Presidência da República

Casa Civil
Comissão Mista de Reavaliação de Informações

 

SÚMULA Nº 7, de 2015.

 

A COMISSÃO MISTA DE REAVALIAÇÃO DE INFORMAÇÕES, tendo em vista o disposto no inciso III do art. 10 do seu Regimento Interno, aprovado por meio da Resolução nº 1, de 21 de dezembro de 2012,

RESOLVE:

Art. 1º Fica aprovada a seguinte Súmula:

Súmula CMRI nº 7/2015

“CONSELHOS PROFISSIONAIS – Não são cabíveis os recursos de que trata o art. 16 da Lei nº 12.527, de 2011, contra decisão tomada por autoridade máxima de conselho profissional, visto que estes não integram o Poder Executivo Federal, não estando sujeitos, em consequência, à disciplina do Decreto nº 7.724/2012.”

Justificativa

Votos-vista do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG) que apreciaram os recursos relativos aos processos nº 00217.000583/2014-47 e nº 00217.000302/2014-56, interpostos à Comissão Mista de Reavaliação de Informações (CMRI) na forma do art. 24 do Decreto nº 7.724 , de 16 de maio de 2012, mediante o qual os recorrentes requerem a revisão das decisões proferidas em pedidos de acesso à informação dirigidos ao Conselho Regional de Medicina Veterinária do Paraná (CRMV-PR) e ao Conselho Regional de Química da Nona Região (CRQ/IX), respectivamente, aprovados por unanimidade pela CMRI na 30ª Reunião, ocorrida no dia 25 de março de 2015:

“Tenho a opinião de que os conselhos profissionais não integram a estrutura do Poder Executivo federal não estando a sua administração vinculada ao Estado. Acerca da questão, o Parecer Jurídico nº 0911-7.14/2014/AGD/CGU/AGU, expedido pela Consultoria Jurídica junto ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, órgão encarregado da organização administrativa do Governo Federal (Decreto nº 8.189, de 21/01/2014), assim discorreu:

“No entanto, os conselhos profissionais não se constituem com a participação do Estado em seu órgão dirigente, que é composto integralmente por representantes da própria classe disciplinada pela entidade, eleitos por seus associados, e consequentemente são estes que também elaboram os regulamentos a serem seguidos na área de atuação da entidade. A Administração Pública não influencia suas decisões. Além disso, os recursos de que dispõe são oriundos das contribuições pagas pela respectiva categoria, não lhes sendo destinados recursos orçamentários nem fixadas despesas pela lei orçamentária anual.

Em razão das características acima apontadas, a Lei nº 9.649, de 1998 admitiu a delegação da atividade de fiscalização profissional a entidades de direito privado. Contudo, o Supremo Tribunal Federal, na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.717/DF, julgou inconstitucional o disposto no art. 58 do referido ato normativo, por entender indelegável a uma entidade privada a atividade típica de Estado, que abrange o poder de polícia, o de tributar e o de punir, no que concerne ao exercício de atividades profissionais regulamentadas, verbis:

EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 58 E SEUS PARÁGRAFOS DA LEI FEDERAL Nº 9.649, DE 27.05.1998, QUE TRATAM DOS SERVIÇOS DE FISCALIZAÇÃO DE PROFISSÕES REGULAMENTADAS. 1. Estando prejudicada a Ação, quanto ao § 3º do art. 58 da Lei nº 9.649, de 27.05.1998, como já decidiu o Plenário, quando apreciou o pedido de medida cautelar, a Ação Direta é julgada procedente, quanto ao mais, declarando-se a inconstitucionalidade do "caput" e dos § 1º, 2º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º do mesmo art. 58. 2. Isso porque a interpretação conjugada dos artigos 5°, XIII, 22, XVI, 21, XXIV, 70, parágrafo único, 149 e 175 da Constituição Federal, leva à conclusão, no sentido da indelegabilidade, a uma entidade privada, de atividade típica de Estado, que abrange até poder de polícia, de tributar e de punir, no que concerne ao exercício de atividades profissionais regulamentadas, como ocorre com os dispositivos impugnados. 3. Decisão unânime.

