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Presidência da República
Secretaria-Geral
Subchefia para Assuntos Jurídicos

DECRETO DE 12 DE JULHO DE 1821

 

Desenvolve e determina os principios que sobre a liberdade de imprensa se acham estabelecidos nos arts 8º, 9º e 10 das Bases da Constituição.

D. João por Graça de Deos e pela Constituição da Monarchia, Rei do Reino Unido de Portugal, Brazil e Algarves, d'aquern e d'alem Mar em Africa etc. Faço saber a todos os meus Subditos que as Côrtes Decretaram o seguinte:

As Côrtes Geraes Extraordinarias e Constituintes da Nação Portuguesa, querendo desenvolver, e determinar os princípios, que sobre a liberdade da imprensa estabeleceram os art. 8º, 9º e 10 das Bases da Constituição, por conhecerem que aquella liberdade é o apoio mais seguro do systema Constitucional, Decretam o seguinte:

TITULO 1

SOBRE A EXTENSÃO DA LIBERDADE DA IMPRENSA

Art. 1.º Toda a pessoa póde da publicação desta Lei em diante imprimir, publicar, comprar e vender nos Estados Portuguezes quaesquer livros ou escriptos sem prévia censura; e só com as declarações seguintes:

Art. 2.º A faculdade de imprimir qualquer livro, ou escripto original, ou traduzido, constitue propriedade vitalicia do seu autor ou traductor, a qual ainda pertencera a seus herdeiros, e successores por espaço de 10 annos. Quando o autor ou traductor fôr sociedade Iitteraría, ou outra qualquer corporação, gozará da mesma propriedade por tempo de 60 annos.

Art. 3.º Quem imprimir qualquer livro ou escripto, que nos termos do artigo antecedente constitua propriedade de outrem, perderá todos os exemplares delle para o proprietario; e se não chegarem ao numero de mil, pagara mais o valor dos que faltarem para preencher este numero.

Art. 4º Todo o escripto impresso nos Estados Portuguezes deve ter estampado o lagar, e anno da impressão, e o nome do impressor.

Art. 5.º Quem imprimir, vender, ou publicar qualquer livro ou escripto sem alguns dos requisitos mencionados no artigo precedente, será condemnado em 30$000.

Art. 6.º Quem falsificar algum dos requisitos mencionados no art. 4°, será condemnado em 50$000; e se com essa falsificação attribuir o impresso a alguma pessoa existente, será condemnado no dobro desta pena.

Art 7.° O autor ou editor de escriptos impressos nos Estados Portuguezes, e o impressor delles, quando não conste quem seja o seu autor, ou editor, responderão por todo o abuso, que nelles se fizer da liberdade da imprensa, nos casos determinados nesta Lei: e bem assim o livreiro, ou publicador, pelos abusos, que se commetterem nos escriptos, que vender, ou publicar impressos em Paizes Estrangeiros, quando contiverem expressões, ou estampas obscenas, ou Iíbellos famosos.

TITULO II

DOS ABUSOS DA LIBERDADE DA IMPRENSA E DAS PENAS CORRESPONDENTES

Art. 8º Pode abusar-se da liberdade da imprensa: 1º contra a religião catholíca romana: 2º contra o estado; 3° contra os bons costumes; 4° contra os particulares.

Art. 9.º Todos os delictos comprehendidos no artigo antecedente serão qualificados em primeiro, segundo, terceiro, ou quarto grão, em attenção as diversas circumstancias, que podem augmentar, ou diminuir a sua gravidade.

Art. 10. Abusa-se da liberdade da imprensa contra a religião: 1º quando se nega a verdade de todos, ou de algum dos dogmas definidos pela Igreja; 2°, quando se estabelecem, ou defendem dogmas falsos ; 3°, quando se blasfema, ou zomba de Deos, dos seus Santos, ou do culto religioso approvado pela Igreja

Art. 11. Quem abusar da liberdade da imprensa contra a religião Catholica Romana em primeiro gráo, será condemnado em um anno de prisão e 50$000 em dinheiro; no segundo em oito mezes de prisão e 50$000; no terceiro em quatro mezes de prisão e 50$000; e no quarto em 50$000 sómente.

