ALVARÁ de 25 de JANEIRO de 1809
Sobre a confirmação das sesmarias, fórma da nomeação dos Juizes e seus salários.
Eu o Principe Regente faço saber aos que o presente Alvará com força de lei virem, que sendo-me presente em Consulta da Mesa do Desembargo do Paço que muito importava á prosperidade deste Estado remediar o abuso de se confirmarem as sesmarias sem preceder a necessaria medição, e demarcação judicial das terras concedidas, contra a expressa decisão do Decreto de 20 de Outubro de 1753, e de muitas outras ordens minhas, que o prohibiam, e que da transgressão dellas provinha a indecencia de se doarem terras que já tinham sesmeiros, e a injustiça de se dar assim occasião a pleitos e litigios, e á perturbação dos direitos adquiridos pelas anteriores concessões: propondo-se-me quanto cumpria, não só que se determinasse que não se passassem pela Mesa cartas de concessão de sesmarias, nem de confirmação das concedidas pelos Governadores e Capitães Generaes, sem se apresentarem medições e demarcações judiciaes legalmente feitas; mas tambem que para ellas se não retardarem, se nomeassem Juizes e Officiaes competentes, e se lhes taxasse conveniente salario: e merecendo a minha real consideração objecto de tanta importancia, para que se ajunte, quanto ser possa, o interesse do bem publico no augmento da agricultura e povoação deste vastíssimo Estado, que muito desejo promover e adiantar, com a segurança e manutenção dos sagrados direitos da propriedade, de cuja offensa resultaria o desaproveitamento das terras, e a despovoação: e não devendo por falta de providencias que facilitem as medições inutilizar-se, e frustrar-se a sabia legislação das sesmarias : conformando-me com o parecer da mencionada consulta, e para augmento e utilidade da causa publica, sou servido determinar o seguinte:
I. A Mesa do Desembargo do Paço não mandara passar cartas de concessão de sesmarias, nem de confirmação das que concedem os Governadores e Capitães Generaes, sem que apresentem os que as requerem medição e demarcação judicial feita e ultimada legalmente com citação dos heréos confrontantes e sobre que haja sentença final e que tenha passado em julgado.
II. E porque, imposta esta obrigação, é justo que se facilitem os meios de se poderem fazer as demarcações com a promptidão e exactidão que convem, e sem excesso de salarios : haverá em todas as Villas um Juiz das sesmarias, que servira por tres annos : as Camaras proporão tres pessoas nesta Capitania a Mesa do Desembargo do Paço, e nas mais ao Governador e Capitão General para se escolher dellas a que mais apta parecer, devendo ser propostos com preferencia Bachareis formados em direito ou philosophia, e na falta delles, pessoas que forem de maior probidade e saber.
III. Os Juizes das sesmarias darão appellação e aggravo para os Ouvidores das Comarcas, dos quaes se recorrerá para as Relações do Districto na fórma da Lei do Reino. E quando as partes quizerem antes requerer as demarcações aos Juizes Ordinarios ou de Fóra, ou aos Ouvidores das Comarcas, estes lhes deferirão indo fazer-lhas: pois que não fica sendo privativa a jurisdicção do Juiz das sesmarias; serão porém elles obrigados a guardar o que vai disposto neste Regimento.
IV. Em casa Villa haverá tambem um Piloto para as medições e demarcações, eleito pela Camara, o qual servirá tres annos, tirando o competente provimento. E servirá de Escrivão o Tabellião mais antigo, ou o que mais desoccupado estiver, e ao Juiz parecer mais habil para semelhantes diligencias.
V. As demarcações serão feitas seguidamente, começando umas nas quadras das outras, sem se deixarem terrenos intermedios e devolutos; salvas somente as estradas e serventias geraes, e as fontes publicas; inteirando-se sempre a quantidade de terras concedida, ainda que pela configuração e situação topographica do terreno não possa haver quadra perfeita e regular.
VI. Para cada meia legua se comtarão mil e quinhentas braças, e no auto da medição se especificarão, além dos marcos, as balisas perduraveis que se encontrarem no terreno, como vertentes, rios, morros e semelhantes; e se fará tambem declaração se ha campinas, serras e mattas virgens, e de todas as qualidades notaveis que ao Juiz parecer que podem concorrer para bem assignalar a sesmaria, que se vai medindo e demarcando.
VII. Finda a medição e demarcação, fará o Piloto uma planta do terreno, onde se desenhará a sua configuração, o logar dos marcos, as balizas que tem notáveis, os rios, ribeirões, pantanos, e o mais que se puder figurar; a qual será guardada na Secretaria da Mesa do Desembargo do Paço, para a todo o tempo, por meio della, se poderem decidir algumas duvidas que ocorrerem.
VIII. Por cada uma demarcação de meia legoa quadrada, ou de uma legoa, sendo em campos, levarão de salario, ou gastem muitos ou poucos dias, o Juiz 20$000, o Piloto 12$000, e o Ajudante da corda 6$000; além deste salario perceberão pelo do caminho na ida e volta, por cada seis legoas 2$000 o Juiz, 1$200 o Piloto, e 600 réis o Ajudante da Corda. O Escrivão vencerá somente os salarios que lhe terem contados, segundo o Regimento geral do seu Officio. O Pitoto perceberá mais 6$400 pelo trabalho de tirar a planta; os quaes pertencerão a quem a fizer, no caso de a haver o Juiz encarregado a outrem, pela inhabilidade ou qualquer outro impedimento do Piloto.
IX. E convindo que o Juiz das sesmarias e mais Officiaes não faltem aos deveres do seu cargo, nas devassas de Correição se perguntará por elles, averiguando-se se cumprem as suas obrigações, e se levam salários de mais; dando-se-lhes em culpa o que contra elles se provar. E os Ouvidores das Comarcas os constrangerão a que com toda a promptidão vão fazer as medições que lhes forem requeridas, se lhes constar por notoriedade ou por queixa das partes, que recusam ir fazel-as.
E este se cumprirá, como nelle se contém. Pelo que mando á Mesa do Desembargo do Paço, e da Consciencia e Ordens; Presidente do meu Real Erario; Conselho da minha Real Fazenda; e a todos os Tribunaes, Ministros de Justiça e mais pessoas, a quem pertencer o conhecimento diste Alvará, o cumpram e guardem. E valerá como carta passada pela Chaneellaria ; posto que por ella não ha de passar, e que o seu effeito haja de durar mais de um anno, não obstante a Ordenação em contrario.
Dado no Palacio do Rio de Janeiro aos 25 de Janeiro de 1809.
PRINCIPE com guarda,
Marquez de Angeja P.
Alvará com força de Lei, pelo qual Vossa Alteza Real ha por bem ordenar, que se não passem cartas de concessão ou confirmação de Sesmarias, sem preceder medição e demarcação judicial : e estabelece o fórma da nomeação dos Juizes das sesmarias, e os salarios que elIes e mais officiaes devem vencer: e dá outras providencias afim da boa ordem e regularidade das mesmas Sesmarias.
Para Vossa Alteza, Real ver.
Joaquim José da Silveira o fez. Joaquim José de Souza Lobato o fez escrever.
Este texto não substitui o publicado na CLBR, de 1809
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