É importante atentar que o precedente em tela se trata de decisão proferida em processo objetivo, no qual, portanto, não foram analisadas todas as peculiaridades inerentes ao regime jurídico a ser considerado em relação aos conselhos de fiscalização profissional, bem como a análise da constitucionalidade do modelo já posto, restringindo-se o âmbito de discussão, neste julgamento, à matéria disposta no art. 58, caput e §§ 1º, 2º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º da lei impugnada.

Segundo Carlos Ari Sundfeld e Jacintho Arruda Câmara:

“Para classificar tais entidades de modo adequado é necessário considerar todas as suas características. O equívoco que se observa em boa parte das propostas de interpretação está em privilegiar um tipo de característica em detrimento de outro. Como não se encontra, entre as categorias tradicionais de classificação, um modelo que apresente as peculiaridades das entidades de fiscalização profissional, acaba-se estabelecendo uma dicotomia, na qual só restaria como opção enquadrá-las como parte da Administração indireta ou como entidade privada.

A superação desse impasse se dá com a separação de duas realidades distintas: a natureza pública, de um lado, e a estatal, de outro. Todavia, por vezes esta distinção é esquecida. De um modo geral se pretende vincular a natureza de direito público à estrutura burocrática que integra o Estado. A premissa da qual se parte é a de que, por ser público, o ente também seria, necessariamente, estatal. A recíproca também é tida como verdadeira. Desta outra forma entende-se que se não for estatal, o ente só poderia ostentar natureza jurídica de direito privado.

Acontece que não há relação necessária entre possuir natureza de direito público e integrar a estrutura estatal. Deveras, não é todo ente estatal que apresenta regime jurídico de direito público, bem como não é necessário que todo ente público faça parte da estrutura estatal.

(...)

Referidas entidades são públicas por determinação da própria lei que as instituiu. A razão para atribuir esse regime jurídico é fácil de identificar. Algumas das funções para as quais essas entidades foram criadas envolvem o exercício de poder de autoridade, atributo típico de Poder Público. Tais competências dizem respeito, por exemplo, à habilitação de pessoas para o exercício profissional, à edição de regulamentos sobre práticas profissionais, à aplicação de sanções disciplinares, entre outras.

Prerrogativas e sujeições tipicamente públicas também lhes foram atribuídas. As entidades são autorizadas por lei a cobrar anuidades de seus membros, podendo, no caso de inadimplência, lançar mão de execução fiscal; gozam de imunidade de impostos; sujeitam-se a controle do Tribunal de Contas, para citar alguns exemplos de aplicação mais freqüente e incontroversa do regime jurídico de direito público.

Nada disso, porém, significa dizer que as entidades de fiscalização profissional foram tratadas por lei como parte integrante da Administração. Muito pelo contrário. Acompanhando uma tendência presente no direito comparado, a regulação das atividades profissionais no Brasil foi atribuída a entidades de caráter corporativo, com personalidade de direito público, mas visivelmente destacadas da estrutura burocrática estatal.[1]

Com efeito, os conselhos profissionais são regidos por um regime jurídico especial que os diferencia das típicas autarquias. Isto porque, ao contrário destas, são dotados, como aduz Diogo de Figueiredo Moreira Neto, de “total autonomia em relação à entidade política matriz”.[2] No ponto, vale citar a lição de Lucas Rocha Furtado, que reconhece, assim como Carlos Ari Sundfeld e Jacintho

Arruda Câmara, que as entidades em comento não integram a Administração Pública:

“Dado que são autarquias, a elas se aplica o Direito Público, porém, em função de particularidades que lhes são próprias, de forma mitigada. A Constituição Federal dispõe, por exemplo, que a criação de cargos, empregos ou funções públicas depende de lei. Seria, portanto, necessária a aprovação de lei federal para criar um emprego de secretária ou ascensorista ou qualquer outro para o Conselho de Educação Física, por exemplo?

