Presidência da República
Secretaria-Geral

Subchefia para Assuntos Jurídicos

DESPACHO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA

ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO

Processo nº 00406.000714/2021-98.  Parecer nº BBL - 01, de 19 de novembro de 2021, do Advogado-Geral da União, que adotou, nos termos estabelecidos no Despacho do Consultor-Geral da União nº 00726/2021/GAB/CGU/AGU, o Parecer nº 00012/2021/CONSUNIAO/CGU/AGU da Consultoria-Geral da União.  Aprovo.  Publique-se para os fins do disposto no art. 40, § 1º, da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993.  Em 24 de novembro de 2021.

PROCESSO ADMINISTRATIVO Nº 00406.000714/2021-98

INTERESSADO: CORREGEDORIA-GERAL DA ADVOCACIA DA UNIÃO.

ASSUNTO: Aplicabilidade do Decreto nº 5.480, de 30 de junho de 2005. Sistema de Correição do Poder Executivo Federal. 

PARECER Nº BBL - 01 

ADOTO, para os fins do art. 41 da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, nos termos do Despacho do Consultor-Geral da União nº 00726/2021/GAB/CGU/AGU, de 17 de novembro de 2021, o Parecer nº 00012/2021/CONSUNIAO/CGU/AGU, de 17 de novembro de 2021, e submeto-o ao EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DA REPÚBLICA, para os efeitos do art. 40, § 1º, da referida Lei Complementar, tendo em vista a relevância da matéria versada.

Em 19 de novembro de 2021.

BRUNO BIANCO LEAL

Advogado-Geral da União

ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO

CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO

GABINETE

SAS, QUADRA 03, LOTE 5/6, 12 ANDAR - AGU SEDE IFONE (61) 2026-8557 BRASÍLIA/DF 70.070-030

DESPACHO n. 00726/2021/GAB/CGU/AGU

NUP: 00406.000714/2021-98

INTERESSADA: Corregedoria-Geral da Advocacia da União

ASSUNTO: Decreto nº 5.480, de 30 de junho de 2005. Sistema de Correição do Poder Executivo Federal.

Exmo. Senhor Advogado-Geral da União,

Aprovo o PARECER n. 00012/2021/CONSUNIAO/CGU/AGU, da lavra do Consultor da União, Dr. José Affonso de Albuquerque Netto.

Nestes termos, submeto as manifestações desta Consultoria-Geral da União a vossa análise para que, em sendo acolhidas, sejam encaminhadas à elevada apreciação do Excelentíssimo Senhor Presidente da República para os fins dos art. 40, § 1º, e art. 41 da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993.

Brasília, 17 de novembro de 2021.

(assinado eletronicamente)

ARTHUR CERQUEIRA VALÉRIO

Advogado da União

Consultor-Geral da União

PARECER n. 00012/2021/CONSUNIAO/CGU/AGU

NUP: 00406.000714/2021-98

INTERESSADA: Corregedoria-Geral da Advocacia da União

ASSUNTO: Decreto nº 5.480, de 30 de junho de 2005. Sistema de Correição do Poder Executivo Federal.

EMENTA:

1. Consulta sobre a aplicabilidade do Decreto nº 5.480, de 30 de junho de 2005, com as alterações do Decreto nº 10.768, de 13 de agosto de 2021, à Corregedoria-Geral da Advocacia da União.

2. Tratamento especial conferido pela Constituição Federal à Advocacia-Geral da União quanto à sua organização, funcionamento e competência exclusiva para regular suas atividades correicionais e disciplinares.

3. Princípios da hierarquia e da especialidade das normas: art. 131 da Constituição Federal; art. 4º, XIV e XVIII, e art. 45, § 1º, da Lei Complementar nº 73/1993.

4. As atividades correicionais e disciplinares da Advocacia-Geral da União e de seus órgãos vinculados não se submetem às disposições do Decreto nº 5.480/2005, não integrando o Sistema de Correição do Poder Executivo Federal.

I - DO RELATÓRIO

1. Por meio do OFÍCIO n. 01408/2021/CGAU/AGU, a Corregedoria-Geral da Advocacia da União - CGAU solicita manifestação desta Consultoria-Geral da União quanto à interpretação do Decreto nº 10.768, de 13 de agosto de 2021, que promoveu alteração no Decreto nº 5.480, de 30 de junho de 2005, que dispõe sobre o Sistema de Correição do Poder Executivo Federal, em face das normas relativas à organização e funcionamento das atividades correicionais da Advocacia-Geral da União.

2. Conforme narrado pela CGAU, o Decreto nº 10.768/2021 revogou o parágrafo 4º do art. 2º do Decreto nº 5.480/2005, que excepcionava o sistema de correição da Advocacia-Geral da União. O dispositivo revogado dispunha que a unidade de correição da Advocacia-Geral da União seria tecnicamente vinculada ao aludido Sistema de Correição do Poder Executivo Federal.  A referida norma, a contrário senso, estabelecia que o sistema correicional da AGU não integra o mencionado Sistema de Correição de que trata o Decreto nº 5.480/2005.

