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Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos

LEI Nº 7.499, DE 25 DE JUNHO DE 1986.

 

Aprova as diretrizes do Primeiro Plano de Desenvolvimento do Nordeste da Nova República.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte lei:

Art. 1º São aprovadas as diretrizes e prioridades estabelecidas no Primeiro Plano de Desenvolvimento do Nordeste, na forma do texto constante do anexo desta lei.

Art. 2º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 3º Revogam-se as disposições em contrário.

Brasília, 25 de junho de 1986; 165º da Independência e 98º da República.

JOSÉ SARNEY

Ronaldo Costa Couto

Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 26.6.1986

APRESENTAÇÃO

Este documento constitui uma Política de Desenvolvimento para o Nordeste, e com ele encerra-se a primeira etapa da elaboração do I Plano de Desenvolvimento do Nordeste na Nova República (I PDN-NR). É o resultado de um amplo debate regional onde foram expressos consensos e divergências que emergem da sociedade nordestina neste momento de transição para a democracia.

Para a efetivação desse debate - parte essencial do processo de construção coletiva de um projeto de desenvolvimento para a Região -, a SUDENE realizou seminários em todos os Estados de sua área de atuação, com a participação de representantes dos Governos e da sociedade civil, para discutir uma proposta de política. Posteriormente, no período de 11 a 13 de setembro, as delegações eleitas nesses seminários reuniram-se na SUDENE para discutir e consolidar as propostas dos Estados.

Essa participação da sociedade, através de representantes dos seus diversos segmentos, deverá exercer-se em todas as etapas do Plano. A discussão abrangerá cada programa e não se encerrará ao final de sua elaboração. Só assim será assegurado o atendimento das reivindicações e propostas da população ao longo das fases subseqüentes, de execução e avaliação.

A partir das tônicas da política nacional expressa no I Plano Nacional de Desenvolvimento, elaborado sob a coordenação da Secretaria de Planejamento da Presidência da República, e da consideração dos problemas e reivindicações do Nordeste, apresenta-se aqui a nova política de desenvolvimento regional.

Vale esclarecer que, nesta primeira etapa, foram incorporadas todas as contribuições dos seminários estaduais e do seminário regional, bem como as emendas propostas pelos membros do Conselho Deliberativo da SUDENE, que se referiam às linhas de política. Algumas propostas encaminhadas à SUDENE, por dizerem respeito a programas ou a instrumentos da política, foram catalogadas para consideração na etapa seguinte, quando se fará o detalhamento da programação do Plano.

Nessa ocasião, além da manutenção do processo de planejamento participativo, é imprescindível privilegiar uma estreita articulação com os Ministérios setoriais, objetivando consolidar a política do Governo Federal na Região. A articulação dos Ministérios setoriais com a SUDENE será fundamental para que se afirme a amplitude do Plano, conduzindo à integração das ações destinadas ao desenvolvimento do Nordeste. Neste sentido, a regionalização dos programas desses Ministérios impõe-se como essencial, a fim de que se fortaleça a atuação do Governo Federal no Nordeste.

Completada a sua elaboração, o I PDN-NR será apreciado pelo Congresso Nacional, no início da Legislatura de 1986.

José Reinaldo Carneiro Tavares

Superintendente da SUDENE

1. OS NOVOS RUMOS DA POLÍTICA REGIONAL

A política do I Plano de Desenvolvimento do Nordeste, na Nova República, inscreve-se no contexto dos grandes objetivos do Plano Nacional de Desenvolvimento. Dessa forma, recupera, no nível do Nordeste, as tônicas da proposta nacional, ao mesmo tempo em que procura atender às demandas da sociedade regional pela Reforma Agrária - com ênfase na mudança do padrão de propriedade da terra e na produção de alimentos -, pela retomada do crescimento econômico e por um amplo e decidido programa social onde o emprego, a distribuição da renda e o aumento da oferta de serviços sociais, constituem objetivos fundamentais da política governamental.

A proposta do Nordeste, além disso, amplia seus passos na direção de objetivos mais ambiciosos, ao defender, para esta Região, uma maior participação nos resultados do crescimento programado para a indústria nacional. Este é um propósito mais que justo, dada a extrema dificuldade de criar empregos produtivos em uma região que abriga 30% da população nacional, mas participa com apenas 8% da produção industrial do País. Por isso, impõe-se um ambicioso programa de investimentos nas áreas urbanas e rurais, de modo a dinamizar a atividade industrial, com aumento de eficiência e produtividade, buscando-se a indispensável integração entre seus diversos ramos e com os demais setores produtivos, especialmente o comércio, os serviços e a agropecuária.

Esse processo de expansão econômica deverá concretizar-se em um novo padrão, ditado pela lição da experiência dos últimos anos. Dessa forma, o novo estilo de crescimento deverá basear-se em uma estrutura industrial e de serviços que, além de integrada dentro e fora do Nordeste, terá que se consolidar e sobretudo, trazer para a Região efeitos significativos sobre o emprego e a renda. Da mesma forma, profundas mudanças deverão ser levadas a efeito na agropecuária, através de alterações nas relações de produção, do aumento de produtividade e do aperfeiçoamento da base técnica, com o propósito final de melhorar significativamente a vida das populações rurais.

A nova política de desenvolvimento do Nordeste é marcada por uma forte tônica no social, desde o planejamento da própria base econômica. A dimensão social, que deverá nortear todo o Plano, implica passar a considerar, predominantemente, os grupos sociais excluídos das decisões e dos benefícios do recente processo de desenvolvimento. Neste sentido, deverão, também, ser mobilizados esforços para assegurar ao cidadão nordestino, no mínimo, o seu direito inequívoco ao trabalho produtivo e aos serviços sociais básicos, condição indispensável ao pleno exercício da cidadania.

Assim, parte o Estado para resgatar o seu compromisso com a sociedade nordestina, através, nesse primeiro momento, da iniciativa da SUDENE de retomar a sistemática de elaboração de um Plano de Desenvolvimento para a Região, em íntima consonância com as diretrizes nacionais e com as aspirações do Nordeste.

A SUDENE procura, dessa forma, recuperar o planejamento de médio e longo prazos, a fim de definir o que se deseja atingir e para onde se pretende orientar o desenvolvimento da Região, rejeitando consumir-se no imediatismo que caracterizou a ação governamental nos últimos anos. Neste sentido busca, juntamente com a população regional, os caminhos para uma sociedade mais justa no Nordeste.

É essa construção coletiva que surge como a outra nova e fundamental característica do I Plano de Desenvolvimento do Nordeste, na Nova República. Desde o seu processo de elaboração, já iniciado, com o debate amplo e aberto, e que continuará a se exercer na execução da política, começa a se formar uma vontade coletiva em torno das mudanças essenciais requeridas para a Região. Essa vontade coletiva não é um ente abstrato, mas expressa-se nas reivindicações da maioria dos nordestinos, que se aliam para construir junto ao Estado, canais institucionais por onde devem passar, livremente, suas diversas demandas.

Nesse processo começa a SUDENE a redefinir e assumir o seu real papel de instituição democratizada, para que o planejamento, em um novo estilo, passe a se explicitar como uma forma moderna e civilizada de mediar os conflitos e as demandas sociais.

Trata-se, fundamentalmente, de introduzir e manter a prática de incorporação sistemática dos interesses dos diversos segmentos sociais na vida cotidiana das instituições. E, ainda, de assegurar aos cidadãos o direito à informação e ao controle da destinação dos recursos públicos alocados no Nordeste.

Nesse sentido, é fundamental que se resgate o conceito de Serviço Público, pelo qual o Estado deverá assumir uma nova postura visando assegurar a concretização das políticas governamentais, rejeitando o caráter empresarial que caracterizou a sua ação social nos últimos anos.

O reconhecimento da importância dos objetivos deste Plano, quanto ao seu conteúdo e quanto ao processo de elaboração e execução, significa, em última instância, a opção política pelo social e a esperança em um futuro a ser construído com base nos interesses e na vontade da maioria da sociedade nordestina, em estreita articulação com um novo Estado, mais aberto e democrático.

2. O QUADRO GERAL DOS PROBLEMAS NORDESTINOS

Dotado de expressivo potencial humano e econômico, o Nordeste tem, no entanto, como marca herdada do processo de formação sócio-econômica regional, a pobreza absoluta da maioria da sua população. Essa situação foi profundamente agravada, nas últimas décadas, em razão do estilo de crescimento econômico adotado no País e na Região e da exclusão política das classes populares. Desse modo, uma política de desenvolvimento para o Nordeste deve tratar os problemas inscritos nos quadros político, econômico e social.

2.1 - A exclusão política da maioria da população

O Setor Público desempenhou um papel muito importante nas transformações ocorridas nas duas últimas décadas no Nordeste. Mesmo assim, os resultados, ainda quando positivo, nos termos estritos do desempenho global da economia, ficaram longe das pretensões originais, tanto no campo como na cidade, onde os problemas sociais assumem dimensões graves e inquietantes. A forma de atuação do Estado, marcada pelo autoritarismo, e desconsiderando as necessidades e reivindicações da maioria da população, privilegiou as classes dominantes da sociedade que, no final, foram as grandes beneficiarias dos resultados das políticas adotadas.

Nas últimas décadas, a forma de atuação do Estado brasileiro, a promover a acumulação privada de capital, estimulou a concentração da renda. Muito generoso no estímulo ao enriquecimento das oligarquias e empresários nacionais e estrangeiros, esse Estado foi, no Nordeste, extremamente parcimonioso na implantação efetiva de programas sociais voltados para a melhoria das condições de vida da maioria dos nordestinos. Para estes, a prodigalidade, só no nível do discurso, terminou, pelos próprios fatos, perdendo a própria credibilidade. Os recursos, ou eram insuficientes e alocados irregularmente, ou então eram aplicados, empresarialmente, por entidades públicas que exigiam o pleno e imediato retorno dos investimentos, constituindo-se, dessa forma, um grande negócio.

Em nome da eficiência e da rapidez na solução dos problemas, a execução dos programas sociais foi transformada num meio de transferência de recursos em favor de grupos privilegiados. Além disso, foi um Estado que utilizou seu poder no esmagamento das organizações populares e no estabelecimento de políticas salariais aviltantes para a força de trabalho.

A lição mais importante dessa experiência reside, precisamente no reconhecimento de que o importante não é o discurso, nem é tanto o próprio conteúdo substantivo das propostas governamentais. O importante são os canais institucionais. Distorcidos e originados de cima, por eles esse conteúdo se desvia sistematicamente de seus principais destinatários de direito - a maioria da população trabalhadora. Não existem canais criados a partir da base da sociedade, por onde a população possa exprimir suas necessidades, suas reivindicações e suas denúncias.

Por outro lado, a centralização político-administrativa ocorrida no País esvaziou politicamente a Região, levando a que decisões acerca de pontos fundamentais da política de desenvolvimento sócio-econômico passassem a ser tomadas fora do seu âmbito. Perdeu o Nordeste sua difícil conquista dos anos sessenta: a de contar com um Plano-Diretor como instrumento normativo e norteador dos investimentos públicos e privados, condizentes com as necessidades regionais. Isso resultou num retorno ao tratamento segmentado dos problemas e à negociação compartimentada dos recursos, o que somente beneficiou os setores mais organizados e as instituições com maior força política.

2.2. O estilo do crescimento econômico

Nas duas últimas décadas (1960-80), foi expressivo o desempenho da economia do Nordeste, cujo Produto Interno Bruto regional cresceu à taxa média anual de 7,1%, em conseqüência dos elevados índices alcançados pelos setores industrial (com taxa média anual de 8,4%) e dos serviços (taxa média anual de 8,7%). A partir dos anos oitenta, a economia regional vem experimentando, com intensidade, a recessão que se instalou no âmbito do País.

O processo de urbanização acelerou-se, em razão da atração exercida pelos investimentos nas cidades e, sobretudo, da permanência das causas expulsivas da população do meio rural, onde se manteve o atraso relativo do setor agropecuário, cuja expansão média anual ficou em cerca de 4% entre 1960 e 1980.

Na realidade, mantém-se muito baixa a produtividade do trabalho na agropecuária: 43% da população brasileira dedicada às atividades rurais residem no Nordeste, que participa com apenas 20% da produção agropecuária nacional. Daí a limitação dos excedentes econômicos rurais. A produção agrícola alimentar, excluída dos processos de modernização, é relegada às unidades familiares que, basicamente, produzem para autoconsumo e são as mais duramente atingidas pelas crises, especialmente pelas secas.

Vale destacar, ainda, que as mudanças nas áreas rurais foram marcadas pelo avanço e pela modernização de algumas atividades como a canavieira, a cacaueira e a pecuária, pela nova presença de empresas capitalistas na antiga fronteira agrícola (processo marcado, em muitos casos, pelo caráter especulativo) e especialmente pelo desaparecimento de áreas antes dedicadas à produção de alimentos. O êxodo rural foi a resposta a muitas dessas mudanças.

De outra parte, é preciso destacar que, não obstante as elevadas taxas de crescimento industrial, continua bastante reduzida a participação do Nordeste na produção industrial brasileira. Nesse particular, a Região representa apenas 8,2% do valor da produção nacional e emprega 10% do pessoal ocupado no parque manufatureiro do País. Já as Regiões Sul e Sudeste empregavam 85% do pessoal, é respondiam por 89% do valor da produção em 1980.

Registra-se, porém, que vêm ocorrendo mudanças qualitativas importantes no perfil da indústria de transformação do Nordeste: em 1960, as indústrias tradicionais representavam 70,1% do valor da transformação industrial, cabendo às dinâmicas 29,9%, e em 1980, as indústrias dinâmicas atingiam 61,1% da produção industrial nordestina, enquanto as tradicionais representavam 38,9% do total.

Constata-se, ainda, na composição desses grandes segmentos, que poucos são os gêneros industriais em que o seu valor de produção atinge mais de 10,0% da população nacional. No âmbito das indústrias dinâmicas, destacam-se os ramos de minerais não metálicos, com 11,3%, e químico, com 14,0%, e, no das tradicionais - bebidas, têxtil e alimentar -, com, respectivamente, 14,1, 14,5 e 10,9%.

Outros ramos dinâmicos, como de material de transporte, mecânico e de material elétrico, estão reduzidos à inexpressiva participação de 0,5, 3,0 e 3,1%, respectivamente, do valor da produção.

Por outro lado, na impossibilidade de estabelecer-se um parque industrial satisfatoriamente auto-sustentado e mais interligado, gerou-se uma condição de grande dependência das unidades fabris nordestinas em relação a outras regiões do País e ao exterior, no que diz respeito à aquisição de máquinas, aparelhos, equipamentos, acessórios e insumos necessários à manutenção dos fluxos produtivos, afora a dependência de mercados consumidores. Até 1980, as empresas incentivadas pela SUDENE adquiriram, em outras regiões, cerca de 48% do valor total de seus insumos; enquanto isso, a importação de máquinas e equipamentos representava 95% do total desses bens adquiridos. Em termos de dependência dos mercados consumidores, registra-se, no período 1960/78, a comercialização de 43% de sua produção no mercado de outras regiões do País, 15 no comércio exterior e 42% no mercado interno regional.