Art. 12. Abusa-se da liberdade da imprensa contra, o Estado: 1°, excitando os povos directamente á rebellião : 2º, provocando-os directamente a desobedecer as leis, os as autoridades constituidas; 3°, atacando a fórma de Governo Representativo, adoptada pela. Nação; 4°, infamando, ou injuriando o Congresso Nacional, ou o Chefe do Poder Executivo.

Art. 13. Quem abusar da liberdade da, imprensa contra o Estado em primeiro gráo, será condemnado em cinco annos de prisão e 600$000 em dinheiro; no segundo, em tres annos de prisão e 400$000 ; no terceiro, em um anno de prisão e 200$000 ; no quarto em tres mezes de prisão e 100$000; e sempre que se verificar abuso em algum dos dous primeiros grãos, accrescerá as penas estabelecidas a do perdimento dos cargos publicos que o delinquente occupar ; e sendo Ecclesiastico, a inbibição do exercicio dos seus officios, e a privação dos redditos dos seus Beneficios, no primeiro gráo perpetuamento e no segundo por seis annos.

Art. 14. Abusa-se da liberdade de imprensa, contra os bons costumes: 1º, publicando escriptos, que ataquem directamente a Moral Christã recebida pela Igreja Universal; 2°, publicando escriptos ou estampas obscenas.

Art. 15. Quem abusar da liberdade da imprensa contra os bons costumes em primeiro gráo, será condemnado em 50$000 ; no segundo, em 40$000 ; no terceiro, em 30$000; e no quarto, em 20$000.

Ar1. 16. Abusa-se da liberdade da imprensa contra os particulares: 1º, imputando a alguma pessoa, ou corporação, qualquer facto criminoso, que daria logar a procedimento judicial contra ella ; 2°, imputando-lhe vícios ou defeitos, que a exporiam ao odio, ou despreso publico; :3° insultando-a com termos de desprezo, ou ignominia.

Art. 17. Quem abusar da liberdade da imprensa contra os particulares em primeiro gráo, será condemnado em 100$000; no segundo, em 80$000; no terceiro, em 60$000; no quarto, em 40$000; e além destas penas haverá em todos os gráos a reparação civil do danno e injuria, sempre que os Juizes de Facto declararem ter logar.

Art. 18. Haverá reincidencia em qualquer dos casos mencionados nesta Lei, applicar-se-ha a pena correspondente, multiplicada pelo numero das reincidencias; nos casos do art. 16 somente se verificará reincidencia havendo identidade do delicto e da pessoa ofendida.

Art. 19. Será livre de toda a pena quem provar os crimes, que Imputou, quando forem contra o Estado, ou consistirem em abusos de autoridade commettidos por algum empregado publico: e o nos outros casos, quando o facto imputado estiver julgado provado em juizo anterior, ou interessar ao publico, ou ao particular, não havendo animo de injuriar.

Art. 20. Em todo o caso porém de abuso da liberdade da imprensa serão supprimidos todos os exemplares daquelle impresso em que se verificar, estando nas mãos do autor, editor, impressor, vendedor, ou distribuidor; e quem vender, ou distribuir algum depois desta suppressão, fícará incurso nas penas impostas ao autor ou editor.

Art. 21. Em todos os casos, em que por esta Lei é imposta, ao delinquente pena pecuníaria, não tendo elle por onde pague será condemnado em tantos dias de prisão, quantos corres- ponderem à quantia, em que for multado, na razão de 1$000 por cada dia.

TITULO III

DO JUIZO COMPETENTE PARA CONHECER DOS DELICTOS COMMETTIDOS POR ABUSO DA LIBERDADE

Art. 22. O conhecimento, e qualificação dos delictos commettidos por abuso da liberdade da imprensa pertencerá aos conselhos de Juizes de Facto, que para isso se crearão nos Districtos.

Art. 23. Em cada um daquelles Districtos se formarão dons conselhos de Juizes de Facto: o primeiro será composto de nove vogues, e o segundo de 12 : haverá também um Juiz de Direito, que no Districto de Lisboa será o Corregedor do Crime da Côrte ; no do Porto o Corregedor da primeira vara do Crime; e nos outros Districtos os Corregedores das respectivas Capitaes ; e haverá igualmente um Promotor da Justiça.