Parece-nos que a observância das normas públicas não pode ocorrer de forma plena ou absoluta sob pena de se mostrar, por vezes, totalmente absurda.

São autarquias especiais. A sua especialidade – e neste ponto não podem ser confundidas com as autarquias em regime especial – está no fato de que não integram a Administração Pública. Elas não se subordinam ou vinculam a nenhuma outra entidade. No desempenho de suas atribuições, devem dispor de plena e absoluta liberdade administrativa, gerencial, financeira, orçamentária, tendo como limite a lei que as criou e os princípios constitucionais.[3]

Veja-se que a particular disciplina a que se submetem os conselhos de fiscalização profissional não é idêntica àquela das típicas autarquias públicas, mas é outra, de natureza híbrida, em que até lhe são aplicáveis algumas normas de direito público, mas sem lhes retirar a característica essencial da ampla independência, autonomia e atuação desatrelada da administração pública federal, o que as aproxima das entidades paraestatais. Pode-se afirmar, portanto, que os conselhos profissionais não se submetem às mesmas normas que regem as entidades que tradicionalmente integram administração pública indireta.

Nesse sentido, transcrevo alguns trechos do voto do Ministro Maurício Corrêa, por ocasião do julgamento do MS nº 21.797/RJ:

“Mesmo que esses Conselhos sejam autarquias, segundo a definição de uns, porém nunca deixarão de ser autarquias corporativas peculiares, em seu sentido particularíssimo, contudo, jamais aquelas especiais integrantes indiretas do Serviço Público, como tal organizado em carreira à imagem do estampado dogmaticamente na Constituição.

(...)

Seria um contra-senso que a ação estatal se fizesse em setor de exclusiva atuação da iniciativa privada, para impor o cumprimento de certo regime para os seus empregados, de que defluiriam prerrogativas, privilégios, ônus e encargos, que ao Estado não é dado constranger ao ente paraestatal a que o faça. Nenhuma lei criou cargos públicos em Conselhos Profissionais, e seria absolutamente inadmissível, inconcebível e ininteligível mesmo, que por uma interpretação analógica e ampliativa, viesse o Estado a exigir que essa categoria de empregados se convertesse em servidores públicos, circunstância que por si só já acarretaria a ele mesmo, pesados ônus, decorrentes das consequências dessa absurda metamorfose.

Em posição semelhante, dispôs o Tribunal de Contas da União, no recurso de reconsideração do Conselho Regional de Nutrição da 5ª Região, TC 010.983/2000-6, contra a decisão prolatada na sessão de 31.10.2000 (relação nº 80/2000), Acórdão nº 042/2002, 1ª Câmara:

“...a posição reiterada dessa Corte tem sido no sentido de que os conselhos profissionais encontram-se obrigados a promover concurso publico previamente à contratação de pessoal. No sentido dessas decisões, concurso público é, dentre outras características, aquele amplamente divulgado ao conhecimento público, no qual restem pública e previamente estabelecidos os requisitos para candidatura e a sistemática de avaliação dos candidatos, e garantam objetividade na avaliação. Não há como considerar que meros processos seletivos de publicidade e isonomia limitados, atendem aos ditames constitucionais incidentes sobre entidades regidas pelo direito público (art. 37, inciso II, da CF). Ressalto, aqui, não se estar afirmando que os conselhos devem promover concurso público nos moldes da Lei n. 8.112/90, mas sim conforme determinação e princípios constitucionais, nos moldes, por exemplo, daqueles já promovidos por diversas empresas estatais.

Pode-se concluir que o regime a que estão submetidos os conselhos profissionais não se adequam completamente às prescrições constitucionais pertinentes ao regime jurídico das entidades de direito público que integram a Administração Pública, bem como não se compatibiliza com a disciplina prevista no Decreto-Lei nº 200/67.