Outro aspecto a registrar é a posição que ocuparam a pequena e a média empresas industriais no aumento da oferta de emprego e na produção regional. No entanto, a sua crescente descapitalização, aliada a outras deficiências de ordem administrativa e operacional vem-se constituindo fator limitante da sua capacidade produtiva, com reflexos diretos sobre a absorção de mão-de-obra.

Além disso, no que se refere à maioria dos segmentos agroindustriais, a evolução da capacidade instalada não induziu a uma resposta por parte dos supridores tradicionais de matérias-primas.

O quadro característico da indústria nordestina espelha, em síntese, o novo padrão da economia brasileira. É que a progressiva integração da economia nacional, acelerando-se, particularmente, nas quatro últimas décadas e produzindo a redivisão territorial das funções regionais, vem destruindo, no Nordeste, uma série de atividades produtoras, incapazes de resistir às concorrentes, sediadas no centro hegemônico do País, sem que se tenham criado, no mesmo ritmo, atividade substitutivas. As emergentes, por sua vez, estão marcadas pelo caráter monopolista e excludente, o que vem resultando em perdas de oportunidades de trabalho, não compensadas por novos empreendimentos destinados à expansão da economia, e acentuando o desemprego, com o conseqüente agravamento das condições de vida em geral e, sobretudo, da pobreza.

As atividades terciárias ampliaram-se, diversificaram-se, modernizaram-se, e, em muitos casos, desregionalizaram-se, acompanhando as tendências gerais da economia nacional. O crescimento das atividades financeiras foi o mais notável, mas verificou-se também uma marcante ampliação dos demais subsetores do terciário nordestino.

Os investimentos realizados na ampliação da infra-estrutura de transportes, comunicações e energia foram importantes, gerando potencialidades para o desenvolvimento da economia regional. No entanto, a retração recente dos gastos públicos vem, progressivamente, deteriorando essa infra-estrutura econômica, o que poderá comprometer o crescimento futuro da base produtiva do Nordeste.

Por outro lado, o estilo da expansão urbano-industrial ocorrida na Região, nos anos recentes, fez com que a grande dimensão do setor terciário resultasse muito mais de uma preponderância de atividades onde dominam o subemprego e os baixos níveis de produtividade do que de uma real incorporação produtiva de mão-de-obra. No mercado de trabalho urbano, a heterogeneidade ampliou-se, fazendo conviver segmentos modernos com um enorme conjunto de atividades informais.

No processo de integração inter-regional, cresceram as classes médias urbanas do Nordeste e fortaleceram-se as oligarquias rurais, em parte modernizadas. Entretanto, as classes dominantes regionais perderam hegemonia, porquanto tiveram que partilhar poder com novos grupos econômicos extra-regionais.

2.3 - A grande dívida social

A problemática social do Nordeste apresenta duas características mercantes. A primeira refere-se à desvantajosa situação que desfruta no contexto nacional, revelada por qualquer indicador que se tome.

Observe-se a esse respeito que, em 1980, apesar de viverem na Região 30% da população do Brasil, a maioria dos índices nordestinos apresenta um hiato de mais de 50% com relação aos das demais regiões, porquanto se encontram no Nordeste:

- Mais da metade (51%) dos analfabetos brasileiros com mais de 10 anos;

- quase metade das habitações subnormais do Brasil;

- quase 2/3 da população brasileira com déficit calórico superior a 200 calorias/dia;

- quase metade dos trabalhadores brasileiros com rendimento igual ou inferior a um salário mínimo;

- quase metade dos trabalhadores brasileiros com rendimento igual ou inferior a meio salário mínimo.

Sabe-se ainda que, no ano de 1980, a esperança média de vida do nordestino (52 anos) era inferior em 10 anos à média do habitante do Sudeste.

É, portanto, nesse espaço do território brasileiro que a dívida social, acumulada em períodos de crise ou de crescimento, assume maior dimensão no âmbito do País, configurando como que uma fratura social e devendo, por isso, ser encarada como um desafio nacional.

A segunda grave característica social do Nordeste é o problema da pobreza absoluta, através da qual se revela um outro tipo de fratura social: uma alarmante desigualdade no próprio interior da sociedade nordestina. Isso significa que, na Região, as elites se contrapõem, de forma ostensiva, aos favelados urbanos e à enorme massa de pequenos produtores rurais em situação de miséria. Neste sentido, em 1980, no Nordeste, 76% da população economicamente ativa percebiam renda média igual ou inferior a dois salários mínimos, sendo que 64% recebiam até um salário mínimo. A sub-remuneração generalizada atinge, inclusive, os ramos mais dinâmicos dos setores secundário e terciário, onde mais da metade dos trabalhadores recebiam menos de dois salários mínimos.

O desemprego, hoje, na Região, atinge mais de 500 mil pessoas, das quais 2/3 se encontram nas áreas metropolitanas, o que, aliado ao contingente de subempregados, totaliza cerca de 5 milhões, conformando uma situação crítica que tenderá a se agravar caso não se resolvam os problemas que a cada dia se acumulam nas cidades.

Significativa parcela desses problemas tem origem no campo, onde uma série de fatores contribui para a expulsão das populações rurais. Entre esses fatores, cabe destacar a extrema vulnerabilidade da produção agrícola (particularmente no semi-árido) e as transformações ligadas à modernização e ao surgimento de atividades menos empregadoras de mão-de-obra (pecuária, por exemplo). Por outro lado, embora responsáveis por 79% da colheita de alimentos básicos (feijão, milho, arroz e mandioca) e por mais da metade dos produtos de transformação industrial (com destaque para mamona, algodão, amendoim e fumo), os pequenos produtores pagam um alto custo social por essa produção, pois assumem todos os riscos inerentes à atividade agrícola e são desprotegidos social e economicamente, além de serem gravemente afetados por toda a problemática ligada à questão fundiária.

Esses processos reduzem, significativamente a capacidade de retenção da população no campo e expulsam, para os centros urbanos regionais e para outras áreas do País, grandes contingentes que a agropecuária não consegue absorver produtivamente.

De fato, estudos recentes revelam que, se na década de sessenta saíram do Nordeste cerca de 1,3 milhão de pessoas em direção a outras regiões, na década seguinte a emigração compreendeu cerca de 2 milhões de nordestinos. Além disto, segundo o Censo Demográfico, na última década saíram dos quadros rurais 4,3 milhões de pessoas, das quais cerca da metade foi absorvida pelo meio urbano nordestino.

O acelerado processo de modernização e os moldes em que este se vem configurando contribuem para a perda das referências culturais das populações, na medida em que têm provocado sua desarticulação sócio-econômica, restringindo-lhes as possibilidades de sobrevivência, particularmente no que se refere às suas camadas populares.

Os crescentes fluxos migratórios que superlotam as cidades, sem uma correspondente incorporação produtiva da força de trabalho, têm provocado, juntamente com a insuficiente base econômica da Região, um crescimento urbano artificial, com aumento da pobreza e da marginalidade. Nos últimos vinte anos, o segmento produtivo urbano foi responsável pela absorção de mais de 80% do aumento da população economicamente ativa, tornando, portanto, bastante claro o papel que a economia urbana vem desempenhando no mercado de trabalho regional. Mas é importante considerar que esse crescimento da ocupação urbana tem ocorrido, predominantemente, sob as formas de subutilização e sub-remuneração da força de trabalho, nas quais as atividades "informais" disseminadas em quase todos os ramos da indústria e dos serviços, assumem papel importante na sobrevivência da população, com todas as suas características que, em geral, conformam situações de extrema pobreza, ou melhor, de exclusão econômica, sócio-política e cultural.

Dentro desse grave quadro urbano, deve-se levar em conta que, pelas projeções do crescimento populacional, até o final do século, cerca de 17 milhões de pessoas se somarão à população nordestina, que, em 1980, era de 35 milhões de habitantes. Esse acréscimo, ao que tudo indica, deverá ser predominantemente dirigido para ás cidades.

Na problemática do emprego no Nordeste, é indispensável chamar atenção para o contexto das relações de trabalho, que explica, em grande parte, a generalizada situação de subemprego e baixos níveis de renda regionais. De fato, a existência de mão-de-obra abundante, aliada aos reduzidos níveis de organização dos trabalhadores e à ação repressiva do Estado, nas últimas décadas, criou condições para um maior poder de barganha dos empregadores.

Outros aspectos fundamentais referem-se às condições de trabalho vigentes, notadamente quanto aos métodos de controle exercidos sobre o trabalhador, à intensidade da jornada de trabalho, às características ambientais da unidade produtiva e à instabilidade e insegurança do emprego, bem como à rotatividade da mão-de-obra. A questão da instabilidade e da rotatividade é fundamental, pois apresenta sérias implicações na própria organização do trabalhador e no desenvolvimento de sua consciência de classe.

Os baixos níveis de renda da população, juntamente com a forma de atuação do Estado, têm conduzido a uma situação extremamente grave no que se refere às condições de vida da população.

O acesso à educação básica, por exemplo, embora seja um dever do Estado e um direito de todos, assegurado por lei, tem-se constituído inviável para a maioria da população. Se a questão se apresenta como um componente crítico da sociedade brasileira, no Nordeste o perfil educacional da população evidencia de forma mais grave que a democratização das oportunidades não se viabilizou, a despeito de sua reiterada prioridade nos discursos oficiais.

A análise da estrutura educacional da população nordestina em idade ativa (cerca de 24,5 milhões de pessoas), em 1980, aponta gue aproximadamente 50% não possuíam instrução, ou tinham menos de um ano de escolaridade; menos de 10% tinham cursado entre 5 e 8 anos de estudo (séries finais do 1º Grau) e somente 5,4% haviam atingido o 2º Grau. A universidade é um privilégio - apenas 1,7% nela consegue ingressar. Com respeito ao meio rural da Região, a situação assume proporções mais amplas, pois 66% de sua população de 10 anos e mais em 1980, eram analfabetos, elevando-se essa taxa para 70% no grupo etário de 15 a 19 anos.

Por outro lado, o nível de saúde da população nordestina expressa, em grande medida, os componentes estruturais da morbidade e da mortalidade, além de significar um elevado tributo pago pela população jovem, especialmente os menores de 1 ano. Nesse quadro, há um predomínio das chamadas doenças de massa, responsáveis pelo coeficiente de mortalidade infantil acima de 100 em cada 1.000 nascidos vivos, por elevada participação no obituário de menores de 5 anos e pelo agravo à saúde de expressivo contingente populacional de vastas áreas rurais.

O problema da moradia mostra-se extremamente grave, na medida em que, apesar da atuação do Sistema Financeiro da Habitação (SFH), o Nordeste permanece com um déficit de aproximadamente 2 milhões de domicílios. Constata-se, também, que o SFH dirigiu sua ação para o atendimento de faixas salariais cada vez mais altas, distanciando-se das faixas prioritárias de 1 a 3 salários mínimos. Além desse déficit e do nível de precariedade da maioria das habitações, é crescente o número de áreas de conflito de propriedade onde o direito à moradia é subordinado ao processo desenfreado de especulação financeira e fundiária. Como decorrência, as populações de baixa renda são cada vez mais afastadas dos seus locais de trabalho ou de origem, o que concorre para um crescente processo de periferização.

A questão do transporte coletivo, sobretudo nas áreas urbanas, configura-se crescentemente como um problema social, na medida em que os gastos da maioria da população com esse item pesam cada vez mais no orçamento familiar. Esse processo se agrava expressivamente, quando amplo contingente populacional é afastado para a periferia das cidades, aumentando a distância entre a residência e o local de trabalho.

Igualmente elevados são os déficits de atendimento às populações com serviços de saneamento, dada a forma como os Governos recentes conduziram seus programas, empresariando-os, adotando soluções similares para situações diferentes, minimizando o papel dos municípios e o envolvimento das comunidades. Ao final, os excluídos foram os pequenos centros urbanos e as periferias das grandes cidades.

São, portanto, bastante precárias as condições de sobrevivência de amplas parcelas da população nordestina, impondo-se, conseqüentemente, uma opção política pela resolução do problema social do Nordeste. Suas características de fragilidade econômica, miséria absoluta e estrutura sócio-econômica fortemente desigual fizeram com que os efeitos do modelo concentrador atingissem esta Região de modo mais dramático do que as demais áreas do País.

3. AS BASES NACIONAIS DE UMA NOVA POLÍTICA PARA O NORDESTE

A consideração do quadro geral dos problemas nordestinos induz à conclusão de que qualquer política de desenvolvimento para a Região não pode ser implementada sem a adoção, no nível nacional, dos pressupostos seguintes:

a) A questão nordestina deve ser prioridade nacional. A consolidação do processo democrático brasileiro supõe e exige que se enfrente a questão nordestina como uma das prioridades nacionais, pois a Região dispõe de potencial de recursos humanos, naturais, tecnológicos, organizacionais e políticos, estando, portanto, apta a contribuir para a superação dos grandes desafios nacionais. O desperdício desse expressivo potencial tem respondido, de um lado, pelo incremento da pobreza na Região e, de outro, pelo retardamento de conquistas sociais em outras regiões do País.

O grande bolsão de pobreza absoluta, que é a marca do Nordeste, não constitui apenas um problema regional, mesmo porque os efeitos de sua existência afetam outras áreas do Brasil. Nesse sentido, a questão nordestina tem de ser considerada como prioritária nas políticas, nos planos, nos programas nacionais. Uma nova política para o Nordeste deve se fundar nessa prioridade.

b) É indispensável a retomada do crescimento econômico do País com o redirecionamento do modelo de desenvolvimento nacional. A continuidade da recessão econômica no País inviabilizaria em grande parte uma nova política para o Nordeste. O corte dos gastos públicos, por exemplo, precisa ser realizado de forma a poupar a região economicamente mais frágil e socialmente mais pobre. A retomada do crescimento, embora não seja condição suficiente, é necessária para promover os objetivos do fortalecimento e transformação da economia do Nordeste e a realização de vultoso investimento nos setores voltados para o atendimento das necessidades sociais da Região. O crescimento concentrador e marginalizador das décadas passadas e seus resultados sociais impõem um redirecionamento substancial do modelo de desenvolvimento do País. É no contexto de um novo modelo que se podem inscrever novas propostas para o Nordeste.

c) A Questão Agrária deve ser assumida como prioridade nacional com ênfase no Nordeste. A estrutura fundiária, fortemente concentrada na Região, tem sido apontada como um dos seus problemas básicos. Ademais, historicamente, o Nordeste tem dependido de maneira crescente da oferta extra-regional de alimentos.