Art. 24. Para exercerem o cargo de Juizes de Facto serão eleitos 48 homens bons, que sejam cidadãos em exercício de seus direitos, de idade de 25 annos pelo menos, residentes no Districto, e dotados de conhecida probidade, intelligencia, e boa fama; além destes se elegerão mais 12 substitutos, dotados das mesmas qualidades: e um para Promotor, e outro para seu Substituto, que, além de possuírem aquellas qualidades, deverão ser bachareis formados em algumas das faculdades juridicas. Não poderá ser eleito para Juiz do Facto quem o não puder ser para eleitor de Comarca.

Art. 25. A eleição das pessoas mencionadas no artigo antecedente será feita pelos eleitores da comarca, ou comarcas, que formam o Districto, reunidos para isso na Capital delle, sob a Presidencia do Juiz de Direito, bastando que concorram aquelles eleitores, que ao tempo da eleição se acharem residindo no Districto.

Art. 26. A primeira eleição será feita logo que esta lei se publicar, expedindo os Presidentes respectivos avisos aos Eleitores para que em dia certo se reunam nas Capitaes dos Districtos, aonde se farão as eleições por listas, e á maioridade relativa de votos. As eleições seguintes serão feitas logo depois das dos Deputados de Côrtes pela mesma fórma, que para estas se prescrever na Constituição.

Art. 27. Nenhum cidadão poderá escusar-se do cargo de Juiz de Facto, ou de Promotor, por motivos, ou pretexto algum; excepto o de impossibilidade moral, ou physica, legalmente provada perante a Junta Eleitoral, emquanto estiver reunida; ou perante a junta dos Juizes do Facto, quando se reunir em sessão periodica , na fóruma do art. 12. Si porém, a escusa fôr temporária, poderá conhecer dela o primeiro conselho mencionado no art. 23.

Art. 28. Finda a eleicão, o Presidente remetterá uma cópia della no Governo, o qual a fará publicar no seu Diario ; e o mesmo Presidente fará afixar na Capital do Districto uma lista das pessoas, que ficaram eleitas para exercerem as funções de Juizes de Facto.

Art. 29. As funções destes durarão de uma até outra legislatura : mas poderão ser reeleitos com intervallo do urna eleição. Estes Juizes no exercício das suas funcções gozarão dos mesmos direitos e imunidades, que competem aos Magistrados.

TITULO III

DA ORDEM DO PROCESSO NOS JUIZES SOBRE OS ABUSOS DA LIBERDADE DA IMPRENSA

Art. 30. Promotor será o Fiscal por parte do publico para dar a denuncia, e promover a accusação dos delictos commettidos por abuso da liberdade da imprensa : e o mesmo fica sendo permettido a todo e qualquer cidadão ; excepto nus casos do art. 16, em os quaes somente as pessoas offendidas o poderão fazer: concorrendo mais do que um denunciante, ficará sondo considerado como talo primeiro que denuciar ; o os mais como assistentes, se ti verem concorrido antes da contestação da lide.

Art. 31. A denuncia do impresso poderá ser feita perante o Juiz de Direito de qualquer dos Districtos : e sendo dada perante muitos, ficará preventa pelo primeiro a quem fôr apresentada.

Art. 32. O Juiz de Direito no primeiro caso do art. 12 logo depois da denuncia mandará proceder á prisão do réo, se pela inquirição de tres testemunhas, que deve tirar, deprehender quem seja, e a sequestro em todos os exemplares do impresso denunciado em qualquer dos casos desta, lei, estando na mão do autor, editor, impressor, vendedor, ou distribuidor.

Art. 33. lmmediatamente fará eleger o primeiro Conselho de Juizes de Facto: e para isso, concorrendo na casa da Camara em hora determinada com o Escrivão, a quem a denuncia tiver sido distribuida, com o Promotor, e denunciante, si o houver, estando á porta aberta, fará lançar em uma urna cedulas, em que estejam escriptos os nomes de cada uma das pessoas eleitas para Juizes de Facto; e fazendo depois de revolvida extrahir della por um menino nove das ditas cédulas, ficarão sendo eleitos para o primeiro Conselho aquelles, cujos nomes ellas designarem, e dos quaes o Escrivão fará assento em um livro destinado para esse fim, numerado, e rubricado pelo Juiz de Direito; e assignado o mesmo assento pelo dito Escrivão, e Juiz de Direito, se publicará por editaes affixados nos logares do costume.

