricos realizados em decorrência do presente Tratado e referida no Artigo IV, obedecerá aos critérios a seguir definidos:
a) a divisão entre o Brasil e a Argentina da energia hidrelétrica produtível pelas diversas centrais será efetuada em partes iguais. Cada país poderá utilizar até o total de sua quota-parte, em consonância com as normas e procedimentos de operação a serem estabelecidos, nos termos do Artigo VI deste Tratado, pela Comissão Coordenadora prevista no Artigo X;
b) para efeito de aplicação do critério acima enunciado, a energia elétrica produzida em qualquer das unidades geradoras será sempre dividida de forma que a energia total produzida nas Centrais pertencerá em partes iguais aos dois países, seja qual for a unidade geradora em operação. O acerto de contas será feito semestralmente com base na medição da energia total produzida pelas centrais e fornecida ao Brasil e à Argentina;
c) a utilização da energia produzida nas centrais será feita pela ELETROBRÁS e por AyE, ou pelas empresas e entidades brasileiras ou argentinas por elas indicadas;
d) ambas as Entidades Executivas deverão manter e operar suas respectivas instalações geradoras a fio de que seja possível o aproveitamento, na maior medida, do recurso hidrelétrico compartilhado. No caso da não utilização, por um dos dois países, da energia produzível a que tem direito, essa energia não utilizada poderá ser transferida ao outro país nos termos e condições a serem estabelecidos de comum acordo;
e) caso venha a ser estabelecido, para um aproveitamento no trecho limítrofe do rio Uruguai, um nível de represamento que ultrapasse os limites territoriais na seção de fronteira, a ELETROBRÁS e AyE proporão às Partes Contratantes os termos e condições para a divisão da energia elétrica adicional decorrente daquela elevação, bem como para a distribuição, entre os dois países, dos aumentos de custos e dos benefícios resultantes.
Relativamente à operação das instalações hidrelétricas realizadas em decorrência deste Tratado, a Entidade Executiva de cada país observará as normas e procedimentos a serem estabelecidos pela Comissão Coordenadora, de acordo com os seguintes critério:
a) deverá assegurar-se a manutenção, a jusante, das vazões permanentes necessárias para facilitar a navegação no rio Uruguai, quando sua regularização o permitir;
b) o enchimento dos reservatórios e a operação posterior das centrais hidrelétricas não deverão causar, a jusante, fora do trecho do rio Uruguai objeto deste Tratado, prejuízos sensíveis à navegação, ao regime do rio, à qualidade de sua águas ou à operação de seus portos, nem afetar o aproveitamento normal do recurso hídrico em outras obras ou instalações existentes ou projetadas sobre o rio Uruguai, fora do trecho deste rio objeto do presente Tratado;
c) serão levados em conta os Planos (anuais) e os Programas (mensais, semanais e diários) de operação dos respectivos sistemas elétricos interligados, com base nas informações a serem fornecidas por ambos os países.
As Partes Contratantes se obrigam, na devida oportunidade, a declarar de utilidade pública as áreas necessárias à execução dos aproveitamentos hidrelétricos e demais obras objeto deste Tratado, bem como a praticar, no âmbito de suas respectivas soberanias, todos os atos administrativos ou judiciais tendentes a desapropriar terrenos e suas benfeitorias ou a constituir servidão sobre os mesmos.
§ 1º A delimitação de tais áreas e o pagamento das desapropriações e relocações nas áreas delimitadas em cada país, na forma prevista nas legislações nacionais vigentes, serão de responsabilidade das respectivas Entidades Executivas. As despesas decorrentes serão realizadas separadamente por cada país.
§ 2º As Partes Contratantes tomarão as medidas adequadas a facilitar nas áreas delimitadas o trânsito e acesso de pessoas que prestarem serviços à ELETROBRÁS e AyE, à Comissão Coordenadora ou às Entidades Executivas, assim como o dos bens destinados às mesmas ou a pessoas físicas ou jurídicas por elas contratadas, desde que necessários à realização das obras ou serviços.
As instalações destinadas ao aproveitamento dos recursos hídricos compartilhados, tais como barragens, canais e centrais hidrelétrica, não produzirão variação alguma nos limites entre os dois países, estabelecidos nos tratados vigentes.
§ 1º As instalações realizadas em cumprimento deste Tratado não conferirão a nenhuma das Partes Contratantes jurisdição sobre qualquer parte do território da outra.