3. A CGAU entende que a citada norma restou finalmente revogada porque equivocada e inaplicável à Advocacia-Geral da União, que possui regras próprias estabelecidas na Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993.

4. No entanto, da forma como restou redigido o Decreto nº 10.768/2021, especialmente por não consignar expressamente que o Sistema Correicional da Advocacia-Geral da União não se submete nem se vincula ao referido Sistema de Correição do Poder Executivo Federal, poderá haver eventual interpretação equivocada no sentido de se cogitar a inclusão da Corregedoria-Geral da Advocacia da União como unidade setorial do referido Sistema.

5. Assim, a Corregedoria-Geral da Advocacia da União solicita que essa “Consultoria-Geral da União, a quem cabe assistir o Advogado-Geral da União na fixação da interpretação da Constituição, das leis, dos tratados e dos demais atos normativos, a ser uniformemente seguida pelos órgãos e entidades da administração pública federal, a elaboração de parecer acerca dos limites de orientação, supervisão e fiscalização estabelecidos por meio de decreto, para a organização, sob a forma de sistema, de atividades auxiliares gerais e comuns a órgãos e entidades do Poder Executivo, em especial, daquelas recentemente atualizadas e redisciplinadas (Decreto nº 10.768, de 13 de agosto de 2021) no Decreto nº 5.480, de 30 de junho de 2005, em face das normas relativas à organização e funcionamento da atividade correicional da Advocacia-Geral da União.”

II - DA FUNDAMENTAÇÃO

Do tratamento especial conferido pela Constituição Federal à Advocacia-Geral da União quanto à sua organização, funcionamento e competência exclusiva para regular suas atividades correicionais e disciplinares, de modo a excepcionar a aplicação do Decreto nº 5.480/2005 ao seu sistema correicional.

6. A Advocacia-Geral da União - AGU foi inserida em capítulo específico da Constituição Federal de 1988, denominado “Das Funções Essenciais à Justiça” (art. 131, CF), demonstrando o Constituinte importante preocupação em fixar as competências da Instituição, assim como o fez em relação às demais instituições que compõem a organização dos poderes estatais (art. 44, 76 e 92, CF).

7. Sobre o destaque dado pela Constituição para a advocacia pública, Maria Sylvia Di Pietro ensina que:

 “A advocacia pública (a que pertenci por 24 anos de minha vida profissional) foi prevista na Constituição Federal de 1988, no capítulo das Funções Essenciais à Justiça (artigo 131), para representar os entes políticos, judicial e extrajudicialmente, bem como desempenhar as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo.

Temos realçado, em diferentes oportunidades em que escrevi sobre o tema, que, embora a Constituição adote, no artigo 2º, o princípio da separação de Poderes, ela prevê, no Título IV, denominado de “Organização dos Poderes”, quatro e não três capítulos; os três primeiros pertinentes a cada um dos Poderes do Estado e, o quarto, imediatamente seguinte ao que cuida do Poder Judiciário, referente às Funções Essenciais à Justiça, nele inserindo o Ministério Público, a Advocacia-Geral da União, as Procuradorias Estaduais, a Defensoria Pública e a Advocacia. (...)

O que a Constituição quis realçar, com a inclusão dessas carreiras no capítulo das “funções essenciais à Justiça”, foi a importância de todas na busca da Justiça, entendida no duplo sentido: a) Justiça como instituição, como sinônimo de Poder Judiciário, já que este não tem legitimidade para dar início às ações judiciais, decidindo os conflitos que são postos e nos limites postos pelo advogado, pelo promotor de Justiça, pelo advogado público, pelo defensor público; sem esses profissionais, a Justiça não é acionada; ela não existe; b) Justiça como valor, incluída no preâmbulo da Constituição entre os valores supremos de uma sociedade fraterna pluralista e sem preconceitos, e que consiste na “vontade constante de dar a cada um o que é seu” (justitia est constans et perpetua voluntas jus suum cuique tribuendi”).

(...)

A posição da Advocacia da União e das procuradorias estaduais na organização do Estado é idêntica àquela ocupada pelo Ministério Público e pela Defensoria Pública. Nem poderia ser diferente, já que todas foram incluídas no mesmo título que trata da Organização dos Poderes, no capítulo referente às funções essenciais à JustiçaTodos exercem atividade típica de Estado, razão pela qual mereceram tratamento diferenciado na Constituição.

