Presidência
da República |
DECRETO DE 20 DE SETEMBRO DE 1808.
Approva as instrucções provisorias para a administração da Fazenda de Santa Cruz. |
Havendo por meu Real Decreto de 31 de Agosto do presente anno dado uma nova forma á administração da Fazenda de Santa Cruz, e nomeado Superintendente da mesma fazenda a Leonardo Pinheiro de Vasconcellos, do meu Conselho, para que as providencias que houver de dar em desempenho desta importante commíssão, que fui servido confiar ao seu zelo, actividade e prestimo, tenham o seu pretendido eifeito e não sejam a cada passo demoradas por falta de approvação: hei por bem autorizar ao dito Superintendente, para que possa promover e dirigir a administração da mesma fazenda, como melhor lhe parecer, e de accôrdo com o primeiro administrador nomeado, que todavia lhe será subordinado, bem como todos os mais empregados na dita fazenda, dando-me conta pelo Presidente do meu Real Erario dos estabelecimentos que julgar conveniente emprehender e levantar de novo, e das alterações e mudanças mais essenciaes que houver de fazer, para eu determinar o que fôr servido. Outrosim sou servido autorlsar o sobredito Superintendente, para que possa mandar vender na occasião que lhe parecer mais conveniente todos os effeitos, gados, madeiras e mais producções da mesma Fazenda de Santa Cruz, devendo entrar o seu producto em o cofre da administração, bem como o preço de todas as producções e effeitos da dita fazenda que se receberem na minha Real Casa; ou em algumas das Estações Reaes, regulado como se fossem vendidas a particulares, e satisfazendo-se à boca do cofre por despacho do sobredito Superintendente, e com a legalidade estabelecida a respeito das despezas da minha Real Fazenda, os ordenados dos empregados na administração e as mais despezas do costeamento do mesmo prédio ; ficando a cargo do Superintendente não somente a execucão das instrucções provisionaes que com este meu Real Decreto baixam, assignadas pelo Presidente do meu Real Erario, mas o fazer subir todos os annos à minha real presença, pelo Presidente do meu Real Erario, um balanço de toda a receita e despeza annual do cofre da administração, com o inventario dos effeitos que ficarem em ser, acompanhado de uma exposição de todos os trabalhos e melhoramentos que se houver feito e conseguido em objectos de agricultura, construcção de edificios, e ramos de industría estabelecidos comparando-se sempre o estado actual da fazenda de Santa Cruz, e a sua despeza e rendimento annual, com o que tinha antecedentemente, para o que serão remettidos pela, estação competente à nova administração todos os titulos, mappas, plantas, representacões e planos feitos sobre a dita fazenda, escripturas dos arrendamentos das terras que lhe pertencem, escriptura da venda dos dous engenhos do Tagoahy e Piauhy, com a demarcação do terreno que se lhes annexou, certidão do liquido producto do seu rendimento em cada um dos seis mais próximos annos preteritos, e geralmente todas as contas e documentos relativos à passada administração. D. Fernando José de Portugal, do Conselho de Estado, Presidente do Real Erario, o tenha assim entendido, e o faça executar com os despachos necessarios, sem embargo de quaesquer Leis, Regimentos ou disposições em contrario.
Palacio do Rio de Janeiro em 20 de Setembro de 1808.
Com a rubrica do Principe Regente Nosso Senhor.
Este texto não substitui o publicado na CLBR, de 1808
Instrucções provisorias para a administração da Fazenda de Santa Cruz.
DO SUPERINTENDENTE
1º Ao Superintendente da Fazenda de Santa Cruz serão subordinadas todas as pessoas empregadas na administração e trabalhos da dita, fazenda, de qualquer ordem ou condição que seja.
2º O Superintendente regulará os trabalhos de agricultura e de industria, como melhor lhe parecer, e de acordo com os Administradores e empregados, cada um no ramo que lhe for prívativamente incumbido, prevalecendo no caso de duvida a deliberação do Superintendente, o qual deverá participar a Sua Alteza Real, pelo Presidente do Real Erario, esta sua deliberação, bem como todos os estabelecimentos novos que julgar convenientes, e a bem da Real Fazenda, para que Sua Alteza Real decida como lhe parecer.
3º Poderá mandar vender, quando, e como julgar mais conveniente, os generos de agricultura, industrla, madeiras, gado vaccum e cavallar, recolhendo o seu producto ao cofre da administração.
4º De todos os generos que forem remettidos para a Real Casa, ou que forem recebidos em qualquer das Estações Reaes, pedirá o pagamento ao Real Erario, pelo preço que taes generos teriam, sendo vendidos a particulares, fazendo recolher ao cofre da administração o dito pagamento.
5º 0 Mandará pagar por despacho, á boca do cofre, todas as despezas de ordenados, e de custeio da fazenda, com as legalidades estabelecidas nas despezas da Real Corôa.