Portanto, se, para o País, o encaminhamento de um processo de Reforma Agrária e uma prioridade para a produção de alimentos estão sendo colocados como decisão política primordial para o delineamento de um novo padrão de desenvolvimento, para o Nordeste essas opções são ainda mais essenciais.

d) A democratização e a descentralização do aparelho do Estado são fundamentais para as transformações requeridos no Nordeste. Uma nova política para o Nordeste supõe uma substancial mudança no papel e nas funções do Estado e, especialmente, na sua forma concreta de atuação. Supõe igualmente o reaparelhamento da sua estrutura administrativa e a institucionalização de formas de integração do planejamento regional com o planejamento nacional.

No entanto, por mais bem intencionadas que sejam as propostas governamentais e mais eficiente e articulada que seja a máquina estatal, os resultados podem ser minimizados se não houver uma crescente democratização do Estado, o que envolve a existência, em todo os níveis, de foros de decisão, de que participem representantes dos mais diversos segmentos da sociedade. A política aqui sugerida pressupõe que a população beneficiaria da ação pública encontre canais de participação para acompanhar a elaboração, a negociação, a implementação e a avaliação dos programas que constarão do Plano regional. A transparência do Estado, tornando possível às mais diversas forças representativas da sociedade disputar espaço no seu interior, conhecendo e controlando a ação governamental, apresenta-se fundamental para a viabilização de uma nova política de desenvolvimento. Para tanto, é imprescindível o desenvolvimento de um processo educativo de organização da população, que resulte na sua instrumentalização para a conquista dessa transparência.

4. A POLÍTICA

A Política de Desenvolvimento para o Nordeste fundamenta-se, essencialmente, em uma nova postura onde a dimensão social é tomada como elemento norteador de toda ação. Introduzir a dimensão social nessa política significa que a responsabilidade do desenvolvimento social é de todos os setores e não apenas daqueles que compõem a chamada "área social do Governo."

Dessa forma, o propósito final da nova política é adotar um padrão de crescimento que privilegie a geração de empregos e a distribuição da renda. Paralelamente, propõe-se o aumento significativo da oferta dos serviços e equipamentos sociais, ao lado da defesa da identidade cultural da população nordestina, pelo respeito às suas características culturais, quando da indicação, criação ou implementação de programas e projetos para a Região.

Portanto, a dimensão social deverá constituir a própria razão de ser da Política, passando a permear a ação de todos os setores.

4.1 Objetivos gerais

Atendimento das necessidades básicas da população regional.

Dada a dimensão da pobreza absoluta no Nordeste, sua erradicação constitui um compromisso irrecusável de política. Isso implica propiciar, a toda a população, condições de satisfazer às suas necessidades elementares de sobrevivência, dentro de padrões de dignidade humana. O respeito à cultura regional é entendido como uma necessidade básica da população. Todas as linhas de política e programação devem estar orientadas expressamente para este objetivo, o que implica, especialmente, a ampliação e melhoria dos serviços públicos essenciais.

Ampliação das oportunidades de emprego e melhoria das condições de trabalho.

A expansão da economia não garantirá, por si, o incremento das oportunidades de ocupação produtiva da força de trabalho em nível suficiente para absorver o imenso contingente de subempregados e desempregados da Região. Daí a necessidade de buscar, explícita e diretamente, por todos os meios disponíveis, que os programas e projetos concretizadores da política adotada assegurem a criação do maior número possível de postos de trabalho efetivamente produtivos. Além disso, é fundamental melhorar as condições de trabalho das pessoas já ocupadas, com destaque para a segurança no emprego.

4.2 - Objetivos específicos

Transformação do mundo rural.

Visa-se elevar a produtividade do trabalho do enorme contingente de pessoas que vivem nas áreas rurais, ou nos pequenos centros urbanos do interior do Nordeste. A população e a diversidade dos sistemas agrários de uso de recursos precisam ser encarados no seu potencial produtivo. Democratizar a posse e o uso da terra deve ser uma opção política acompanhada de um grande esforço do Governo orientado para fortalecer os pequenos produtores do campo, organizados em unidades familiares, para torná-los aptos a assumir papel dinâmico no processo produtivo e suficientemente fortes para se organizar de forma associativa, ter acesso ao crédito oficial, comercializar seus excedentes e investir, absorvendo progresso técnico. A ampliação da produção de alimentos deve orientar todo esse esforço.

Dinamização, fortalecimento e integração espacial e setorial da economia regional.

Trata-se de condição necessária, embora não suficiente, para a ampliação dos índices de emprego e renda. Por isso, além de manter-se o ritmo de expansão dos investimentos e do Produto Interno Bruto, é preciso articular, mais estreitamente, todos os setores produtivos e disseminar, especialmente, as atividades econômicas no domínio da Região. Para isso, a adequação da infra-estrutura econômica é imprescindível. Por outro lado, importa evoluir no plano nacional, para uma integração com as demais regiões, que se caracterize por uma progressiva interdependência sócio-econômica e, portanto, por uma aproximação dos níveis de desenvolvimento alcançados nas áreas mais ricas do País. Nesse sentido deve continuar a merecer destaque a ampliação da base industrial do Nordeste para consolidar o esforço feito nas décadas recentes e ampliar a participação da Região no total da produção nacional. O crescimento da indústria deve objetivar o aumento da integração intra-setorial e sobretudo da sua integração com o resto da economia nordestina, para maximizar os efeitos diretos e indiretos sobre o emprego e a renda dentro da própria Região.

Desenvolvimento da pesquisa científica, tecnológica e sócio-econômica.

Para que se obtenha um novo padrão de crescimento, é fundamental a busca de novas soluções e oportunidades. A adoção de formulações alternativas para encaminhar respostas aos problemas da Região e a busca de padrões tecnológicos modernos ou adaptados às especificidades nordestinas são indispensáveis ao desenvolvimento regional. Por outro lado, é fundamental que se amplie e se aprofunde o conhecimento dos aspectos sociais, políticos e econômicos da realidade nordestina, com vistas a uma adequação progressiva da política às necessidades da Região.

Realização de mudanças político-institucionais.

Uma efetiva transformação do aparelho do Estado e uma maior organização da sociedade nordestina precisam ser realizadas para garantir a incorporação dos interesses dos diferentes segmentos sociais no sentido da generalização da cidadania.

4.3 - Linhas estratégicas

A transformação da realidade nordestina exige ações convergentes em diferentes planos, visando a utilizar o potencial de recursos humanos e econômicos do Nordeste. O Governo deve orientar seus esforços para atuar sobre os principais determinantes da pobreza generalizada, que são a dificuldade de acesso à terra, a insuficiência de emprego, a carência dos serviços sociais e a exclusão política da maioria da população regional.

São seis as linhas estratégicas propostas:

- transformação das estruturas rurais;

- reorientação do desenvolvimento urbano;

- consolidação e conservação da infra-estrutura econômica;

- ampliação e melhoria da oferta de serviços sociais;

- estímulo ao desenvolvimento da Ciência e da Tecnologia;

- democratização e descentralização do aparelho político-institucional.

4.3.1 - Transformação das estruturas rurais

No meio rural do Nordeste, deverão ser promovidas todas as oportunidades de produção e geração de renda, a partir do estímulo à silvicultura, ao extrativismo vegetal e mineral, à aqüicultura, aos pequenos negócios não agrícolas e, particularmente, à agroindústria, de modo a contribuir para tornar, as áreas rurais uma contrapartida significativa e estável ao desenvolvimento ora conduzido pelos centros e setores urbanos da Região. No entanto, dependendo das peculiaridades de cada sub-região, dar-se-á prioridade às atividades agrícolas e pecuárias, sobretudo para a ampliação da produção alimentar. Os esforços serão conduzidos perseguindo-se o desenvolvimento rural integrado e a interiorização do desenvolvimento urbano.

A - Reforma agrária

A fim de obter crescentes ganhos de produção e produtividade do trabalho e a melhoria dos padrões de vida do homem do campo, ter-se-á de assegurar-lhe o acesso à terra e à água, aos meios técnicos de produção, aos mercados de insumos e produtos e às formas de organização e associação, bem como ampliar e melhorar os serviços de apoio (crédito, pesquisa, assistência técnica, educação, saúde, saneamento e previdência e assistência social, entre outros). Conseqüentemente, é preciso fomentar a "urbanização rural" fortalecendo-se os pequenos núcleos urbanos, funcionalmente articulados com as atividades rurais.

Dar-se-á atenção prioritária às unidades produtoras familiares ou organizadas em forma associativa, inclusive cooperativa, para as quais serão criados programas e instrumentos específicos de estímulo. Os médios e grandes empreendimentos individuais ou organizados sob forma não cooperativa utilizarão os mecanismos convencionais do mercado, definindo-se, contudo, seus parâmetros de atuação, de modo a não inviabilizarem as ações de apoio às unidades produtoras familiares e associativas.

Essa orientação implica a necessidade de imediata e ampla Reforma Agrária, com a participação e o controle dos trabalhadores rurais e seus órgãos de classe.

O processo da Reforma Agrária, a ser implementado de acordo com o Plano Nacional de Reforma Agrária e o Estatuto da Terra, é condicionante do desenvolvimento regional e, portanto, de absoluta prioridade, porquanto compreende, além da distribuição de terras, o redirecionamento das diversas políticas agrícolas existentes, buscando sua melhor aplicabilidade, no sentido de viabilizar o desenvolvimento sócio-econômico do camponês e permitir-lhe exercer plenamente a sua cidadania.

Nesse sentido serão desestimuladas e coibidas todas as formas especulativas e predatórias do uso do solo e, ao contrário, será fomentada a agricultura típica de mercado e a agricultura semimercantil organizada. Será promovida a revisão dos incentivos fiscais e financeiros, bem como dos programas e projetos em curso, de modo a atenderem aos objetivos da Reforma Agrária e da política regional.

Todas as terras indígenas deverão ser demarcadas - com a retirada de posseiros - levando-se em consideração os estudos antropológicos existentes ou a serem realizados, ouvidas as próprias nações indígenas.

A execução da Reforma Agrária exige que se promova o reforço institucional e operacional do INCRA.

É indispensável a criação da Justiça Agrária, inclusive com poderes de supervisão sobre as atividades dos Cartórios de Imóveis, no que respeita, especificamente, às transcrições e averbações de títulos que tenham por objeto a propriedade imobiliária rural.

Os programas e projetos de colonização deverão ser complementares à Reforma Agrária, pelo que é necessária a revisão das atuais ações e políticas nesse domínio, incorporando-se a participação dos trabalhadores rurais em todas as fases do processo.

A pesquisa agropecuária orientar-se-á para a geração de técnicas e processos de produção que, atendendo aos condicionantes ecológicos, sócio-econômicos e culturais das unidades produtoras, elevem substancialmente seus níveis de produção e produtividade. Para contribuir com a ampliação das oportunidades de trabalho, a pesquisa será direcionada para a criação de nova tecnologia, a incorporação de terras ao processo produtivo e a redução dos impactos negativos das variações climáticas. Nesse domínio, a biotecnologia deverá merecer uma atenção especial. Com relação às pesquisas de culturas irrigadas, especial atenção deverá ser dada aos cultivos de milho, feijão, arroz, algodão e frutícolas. Considerando os altos níveis de perda de grãos por má conservação, privilegiar-se-á a pesquisa e a divulgação de tecnologias adequadas à solução desse problema.

As atividades de pesquisa devem ser orientadas no sentido de indicar alternativas viáveis, que atendam aos interesses da unidade produtora familiar como um todo, identificando sistemas de produção capazes de utilizar racional e integradamente os recursos naturais disponíveis. É imperiosa a criação de canais de comunicação dos agricultores com as instituições de pesquisa, objetivando o encaminhamento de demandas tecnológicas, o retorno em termos das soluções encontradas e, em geral, o intercâmbio de informações, de modo que os planos de pesquisa das entidades especializadas sejam resultantes de um trabalho integrado de pesquisadores, extensionistas e produtores rurais. Isso implica o fortalecimento e a reorientação das instituições de pesquisa agropecuária atuantes na Região.

Para que os resultados da pesquisa atinjam com eficácia o produtor, particularmente o pequeno, torna-se indispensável que os atuais canais de assistência técnica e extensão rural sejam ampliados e melhorados. Para tanto, deve ser estabelecida uma estreita e permanente comunicação entre o pesquisador e o extensionista e entre este e as lideranças dos produtores previamente treinados, de modo que elementos da própria comunidade operem como agentes de extensão.

Paralelamente, deverá ser perseguida a descentralização dos serviços de assistência ao agricultor, mediante a participação de suas organizações (sindicatos, cooperativas, associações, etc.) no processo de difusão da informação tecnológica e de natureza social.

A assistência técnica deverá atingir todos os produtores e trabalhadores rurais, dando-se ênfase, porém ao atendimento das necessidades dos pequenos agricultores, considerando os seus costumes e a experiência por eles acumulada e estimulando o aproveitamento de todos os recursos de que dispõe a própria unidade produtora rural. No caso dos pequenos agricultores, os custos da assistência técnica e extensão ficarão a cargo exclusivo da administração governamental.

Igualmente importante é a revisão das condições de acesso ao crédito. O crédito rural - fundiário, de investimento, de custeio ou de comercialização - deverá ser concedido em volume adequado às demandas das unidades produtoras e no momento oportuno, simplificando-se as exigências e os procedimentos operacionais.

Preferencialmente, o crédito rural será deferido a cooperativas ou a outras formas associativas, as quais o repassarão aos associados ou aos usuários, com interveniência das organizações a que estiverem vinculados. Em face disso, deve ser revisto o atual sistema de garantias junto aos agentes financeiros.

A fim de assegurar que a concessão do crédito rural se processe segundo as orientações já referidas, considera-se fundamental a criação de um Fundo de Desenvolvimento Agropecuário, como fonte de recursos financeiros segura e estável. As normas de funcionamento desse Fundo serão definidas com a participação das representações dos produtores rurais.

As unidades produtoras familiares ou organizadas sob forma associativa deverão receber o crédito rural em condições especiais de juros, correção monetária e prazos de carência e amortização, ou por meio de instrumentos compensatórios.

É necessária a criação de um sistema de seguro agrícola, desvinculado do crédito rural, opcional e extensivo a todos os produtos, tomando-se por base a produção esperada. As normas operacionais desse sistema serão estabelecidas com a participação dos produtores rurais.

