Presidência
da República |
MENSAGEM Nº 1.009, DE 19 DE SETEMBRO DE 2001.
Senhor Presidente do Senado Federal,
Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do parágrafo 1o do artigo 66 da Constituição Federal, decidi vetar integralmente, por contrariar o interesse público, o Projeto de Lei no 604, de 1991 (no 104/92 no Senado Federal), que "Define e pune contravenção penal referente a condutas atentatórias contra o patrimônio público e privado".
Ouvido, o Ministério da Justiça assim se manifestou:
"A norma projetada define como contravenção penal fixar cartazes, faixas ou realizar qualquer tipo de pichação em muros, paredes e fachadas em geral, em áreas particulares ou públicas, sem a expressa autorização do proprietário ou do órgão competente, cominando-lhe a pena do art. 46 da Lei no 7.209, de 11 de julho de 1984 Código Penal. Além disso, estabelece que se o contraventor for primário, pode o juiz aplicar somente a pena de multa.
Segundo dispõe o art. 5o, inciso XXXIX, da Constituição Federal, "não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal" (princípio de legalidade penal). Nesse sentido dispõe, também, o art. 1o do Código Penal.
O preceito sancionador da norma projetada estabelece:
"Pena a do art. 46 da Lei no 7.209, de 11 de julho de 1984 Código Penal".
O mencionado dispositivo define pena de prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas. De se observar, porém, que as penas restritivas de direitos, na sistemática do Código Penal, são sempre penas substitutivas. Assim, sempre será necessário que, originariamente, haja a previsão de uma pena privativa de liberdade no preceito sancionador. Não é possível a aplicação direta de pena restritiva de direitos. Assim, como não há previsão de pena privativa de liberdade, ou no caso pena de prisão para a mencionada contravenção, será impossível a substituição. Cumpre lembrar que o § 3o do art. 46 estabelece que a pena de prestação de serviços à comunidade deve ser cumprida "à razão de 1 (uma) hora de tarefa por dia de condenação".
Em assim sendo, da forma como estabelecido no projeto, tem-se uma contravenção penal com pena inexeqüível.
Sobre o assunto, colhemos nos tribunais os seguintes pronunciamentos:
"Necessidade de fixação inicial de pena privativa de liberdade TACRSP: `A Pena restritiva de direito, embora seja autônoma, tem caráter substitutivo não podendo ser aplicada diretamente e sim em substituição a anterior imposição da pena corporal´ (RJDTACRIM 4/118). No mesmo sentido, TACRSP: JTACRIM 85/511, 93/210´.
Inadmissibilidade de cumulação com pena privativa de liberdade TJMS: `A pena restritiva de direitos não pode coexistir com a pena corporal, uma vez que aquela é de caráter autônomo e substitutiva da pena privativa de liberdade quando o crime é culposo´ (RT 612/378). TACRSP: `As penas restritivas de direitos são substitutivas, e não acessórias. Assim, não podem ser aplicadas cumulativamente com a privativa de liberdade´ (RT 637/277). No mesmo sentido, TACRSP: JTACRIM 89/444 e 445.
Necessidade de fixação da espécie de pena TACRSP: `o juiz, ao proceder a substituição da pena privativa por uma restritiva de direitos, deve, na sentença, especificar qual a espécie de restritiva foi escolhida. Deve o sentenciado saber que tipo de pena resgatará. Não sendo clara a sentença neste aspecto, deve ela ser anulada´ (JTACRIM) 86/400).TACRSP:"
Ademais, é de se observar que já há no ordenamento tutela penal ao bem jurídico objeto do projeto. A Lei dos Crimes Ambientais Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, em seu art. 65, define como crime:
"Pichar, grafitar ou por qualquer outro meio conspurcar edificação ou monumento urbano:
Pena detenção de três meses a um ano, e multa".
Ressalte-se que as demais formas de condutas previstas no tipo contravencional enquadram-se no preceito de interpretação analógica contido na expressão "ou por outro meio conspurcar". Em conseqüência, a aprovação do projeto significaria um enfraquecimento da tutela penal na medida em que transformaria uma conduta hoje definida como crime em mera contravenção penal.
Cumpre, ainda, salientar que as contravenções penais estão definidas no Decreto-Lei no 3.688, de 2 de outubro de 1941, diploma legal que deverá sediar disposição nova que trate da matéria, em obediência à Lei Complementar no 95, de 1998, segundo a qual "o mesmo assunto não poderá ser disciplinado por mais de uma lei, exceto quando a subseqüente se destine a complementar lei considerada básica, vinculando-se a esta por remissão expressa" (art. 7o, inciso IV)."
Estas, Senhor Presidente, as razões que me levaram a vetar integralmente o projeto em causa, as quais ora submeto à elevada apreciação dos Senhores Membros do Congresso Nacional.
Brasília, 19 de setembro de 2001.