Art. 34. Logo depois deste acto mandará o mesmo Juiz notificar cada um daquelles eleitos para que em dia, e hora determinada se reúnam na Capital do Districto, na casa da Camara : e aquelle que faltar será pela primeira vez condemnado em 20$000; pela segunda em 40$000 ; pela terceira em 60$000; e pela quarta em 80 dias de prisão, não justificando uma impossibilidade absoluta nos termos do art. 27.

Art. 35. Reunido o Conselho, o Juiz de Direito, á porta aberta, deferira a cada um dos Vogaes o juramento aos Santos Evangelhos para que bem e fielmente desempenhe os deveres do seu cargo: e entregando depois no Vogal primeiro na ordem da eleição o exemplar do impresso denunciado, e mais documentos, que instruirem o processo, lhes fará uma explicação exacta, e clara de tudo, e exporá a questão, que tem a examinar, e decidir, e que deve estar escripta nos autos do processo na fórma seguinte: « Este escripto contém motivo para se formar processo por tal abuso da liberdade da imprensa.

Art. 36. lmmediatamente se retirarão os Vogaes do Conselho para outra casa, a onde estando sós, presididos pelo primeiro na ordem da eleição, e á porta fechada, farão o exame do impresso, e mais documentos ; e depois de conferenciar entre si, declararão em resposta àquelle quesito si o impresso contém, ou não, motivo para se formar processo pelo abuso indicado; sendo preciso para decisão affirmativa que concorram pelo menos duas terças partes dos votos.

Art. 37. Escripta a declaração nos autos da denuncia por um dos Vogaes, e assignada por todos, sahirão para a primeira casa, aonde deve estar o Juiz de Direito, e em presença, delle, estando à porta aberta, lerá o Vogal, que serviu de Presidente, em voz alta aquella declaração.

Art. 38. Si a declaração fôr negativa, o Juiz de Direito proferirá sentença, em que julgue sem effeito a denuncia, e ordene a soltura do réo, estando preso, e o levantamento do sequestro dos exemplares do impresso, condernnando o denunciante nas custas da denuncia, quando tiver sido feita por algum particular. A denuncia assim julgada sem effeito não poderá ser repetida em outro Juizo pelo mesmo caso.

Art. 39. Si a declaração fôr affirmativa, o Juiz de Direito proferirá sentença, em que declare ter lagar a accusação, o ordene o sequestro em todos os exemplares do impresso denunciado existentes na mão do autor, editor, impressor, vendedor, ou distribuidor : e mande proceder á averiguação de quem seja o réo, e á prisão delle no primeiro caso do art. 12, quando se não tenha verificado pela diligencia ordenada no art. 32.

Art. 40. Proferida a sentença, seguir-se-ha a accusação do réo, que deve ser intentada no juizo do districto do seu domicilio: excepto no caso de ser denunciado por libellos famosos, porque nesses fica livre ao accusador intentar a accusação naquelle juizo ou no do proprio domicilio.

Art. 41. O Juiz de Direito, sendo-lhe apresentado o processo, que para, isso será entregue ao accusador, nos casos de delicto particular, e remettido pelo Correio officiosamente nos casos de delictos publicos, ficando em uns e outros por traslado no primeiro juizo, fará notificar o réo a requerimento da parte, ou do promotor, não a havendo, para que no dia da reunião do segundo Conselho compareça perante elle por si, ou por seu procurador.

Art. 42. Esta reunião se fará em Lisbôa, Coimbra e Porto de seis em seis semanas, nos outros Districtos do Reino de Portugal, e Algarves de tres em tres mezes ; o nos das ilhas adjacentes de seis em seis mezes, concorrendo todos os eleitos pira Juizes de Facto á Capital elo Distrícto por aviso do Juiz de Direito, quando houver processos para que seja precisa aquella reunião.

Art. 43. No dia aprazado, concorrendo o Juiz de Direito com os eleitos na casa da Camara, à porta aberta, e na, presença das partes, ou de seus procuradores, mandará fazer pelo Escrivão a chamada de todos, e fazendo escrever em cédulas os nomes que responderem, excepto o daquelles, que formaram o primeiro conselho, ordenará que se lancem em uma urna, e que depois procedendo-se na, fôrma do art. 33, se extraiam della os 12 que hão de formar o segundo Conselho.