Tudo isso é importante para elevar a produtividade do trabalho familiar, mas não é suficiente para garantir que os melhores resultados obtidos beneficiem as famílias dos agricultores na mesma proporção. Os preços dos insumos e dos produtos regularão essa proporção, o que decorrerá do grau de organização e associação dos agricultores em cooperativas, sindicatos e outras entidades menos formalizadas e, sobretudo, do controle de preços dos insumos e da garantia de preços dos produtos. Para tanto, é fundamental a formação de estoques reguladores, bem como o funcionamento eficiente do sistema de informações de mercado e orientação comercial. Por outro lado, preços mínimos deverão ser fixados, considerando-se, além de outros componentes, os custos reais de produção, diferenciados regionalmente, o zoneamento hidroedafoclimático e o destaque dos produtos destinados ao abastecimento do mercado interno.

A preocupação com os mercados para a produção agropecuária induz ao esforço de repensar a questão da base física e dos circuitos de comercialização, particularmente no caso das Centrais de Abastecimento (CEASA). Assim, a infra-estrutura e os serviços de armazenagem e de transportes e a rede de intermediação comercial devem ser reorientados em benefício das formas associativas dos próprios produtores rurais. É preciso reforçar os investimentos na instalação e complementação da rede hierarquizada de armazéns, assegurando-se atenção especial à instalação de armazéns dos centros de produção. Ao lado desse esforço, importa promover-se o desenvolvimento da própria tecnologia de armazenagem, à luz das condições ecológicas e culturais da Região.

Na estratégia de transformação do meio rural do Nordeste, a industrialização rural, ou, mais restritamente, a agroindústria, constitui componente imprescindível e, por isso, prioritário, pela sua capacidade de criar uma produção e uma demanda vastas e seguras para os produtos agropecuários e de reter valor agregado no campo. Uma grande quantidade de subprodutos será obtida nas agroindústrias, permitindo, inclusive, maior oportunidade de crescimento das atividades pecuárias.

Em face disso, serão incentivadas as unidades agroindustriais pertencentes a cooperativas ou a outras formas associativas de produtores rurais, de modo a aproveitarem as oportunidades abertas pela dinamização das atividades agropecuárias.

Serão exploradas as condições excepcionais de competitividade da Região para um vigoroso programa agroindustrial, dado que, sob regime de irrigação, há possibilidade de achatamento dos picos de safra e de produção prolongada e defasada em relação a outras regiões tradicionalmente produtoras. Nesse sentido, estimular-se-á a criação de pólos agroindustriais, em função, sobretudo, dos projetos de irrigação. Os incentivos fiscais e financeiros deverão ser reorientados para unidades agroindustriais formadas com a participação dos produtores das matérias-primas agrícolas e pecuárias.

Na transformação do mundo rural, há de se ter presente, também, que a ocupação demográfica e econômica do espaço e dos seus ecossistemas deve se processar de forma racional e permanente. Isso implica otimizar o uso dos recursos ambientais, compatibilizando a ordem cultural com a ordem natural, valendo-se da ciência e da tecnologia. Conseqüentemente, importa evitar a adoção de tecnologias agressoras do meio ambiente (como as responsáveis por processos de desertificação, erosão dos solos, assoreamento dos rios e açudes, inundações, proliferação de pragas, poluição dos solos e das águas, entre outros efeitos). Para fazer face a tais problemas, é fundamental, entre outras possíveis alternativas, o emprego do manejo e uso racional da cobertura florística natural, do florestamento e reflorestamento heterogêneos e de técnicas de agricultura biológica.

A implantação de uma política de águas norteará o uso dos recursos hídricos da Região, analisando-se, no tempo, a evolução das demandas dos diferentes usuários dos setores econômicos e sociais, com a finalidade de poder satisfazê-los, evitando ou minimizando os conflitos que poderão surgir da multiplicidade de usos. Para atender a esses objetivos, torna-se necessária a institucionalização de um esquema organizacional, com estrutura administrativa e respaldo legal, que se traduzirá por delegação de poderes e competências preestabelecidas, com unidade de comando em nível regional.

B - Reestruturação da base econômico rural

No contexto de transformação do meio rural, a irrigação deve ser considerada como instrumento assegurador do aumento da produção e da produtividade das áreas agricultáveis, bem como um instrumento de minimização dos efeitos das secas, aproveitando-se, portanto, os recursos de solo e água, pontualmente localizados. Trata-se, pois, de uma das prioridades da política sugerida para a Região, por seu caráter social, não podendo dispensar a intervenção governamental no caso de grandes obras típicas dos projetos públicos.

A estratégia a ser adotada fundamenta-se nos seguintes pontos:

- intervenções que visem melhorar ou ampliar os sistemas tradicionais de irrigação serão feitas mediante planos integrados, objetivando, além da obtenção de maior eficiência do uso da água e do solo, a reformulação fundiária e a organização dos produtores rurais;

- a definição e a implementação dos planos, programas e projetos de irrigação deverá contar com a participação dos segmentos sociais interessados, o que permitirá, entre outras vantagens, o atendimento das especificidades locais, inclusive com significativa redução dos custos;

- a agricultura irrigada deverá ser planejada de forma a permitir a sua integração com a pecuária, com a agricultura de sequeiro e, especialmente, com a agroindústria;

- as ações governamentais diretamente relacionadas com a ampliação da atividade irrigatória devem ser realizadas com vistas a aumentar a oferta de projetos baseados em unidades produtoras familiares ou organizadas sob forma associativa. Por ser geradora de pólos de irradiação, a irrigação pública deve ter prioridade no sentido de buscar a auto-sustentação desses projetos;

- em áreas que venham a ser definidas como de interesse social, no caso em que já se verifique a prática da irrigação, o Setor Público atuará no sentido de assegurar os objetivos sociais que constituíram critério para sua seleção;

- o Setor Público atuará, ainda, em áreas onde existam obras de barramento ociosas, ou onde as condições de perenização dos cursos de água venham a favorecer o aproveitamento produtivo dos solos mediante investimentos complementares, no sentido de incentivar a expansão da irrigação a cargo da iniciativa privada;

- nos programas e projetos de irrigação, promover-se-á permanente capacitação dos agricultores irrigantes da Região, com vistas a permitir-lhes a cogestão, a autogestão e a emancipação no trato dos negócios agrícolas;

- a agricultura irrigada voltar-se-á prioritariamente para a produção de alimentos básicos e de matérias-primas para o processamento agroindustrial, destinados ao abastecimento do mercado interno;

- para implementação da política de irrigação, são imprescindíveis o fortalecimento das ações dos órgãos executores e a criação de estímulos e subsídios.

A energização rural, sob forma convencional ou não, deverá ser adotada como elemento de apoio às atividades produtoras rurais e como instrumento de melhoria da qualidade da vida do homem do campo. Adotar-se-ão, nos sistemas de transmissão de energia, padrões técnicos que impliquem custos econômicos reduzidos, de modo a ampliar-se o número de estabelecimentos beneficiados. Serão fortalecidas financeiramente as Cooperativas de Eletrificação Rural, revistas as tarifas e melhoradas as condições de financiamento dos programas de implantação das redes, sobretudo no tocante aos juros e aos prazos de amortização.

Relativamente à construção e manutenção de estradas vicinais, destinadas ao escoamento da produção, é fundamental garantir o apoio financeiro às associações municipais ou de agricultores para a mobilização de Patrulhas Motomecanizadas, a serem empregadas inclusive para a construção e recuperação de equipamentos hidráulicos. A formação dessas patrulhas, de iniciativa do Setor Privado, deve ser estimulada mediante, por exemplo, programas de financiamento em condições especiais, de modo a atenderem às demandas das comunidades rurais, cabendo aos Departamentos Estaduais de Estradas de Rodagem (DER) o estabelecimento de tarifas e critérios técnicos para a realização dos serviços.

Um dos instrumentos básicos para a implantação e o desenvolvimento de uma agricultura moderna é a Engenharia Rural, visto que leva as soluções tecnológicas ao nível da unidade produtora, permitindo-lhe superar seus problemas concretos de vias de acesso, dotação de equipamentos de captação e uso de recursos hídricos, instalação de equipamentos de geração e uso de energia, uso de máquinas agrícolas, manejo dos solos, construções rurais, etc. Para tanto, torna-se necessário preparar, sistematicamente, nas Universidades e Escolas Técnicas, especialistas em Engenharia Rural. De igual modo, é preciso treinar extensionistas e líderes rurais para exercerem funções nesse domínio. Considera-se recomendável a criação de Centros Especializados ou de fazendas-escola para a formação de técnicos em Engenharia Rural.

A transformação das estruturas rurais do Nordeste, na forma ora sugerida, permitirá a criação de condições para evitar ou minimizar a crise econômica e social provocada pela ocorrência da seca hidrológica ou agrícola. Significa isso canalizar as políticas fundiária e agrícola para a edificação de uma estrutura sócio-econômica que assegure à população conviver com a escassez das chuvas e a sua má distribuição no tempo, sem enfrentar crises de produção agropecuária mas, ao contrário, prosperar sem solução de continuidade.

A condução dos esforços nesse rumo exige que, por um lado, se promovam medidas de caráter permanente, visando à dotação de equipamentos de captação de água superficial ou subterrânea. Isso implica perfuração de poços, construção de cisternas e cacimbões e tratamento racional das bacias hidrográficas, com a construção de açudes e barragens das mais diversas modalidades e os investimentos complementares de manejo da cobertura florística natural e de florestamento ou reflorestamento, destinados a preservar as nascentes dos rios e a minimizar as perdas por assoreamento e evaporação. Isso deve assegurar, à população, aos rebanhos e às atividades produtoras não agrícolas, o volume de água necessário para suas necessidades.

Por outro lado, à superação dos riscos de perda ou redução da produção agrícola requer providências sistemáticas e de resultados não imediatistas, no sentido da difusão das práticas de agricultura irrigada, da utilização de culturas de ciclo vegetativo mais curto, do desenvolvimento de plantas xerófilas ou xerófitas e da adoção de práticas de economia de água no solo (voltadas para a diminuição das perdas de água por infiltração, evaporação e evapotranspiração e para a formação e conservação dos solos), bem como da racionalização da exploração pecuária.

Simultaneamente, o manejo e o enriquecimento da cobertura vegetal da região semi-árida serão feitos mediante a minimização da erosão dos solos, provocada pelas precipitações pluviométricas intensas, e através do aumento da capacidade de suporte da carta animal da caatinga, permitindo uma oferta maior de alimento protéico.

Ainda no que diz respeito à racionalização das atividades produtoras rurais, é preciso promover uma estreita articulação entre as atividades de aquicultura e as dos projetos de irrigação. Isso permite maximizar o aproveitamento da infra-estrutura montada para a irrigação, nas áreas mortas ou adjacentes e de solos salinizados, com problemas para a agricultura. Subprodutos agrícolas e animais deverão ser utilizados para maximizar a produtividade/ha/ano de pescado. Naturalmente haverá necessidade de treinamento de piscicultores, assistência técnica, crédito, etc., e de fortalecimento e ampliação das estruturas produtoras de alevinos.

Em diversas áreas do Nordeste, a atividade econômica básica deverá ser a extração mineral. Neste caso, dar-se-á apoio ao pequeno e médio minerador, com a finalidade de aproveitar a mão-de-obra disponível na zona rural e combater os efeitos sócio-econômicos das calamidades climáticas. Atenção especial será conferida ao setor de exploração de pedras ornamentais e de outros insumos minerais, cuja utilização imediata poderá gerar pólos de desenvolvimento e criar empregos. O êxito alcançado na implantação de núcleos de lapidação, artesanato e manufatura mineral, em alguns Estados do Nordeste, recomenda sua consolidação para o aproveitamento de gemas e outras substâncias minerais que se prestam ao artesanato e à manufatura, agregando ao produto o valor multiplicativo do beneficiamento. Neste sentido, concentrar-se-ão esforços na pesquisa tecnológica, orientada efetivamente para a geração de técnicas que venham a aprimorar o aproveitamento integral desses minerais.

Reafirma-se, porém, que a ênfase no esforço de transformação do mundo rural nordestino recai nas atividades agropecuárias. Nesse quadro, o abastecimento alimentar, por meio de produtos básicos (arroz, feijão, mandioca e milho), hortifrutigranjeiros e pecuários (inclusive pesqueiros), receberá tratamento prioritário nos instrumentos de política agrícola. Serão incentivadas particularmente as hortas familiares ou coletivas, dedicadas ao aproveitamento integrado dos recursos naturais disponíveis, sob as condições econômicas, sociais e culturais da comunidade. Além da garantia dos recursos financeiros para a promoção dessa produção alimentar, em larga escala, o Governo manterá o mercado institucional, adquirindo parte substancial da referida produção, sobretudo para executar os programas suplementares de alimentação e nutrição.

Em face de todas as orientações de política e estratégia de desenvolvimento rural ora propostas, deverão ser revistos e reorientados os programas e projetos rurais em curso no Nordeste, sejam eles setoriais ou integrados, sobretudo o Programa de Apoio ao Pequeno Produtor Rural (PAPP), assim como os incentivos fiscais e financeiros. Neste particular, não serão apoiados projetos agrícolas ou agroindustriais que estejam divorciados do uso potencial do solo agrícola ou da fonte de matéria-prima local ou regional. No processo de redefinição, os segmentos sociais diretamente envolvidos participarão de todas as fases. Além disso, torna-se imprescindível a unificação do comando da política agrícola, disciplinando-se suas diferentes instâncias, de modo a garantir-se que a eficiência dos distintos agentes resulte na eficácia geral do sistema. Nesse contexto, ao órgão regional caberá a compatibilização e a articulação dos instrumentos normativos e programáticos, propostos pelas entidades setoriais, no nível federal, pelas administrações estaduais e municipais e pelos colegiados formados em vários níveis espaciais.

C - Reestruturação dos espaços agrários

Na transformação das estruturas sócio-econômicas rurais, aproveitar-se-á a diferenciação do potencial ecológico e dos sistemas produtivos, mediante a adoção de políticas específicas, segundo as cartas de aptidão dos solos e hidropedológica de secas agrícolas.

A Região Semi-Árida, compreendendo as áreas dos agrestes e dos sertões, é uma região de equilíbrio climático, instável, exigindo observância rigorosa das normas ecológicas na ocupação e no uso de seus territórios.

Nos Agrestes adotar-se-á uma política racional de aproveitamento dos recursos naturais disponíveis, voltada sobretudo para a produção de alimentos, tendo em vista a tendência natural da área, a infra-estrutura econômica existente e, em especial, a proximidade dos mercados consumidores, dar-se-á, pois, estímulo à produção agrícola, propiciando expansão e sustentação à pequena propriedade rural, através do acesso à terra ou da regulamentação do pequeno arrendamento.

Além dos serviços agrícolas diretamente voltados para o sistema produtivo, serão assegurados aqueles relativos ao abastecimento de insumos e sobretudo os de comercialização da produção agropecuária.

Ter-se-á como fundamental, para desenvolvimento da atividade pecuária nos agrestes, o estímulo ao crescimento vertical, ou seja, à exploração intensiva, desestimulando-se as formas de crescimento extensivo ou horizontal da atividade pastoril.

