Presidência
da República |
MENSAGEM Nº 140, DE 14 DE ABRIL DE 2003.
Senhor Presidente do Senado Federal,
Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do § 1o do art. 66 da Constituição Federal, decidi vetar integralmente, por contrariedade ao interesse público e inconstitucionalidade, o Projeto de Lei no 2.859, de 1997 (no 21/97 no Senado Federal), que "Dispõe sobre norma geral de organização que torna obrigatória a avaliação psicológica periódica dos integrantes das polícias e corpos de bombeiros militares e civis".
Ouvido, o Ministério da Saúde assim se manifestou:
"Em que pese o projeto de lei estar imbuído da melhor intenção, no sentido de considerar o forte potencial de dano psíquico a esses profissionais que o seu dever de oficio ocasiona e a própria organização do trabalho propicia, como foi bem explicitado na justificativa do projeto (permanente estado de incerteza e risco, jornadas de trabalho estafantes, cotidiano infernal etc.), é preciso avaliar com muita cautela a iniciativa, sob pena de se atuar nas conseqüências e pouco ou nada se atuar nas causas dos problemas enunciados.
Além disso, a avaliação psicológica de perfil ocupacional, efetuada como condição pré-admissional, em que pese suas falhas, é um procedimento, se bem aplicado, desejável e consagrado, especialmente nesses ofícios. No entanto, sua realização periódica, não acrescentará ou suprimirá dados que modifiquem o perfil ocupacional, salvo se a 1ª avaliação não tiver se realizado adequadamente, o que contrariaria o ingresso do avaliado na corporação. Portanto, a avaliação psicológica periódica só teria sentido como avaliação clínica, e não como avaliação de perfil ocupacional. Pois bem, uma avaliação clínica do estado psicológico de qualquer cidadão, requer uma demanda, ou voluntária, ou por encaminhamento médico, no caso de haver sinais inequívocos de perturbação psicológica de qualquer ordem. E uma avaliação clínica deste jaez requer um ritual de procedimentos para um diagnóstico mais preciso e definitivo, que, em absoluto, um único exame é capaz de alcançar. E, ainda, um exame psicológico clínico periódico, a priori, remete-nos a um estado de vigilância permanente de caráter policial (sem trocadilho), em que os profissionais a cada período seriam submetidos a um crivo de eficácia duvidosa sobre sua saúde mental e conseqüente aptidão ou não para o desempenho profissional. Trata-se de ato altamente discriminatório que, por deliberação do examinado, contrária ou favorável a um determinado parecer, suscitará, com certeza, situações permanentes de controvérsia, dada não só à eficácia duvidosa dessa avaliação, como à evidente possibilidade de que conflitos de caráter administrativo-organizacional sejam considerados como perturbações de ordem mental, especialmente no pessoal de categorias subalternas, como aliás é bem conhecido na história da conduta de regimes totalitários com seus dissidentes.
Deste modo, o que se deve propor como alternativa ao sofrimento psíquico desses trabalhadores, e também de outras categorias sujeitas a situações tão ou mais geradoras de dano psíquico, como é o caso de profissionais de saúde, segurança, transportes, só para citar alguns, está muito além de uma avaliação psicológica clínica periódica."
O Ministério da Justiça acrescentou a seguinte manifestação:
"O projeto veicula preceitos normativos que alteram o regime jurídico dos servidores (policiais e corpos de bombeiros civis e militares), uma vez que a avaliação psicológica periódica diz respeito ao exercício da função.
A Constituição de 1988 estabelece no art. 61, § 1o, II, "c", que são de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que disponham sobre servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria.
Neste sentido, o projeto de lei em exame, de iniciativa de parlamentar, ao versar sobre matéria reservada ao Chefe do Poder Executivo pela Constituição Federal, apresenta vício insanável de inconstitucionalidade."
Estas, Senhor Presidente, as razões que me levaram a vetar o projeto em causa, as quais ora submeto à elevada apreciação dos Senhores Membros do Congresso Nacional.
Brasília, 14 de abril de 2003.
Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 15.4.2003