Art. 44. O accusado, e accusador poderão recusar os Juizes que lhes forem suspeitos, a medida que seus nomes forem sahindo da urna: podendo o primeiro recusar até 20, e o segundo até 6 : si forem muitos os accusadores, dividirão o numero entre si, de maneira que nunca se recuse maior numero que o rie 20. Si, antes de se apurarem 12 Juizes não recusados se extrahirem da urna todas as cédulas, lançar-se-hão nella outras com os nomes dos substitutos, e se continuará na extracção até que haja 12 Juizes não recusados, com os quaes ficará formado o Conselho, para se proceder ao Juizo de Accusação.

Art. 45. Reunidos os Vogues do Conselho, á portas abertas, o Juiz lhes deferirá juramento na forma do art. 35, na presença das partes e de seus advogados ou procuradores: em caso de revelia do réo terá o Juiz nomeado um advogado que o defenda.

Art. 46. Immedíatamente perguntará ao réo o seu nome, sobrenome, idade, profissão, domicilio e naturalidade; si foi avisado do dia e hora da reunião do Conselho, e si recebeu copia do libello, com o do rol das testemunhas, tres dias antes da reunião; devendo para isso o Juiz de Direito ter dado logar ao autor para o offerecer antes desse termo. A estas perguntas se seguirão todas as outras, que se julguem necessarias para averiguação da verdade.

Art. 47. Ultimado o interrogatorio, ordenará, o Juiz de Direito ao Escrivão que leia a accusação do autor, a defesa que o réo deve ter apresentado, e mais peças do processo; e fará de tudo uma exacta e clara exposição para intelligencia dos Juizes de Facto, das partes e testemunhas.

Art. 48. Seguir-se-ha a inquirição das testemunhas, principiando pelas do autor e continuando com as do réo successlvamente; podendo as partes, ou seus procuradores contestai-as, e arguil-as sem que as possam interromper. Poderá depois o accusador fazer verbalmente a sua allegação juridica sobre a accusação, e provas, e o accusado defender-se pelo mesmo modo.

Art. 49. O Juiz fará então ao Conselho um relatório resumido do processo, expondo a, questão com todas as suas qualidades, indicando as provas produzidas por uma e outra parte, e os fundamentos principaes da accusação e defeza, e recommendando-lhe que deve consultar somente a voz da sua intima convicção, resultante do exame do processo e independente de formalidades judiciaes, lhe proporá as questões, que tom a decidir á vista do processo.

Art. 50. Estas questões serão reduzidas às formulas seguintes: 1º, o imporesso denunciado contém tal abuso da liberdade da imprensa? 2º, o acusado é criminoso dessa delicto? 3º, em que gráo é criminoso? Nos casos do art. 16 accrescentará o seguinte 4º quesito: Terá logar a reparação civil de damno e injuria?

Art. 51. Escriptos estes quesitos, o Juiz de Direito os entregará com todas as peças do processo ao Conselho por meio do Vogal primeiro na ordem da eleição; e retirando-se depois todos os Vogues para outra casa, estando sós, à porta fechada, e presididos por aquelle, farão o exame do processo, e depois de conferenciarem entre si decidirão em resposta ao 1º quesito, si o impresso contém, ou não, o abuso de que e arguido : em quanto ao 2°, si o accusado é, ou não, criminoso: em quanto ao 3º, si é no primeiro, segundo, terceiro ou quarto gráo: em quanto ao 4°, si tem, ou não, lagar a reparação do damno : sendo precisos nove votos para que se verifique a decisão affirmativa, o se determine o gráo propondo o Presidente cada um delles sucessivamente á votação.

Art. 52. Escripta cada uma destas decisões em resposta aos quesitos por um dos Vogaes, e assignada por todos, sahirão estes para a casa publica, onde deve estar o Juiz de Direito, e tomando assento, se levantará depois o Vogal, que serviu de Presidente, e dizendo em voz alta - O conselho dos Juizes de Facto, consultando a convicção intima da sua consciencia, entende que (lerá a declaração) entregará as decisões com o processo ao Juiz de Direito.

Art. 53. Si a decisão fôr de que o impresso não contém o abuso da liberdade da imprensa, de que é arguido, o Juiz de Direito proferirá sentença de absolvição do réo, mandando que seja, imediatamente posto em liberdade, estando preso, e que se relaxe o sequestro dos exemplares do impresso denunciado, condemnando nas custas do processo o denunciante si fôr particular.