Visando assegurar à pecuária um suporte alimentar estável, promover-se-á, além do melhoramento e conservação das espécies vegetais nativas, o florestamento e reflorestamento da área à base de forrageiras arbóreas, ao tempo em que será estimulado o plantio de gramíneas e leguminosas herbáceas.

Será igualmente incentivada a implantação de agroindústrias consumidoras de matérias-primas locais, de modo especial nas bacias leiteiras.

Nos Sertões, promover-se-á a produção de proteína animal e de matérias-primas industriais à base de xerófilas. Neste sentido, a pecuária deverá integrar-se no sistema produtivo regional, com elevados ganhos de rendimentos. Isso porque as condições naturais dos sertões implicam grandes riscos para a produção em larga escala de grãos tradicionais e comestíveis, em cultura de sequeiro. Em face do desflorestamento existente e dos riscos de culturas anuais, estimular-se-á a silvicultura, com predomínio das forrageiras arbóreas, nectaríferas ou não, consorciadas com as gramíneas e leguminosas herbáceas, além de outras (palma forrageira, mandacarú, etc.), o que permitirá a redução dos riscos de deficiência hídrica normais da Região.

A oferta de alimentos aos animais passará a ser regular o ano todo, aumentando a produção de carne e de leite para o mercado regional, abrindo perspectivas para a implantação de indústrias estáveis de Iaticínios no meio rural. Com esse objetivo, também impõe-se o manejo e o enriquecimento da caatinga voltados para o aumento de sua capacidade de suporte animal, bem como para a produção de biomassa para fins múltiplos, sem perder de vista a necessidade de manutenção de bancos genéticos da caatinga. Para a exploração de uma pecuária intensiva (leite e/ou corte), prevê-se o armazenamento de forragens (fenação e ensilagem).

Por outro lado, para que a intervenção no semi-árido amplie o seu potencial produtivo agropecuário, é necessário que se multipliquem as áreas agricultáveis que ofereçam menores riscos: manchas de solos mais férteis e portadoras de reservas hídricas subterrâneas. Para tal, a Engenharia Rural, aplicada segundo a concepção ecológica, busca industrializar a energia dos pingos de água das chuvas intensas, construindo obstáculos ao longo dos cursos dos drenos naturais de uma bacia hidrográfica, em sítios estrategicamente selecionados,.promovendo, assim, a deposição dos materiais sólidos e dissolvidos transportados.

De modo geral, as regiões serranas dos Agrestes e dos Sertões nordestinos apresentam condições de clima bastante favoráveis ao desenvolvimento da fruticultura. Do mesmo modo, a cafeicultura tem suas condições de exploração asseguradas pela altitude e pelo clima dessas zonas serranas. Tratando-se, também, de áreas com problemas de relevo muito acentuado e, portanto, com solos sujeitos à erosão, é importante, nesse espaço, a introdução de culturas permanentes, evitando-se, assim, o desnudamento dos solos e seu revolvimento excessivo. Nessas regiões, as práticas de conservação de solos, como cobertura verde, cordões em contorno, banquetes, renques vegetais, etc., são imprescindíveis para o manejo dos solos.

A fruticultura deverá merecer atenção especial para a exploração das zonas serranas do Agreste e do Sertão nordestinos.

Na Região das Matas Costeiras e Formações Litorâneas há dois espaços bem definidos de intervenção. O primeiro, das matas costeiras, teve sua cobertura florestal praticamente erradicada. Aí se encontram o parque sucroalcooleiro e as culturas do cacaueiro, da seringueira e de frutíferas diversas. Os seus recursos em água são abundantes e subaproveitados. A topografia, acidentada em grandes extensões, dificulta, senão impede, a motomecanização intensiva da cultura canavieira. Desse modo, nesse espaço deve-se estimular significativamente a policultura de alimentos, a arboricultura, principalmente com frutíferas arbóreas nativas, e a psicultura, mediante o associativismo rural dos pequenos e médios produtores.

Nas formações litorâneas, ao lado dos manguezais, que representam áreas de alto sentido ecológico de viveiros da vida marinha, impõem-se medidas antipoluidoras a fim de preservar o meio ambiente e propiciar o desenvolvimento da mitilicultura, da ostricultura e da carcinicultura, cujas tecnologias estão praticamente dominadas.

Os Cerrados do Nordeste, que constituem um expressivo potencial silvo-agropastoril, encontram-se praticamente inexplorados. Sua cobertura florestal é constituída por essências produtoras de óleos e forrageiras, além de madeiras de lei. O quadro natural existente aponta para a verdadeira vocação da área, ou seja, a exploração da pecuária em combinação com o potencial da vegetação natural. Além disso, a topografia plana do cerrado permite o seu aproveitamento mediante técnicas modernas de mecanização.

Para que seja promovida a exploração racional do cerrado na Região Nordeste, deve-se dar prioridade;

a) à exploração dos recursos vegetais, objetivando o seu aproveitamento para matéria-prima energética;

b) ao aproveitamento de matéria-prima para produtos farmacêuticos, celulose e indústrias de óleos e essências;

c) ao desenvolvimento de atividades agro-silvo-pastoris, inclusive apicultura.

Nos Cerrados, dever-se-ão implantar projetos de colonização, sob forma de produção comunitária, ou por meio de pequenas empresas familiares.

Na Região Úmida do Meio-Norte, onde predomina a mata equatorial de grande porte, a primeira preocupação deverá ser evitar o desmatamento indiscriminado. O que ocorreu com a caatinga já ameaça o Maranhão. O risco de desertificaçâo do Nordeste, em menos de 50 anos, poderá ser uma realidade se não se der importância à conservação e recuperação das reservas vegetais. As dezenas de serrarias existentes na área de colonização do Estado do Maranhão denotam o perigo a que estão submetidas as reservas de madeira daquela zona. É, portanto, da máxima importância que se promovam medidas urgentes para uma exploração racional das reservas vegetais ainda existentes, assegurando o cumprimento do Código Florestal e implementando a silvicultura como base de exploração das referidas reservas madeireiras.

As culturas permanentes e a pecuária poderão conviver como atividades indicadas para a área, desde que se proceda a um planejamento para sua ocupação, evitando-se o avanço das pastagens em todo o território.

É fundamental que se tire partido do potencial criado pelo Complexo Carajás, integrando-se nele o sistema de exploração agropecuária e o extrativismo vegetal, representado principalmente pelo babaçu.

A Região Pré-Amazônica tem no extrativismo madeireiro a sua principal base econômica. No entanto, para que o extrativismo seja auto-sustentado, impõe-se a definição de uma política apoiada no manejo florestal, a fim de evitar a degradação dos seus ecossistemas, em face das condições de solo e clima dominantes.

Enfim, a Bacia do Rio São Francisco deverá ser objeto de um plano integrado de valorização e aproveitamento. Este plano definirá a forma de uso múltiplo dos recursos naturais disponíveis e de ocupação demográfica da bacia, de modo a contribuir, decisivamente, para a solução de graves problemas ecológicos, econômicos e sociais do Nordeste. Providência similar deverá ser adotada com relação à Bacia do Rio Parnaíba.

4.3.2 - Reorientação do desenvolvimento urbano

A dimensão do contingente populacional que já se encontra nas cidades do Nordeste e suas perspectivas de crescimento exigem um esforço no sentido de ampliar e reorientar as atividades produtivas urbanas.

A nova política deve privilegiar a criação de empregos ao longo da rede de cidades, levando o crescimento econômico ao interior e distribuindo melhor a renda entre as pessoas e no espaço urbano da Região. Compreende, assim, duas tônicas: a dinamização da economia e o reordenamento do espaço urbano.

A - Dinamização da economia urbana

Esta linha estratégica, por seus efeitos multiplicadores sobre o emprego e por sua perspectiva de permanência, conduzirá à expansão e ao desenvolvimento das forças produtivas. Deve apoiar-se na indústria de transformação, na construção civil, no turismo, no artesanato e no setor informal, onde se incluem vastos contingentes de autônomos e de microempresas, tanto da indústria como do comércio e dos serviços.

Indústria de Transformação

A definição de uma nova política industrial para o Nordeste deve levar em conta a natureza da estrutura produtiva herdada do período recente: pouco integrada, desarticulada, reconhecidamente complementar ao parque industrial de outras áreas do País. Deve ainda considerar o grau de integração do Nordeste ao conjunto da economia nacional, para que se definam estratégias realistas.

A tônica da nova política centra-se na busca de uma maior integração entre os diversos ramos industriais, numa perspectiva intra-setorial, e de uma mais forte articulação da indústria com o restante da atividade produtiva nordestina (integração inter-setorial), especialmente com a agropecuária, o extrativismo mineral e as atividades de comércio e serviços.

No que se refere à questão do emprego, deve-se levar em conta que o papel primordial da indústria é funcionar como dinamizadora da economia, e seus efeitos sobre o nível de emprego estarão associados ao maior grau de integração que ela obtenha dentro da própria Região, o que ampliará seu poder de criar empregos indiretos. No entanto, deve-se estimular as atividades industriais que absorvam potencialmente mais força de trabalho. No curto prazo, a recuperação de empreendimentos afetados pela recessão teria efeito positivo sobre o emprego.

A política inclui, portanto, uma estratégia de médio e longo prazos na qual a tônica é a integração, a consolidação e a modernização da estrutura industrial, e outra, de curto prazo, cuja ênfase é dada ao esforço de recuperação de empresas paralisadas ou em dificuldades econômicas e financeiras. Propõem-se ainda algumas ações complementares, a seguir enunciadas.

No médio prazo, a política de industrialização do Nordeste, para aumentar seu grau de integração inter e intra-setorial, deve direcionar esforços para consolidar e implantar os pólos e complexos industriais, dinamizar as atividades agroindustriais, instalar novas indústrias dinâmicas, apoiar a expansão da atividade siderúrgica e incentivar a modernização do parque industrial.

Ao mesmo tempo, para ampliar a geração de empregos, a ênfase deve ser dada ao estímulo à integração e à diversificação dos ramos tradicionais e ao apoio às pequenas e médias empresas industriais. No caso das tradicionais, deve ser enfatizada a integração do parque têxtil e deste com a indústria de confecções, em todo o Nordeste, e para a expansão da indústria calçadista regional, substituindo importações de outras regiões ou produzindo para o mercado internacional. Associado a isto, deve-se estimular os projetos de curtume que se destinem ao beneficiamento e acabamento de couros, notadamente a partir do "wet-blue".

No caso das pequenas e médias empresas, o importante é criar instrumentos específicos de apoio a essas unidades de produção, dentre quais se destaca um Fundo de Incentivos, com recursos significativos e normas adaptadas a esse tipo de empresa.

Igualmente fundamental é a definição de mecanismos de compensação de custos operacionais - comparativamente mais elevados que os das grandes empresas - como a isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) em vendas intra-regionais, para ramos industriais de especial interesse.

Por outro lado, o fortalecimento do Centro Brasileiro de Apoio à Pequena e Média Empresa (CEBRAE) é considerado estratégico para o apoio às pequenas e médias empresas, bem como a construção de galpões multifabris, como forma de estimular a instalação ou relocalização de unidades desse porte.

No que se refere a pólos e complexos industriais, visando, sobretudo, maximizar os efeitos de sua ação dinamizadora no interior da Região, as ações deverão orientar-se no sentido de consolidar e/ou implantar:

- o Pólo Petroquímico de Camaçari, o Complexo Industrial Integrado de Base de Sergipe, o Pólo Cloroquímico de Alagoas, o Complexo Sucroalcooquímico de Pernambuco, o Parque Industrial Portuário de Suape, o Complexo Químico-Metalúrgico do Rio Grande do Norte e o III Grande Aglomerado Industrial do Nordeste, no Ceará;

- uma refinaria de petróleo na Região, definida sua localização em função de fatores técnicos, econômicos, sociais e ambientais;

- indústrias de fertilizantes, fosfatados, nitrogenados e potássicos no Nordeste; e

- outros aglomerados industriais que venham surgir em decorrência da exploração dos recursos naturais da Região.

Com referência à dinamização das atividades agroindustriais, consideradas prioritárias pelo seu potencial de descentralização espacial e por sua capacidade integradora, a política a ser implementada deve considerar a existência de dois grandes tipos de unidades: um vinculado aos grandes grupos agroindustriais/empresariais de estrutura produtiva integrada, e outro, aos pequenos e médios empreendimentos, com bases locais, preferencialmente de caráter associativista, apoiados em projetos de irrigação. Para este último, são importantes a criação de novos estímulos e o desenvolvimento de ações que considerem sua especificidade e diversidade.

As ações do Setor Público deverão voltar-se para:

- a ampliação e a diversificação do parque agroindustrial nordestino, incentivando sua localização junto a pólos de irrigação existentes ou a serem implantados, estimulando, concomitantemente, sua integração inter-setorial;

- a continuidade dos investimentos agroindustriais, com ênfase no aproveitamento das frutas tropicais;

- a criação de um centro de desenvolvimento de tecnologias agroindustriais no Nordeste.

É imprescindível, no desenvolvimento da agroindústria, dar prioridade a atividades com mais amplas repercussões sobre a geração direta e indireta de empregos produtivos e exercer maior controle sobre as repercussões negativas que, sobretudo, a agroindústria de cunho mais capitalista vem acarretando nas relações de trabalho e de emprego e sobre o meio ambiente e os recursos hídricos.

No que concerne ao apoio às novas indústrias dinâmicas, a preocupação fundamental é aumentar a participação do Nordeste na produção nacional, deslocando para esta Região atividades que certamente irão liderar o crescimento industrial do País. Nesse sentido, esforço especial deve ser dirigido para realizar investimentos nas indústrias de bens de capital, na química fina, na mecânica de precisão, na microeletrônica, na informática e na biotecnologia, as quais são capazes de gerar efeito propagador de expansão de unidades produtivas, inclusive de pequeno porte, internalizando resultados na própria Região.

No que se refere à expansão da produção siderúrgica, propôs-se a implantação de uma usina siderúrgica de grande porte em Itaqui-MA, tendo em vista a redução do minério de ferro de Carajás, para a produção de "billets" e tarugos, a serem laminados nas unidades nordestinas de produtos siderúrgicos planos.

Além disso, deve-se apoiar a implantação de pequenas e médias unidades de produção siderúrgica onde existam minério de ferro e redutores, notadamente voltados para a produção de gusa.

Quanto à modernização do parque industrial nordestino, a incorporação progressiva de tecnologia acarretará ganhos de produtividade e melhoria da competitividade e da qualidade do produto, sem necessariamente reduzir o volume de emprego.

No curto prazo, a política estará voltada para a recuperação de empreendimentos industriais - sobretudo os beneficiados com incentivos fiscais e financeiros - os quais em geral, por motivo de crises conjunturais ou por alteração de políticas econômicas governamentais, se encontram em dificuldades, ou mesmo paralisados. Deverão ser apoiados aqueles empreendimentos que se revelarem novamente viáveis do ponto de vista econômico e relevantes do ponto de vista social, pela sua capacidade de ampliar a oferta regional de empregos.