§ 2º As autoridades declaradas respectivamente competentes pelas Partes Contratantes estabelecerão, quando for o caso, para os efeitos práticos do exercício de jurisdição e controle, a sinalização conveniente nas instalações a serem realizadas, pelo processo que julgarem adequado.
Para a execução e operação, das obras de aproveitamento hidrelétrico a serem realizadas no contexto deste Tratado, ELETROBRÁS e AyE firmarão um Convênio de Cooperação definindo suas responsabilidades e atribuições.
§ 1º O Convênio de Cooperação preverá, também, o prosseguimento dos estudos realizados em decorrência do Convênio ELETROBRÁS-AyE, firmado em Brasília a 14 de março de 1972, o qual será considerado extinto a partir da data da aprovação por ambos os Governos do Convênio de Cooperação.
§ 2º O Convênio de Cooperação referido neste Artigo deverá ser aprovado pelos dois Governos mediante troca de notas.
Com a finalidade de coordenar a execução do Convênio de Cooperação previsto no Artigo IX, bem como a atuação das Entidades Executivas na realização de programas, estudos, projetos, construção, manutenção, operação e outras atividades relacionadas com os aproveitamentos hidrelétricos que venham a ser realizados no contexto deste Tratado, é criada uma Comissão Coordenadora que se regerá pelo Tratado e pelo Convênio de Cooperação.
§ 1º A Comissão Coordenadora será constituída de duas delegações, presididas respectivamente e por um representante designado pela ELETROBRÁS e por um representante designado pela Secretaria de Estado de Energia da República Argentina. As delegações contarão ainda com dois representantes de cada parte e um representante do Ministério das Relações Exteriores. Aos membros efetivos corresponderão membros suplentes para atenderem eventuais ausências dos respectivos titularas. Os membros efetivos e seus suplentes exercerão suas funções sem direito a remuneração.
§ 2º As reuniões da Comissão Coordenadora terão lugar em qualquer ponto do território dos dois países, de acordo com o interesse dos seus trabalhos.
§ 3º A Comissão Coordenadora apresentara à ELETROBRÁS e AyE, artes do dia 31 de março de cada ano, um relatório consolidado sobre suas atividades e das Entidades Executivas, referentes aos projetos e obras, incluindo demonstrativos da execução orçamentária com base na moeda de referência.
§ 4º Os assuntos que exigirem decisão superior serão encaminhados pela Comissão Coordenadora à ELETROBRÁS e AyE, as quais os submeterão às autoridades competentes de cada país.
As Partes Contratantes, direta ou indiretamente, propiciarão a ELETROBRÁS e AyE e às Entidades Executivas de ambos os países a obtenção de recursos e darão garantias para as operações de crédito necessárias à execução das obras mencionadas no presente Tratado assegurando, da mesma forma, as conversões cambiais requeridas para o pagamento das obrigações assumidas nas moedas brasileira, argentina ou de terceiros países.
As Entidades Executivas de cada país incorporarão, como parte dos investimentos relativos às obras hidrelétricas decorrentes deste Tratado, os dispêndios realizados pela ELETROBRÁS e AyE nos seguintes trabalhos:
a) administração do Convênio ELETROBRÁS-AyE, mencionado no Artigo IX, parágrafo 1;
b) estudos resultantes do Convênio acima referido;
c) trabalhos preliminares relacionados com a execução das obras hidrelétricas previstas neste Tratado.
As Partes Contratantes, através de protocolos adicionais ou de atos unilaterais, adotarão todas as medidas necessárias ao cumprimento do presente Tratado, inclusive as referentes ao trânsito e acesso às áreas que se delimitem, em conformidade com a Artigo VII, bem como à situação jurídica e trabalhista de pessoas que devam realizar trabalhos nas referidas áreas.
Em caso de divergência quanto à interpretação ou à aplicação do presente Tratado, as Partes Contratantes a resolverão pelos meios diplomáticos usuais, o que não retardará ou interromperá a execução das obras nem a operação das suas instalações.
O presente Tratado será ratificado e os respectivos instrumentos serão trocados, o mais brevemente possível, na cidade de Brasília.
O presente Tratado entrará em vigor na data da troca dos instrumentos de ratificação e terá vigência até que as Partes Contratantes, mediante novo acordo, adotem decisão que estimem conveniente.
Feito na cidade de Buenos Aires aos dezessete dias do mês de maio de mil novecentos e oitenta, em dois exemplares originais, em português e espanhol, ambos os textos igualmente válidos.
PELO GOVERNO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL: |
PELO GOVERNO DA REPÚBLICA ARGENTINA: |
Ramiro Saraiva Guerreiro |
Carlos W. Pastor |