Presidência da República |
EM n° 00022/2023 MF
Brasília, 14 de Fevereiro de 2023.
Senhor Presidente da República,
Submeto a sua apreciação proposta de Medida Provisória que tem por finalidade alterar o Decreto-Lei nº 1.455, de 7 de abril de 1976, a Medida Provisória nº 2.158-35, de 24 de agosto de 2001, e a Lei nº 10.833, de 29 de dezembro de 2003, para dispor sobre a aplicação e o julgamento da pena de perdimento de mercadoria, veículo e moeda.
O Processo de Aplicação da Pena de Perdimento de Mercadoria e de Veículo encontra-se atualmente regido pelo art. 27 do Decreto-Lei nº 1.455, de 7 de abril de 1976, enquanto o Processo de Aplicação da Pena de Perdimento de Moeda encontra-se disciplinado pelo art. 89 da Medida Provisória nº 2.158-35, de 24 de agosto de 2001.
Trata-se, por suas peculiaridades, de rito processual específico, que não segue o trâmite do Decreto nº 70.235, de 6 de março de 1972, que disciplina o Processo Administrativo Fiscal, tampouco da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, que regula o processo administrativo do âmbito da Administração Pública Federal.
A peça inicial é o auto de infração acompanhado do termo de apreensão e, se for o caso, do termo de guarda fiscal. Uma vez realizada a intimação, a não apresentação da impugnação no prazo de vinte dias, contados da ciência, implica revelia do autuado. Se apresentada a impugnação, a autoridade preparadora remeterá o processo a julgamento, que atualmente é realizado em instância única, o que significa dizer que a aplicação da pena de perdimento pela autoridade competente é, atualmente, uma decisão definitiva na esfera administrativa.
Ocorre que o Brasil é signatário do Acordo sobre a Facilitação do Comércio (AFC) da Organização Mundial do Comércio (OMC), promulgado pelo Decreto nº 9.326, de 3 de abril de 2018, e da Convenção de Quioto Revisada (CQR) da Organização Mundial de Aduanas (OMA), promulgada pelo Decreto nº 10.276, de 13 de março de 2020.
O AFC/OMC, já vigente e aplicável no Brasil, em seu Artigo 4.1, prevê a possibilidade de “recurso administrativo a uma autoridade administrativa superior ou independente da autoridade ou repartição que tenha emitido a decisão”, como alternativa ou complemento a uma revisão judicial da decisão. A norma 10.5 do Anexo Geral da CQR/OMA é mais enfática, assegurando o acesso recursal administrativo a uma autoridade independente da Aduana: “Quando um recurso interposto perante as Administrações Aduaneiras seja indeferido, o requerente deverá ter um direito de recurso para uma autoridade independente da administração aduaneira”.
A CQR/OMA, apesar de já estar em vigor, permitiu um prazo, no art. 13 de seu Corpo, para que os membros da OMA que a ratificaram adaptem suas legislações às normas do tratado. E, para o Brasil, tal prazo esgotou-se em 5 de dezembro de 2022. Assim, faz-se necessário estabelecer com urgência um rito processual administrativo próprio e simplificado, que garanta a dupla instância recursal, sem prejuízo à celeridade necessária para a o julgamento do litígio.
Com efeito, a rapidez da destinação das mercadorias é imprescindível para que a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil promova a saída de produtos apreendidos de centenas de depósitos, de sorte a permitir que não falte espaço físico para armazenar materiais provenientes de novas apreensões levadas a efeito pela fiscalização.
Importa considerar que a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Fazenda realiza a destinação de, aproximadamente, R$ 3 bilhões (três bilhões de reais) em mercadorias por ano, e que mais de 200 (duzentos) recintos são utilizados para armazenar e guardar as mercadorias apreendidas.
Nesse contexto, a definição do novo modelo para o julgamento da penalidade de perdimento deverá garantir que os processos de administração e destinação de mercadorias apreendidas não sejam impactados em sua eficácia, sob risco de prejudicar o próprio processo de perdimento e, por conseguinte, de obstar o exercício da atribuição constitucional de controle e a fiscalização sobre o comércio exterior.
As modificações sugeridas ao Decreto-Lei nº 1.455, de 1976, à Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001, e à Lei nº 10.833, de 2003, visam estabelecer a dupla instância recursal, atribuindo competência ao Ministro de Estado da Fazenda para regulamentar o rito administrativo de aplicação e as competências de julgamento da pena de perdimento de mercadoria, veículo e moeda.
Em todos esses processos, será garantida a dupla instância recursal, inovação processual de grande relevância para os operadores do comércio exterior, uma vez que amplia e fortalece o instituto do contraditório e da ampla defesa.
Em cumprimento ao disposto no art. 14 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000 - Lei de Responsabilidade Fiscal, cabe informar que a medida em tela não ocasiona renúncia de receitas tributárias.
Diante de todo o exposto, a presente proposta preenche o requisito constitucional de relevância, especialmente porque a sua edição promoverá a adequação da legislação interna a tratados internacionais dos quais o país é signatário e garantirá a dupla instância recursal no processo administrativo de aplicação da pena de perdimento de mercadoria, veículo e moeda.
Em relação ao requisito constitucional de urgência, há de se considerar o prazo de 5 de dezembro de 2022 para que o Brasil adaptasse sua legislação às normas da CQR/OMA. Neste caso, e reforçando a premência na adoção da medida proposta, é imperioso ressaltar que a inexistência de lei específica desde 5 de dezembro de 2022 que preveja rito processual próprio que garanta a dupla instância recursal acarreta, além de grande insegurança jurídica, prejuízos para os operadores de comércio exterior, tendo em vista a redução de seus direitos fundamentais (art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal).
Essas, Senhor Presidente, são as razões que justificam o encaminhamento da proposta de Medida Provisória que ora submeto a sua apreciação.
Respeitosamente,
Fernando Haddad
Ministro de Estado da Fazenda