Finalmente, algumas ações complementares são sugeridas, como a realização de estudos de viabilidade de novos empreendimentos (a exemplo de unidades de magnésio metálico e outros produtos associados), a adoção de medidas de proteção do meio ambiente e a ampliação da oferta de equipamentos de infra-estrutura.

Para que se venha a efetivar essa política, impõe-se, como essencial, uma profunda revisão no sistema de incentivos fiscais e financeiros administrado pela SUDENE, enfatizando o aumento do volume de recursos, a democratização do acesso aos incentivos, a revisão dos critérios para aprovação dos projetos e a melhoria da administração do FINOR.

Construção Civil

Uma estratégia de emprego, sobretudo para o setor urbano, deve incluir necessariamente o estímulo à construção civil, já que se trata de um importante segmento do ponto de vista da sua grande capacidade de absorção de força de trabalho.

A orientação estratégica para o segmento prevê:

- maior articulação entre as ações do Setor Público e os recursos e necessidades da sociedade, maximizando-se o aproveitamento da mão-de-obra local e a capacidade empresarial instalada na Região;

- estímulo à formação e ao funcionamento de empresas locais de construção civil e de produção de materiais, para a implantação de empreendimentos de pequeno e médio portes;

- integração planejada com os produtores de material de construção, para evitar os estrangulamentos normalmente gerados pela pressão da demanda sobre esse subsetor;

- participação do Setor Público na produção de materiais e peças construtivas para habitação e infra-estrutura urbana, como alternativa de solução de custo mínimo nas áreas de baixa renda;

- ênfase na utilização de tecnologias alternativas, de mão-de-obra intensiva, na atividade da construção civil e na produção de materiais, bem como nos gastos de manutenção e conservação da infra-estrutura econômica e social;

- prioridade para os investimentos voltados para os programas de habitação popular, importante segmento da infra-estrutura social, cuja carência ainda é alarmante.

Turismo

O Nordeste tem revelado um grande potencial para o desenvolvimento da atividade turística, especialmente no que se refere ao turismo interno, o que se alia à capacidade de atrair parte dos visitantes estrangeiros que se dirigem ao Brasil.

Sendo o turismo uma atividade fortemente geradora de emprego, a nova política de desenvolvimento regional deve conceder prioridade ao seu desenvolvimento. Os investimentos nesse setor devem buscar:

- descentralizar e interiorizar os serviços e equipamentos turísticos, aproveitando e respeitando as características naturais e culturais da Região e o potencial de áreas e locais urbanos e rurais ainda não incorporados à oferta turística e ampliando a oferta de equipamentos de cultura, lazer e entretenimento também para as populações locais;

- incorporar à oferta turística e enquadrar nos objetivos preservacionistas da Lei nº 6.513/77 novas áreas e locais urbanos e rurais;

- melhorar a infra-estrutura em áreas e locais que já estejam desenvolvendo a atividade turística;

- ampliar e sedimentar os mercados turísticos, dando ênfase especial ao mercado interno, estimulando o desenvolvimento de ações conjuntas dos organismos oficiais e entidades representativas dos usuários e das empresas transportadoras, visando à criação de tarifas e vôos alternativos, a exemplo de vários outros países;

- apoiar o desenvolvimento do turismo social, visando a incorporar o trabalhador como usuário do turismo;

- desenvolver uma política de preservação e valorização do patrimônio histórico-artístico-cultural e natural da Região, inclusive criando e operacionalizando mecanismos e normas legais que impeçam a deterioração dos bens patrimoniais e culturais, a descaracterização e o desaparecimento de manifestações da cultura popular da Região (sem, no entanto, perder de vista a sua dinâmica própria), bem como o uso desordenado e predatório do meio ambiente regional;

- apoiar a participação de entidades comunitárias, artísticas, culturais e outras na formulação de programas e projetos voltados para a atividade turística, bem como a criação e utilização, pela sociedade, de mecanismos de controle e fiscalização dos recursos públicos aplicados nesses programas e projetos.

Artesanato

O Nordeste conta, hoje, com um expresivo contingente de força de trabalho dedicado à atividade artesanal nas áreas urbanas e rurais. Essa atividade, além de compor a riqueza do potencial cultural da Região, contribui como importante fonte de complementação de renda, ou, em muitos casos, como única fonte de renda para a sobrevivência de vastos segmentos populacionais.

O apoio ao artesanato assume, dessa forma, grande significado social, cultural e econômico para a Região, devendo fundamentar-se nas seguintes diretrizes:

- fomentar a produção artesanal, como procedimento coadjuvante na implantação de outros projetos;

- concentrar recursos e esforços para tornar auto-sustentáveis as organizações artesanais;

- adotar uma política creditícia e de comercialização, para facilitar a produção e a distribuição, evitando, especialmente, a ingerência de atravessadores;

- fortalecer as cooperativas de artesanato, dando apoio significativo à formação de capital de giro, a fim de possibilitar a compra antecipada da produção;

- possibilitar a criação de centros e espaços diversos de produção e difusão artesanal;

- apoiar a pesquisa do artesanato, com ênfase na análise da importância econômica e social da produção no contexto do mercado de trabalho regional;

- preservar as zonas ecológicas que são redutos de matérias-primas, com o objetivo de suprir os produtores artesanais;

- estimular a criatividade do artesão e a difusão de processos tecnológicos de produção artesanal, de modo a melhorar a qualidade do produto, sem comprometer o seu conteúdo cultural;

- concentrar esforços para preservar os traços culturais da atividade artesanal, como forma de garantir sua reprodução e autenticidade;

- interiorizar as ações de fomento ao artesanato, apoiando ou implantando projetos nas pequenas comunidades interioranas e zonas rurais;

- incentivar fortemente o associativismo, especialmente o cooperativismo, com gerenciamento dos próprios produtores artesanais;

- rever a regulamentação da atividade artesanal, para facilitar seu ingresso na Previdência Social e resolver conflitos no que diz respeito à tributação;

- definir competências, funções e jurisdição dos órgãos e instituições que tratam do artesanato nos níveis federal, regional, estadual e municipal.

Setor Informal

As políticas de médio e longo prazos destinadas à dinamização e à reativação da economia são insuficientes para absorver o grande número de desempregados e subempregados excluído dos benefícios do crescimento passado. Assim sendo, é fundamental que se apóiem maciçamente as atividades informais da economia, hoje fortemente inseridas no contexto regional e constituindo importante fator complementar de ampliação das oportunidades de trabalho para expressivo contingente populacional.

É importante esclarecer que se trata de apoiar o setor "informal" considerando a sua diversidade e a sua relação com os setores formalizados da economia. Deste ponto de vista, leva-se em conta a existência, no seu interior, de um conjunto de formas diversificadas de sobrevivência e de inserção produtiva, sejam marginais, subordinadas ou articuladas aos segmentos dominantes da economia.

Essa política deverá apoiar os mais variados tipos de atividades informais: aquelas articuladas com a economia "formal", as atividades que, embora não gerando excedentes, também não comprometem a sua realização e, mesmo operando em baixos níveis de produtividade, contribuem para a formação do produto social e as atividades que são puras estratégias de sobrevivência, devendo, portanto, ser encaradas dentro de uma situação transitória, com incentivos específicos.

Embora as atividades informais se exerçam predominantemente nas áreas urbanas, dever-se-á garantir também a sua indispensável integração com o setor rural, tanto no apoio a atividades não-agrícolas no campo, como à comercialização de seus produtos.

Essa estratégia deve ser orientada para o fortalecimento dos segmentos informais de produção e de comercialização de bens e serviços. A política deve dirigir-se prioritariamente para:

- a organização e a gestão da produção de bens e serviços;

- a consolidação da base econômica local mediante o estímulo e o apoio às diferentes modalidades alternativas tecnológicas e culturais de organização da produção;

- a promoção de treinamento e assistência técnica e gerencial e a garantia de suporte financeiro às microunidades de produção e de comercialização de bens e serviços. Igualmente deverão ser apoiados os autônomos prestadores de serviços pessoais, na medida das necessidades e dos interesses das comunidades envolvidas;

- o estímulo à produção em formas associativas;

- a criação e a implementação de programas especiais de emprego para trabalhadores não qualificados, de baixa renda, especialmente nas áreas de maior nível de desemprego e subemprego.

Para o apoio ao "setor informal", propõem-se as seguintes estratégias específicas:

- integrar as ações entre os diversos órgãos governamentais, inclusive bancos oficiais, envolvidos no apoio ao setor, de modo a evitar a duplicidade de ações;

- estimular as entidades governamentais a efetivar compras junto ao setor informal, de maneira a garantir uma demanda efetiva de produtos e serviços oriundos de microempresas, autônomos e outras unidades produtivas dessa natureza;

- incentivar ações coletivas no sentido da implantação de centrais de compra e venda e de prestação de serviços comuns (inclusive divulgação, assistência técnica, capacitação, etc.), com a finalidade de socializar os ganhos de escala que não são possíveis no nível individual;

- estimular o aproveitamento de áreas urbanas especiais destinadas ao comércio ambulante, atividades autônomas, feiras livres, mercados e outros;

- promover o aproveitamento de terras urbanas devolutas, áreas ribeirinhas e áreas não edificadas, para a produção de alimentos, piscicultura e outras formas de complementação de renda, com apoio técnico, insumos e equipamentos necessários à sua viabilização. Estas áreas devem ser aproveitadas para a implantação de hortas e lavouras comunitárias, com larga absorção de mão-de-obra;

- estimular a produção de hortifrutigranjeiros e pequena criação de animais, mediante incentivo a unidades de produção familiares, ou comunitárias, bem como a estruturação dos chamados cinturões verdes ao redor dos centros consumidores;

- adequar a legislação existente às especificidades do setor informal (autônomos, ambulantes e microempresas), no que se refere às áreas trabalhista, previdenciária e fiscal,

- reestruturar a política de assistência creditícia, em especial dos bancos oficiais, direcionada para as microunidades de produção, principalmente no que diz respeito a aporte de recursos e garantia para obtenção de crédito, tornando possível o acesso a este por parte de todos os segmentos que compõem o setor informal;

- criar um Fundo de Financiamento às microempresas, unidades produtivas familiares e associativas do setor informal, com condições de prazos e juros favorecidos.

B - Reordenamento do espaço urbano

Rede Urbana

É necessário que a estruturação da rede urbana do Nordeste ocorra a partir das funções específicas dos diversos centros urbanos regionais no quadro da divisão inter e intra-regional do trabalho. É importante que se promova o desenvolvimento desses centros em função dos potenciais produtivos suscetíveis de ampliar o mercado interno, de integrar a economia regional na economia nacional e de proporcionar o desenvolvimento rural/urbano, num dado âmbito espacial.

Nesse sentido, é preciso estruturar as metrópoles regionais, capitais não metropolitanas e centros regionais de forma a exercerem seus papéis de centros dinâmicos no processo de integração da economia nordestina na dinâmica da economia nacional.

Ao lado disso, ter-se-á de consolidar as cidades interioranas e os centros de prestação de serviços, de forma a ocuparem seus espaços na produção do mercado interno regional, particularmente como centros de troca e comercialização de mercadorias.

Adicionalmente, é importante dotar as áreas urbanas estratégicas, nas quais estejam sendo ou venham a ser implantados grandes empreendimentos industriais, da imprescindível infra-estrutura urbana e dos equipamentos sociais básicos de apoio.

É necessário, ainda, adotar medidas que venham a assegurar a complementaridade entre os diversos tipos de cidades e entre a cidade e o campo, no sentido da expansão da economia e do desenvolvimento social e político, especialmente considerando a articulação dessas cidades com os projetos de desenvolvimento rural integrado.

Impõe-se urbanizar o meio rural, mediante o estímulo direto a atividades que possam contribuir para a formação e dinamização da base econômica e a criação de empregos produtivos nos núcleos urbanos interioranos, bem como para a instalação de uma infra-estrutura social básica, capaz de propiciar as condições de reprodução da força de trabalho. Em particular, estimular-se-á o desenvolvimento dos pequenos e médios centros receptores de migrantes e dinamizar-se-ão as áreas de origem dos fluxos migratórios, por meio da reestruturação e revitalização das atividades econômicas (agroindústria e pequena produção, em especial) e da oferta de infra-estrutura urbana e de serviços, de forma a desempenharem as funções urbanas de apoio requeridas pelo processo de dinamização da economia de subespaços regionais.

Uso do Solo

O Estado deverá fazer uma revisão imediata dos instrumentos jurídicos e institucionais, de forma a adequar a propriedade e o uso do solo urbano à sua função social, compatível com as necessidades da maioria da população, implementando, neste particular, as seguintes ações:

- controle do uso do solo, de modo a coibir a especulação imobiliária, eliminando os vazios urbanos e, portanto, contribuindo para minimizar os processos de favelização e de periferização, bem como os usos incompatíveis ou inconvenientes, e reduzir os custos de urbanização;

- desapropriação, para fins de utilidade pública ou de interesse social, de áreas urbanas ociosas consideradas prioritárias, evitando-se que a renda gerada com os serviços públicos de melhoria seja incorporada aos valores das desapropriações;

- legalização da posse de terra e implantação prioritária de equipamentos urbanos e comunitários nas áreas habitadas por populações de baixa renda;

- destinação e reserva de áreas urbanas próximas aos locais de trabalho para a população de baixa renda, reduzindo as distâncias entre a residência e o trabalho;

- reurbanização das áreas de favelas, garantindo a permanência da população no próprio local, ou em áreas próximas, quando aquelas se confrontam com problemas de notórias restrições físicas ou de meio ambiente;

- criação de mecanismos que garantam o ressarcimento ao Poder Público dos investimentos de que resulte a valorização dos imóveis urbanos;

- proteção, preservação, renovação e recuperação do patrimônio histórico, artístico, arqueológico e paisagístico;

- adoção de padrões de equipamentos urbanos e comunitários que atendam às condições sócio-econômicas-culturais e às diversidades dos centros urbanos.

Meio Ambiente

O desenvolvimento urbano e industrial deve considerar o meio ambiente como patrimônio inalienável da sociedade, tornando-se, portanto, necessário adotar uma estratégia que minimize os impactos negativos daquele processo na qualidade de vida das populações urbanas e nos recursos naturais. A superação dos sérios problemas ambientais hoje existentes sugere, de um lado, uma política de implementação de soluções imediatas para as áreas críticas e, de outro, a adoção rigorosa de padrões técnicos ambientais em face das novas intervenções industriais e urbanas.