6º Mandará proceder a um inventario de todos os escravos de um e outro sexo, com declaração dos seus nomes, sexo, officios, estado e idades, de um a cinco, de cinco a dez, de dez a quinze annos, e assim por diante, de maneira que conste com exacção o numero total dos escravos de que toma conta a administração.
7º Estabelecerá, ouvido o 1º administrador, o melhor methodo que lhe parecer conveniente ao tratamento, disciplina, e policia dos escravos, afim de que se consiga a sua conservação e augmento, promovendo-se os casamentos, e afim de que se possa tirar do trabalho dos mesmos escravos o maior partido possivel.
8º Mandará fazer mappas diarios em que se vejam os destinos de todos os escravos, e a sua occupação, declarando-se nelles o numero dos promptos, o serviço em que foram occupados, o numero dos doentes, dos mortos, dos presos, e todas as mais particularidades que julgar convenientes, por um methodo analogo ao que se pratica nos Regimentos da tropa, e tantas quantas forem as divisões dos trabalhos que estabecer na Fazenda de Santa Cruz, assignando estes mappas os chefes de cada uma das repartições, que serão obrigados a apresenta-los ao Superintendente no fim de cada semana.
9º Mandará proceder a um inventario de todo o gado vaccum e cavallar. para que se possa depois conhecer o augmento ou diminuição que tiver: o mesmo se fará a respeito de quaesquer outras criações ora existentes.
10. Mandará tomar conta, por ínventnrio de todos os utensilios, machinas, trastes e geralmente de tudo que ora pertencer á Fazenda de Santa Cruz.
11. Mandará proceder logo á limpeza e abertura das vallas, quantas sejam necessarias á conservação dos pastos, que se devem ter sempre o melhor estado para sustento e augmento das criações, que convém ter em pastos separados, segundo a sua qualidade, idade e destino.
12. Mandara proceder ao corte de toda a madeira que for necessaria, não somente ao reparo e conservação dos uctuaes edifícios e offícinas, aas para a construccão dos novos que forem indispensaveís, e dos que Sua Alteza Real houver de mandar fazer.
13. Dará annualmente conta a Sua Alteza Real, pelo Presídente do Real Erario, do estado do cofre da admlnistração, acompanhando o balanço de receita e despeza, uma memoria ou exposição de todos os melhoramentos que no decurso do anno se obtiveram, tanto nos objectos de cultura já estabelecida e nas que de novo se introduzirem, como nos objectos de índustria, com tabellas em que se veja claramente qual foi a producção de toda a especie em que houve naquelle anno, e qual o rendimento liquido comparado com o do anno antecedente.
14. Poderá o Superintendente procurar todo o dinheiro que necessitar para as despezas correntes, a cinco por cento ou a meio por cento ao mez, quando faltarem fundos no cofre da administração, pagando-se successívamente o juro e capital logo que forem entrando os rendimentos da fazenda, dando no fim do anno uma conta particular do que a este respeito tiver feito, juntamente com os balmços.
15. Deverá apresentar todos os annos um mappa da escravatura com declaração dos nascimentos, casamentos e mortes que houveram, comparado com o do anno antecedente.
16. Deverá apresentar de tres em tres annos um mappa de tada a criação de gado vaccum e cavallar, para que se conheça o progresso ou diminuição que houver.
17. Todas estas contas e relações deverão ser assígnadas pelo Superintendente, pelos Administradores, Almoxarife, e pelo Escrivão da receita e despeza da administração.
DO PRIMEIRO ADMINISTRADOR
1º Receberá o Primeiro Administrador, além do seu ordenado de 800$000, uma ração de farinha, carne fresca, legumes; dous escravos e um cavallo para o seu serviço.
2º Terá a seu cargo a administração da Fazenda de Santa Cruz, debaixo da ínspecção do Superintendente, a quem deverá sempre propor tudo quanto julgar conveniente aos interesses da mesma, não somente a respeito das actuaes culturas, mas das novas, que se emprehenderem pelos methodos e praticas da bem entendida agricultura, que tanto floresce em Inglaterra, ja pela introducção dos instrumentos mais apropriados, já pela alternação das culturas e conveniente adubo e preparação da terra.
3º Será igualmente encarregado de todos os objectos de industría que for possivel e conveniente estabelecer; tendo particular cuidado sobre a manufactura de manteiga e queijos.
4º Deverá dar particular attenção ao augmento do gado vaccum, e ao melhoramento da sua raça, para que haja o maior numero possivel de vaccas mansas, e de boa qualidade para se poder fazer manteiga e queijos em abundancia, estabelecendo a divisão dos pastos, sem a qual nada se pode conseguir neste interessantissimo ramo de índustria.
