Condecora a Sé Cathedral do Río de Janeiro com o titulo de Capella Real.
Eu O Príncipe Regente faço saber aos que este AIvará com força de lei virem, que sendo-me presente a situação precaria e incommoda, em que se acham o Cabido e mais Ministros da Cathedral desta minha Cidade e Córte do Rio de Janeiro, em urna Igreja alheia e pouco decente para os Offlcios Divinos; e desejando estabelecer-lhes um local, em que com o devido decoro possam exercer o Ministerio de suas funcções sagradas, não só por seguir o exemplo de meus augustos predecessores, mas principalmente por serem os Senhores Reis de Portugal os primitivos fundadores e perpetuas padroeiros de todas as Igrejas do Estado do Brazil , concorrendo por essa razão com tudo o que era necessário para a conservação e fabrica das mesmas Igrejas; o considerando por uma parte as necessidades actuaes e mais urgentes do Estado, a que cumpre acudir sem demora, e que me não permittem continuar as obras da nova Cathedral, a que dera principio meu Augusto Avó o Senhor Rei D. João V. de gloriosa memória ; e por outra parte não querendo perder nunca o antiquissimo costume de manter junto ao meu Real Palácio uma Capella Real, não só para maior commodidade e edificação da minha Real Familia, mas sobretudo para maior decencla, e esplendor do Culto Divino., e Gloria de Deus, em cuja omnipotente providencia confio que abençoará os meus cuidados e os desvelos com que procuro melhorar a sorte de meus vassallos na geral calamidade da Europa: tendo ouvido sobre esta matéria pessoas mui doutas e zelosas do serviço de Deus, e meu, e juntamente com o parecer do Bispo Diocesano na parte que pode tocar á sua jurisdicção espiritual e ordinaria; fui servido adaptar o plano que nas presentes círcumstancias mais conviesse, ordenando a este respeito o seguinte:
I. Que o Cabido da Cathedral seja logo com a possivel brevidade transferido com todas as pessoas, Cantores e Ministros, de que se compõe no estado actual em que se acha na Igreja da Confraria do Rosario, para a Igreja que foi dos Religiosos do Carmo, contigua ao Real Palácio da minha resídencia ; para onde se passarão igualmente todos os vasos sagrados, paramentos, alfaias e todos os moveis que pertencerem ao mesmo Cabido e possam de alguma sorte servir no exercício de suas funcções.
II. Que todos os sobreditos membros do Cabido sejam deste logo e para o futuro reputados por Ministros da minha CapelIa Real, e como taes gozarão de todos os privilegios, immunidades e isenções que por costumes antíquissimos e Bullas Pontifícias tem sido concedidos á Capella Real dos Senhores Reis meus predecessores.
III. Que em consequencia dos mesmos privilégios, não só os Conegos de que presentemente consta o Corpo Capitular, mas todos os mais que eu for servido accrescentar para o futuro, poderão usar de alguma dífferença no feitio dos roquetes e cores das murças, segundo o accordo que eu for servido fazer com o meu Capellão Mór, em quem concorre igualmente a jurisdicção ordinaria e delegada desta Diocese.
IV. Que além da corporação e da hierarchia dos Conegos, deve haver uma nova hierarchia de Conegos graduados, a que se poderá dar o nome e o tratamento de Monsenhores, na qual poderão entrar os Monsenhores que vieram da Patriarchal de Lisboa e outras, que eu for servido accrescentar para o futuro, occupando pela sua antiguidade a precedencia no coro e no Altar dentro e fora da Igreja e usando dos mesmos habitos e insignias, sem exceptuar a Mitra que estou na posse de permittir em Lisboa aos Monsenhores não Mitrados.
V. Que os Ministros das duas hierarchias entrarão nas funcções do Culto Divino e no serviço da Capella, constituindo um só corpo na união do um só Prelado, porém segundo a sua graduação e do modo mais approximado, que for possivel, ao estylo da Santa Igreja Patriarchal de Lisboa, sem comtudo se derogarem os Estatutos da Cathedral, nus partes em que forem compativeís com o dito estylo, emquanto se não formam novos estatutos inteiramente conformes e adaptados ao novo arranjamento da Capella.
VI. Que na mesma razão das funcções e dos deveres se devem considerar todos os direitos e privilegios do antigo Cabido diffundidos e communicados a todos os membros das duas hierarchias, sem differença alguma de votos nas deliberações e negocias capitulares, á excepção daquella que por direito commum é concedida ao Presidente da Capella ou Decano, que deve ser sempre o Monsenhor mais antigo.
VII. Que assim como entre os antigos Conegos existem alguns que sem differença de voto e de graduação percebem sómente o meio ordenado ou congrua de 150$000, da, mesma sorte a respeito de cada um dos Ministros em qualquer das duas hierarchías tica sempre reservado a meu real arbitrio aquelle ordenado que segundo seus merecimentos e serviços for servido conceder-lhe, sem que jamais possa servir de aresto para igualdade dos ordenados, a igualdade da graduação; e o mesmo se entenderá com os Capellães e mais Ministros inferiores que possa haver na Capella.
VIII. Que dentro da mesma Capella Real se conservará uma parochia privativa para os criados da minha Real Casa, e família, de que será parocho um Sacerdote, que eu nomear e que será ao mesmo passo Conego nato da Capella.
IX. Que para obviar os embaraços e a confusão que poderiam resultar de duas parochias existentes dentro da capella: sou servido ordenar que ficando sempre para o futuro Conego nato da minha Capella Real, como já o era da Sé, o Cura da mesma, entretanto se conserve esta Freguezia na mesma Igreja do Rosario, emquanto não sou servido designar-lhe outra mais acommodada e decente.
E como se cumprirá, como nelle se contém. Pelo que mundo á Mesa do Desembargo do Paço, e da Consciencia e Ordens; Presidente do meu Real Erario ; Regedor da, Casa da Supplicação do Brazil ; Bispo desta Diocese, e mais Autoridades Ecclesiasticas ; Governador da Relação da Bahia; Governadores e Capitães Generaes, e mais Governadores do Brazil, e dos meus Dominios Ultramarinos; e a todos os Ministros de Justiça, e mais pessoas, a quem pertencer o conhecimento e execução deste Alvará, que o cumpram e guardem, e façam inteiramente cumprir e guardar, tão inviolavelmente, como nelle se contém, não obstante quaesquer Leis, Alvarás, Regimentos, Decretos, ou ordens em contraria; porque todos e todas hei por derogadas para este effeito sómente, como se delles fizesse expressa e individual menção, ficando aliás sempre em seu vigor. E este valerá como carta passada pela Chancellaria, ainda que por ella não ha de passar, e que o seu effeito haja de durar mais de um anno , sem embargo da ordenação em contrario: registrando-se em todos os logares, onde se costumam registrar semelhantes Alvarás.
Dado no Palacio do Rio de Janeiro em 15 de Junho de 1808.
PRINCIPE com guarda.
D. Fernando Jose de Portugal .
Alvará por que Vossa Alteza Real ha por bem de condecorar a Sé Cathedral desta Cidade do Rio de Janeiro com o título é dignidade de Capella Real, transferindo-a para a Igreja contigua ao seu Real Palacio, e dando outras providencias a este respeito na fórma acima declarada.
Para Vossa, Alteza Real ver.
João Alvares do Miranda Varejão o fez.
Este texto não substitui o publicado na CLBR, de 1808
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