Neste sentido, propõem-se as seguintes diretrizes:

- efetivo controle social da definição de padrões ambientais e da fiscalização exercida pelos órgãos públicos especializados, no que diz respeito a despejos industriais, extração de materiais, instalação de equipamentos de grande porte, destinação final de resíduos urbanos etc.;

- adoção de soluções emergenciais não convencionais para os sistemas de saneamento, como uma forma de, barateando os custos, ampliar espacialmente a melhoria das condições ambientais;

- medidas efetivas para evitar alterações significativas no modo de vida das populações próximas, resultantes de possíveis agressões industriais, e de usos urbanos;

- obrigatoriedade da realização de estudos sobre o impacto ambiental e análise de riscos, com divulgação que permita a participação da sociedade e a conseqüente adoção de medidas preventivas para as intervenções públicas e privadas que possam implicar alteração do ecossistema.

4.3.3 - Consolidação e conservação da infra-estrutura econômica

A consolidação e a conservação da infra-estrutura econômica já existente constitui requisito básico para a dinamização, o fortalecimento e a integração espacial e setorial da economia nordestina.

A - Energia

A política energética a ser adotada não se deve restringir à visão da energia como infra-estrutura, mas tem que identificar as correlações entre esse aspecto e a problemática sócio-econômica e ecológica da Região.

A infra-estrutura de energia deve ser consolidada e adequada ao processo de desenvolvimento regional, dando-se ênfase a: ampliação da infra-estrutura energética no meio rural; atuação sobre os pontos de estrangulamento do sistema hidroelétrico; uso de fontes alternativas regionais; conservação da energia como elemento de racionalização do consumo e desenvolvimento de um sistema de Planejamento Energético Regional que estabeleça diretrizes e ações para o setor.

B - Transportes

A política de transportes deve ser direcionada para:

- estimular a integração modal no intuito de minimizar os desperdícios decorrentes da competição entre as diversas alternativas de transporte, aumentando a produtividade do setor;

- implementar um vigoroso programa de restauração, manutenção e melhoramento da rede rodoviária, elemento vital para a dinamização da economia da Região;

- assegurar prioridade às estradas vicinais na alocação de recursos destinados à expansão da rede rodoviária;

- estimular a recuperação do transporte ferroviário e marítimo de cabotagem, levando o sistema inter-regional de transportes a padrões mais aceitáveis de racionalidade;

- promover a execução de melhorias do atual serviço ferroviário de subúrbio nos centros metropolitanos e nos principais aglomerados urbanos da Região;

- rever os critérios de distribuição do Fundo Rodoviário Nacional e de outros recursos setoriais, objetivando a maior participação do Nordeste no rateio dos recursos destinados aos transportes;

- fomentar a utilização de tecnologias alternativas de transporte, conforme a realidade de cada área;

- estimular a utilização de métodos de construção de rodovias com tecnologias adequadas às limitações e reais necessidades das pequenas comunidades, como emprego, no maior nível possível, de mão-de-obra, intensiva na execução dos serviços;

- apoiar as associações de municípios na construção e recuperação de estradas vicinais para escoamento da produção em áreas de interesse da SUDENE;

- estimular e oferecer condições para que as associações locais possam explorar o serviço de transporte de mercadorias, em apoio às necessidades do pequeno produtor;

- incentivar programas de capacitação de pessoal para o planejamento, o controle e a operacionalização dos transportes;

- promover estudos e pesquisas de transportes de interesse do Nordeste.

C - Telecomunicações

A política de telecomunicações para a Região deverá ser orientada para a criação de uma infra-estrutura que possibilite maior integração, tanto do ponto de vista econômico como sob os aspectos social, político e cultural.

Os esforços deverão ser concentrados prioritariamente para a implantação de serviços de telefonia interurbana, com a instalação de postos de serviços interurbanos (PS-IU) nos distritos e povoados ainda mudos e de serviços locais de natureza rural.

Ênfase deverá ser dada ao atendimento individualizado a cooperativas e unidades produtoras da agropecuária e ao apoio a comunidades rurais. Com isto, pretende-se possibilitar o acesso rápido às fontes de informação de mercado, dar condições para a redução de custos operacionais e minimizar os riscos de perdas de produtos perecíveis, pela prestação de um serviço de alto significado social.

4.3.4 - Ampliação e melhoria da oferta de serviços sociais

A política social permeia todas as linhas estratégicas que compõem este Plano, não se restringindo aos chamados serviços sociais. Contudo, um tratamento prioritário à oferta desses serviços é fundamental no Nordeste, e para isso o Estado deve orientar importante parcela dos excedentes que capta na economia. Deve, sobretudo, alterar sua forma de atuar nos programas sociais, adotando soluções alternativas que envolvam a população na sua definição e operacionalização. Por sua vez, torna-se fundamental restaurar o conceito de Serviço Público no interior do Estado.

Essa linha estratégica privilegia as áreas de cultura, educação, saúde, habitação, saneamento, transporte coletivo e defesa civil.

A - Cultura

A questão cultural está presente em todos os segmentos deste Plano, na medida em que se recomenda considerar e respeitar as características e os interesses culturais das comunidades, por ocasião da definição e execução de programas e projetos de desenvolvimento para o Nordeste. Neste sentido, propõe-se:

- incentivar a pesquisa e a documentação de práticas não institucionais, resgatando dados e informações sobre essas práticas, por traduzirem um acervo significativo de modos de pensar e fazer não convencionais, gerando assim, conhecimento imprescindível para novas formulações científicas e tecnológicas capazes de contribuir para o desenvolvimento da Região;

- apoiar a criação e a consolidação de uma infra-estrutura para o desenvolvimento das atividades artístico-culturais da Região, consubstanciada na melhoria dos sistemas regionais de editoração, gravação, filmagem, exposição, divulgação e comercialização da produção cultural;

- apoiar, viabilizar e incentivar a criação e a consolidação de grupo ou organizações representativos da cultura popular nordestina, objetivando articulá-los e fortalecê-los na luta pela sua identidade, automia, crescimento e auto-sustentação;

- incentivar a preservação da memória cultural da Região, buscando operacionalizar mecanismos legais para o apoio e a conservação patrimônio histórico, artístico, arquitetônico e cultural da Região;

- possibilitar apoio financeiro à criação e à manutenção de espaços culturais produtivos, consultada a comunidade nas suas reais necessidades e aspirações;

- estimular uma política cultural que rejeite qualquer tipo de discriminação quanto a raça, sexo, "status" sócio-cultural, postura comportamental, religião ou ideologia.

B - Educação

A adoção de uma política de Educação destinada à ampliação dos direitos sociais tem por finalidade elevar as aspirações da população por melhores condições de vida, fortalecer a base democrática do País e preparar o indivíduo para o exercício da cidadania. Para tanto, deverão ser observadas a política e as linhas estratégicas que se seguem:

- universalização da educação básica, propiciando o acesso de toda a população na faixa de idade de 7 a 14 anos ao ensino de 1º Grau, conforme prevê a legislação vigente;

- expansão e melhoria da qualidade do ensino de 1º e 2º Graus.

A política de expansão da oferta de educação do 1º e 2º Graus é da responsabilidade do Governo e deve incorporar, necessariamente, medidas que garantam a qualidade do ensino. Deste ponto de vista, a expansão da rede física escolar deve levar em conta, além do atendimento à demanda da clientela, o fornecimento de equipamento e mobiliário necessários ao funcionamento das unidades escolares, o provimento de meios para a sua manutenção, a melhoria da relação aluno/professor e a regularização dos turnos de funcionamento escolar, com a eliminação dos chamados turnos intermediários.

Deve incluir, ainda, os seguintes aspectos:

- valorização do magistério, implicando a adoção de uma política salarial condigna, o estabelecimento de plano de carreira, o desenvolvimento de programas de capacitação e de qualificação, bem como a adoção de concurso público para ingresso no sistema de ensino. Implica, também a melhoria dos cursos de formação de docentes, tanto no nível do 2º Grau como no nível das licenciaturas;

- reformulação dos currículos escolares, de modo a valorizar a identidade cultural local sem descurar a veiculação dos conhecimentos universais sistematizados, necessários à formação do cidadão, função essencial da escola. Na reformulação dos currículos impõe-se a revisão do instrumental referente à socialização do papel feminino na sociedade, o qual vem sendo elaborado sob uma visão conservadora e discriminatória, bem como a inclusão de elementos de história e cultura de segmentos étnicos marginalizados, a exemplo dos negros e dos índios;

- ampliação e fortalecimento da rede de bibliotecas públicas e escolares, com garantia de recursos para a sua manutenção, a fim de assegurar o efetivo acesso da comunidade à informação e aos bens culturais;

- instituição de uma política do livro didático específica para o ensino do 1º Grau, de forma a garantir a excelência do conteúdo das obras didáticas e estimular o desenvolvimento do espírito crítico e científico;

- melhoria e ampliação da assistência ao educando do ensino do 1º Grau e, extensivamente, ao do 2º Grau;

- democratização da escola, entendida não apenas como a eliminação, no seu âmbito, dos mecanismos de seleção social e cultural que atuam como fatores impeditivos do percurso regular do aluno no sistema de ensino, como também a adoção de gestão participativa e abertura do seu espaço físico à comunidade;

- revisão e aperfeiçoamento dos mecanismos legais existentes relativos à criação e ao funcionamento de unidades privadas de prestação de serviços educacionais;

- fortalecimento do ensino público e gratuito do 1º e 2º Graus. A expansão da oferta do ensino do 1º e 2º Graus deve ser realizada, prioritariamente, pela rede oficial, assegurando-se a sua gratuidade e o seu fortalecimento, mediante a obrigatoriedade de circunscrever a aplicação, nessa rede, dos recursos públicos disponíveis para esses graus de ensino.

O fortalecimento do ensino público e gratuito implica, também, a garantia do fornecimento de material escolar ao educando, sobretudo o do 1º Grau, a eliminação da exigência de pagamento de taxas e da obrigatoriedade do uso de fardamento escolar, bem como a supressão de mecanismos seletivos de acesso ao sistema (testes de admissão ao 2º Grau).

A instituição do planejamento participativo nos projetos governamentais de educação, envolvendo todos os segmentos da sociedade, configura-se um mecanismo importante para o sistema público de ensino.

- Ampliação do atendimento a população da faixa etária de 0 a 6 anos.

A ampliação da oferta de educação pré-escolar, mediante a construção, o equipamento e a manutenção da rede física do Setor Público, visa atender ao grupo etário de 4 a 6 anos, prioritariamente, das periferias urbanas. Esse atendimento não deve ser obrigatoriamente escolar, mas deve ser, necessariamente, pedagógico.

A instalação de creches para o atendimento da população de 0 a 3 anos, sobretudo das camadas populares, deve ser ampliada, o que constitui uma responsabilidade tanto do Poder Público como das empresas particulares, conforme dispositivo legal vigente. O estímulo ao cumprimento legal deve envolver um tratamento integrado da criança no que diz respeito aos aspectos de educação saúde e nutrição.

- Integração das Universidades nos programas de desenvolvimento regional.

Como centros privilegiados de produção de conhecimento e como espaço crítico com relação à sociedade, as Universidades devem colaborar no encaminhamento de soluções adequadas aos problemas regionais. Nesta perspectiva, as instituições de ensino superior devem-se apoiar na execução de programas que visem melhorar a articulação entre os níveis de ensino e promover a melhoria da formação de professores, especialmente para o ensino de 1º e 2º Graus.

Devem ser incentivados, ainda, estudos e experimentos que levem à criação de tecnologias educacionais compatíveis com os padrões culturais da Região e direcionadas para a problemática do ensino, sobretudo no que se refere às séries iniciais do 1º Grau.

Ênfase especial deve ser dada ao aprofundamento do conhecimento científico com vistas à criação ou adaptação de processos tecnológicos direcionados para a melhoria do atendimento das necessidades básicas das camadas populares.

- Apoio à educação de adultos.

As propostas educacionais voltadas para adolescentes e adultos devem ser validadas na sua experiência e no seu saber acumulado, objetivando desenvolver a capacidade crítica, de modo a possibilitar a busca de meios para transformar suas condições concretas de vida. Nesta perspectiva, devem ser apoiadas as iniciativas da comunidade com relação à educação não-formal, bem como impõe-se a revisão dos programas governamentais da área, em especial aqueles destinados à alfabetização.

- Expansão do ensino profissionalizante.

Deverá ser ampliada a oferta e garantida a melhoria da qualidade do ensino técnico-profissional, notadamente nas áreas de agropecuária e de formação para o magistério.

- Capacitação de recursos humanos para o trabalho.

A capacitação para o trabalho deve contemplar os conteúdos técnico-profissionais requeridos pelas necessidades do mercado de trabalho e a formação da consciência crítica do trabalhador, com vistas ao exercício pleno da cidadania.

As atividades de capacitação de mão-de-obra devem-se respaldar em levantamento, estudos e pesquisas que orientem sua adequação tanto aos requerimentos do mercado como à tecnologia a ser utilizada.

C - Saúde

A política a ser adotada pelo setor será orientada pelas seguintes diretrizes:

- dar prioridade às atividades de promoção de saúde e prevenção das doenças e outros agravos, devendo a atuação centrar-se na prevenção e no controle das doenças transmissíveis, principalmente as redutíveis pelo saneamento e pela imunização.

- Combater e exercer um controle sistemático, continuado e mais abrangentes às endemias de maior importância sócio-econômica e sanitária.

- Ampliar a distribuição de alimentos aos grupos mais vulneráveis social e biologicamente - gestantes, nutrizes e menores de 6 anos. A aquisição desses alimentos será feita, prioritariamente, aos produtores locais.

- Proporcionar atenção especial à mulher e à criança, obedecendo às normas específicas já fixadas pelo Ministério da Saúde. O planejamento familiar constituirá atividade complementar da Assistência Integral à Saúde da Mulher e obedecerá, exclusivamente, às orientações dessa instância ministerial, que garante a livre escolha de concepção, de maneira a não prejudicar a saúde física e mental das mulheres.

- Dar prioridade à consolidação da rede básica de saúde existente, antes de realizar a sua ampliação, e promover a reorganização e o reequipamento de hospitais regionais, visando a um melhor apoio a essa rede básica e, na maioria dos casos, à terminalidade da ação médica no âmbito regional.

- Ensejar, em iguais condições, a prática das medicinas alopática, homeopática, popular e outras.

- Orientar a atenção do setor para os estudos e pesquisas que procurem responder às solicitações próprias da nosologia regional, à operação de centros hemoterápicos do Setor Público que atendam aos requisitos técnicos recomendados e à produção de equipamentos médico-hospitares de tecnologia mais ajustada à realidade regional.

- Garantir o acesso à informação sobre a concepção e a contracepção, de modo a evitar os efeitos perversos de um controle de natalidade de tendência irreversível.

A prestação dos serviços de saúde será desenvolvida, prioritariamente, pelo Setor Público. O Setor Privado deverá participar de forma complementar, sobretudo no que diz respeito à assistência médico-hospitalar.