5º Dará semanalmente conta ao Superintendente do tudo o que lhe for incumbido, apresentando um diario em forma de tabella, em que se especifiquem os trabalhos que se fizeram na semana, o numero de praças que teve debaixo da sua direcção, e os productos que houveram.
6º No fim de cada anno fará uma exposição de tudo o que fez a bem da sobredita fazenda, comparando o seu estado, com aquelle em que a recebeu; cuja exposição, assignada pelo Superintendente, subirá com os balanços da receita e despeza à presença de Sua Alteza Real, pela repartição do Presidente do Real Erario.
DO SEGUNDO ADministrador
1º O Thesoureiro e Segundo Administrador receberá, além do seu ordenado annual de 400$000, uma ração de farinha, carne fresca, legumes; e um cavallo para o seu serviço.
2º Deverá ajudar em tudo ao Primeiro Administrador com subordinação ao Superintendente.
3º Receberá no cofre da administração todo o dinheiro que a elle concorrer, e fará á bocca do mesmo os pagamentos que lhe forem ordenados por despacho do Superintendente, e com as legalidades estabelecidas nas despezas da Real Fazenda, fazendo-se de tudo os competentes assentos no livro mestre, diarios e auxiliares que deverão sempre estar em dia.
DO ALMOXARIFE DOS PAÇOS E DIRECTOR DAS MANADAS DE CAVALLOS, E EGUAS E BOIS DE SERVIÇO
1º Receberá o Almoxarife dos Paços, Director das manadas de cavallos, eguas e bois de serviço, além do seu ordenado annual de 400$000, uma ração de farinha, carne fresca, legumes; e um cavallo para o seu serviço.
2º Deverá ter em boa arrecadação toda a mobilia do Paço, cuidará na sua conservação e reparo e em toda a nova obra que se fizer, sendo em tudo subordinado ao Superintendente.
3º Deverá ter particular cuidado no melhoramento e conservação das pastagens dos gados, na limpeza e abertura das vallas, no reparo e na factura das pontes, estradas e caminhos.
4º Conservará em pastos separados as differentes criações que lhe são incumbidas, cuidando muito no melhoramento da raça.
5º Dará semanalmente conta ao Superintendente de tudo o que lhe for incumbido, apresentando um diario em forma de tabella, em que se especifiquem os trabalhos que se fizeram, o numero de praças que teve a sua disposição e os productos que houveram.
6º No fim de cada anno fará uma exposição circumstanciada de tudo o que fez a bem da fazenda nos ramos que lhe foram confiados, comparando o seu estado com aquelle em que os recebeu; cuja exposicâo, assignada pelo Superintendente, subírá á presença de Sua Alteza Real com os balanços da receita e despeza pela repartição do Presidente do Real Erario.
DO PRIMEIRO ESCRIPTURARIO
1º O Primeiro Escripturarío servirá de Escrivão da administração da Fazenda de Santa Cruz o terá a seu cargo toda a escripturação da receita e despeza do Thesoureiro e Segundo Administrador, bem como a do Almoxarife em livros separados que deverá ter sempre em dia, assim como o diario e livros auxiliares, quantos forem necessarios, para que se conserve na escripturação a maior clareza e exacção
2º Terá igualmente a seu cargo a escripturacão em livro separado de todas as transacções que se fizerem na dita fazenda, e as contas correntes de todos os rendeiros, ou devedores por qualquer titulo afim de se promover a cobrança do que se dever à Fazenda de Santa Cruz.
3º Dará mensalmente ao Superintendente um balanço do cofre da administração, e no fim do anno um balanço de toda a receita e despeza que tiver tido o Thesoureiro no dito anno, comparada com a do anno antecedente, e acompanhado dos documentos que legalisarem a despeza; cujo balanço annual, assignado pelo dito Escrivão, pelo Thesouroiro e pelo Superintendente deverá subir à presença de Sua Alteza Real pelo Presidente do Real Erario.
DO SEGUNDO ESCRIPTURARlO
1º O Segundo Escripturario fará as vezes do primeiro em todos os seus impedimentos, e o ajudará na escrlpturação do diario, livros auxiliares e inventario do cartorio da administração.
2º Será encarregado do registro de todos os diplomas regios e de todas as resoluções e despachos do Superintendente, bem como do arranjo e factura dos mappas, ou diarios que semanalmente devem dar ao Superintendente o Primeiro Administrador e Almoxarife, e de todos os inventarios e mappas que forem necessários.
3.° Assistirá à distribuição dos escravos quando sahirem para os differentes trabalhos, fazendo logo os devidos assentos e lembranças indis pensaveis à organização do diario.
4º Será subordinado, bem como o Primeiro Escripturario, ao Superintendente.
Palacio do Rio de Janeiro em 20 de Setembro de 1808. --- D. Fernando Jose de Portugal.
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