Os conselhos de fiscalização profissional não foram concebidos como entes vinculados ao Estado, e dessa forma se desenvolveram, sem qualquer ingerência estatal em relação à estrutura, administração, com seus dirigentes eleitos diretamente pelos próprios associados, o mesmo ocorrendo quanto à sua receita, não estando submetidas a qualquer controle por parte da administração centralizada, apenas ao controle externo, ligado aos poderes Judiciário e Legislativo, mas sem vincular-se ou subordinar-se a qualquer órgão público, portanto, sem admitir qualquer influência do Estado na sua administração.

Com efeito, seu desenvolvimento como entidades corporativas fechadas, com estrutura e funcionamento completamente apartado da administração pública federal, demonstra ainda uma independência ampla do Estado, não apenas nos seus aspectos estruturais, ligados à sua organização, completamente alheios à disciplina prevista no Decreto-Lei nº 200, de 1967, mas também quanto ao regime jurídico aplicado em relação aos seus bens, receitas, despesas, finanças, contabilidade, compras, contratos e pessoal.

Pelos fundamentos expostos, a natureza pública das entidades de fiscalização profissional não implica que integrem a estrutura do Estado nem tampouco que façam parte do Poder Executivo federal.

Em consequência, o Decreto nº 7.724, de 2012, que regula os procedimentos de garantia do acesso às informações no âmbito do Poder Executivo federal, é inaplicável no caso concreto.

No que toca à aplicabilidade da Lei nº 12.527, de 2011 aos conselhos profissionais, embora seu art. 1º, que trata de sua abrangência subjetiva, não tenha feito menção expressa a estes órgãos, declara que se trata do regulamento legal do inciso XXXIII do art. 5º da Constituição Federal que dispõe acerca do direito à informação a ser obtida perante os órgãos de natureza pública. Portanto, entendo pela aplicabilidade das regras legais aos conselhos profissionais que detém autonomia para regular seus procedimentos internos na forma como entenderem cabível.”

Assim, apesar de geralmente constituídas sob a forma de autarquias, o que resulta na submissão ao regime de acesso à informação previsto na Lei de Acesso a Informação, a natureza pública singular das entidades de fiscalização profissional não implica que integrem a estrutura do Estado nem tampouco que façam parte do Poder Executivo federal, de modo que não cabe atribuir à CGU e à CMRI o poder revisional das respostas a pedidos de acesso às informações proferidas por conselhos profissionais.

Diante disso, a CMRI entende ser aplicável a Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2012) aos conselhos profissionais, não sendo aplicável, contudo, os recursos de que tratam o art. 16 da Lei às decisões exaradas pelas autoridades máximas dos conselhos profissionais. Igualmente inaplicável a esses órgãos é o Decreto nº 7.724, de 2012, que regulamenta, no âmbito do Poder Executivo federal, a Lei de Acesso a Informação.

 

Membros

 

LEILA DE MORAIS

Casa Civil

Presidente

Gen. GERALDO ANTÔNIO MIOTTO

Gabinete de Segurança Institucional

JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA

Ministério das Relações Exteriores

CARLOS AUGUSTO MOREIRA ARAÚJO

Ministério da Fazenda

MARCO ANTÔNIO JULIATTO

Secretaria de Direitos Humanos

FERNANDO LUIZ ALBURQUERQUE FARIA

Advocacia-Geral da União

GILBERTO WALLEU JÚNIO

Controladoria-Geral da União

MARIVALDO DE CASTRO PEREIRA

Ministério da Justiça

GUILHERME ESTRADA RODRIGUES

Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão

 



[1] SUNDFELD, Carlos Ari; CÂMARA, Jacintho Arruda. Conselhos de fiscalização profissional: entidades públicas não-estatais, in RDE – Revista de Direito do Estado, SP, nº 4, out/dez/06, p. 321/33.

[2] MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de Direito Administrativo. Rio de janeiro: Forense, 2014, p. 284.

[3] FURTADO, Lucas Rocha. Curso de Direito Administrativo. Belo Horizonte: Editora Forum, 2012, p. 160.