Art. 54. Si a decisão fôr de que o Impresso contém abuso, e o accusado é criminoso, o Juiz de Direito proferirá sentença, em que applique a pena correspondente ao crime e ao grito e condemne o réo nas custas do processo, declarando qual e o artigo desta lei em que foi incurso e ordenando igualmente a suppressão de todos os exemplares do impresso denunciado, que estiverem na, mão do autor, editor, impressor, vendedor, ou distribuidor: e a reparação do damno, si tiver havido declaração de que tem logar.

Art. 55. Si a declaração fôr do que o impresso contém abuso, mas que o accusado não é criminoso, o Juizo de Direito ordenará na sentença a suppresão dos exemplares do dito impresso, mas que o accusado seja posto em liberdade, si estiver preso, declarando-o absolvido, e condemnando o accusador nas custas do processo, si fôr particular.

Art. 56. Quando o denunciado, ou accusado tiver sido absolvido, e o denunciante, ou accusador não fosse particular, as custas do processo serão pagas pelo corre da Capital do Districto, aonde se deve recolher a importancia das penas pecuniarias impostas em virtude desta Lei.

Art. 57. Da declaração dos Juizes de Facto não haverá recurso algum, excepto: 1º, si houver nullidado no processo por falta de algum dos requisitos exigidos nesta Lei; 2º, si o Juiz de Direito não applicar a pena correspondente.

Art. 58. Nos dous casos de artigo antecedente, poderão as partes appellar para o Tribunal Especial de Protecção da Liberdade da Imprensa: no 1º, para que remettido o processo ao Juiz de Direito, este convoque de novo o Conselho dos Juizes de Facto para o reformarem: e no 2º para que elle mesmo Juiz o reforme, applicando a pena correspondente. Em qualquer destes dons casos poderá o Tribunal condemnar o Juiz de Direito nas custas do processo de appellação.

Art. 59. A Sentença proferida pelo Juiz de Direito, não sendo appellada no decennio, passará em julgado, e se executará e publicará com a declaração do Conselho dos Juizes de Facto no Diario do Governo enviando para este fim o Juiz de Direito uma copia ao Redactor.

TITULO V

DO TRIBUNAL ESPECIAL DE PROTEÇÃO DA LIBERDADE DA IMPRENSA.

Art. 60. Haverá um Tribunal Especial para proteger a liberdade da imprensa, composto de cinco membros nomeados pelas Côrtes, no principio de cada Legislatura, e poderão ser reeleitos. Servirá de Presidente o primeiro na ordem da nomeação.

Art. 61. O mesmo Tribunal nomeará um Secretario, que não será de entre os seus membros, um Escripturario, e um Porteiro; e apenas eleito, fará um Regulamento para o seu governo interior, que proporá á approvação das Côrtes, bem como o ordenado para os ditos Secretario, Escripturario e Porteiro.

Art. 62. Os Membros do referido Tribunal terão de ordenado annual 600$000. Si porém perceberem de outro Emprego Publico um igual ordenado, nenhum outro vencerão por este titulo.

Ar1. 63. Este Tribunal terá as attribuIções seguintes : 1º, tomar conhecimento das appellações, que para elle forem interpostas na, forma dos arts. 57 e 58; 2°, propor ás Côrtes com o seu informe todas as duvidas, sobre que as autoridades, e Juizes o consultarem respectivas a observancia desta, Lei; 3° apresentar ás Côrtes no princípio de cada Legislatura uma exposição do estado, em que se achar a liberdade da imprensa, dos obstáculos que fôr preciso remover, e dos abusos que devam remediar-se.

Paço das Côrtes em 4 de Julho de 1821.

Portanto mando a todas as autoridades, a quem o conhecimento, e execução do referido Decreto pertencer, que o cumpram, e executem tão inteiramente como nelle se contém.

Dada no PaIacio de Queluz aos 12 dias do mez de Julho de 1821.

EL-REI com guarda

Ignacio da Costa Quintella

Carta de Lei, por que Vossa Magestade manda executar o Decreto das Côrtes Geraes Extraordinarias e Constituintes da Nação Portugueza, sobre a liberdade da imprensa, na fórma acima declarada.

Para Vossa Magestade ver.

Antonio da Silva Freire de Andrade Paysinho a fez.

Este texto não substitui o publicado na CLBR de 1821