Presidência
da República |
MENSAGEM Nº 339, DE 19 DE ABRIL DE 1996.
Senhor Presidente do Senado Federal,
Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do parágrafo 1o do artigo 66 da Constituição Federal, decidi vetar integralmente o Projeto de Lei no 87, de 1992 (no 3.772/93 na Câmara dos Deputados), que "Dispõe sobre o reassentamento de ocupantes em imóvel rural desapropriado por necessidade ou utilidade pública".
Ouvido, o Ministério da Justiça assim se manifestou:
"Observa-se, pois, que a proposta confunde vocábulos utilizados em institutos distintos: assentamento (art. 17 da Lei n° 8.629/93) e fertilidade, inerente à produtividade, são ínsitos à desapropriação por reforma agrária, não sendo adequada a terminologia às desapropriações por necessidade ou utilidade pública.
Além do mais, estabelece o art. 26 do Decreto-lei n° 3.365/41 estabelece que no valor da indenização não se incluirão direitos de terceiros contra o expropriado. Aduza-se, ainda, que a desapropriação por necessidade ou utilidade pública comporta a imissão provisória na posse (art. 15). Com a adoção da proposta, confere-se tratamento diferenciado às desapropriações com o mesmo fundamento: as de imóveis rurais, que estarão praticamente inviabilizadas, tendo em vista que, no caso de serem destinados a construções, o Poder Público só poderá iniciá-las após o assentamento, inadmitida, assim, imissão provisória na posse; e as de imóveis urbanos, que continuarão regidas pelo decreto-lei acima mencionado. Também se constitui em procedimento desarrazoado o de o Poder Público arcar com as indenizações devidas pelo expropriado em virtude de suas relações laborais ou contratuais no caso dele ser proprietário de imóvel rural, ainda mais que tal não ocorre nas demais hipóteses de apropriação.
Assim sendo, embora o Poder Público deva estar atento para as questões sociais que decorrem das desapropriações, em especial no que se refere às relações de terceiro com o expropriado, não nos parece crível admitir a propositura, nos termos em que redigida, já que ela confunde os institutos da desapropriação, apresentando solução para o problema de difícil aplicabilidade prática. Seria de melhor técnica cogitar-se de atribuir preferência aos destinatários da norma projetada nos planos de reforma agrária, o que, é certo, não é cabível na fase em que se encontra a proposta."
As desapropriações para fins de reforma agrária distinguem-se das desapropriações por necessidade ou utilidade pública, em particular sob o aspecto da competência, que no primeiro caso é exclusiva da União e, no segundo, é também dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal.
Da forma como o projeto se apresenta, a obrigatoriedade de reassentar os expropriados gera direitos subjetivos em face não só da União, mas também dos Estados, Municípios e do Distrito Federal, que não terão condições de proceder ao reassentamento em terras que ofereçam as mesmas condições de fertilidade e ainda se situem no mesmo município ou região, uma vez que terras produtivas e pequenas propriedades, definidas na Lei n° 8.629/93, não podem ser desapropriadas.
Sob o fundamento social, a proposta parece atender à finalidade da desapropriação, porém, sob o aspecto de constitucionalidade, o texto do projeto vai além do que dispõe a Constituição, criando obrigações não só para a União, mas para os Estados, Municípios e Distrito Federal, que deverão encontrar meios para reassentar as famílias, tornando, assim, mais onerosa a desapropriação.
O texto impõe que, além da terra para sobrevivência das famílias a serem reassentadas, o expropriante assegure infra-estrutura, como estradas, energia elétrica, habitação, benfeitorias de apoio, escola, posto de saúde, comunicações e transporte. A Constituição prevê indenização em dinheiro e as benfeitorias citadas no art. 4° implicam obras de naturezas diversas, criando custos que gerariam aumento de despesas para os Estados, Municípios e Distrito Federal, o que equivale dizer que o projeto cria um ônus adicional, extrapolando o texto constitucional e ferindo a autonomia prevista no seu art. 18.
Não deve prosperar a presente proposta, por ser o texto confuso no plano fático e no plano jurídico, com falhas e distorções. A norma legal deve ser precisa, não admitindo contradições que culminariam em questionamentos no Poder Judiciário.
Na fase em que se encontra o projeto, não é cabível qualquer discussão a respeito do que foi abordado. A proposta acarretaria dificuldades, inclusive discussões judiciais, sendo inviável a aplicação, na prática, dos dispositivos inseridos no texto apresentado.
Estas, Senhor Presidente, as razões que me levaram a vetar totalmente o projeto em causa, as quais ora submeto à elevada apreciação dos Senhores Membros do Congresso Nacional
Brasília, 19 de abril de 1996.
Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 22.4.1996