- Dar prioridade à saúde ocupacional no âmbito das empresas financiadas pela SUDENE.

A estratégia a ser, adotada pelo setor fundamenta-se nos seguintes pontos:

- fortalecimento da Comissão Interinstitucional da Saúde (CIS) das Ações Integradas de Saúde, em cada Estado, como centro real e dinâmico de gerência dos recursos públicos;

- remoção ou redução de obstáculos que interfiram na eficiência da estrutura executiva de saúde, entre os quais: remuneração profissional pouco atrativa; falta de informações oportunas e fidedignas necessárias à administração; limitada descentralização administrativa regional e inadequação dos recursos humanos;

- apoio à Central de Medicamentos (CEME) e a laboratórios públicos para produção de medicamentos essenciais necessários à complementação do ato médico, de modo a fortalecer a indústria estatal para a produção de medicamentos a baixo custo.

D - Habitação

Direcionar, prioritariamente, o atendimento às populações de baixa renda, nos meios urbano e rural, mediante a completa revisão do Sistema Financeiro de Habitação (SFH) e do próprio Banco Nacional da Habitação (BNH), no sentido de fazê-los exercer a sua intrínseca função social. Nesse sentido, a política habitacional deverá ser tratada não dentro de um contexto meramente empresarial, mas integrada às necessidades básicas da comunidade, coibindo-se práticas de especulação fundiária e financeira.

Serão desenvolvidas as seguintes ações:

- regularização fundiária em áreas de conflito de propriedade, onde seja dada prioridade ao direito de moradia, acentuando-se a busca do sentido social da propriedade;

- implantação de uma política fundiária capaz de racionalizar o uso do solo (barateando, conseqüentemente, os custos do terreno e da habitação) e de aumentar a eficiência e a produtividade do setor da construção civil;

- extensão da política habitacional ao meio rural, ajustando-a às condições sócio-econômicas, ambientais e culturais de suas populações e contribuindo para melhorar as condições de reprodução da mão-de-obra no campo e da própria produção rural;

- fortalecimento da política habitacional nos setores de mais baixa renda, de fato excluídos do Sistema Financeiro de Habitação (SFH);

- exclusão dos agentes financeiros intermediários privados dos programas de habitação popular;

- adequação dos conjuntos habitacionais aos padrões culturais e ambientais da Região, reservando seu planejamento, sua execução e a especificação de materiais a profissionais pequenas e médias empreiteiras locais;

- estímulo à pesquisa de materiais e de métodos construtivos alternativos, de modo a melhorar o padrão de qualidade das habitações, preservando suas características regionais e barateando-lhes os custos;

- dotação de recursos, incentivos e apoio tecnológico para o desenvolvimento da autoconstrução;

- expansão das linhas de financiamento de terreno e de material de construção para as populações de mais baixa renda;

- implementação de uma política de produção pública de materiais de construção, a serem repassados ao usuário a preço de custo;

- previsão, nos conjuntos habitacionais, de infra-estrutura básica, equipamentos coletivos - escolas, centros comunitários, creches, postos de saúde, etc., áreas verdes e de lazer, evitando-se sua periferização.

E - Saneamento

- Orientar as ações de saneamento básico para a utilização de técnicas alternativas de baixo custo, com atendimento maciço às populações, principalmente das favelas, das periferias urbanas e da área rural. Nesse sentido, deverá ser definida uma política social para o saneamento, a partir da elaboração de um Plano Diretor Regional, adequado às prioridades de cada Estado, contendo contribuições calcadas nos interesses das comunidades.

- Agilizar a implantação da Política Nacional do Meio Ambiente, Lei nº 6.938, de 31-8-81 - enfatizando o controle da poluição, a limpeza pública, a drenagem urbana e a educação ambiental.

- Disciplinar o uso dos recursos hídricos, com a finalidade de preservar os mananciais de superfície e os subterrâneos.

- Incentivar os Municípios a assumirem as ações de saneamento mais simplificadas, cabendo aos Estados a administração dos sistemas convencionais.

- Desenvolver pesquisas e experimentos que visem ao desenvolvimento técnico e institucional do setor.

F - Transporte coletivo

A política de transporte coletivo urbano deverá voltar-se, primordialmente, para o atendimento das populações pobres das áreas urbanas, por meio de medidas que visem diminuir seus custos no orçamento das classes trabalhadoras. Nesse sentido, deve-se buscar soluções para a questão tarifária do transporte de passageiros. Por outro lado, é importante assegurar a participação da empresa pública na operação do transporte coletivo, funcionando como reguladora do mercado e minimizando os efeitos do oligopólio prevalecente nas condições atuais.

G - Defesa civil

Considerando a situação de emergência provocada por fatores adversos que periodicamente afetam, com gravidade, a população nordestina, privando-a, total ou parcialmente, do atendimento das suas necessidades, a política para a Região pretende:

- Reforçar as estruturas de Defesa Civil, enfatizando as funções preventivas, por meio de obras, e serviços capazes de conter ou controlar os efeitos das secas, enchentes e outras ocorrências que se vêm repetindo na Região, bem como da conscientização da sociedade para a importância das ações de Defesa Civil e das responsabilidades decorrentes.

- Assistir, de forma imediata, as populações vitimadas por calamidades públicas, mediante ações de caráter assistencial ou recuperativo.

4.3.5 - Estímulo ao Desenvolvimento da Ciência e da Tecnologia

Nos termos da política regional ora proposta, a ampliação do esforço de investigação científica e tecnológica constitui imprescindível fator do desenvolvimento sócio-econômico, político e cultural do Nordeste. Esse esforço - referente às pesquisas básicas e aplicadas, particularmente nos planos social, econômico e dos recursos naturais deve resultar em abertura e aproveitamento de novas frentes de transformação estrutural e avanço qualitativo, nos mais diversos setores e espaços produtivos e culturais da Região.

Nesse sentido, a orientação estratégica geral direciona-se para assegurar o acesso a novas tecnologias disponíveis, em nível internacional ou em outras áreas do País (sobretudo nos campos da informática, da biotecnologia, da química fina, da mecânica de precisão, de novas fontes de energia e de novos materiais). Por outro lado, as particularidades do Nordeste exigem a realização de esforços de adaptação e imitação de tecnologias disponíveis, além da geração e da difusão de tecnologias apropriadas à realidade regional.

Naturalmente, o estímulo à investigação científica e tecnológica requer a consolidação do Sistema Regional de Ciência e Tecnologia, o que implica:

- fomento à capacitação técnico-científica, mediante a formação de recursos humanos qualificados em todos os níveis;

- geração de mecanismos de fixação de recursos humanos especializados;

- fortalecimento dos institutos tecnológicos existentes, interiorizando também suas ações no apoio às pequenas e médias empresas;

- criação de institutos de pesquisa tecnológica setoriais ou especializados, locais ou regionais, de forma organizada, completando a estrutura já existente;

- apoio a ações de transferência e de difusão de tecnologias, incentivando a integração entre órgãos ofertantes e demandantes de tecnologia (Universidades/Institutos/Empresas);

- estímulo e apoio ao surgimento de empresas de alta tecnologia a partir de Universidades e Institutos;

- implementação de mecanismos que garantam a seleção e negociação de tecnologia favorável nos projetos industriais a serem implantados na Região;

- consideração, na definição das opções tecnológicas a serem perseguidas, dos efeitos de longo prazo dos empreendimentos, no que diz respeito à dicotomia emprego/competitividade econômica;

- apoio a programas de assistência tecnológica à pequena e à média empresas;

- criação de um Fundo Regional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico;

- criação de incentivos fiscais e financeiros para empresas isoladas ou associadas investirem em pesquisa e desenvolvimento;

- fortalecimento e apoio às atividades de pesquisa básica e aplicada nas Universidades e Institutos Tecnológicos;

- estímulo à elaboração de estudos e análises sobre tendências e perspectivas da conjuntura sócio-econômica regional e à produção tecno-científica que viabilize as atividades de planejamento no setor;

- fortalecimento das atividades de pesquisa, planejamento e valorização dos recursos naturais, de forma a assegurar a complementariedade de informações e a geração de novos conhecimentos relativos às ocorrências e potencialidades desses recursos (particularmente quanto a solos, água, ecossistemas, recursos pesqueiros, minerais e de vegetação). Essa linha estratégica de ação compreende: a complementação da base informacional existente e inventário correspondente à coleta, análise e interpretação de informes sobre localização, quantificação e qualificação dos recursos potenciais; o planejamento dirigido à execução aprofundada de estudos e pesquisas voltados para áreas selecionadas na fase do inventário e a valorização, caracterizada como definidora de alternativas econômicas de aproveitamento, em variados níveis de tecnologias, a depender de condicionamento e vantagens detectados.

4.3.6 - Democratização e Descentralização do Aparelho Político-institucional

A efetivação das políticas anteriormente propostas está a exigir mudanças institucionais importantes dentro do aparelho governamental e nas relações do Estado com a sociedade.

A - Democratização do Aparelho do Estado

O processo de democratização implica a mudança das relações entre o Estado e a sociedade civil, abrindo espaço para que todos os seus segmentos se manifestem e participem, efetivamente, da definição e da execução das políticas públicas, não se limitando a sua participação a meras consultas para legitimação de ações governamentais.

Nessa perspectiva, é fundamental que as instituições civis sejam explicitamente reconhecidas como entidades legítimas de atuação junto às administrações públicas, na defesa dos interesses da sociedade, descartando-se, entretanto, seu tutelamento pelo Poder Público.

Para que a sociedade civil, em sua totalidade, possa acompanhar a ação do Estado, definem-se como prioritárias as seguintes diretrizes:

- assegurar o desenvolvimento de ações de educação comunitária, visando garantir a participação da população, seja no nível da definição dos critérios de prioridade da programação global e setorial, ou no nível dos instrumentos a serem utilizados no processo educativo;

- garantir a livre organização e atuação das instituições de base, como sindicatos, organizações comunitárias e entidades profissionais, desatrelando-as do controle do Estado e requerendo, inclusive, a revisão dos diplomas legais, de caráter restritivos;

- eliminar procedimentos formais e burocráticos que dificultam ou mesmo impedem o acesso das entidades de base aos órgãos do Poder Público:

- restringir a ação do aparelho de segurança ao estrito cumprimento das leis, assegurando a ordem pública e a efetiva competição entre os diversos agentes sociais;

- criar canais de comunicação entre o Estado e os sindicatos, como forma de possibilitar a participação dos trabalhadores na revisão dos mecanismos de regulação do mercado de trabalho e na fiscalização do cumprimento da legislação trabalhista. Atenção especial deve ser dada ao trabalho do menor e da mulher:

- garantir a livre circulação das informações, em todos os níveis e planos internos da administração pública, facilitando o acesso da sociedade a essas informações;

- criar canais institucionais, nos níveis regional, estadual e municipal (Conselhos de Desenvolvimento, Comissões Técnicas ou outras modalidades), que garantam a participação efetiva das organizações da sociedade na formulação e na implementação de políticas, planos e programas governamentais. Com referência aos Conselhos e Comissões já existentes, reformular seus segmentos, a fim de incluir a participação de organizações de base;

- considerar o nível municipal como instância privilegiada para efetivação da gestão democrática, por se constituir o espaço real no qual se manifestam mais concretamente os interesses da sociedade;

- com relação, especificamente, à SUDENE, a participação das organizações da sociedade civil deverá ser institucionalizada em duas instâncias: no Conselho Deliberativo e na Secretaria Executiva, por meio de Comissões Setoriais;

- garantir o acesso ao Serviço Público a todos os segmentos da sociedade, pela instituição de concurso público em todos os níveis da administração;

- apoiar formas associativas de produtores, especialmente cooperativas, facultando-lhes o acesso aos meios de produção e estendendo-lhes os benefícios previstos no Estatuto das Microempresas.

B - Descentralização dos Níveis Decisórios e Desconcentração dos Recursos Financeiros

O processo de descentralização administrativa e financeira deve ser entendido como fortalecimento da autonomia dos Governos estaduais e municipais, como modificação da sistemática de transferências de recursos intergovernamentais e como redefinição das competências específicas em cada nível de Governo. Por outro lado, propicia condições favoráveis à participação de toda a sociedade na gestão pública, na medida em que as decisões serão tomadas em níveis mais próximos às comunidades.

Nessa perspectiva, a política adotada deverá seguir as seguintes diretrizes:

- restabelecer o sistema de planejamento nacional, privilegiando as instâncias regionais como instrumentos de articulação e coordenação entre o nível federal e os níveis estadual e municipal;

- fortalecer a empresa pública como elemento fundamental para viabilizar a desconcentração do processo de crescimento econômico;

- realizar uma reforma da Administração Pública como forma de evitar superposições e paralelismos e dar unidade de comando;

- descentralizar as decisões e regionalizar os orçamentos do Governo Federal;

- redefinir competências entre as diversas esferas do Governo, de modo a resgatar o federalismo e fortalecer a autonomia municipal;

- incentivar as diversas modalidades de associações dos Governos municipais, no sentido de lhes possibilitar um melhor atendimento às necessidades das suas comunidades;

- descentralizar a Administração Municipal das grandes e médias cidades mediante a criação de subprefeituras;

- criar mecanismos fiscais específicos de proteção à indústria e à agricultura nordestinas, bem como mecanismos que impeçam a transferência de recursos oriundos de investimentos realizados na Região, com apoio público, para outras áreas do País;

- consolidar o papel da SUDENE de articulação com os Governos Estaduais, seus organismos financeiros e o Banco do Nordeste do Brasil (BNB), no sentido de formular programas de investimento e promover a multiplicação de projetos que se habilitem a recursos de fontes nacionais e externas;

- fortalecer o BNB, assegurando-lhe novos recursos e condições estruturais de maior dinamismo;

- realizar ampla reforma tributária que privilegie Estados e Municípios, como base para a restauração do sistema federativo, devendo-se observar a seguinte orientação:

- a reforma tributária deverá contribuir para equilibrar a distribuição espacial da renda nacional, institucionalizando-se mecanismos de equalização tributária, de modo a assegurar recursos significativos aos Estados e Municípios, mais pobres;

- a arrecadação tributária e, também, a distribuição da receita pública, deverão obedecer à repartição dos encargos e responsabilidades entre as diversas esferas da administração pública;

- o redimencionamento da carga tributária deverá orientar-se pelo princípio da justiça fiscal, objetivando uma mais justa relação entre o contribuinte e sua capacidade contributiva e uma incidência maior dos tributos diretos;

- o sistema tributário deverá proporcionar aos Estados e Municípios instrumentos de política fiscal que lhes permitam orientar as atividades produtivas em seus respectivos territórios;

- a reforma tributária deverá tornar automáticas as transferências aos Estados e Municípios, desvinculando-as de quaisquer aplicações específicas.