(artigo: A Advocacia Pública como função essencial à Justiça.” https://www.conjur.com.br/2016-ago-18/interesse-publico-advocacia-publica-funcao-essencial-justica?imprimir=1. Disponível em 25/08/2021.) (destacou-se)

8. No julgamento do RE n° 558.258/SP, no qual se discutiu o alcance do termo “Procuradores”, constante da parte final do inciso XI do art. 37 da Constituição, o Relator, Ministro Ricardo Lewandowski, destacou que:

Parece-me necessário, entretanto, indagar a razão pela qual o inciso XI do art. 37, na redação dada pela EC 41/03, estabeleceu uma exceção tão somente em prol dos membros do Ministério Público, dos Procuradores e dos Defensores Públicos.

A razão, segundo entendo, reside no fato de que, embora os integrantes de tais carreiras não façam parte do Poder Judiciário, exercem, segundo assenta o próprio texto constitucional, “funções essenciais à Justiça”.  Tal característica determinou que se conferisse tratamento isonômico aos membros das carreiras jurídicas.

(RE 558258/SP, Relator(a): RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 09/11/2010, DJe-051 DIVULG 17-03-2011 PUBLIC 18-03-2011 EMENT VOL-02484-01 PP-00188)

9. Do Voto do Ministro Dias Toffoli no referido julgamento, colhe-se o seguinte trecho:

Senhor Presidente, parabenizo o brilhante voto proferido por Vossa Excelência, que muito bem destaca a posição da advocacia pública no nosso texto constitucional.

A Constituição brasileira trouxe a advocacia pública na segunda sessão do Capítulo IV do Título IV da Constituição Federal. O Título IV trata da Organização dos Poderes; o Capítulo I do Título IV trata do Poder Legislativo; o Capítulo II, do Poder Executivo; o Capítulo III, do Poder Judiciário.

No Capítulo IV, trata das chamadas Funções Essenciais à Justiça.  Na Seção I, do Ministério Público; na Seção II, da Advocacia Pública; na Seção III, da Defensoria Pública. Dentro da Advocacia Pública, estão as procuradorias de Estado, como traz o art. 132 da Constituição Federal.

Ora, o que temos aí? Temos que tanto o Ministério Público, quanto a Advocacia Pública, quanto a Defensoria Pública são instituições que não integram nenhum dos Três Poderes.  Eles estão separados tanto do Legislativo, quanto do Executivo, quanto do Judiciário.

10. Assim, erigida à condição de instituição de Estado e essencial à Justiça, a Advocacia-Geral da União - AGU possui competência para representar judicial e extrajudicialmente a União, além de prestar consultoria e assessoramento jurídico ao Poder Executivo.

11. Demais disso, a competência da AGU extravasa o limite do território brasileiro, pois atua também como representante máxima da República Federativa do Brasil em sua defesa perante os mais diversos organismos internacionais, a exemplo da Organização das Nações Unidas, Comissão Interamericana de Direitos Humanos, Corte Interamericana de Direitos Humanos, Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico etc.

12. Sublinhe-se que o art. 131 da Constituição Federal dispõe que a organização e o funcionamento da AGU são disciplinados não por meio de lei ordinária, mas por espécie normativa diferenciada, qual seja, Lei Complementar, a exigir inclusive quórum especial de aprovação (art. 59 e art. 69, CF). Dada a sua importância tanto para a compreensão do tema quanto para a sua correta interpretação, veja-se o conteúdo desses dispositivos:

CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

DO PROCESSO LEGISLATIVO

Subseção I

Disposição Geral

Art. 59. O processo legislativo compreende a elaboração de:

I - emendas à Constituição;

II - leis complementares;

III - leis ordinárias;

IV - leis delegadas;

V - medidas provisórias;

VI - decretos legislativos;

VII - resoluções.

[...]

Art. 69. As leis complementares serão aprovadas por maioria absoluta.

[...]

TÍTULO IV

DA ORGANIZAÇÃO DOS PODERES

[...]

CAPÍTULO IV

DAS FUNÇÕES ESSENCIAIS À JUSTIÇA

[...]

Seção II

DA ADVOCACIA PÚBLICA

Art. 131. A Advocacia-Geral da União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo.

§ 1º - A Advocacia-Geral da União tem por chefe o Advogado-Geral da União, de livre nomeação pelo Presidente da República dentre cidadãos maiores de trinta e cinco anos, de notável saber jurídico e reputação ilibada. (destacou-se)

13. Na forma estabelecida pela Constituição Federal, foi editada a Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, que instituiu a Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União. Entre outros disciplinamentos, a Lei Complementar nº 73/1993 tanto dispôs sobre as funções essenciais da Advocacia-Geral da União (art. 1º e 3º) como atribuiu competência exclusiva ao Advogado-Geral da União para disciplinar (art. 4° e 45), por meio de Regimento Interno próprio, a estrutura, a composição e o funcionamento dos órgãos da Instituição, entre os quais se encontra a Corregedoria-Geral da Advocacia da União. Confira-se:

LEI COMPLEMENTAR nº 73/1993

TÍTULO I

DAS FUNÇÕES INSTITUCIONAIS E DA COMPOSIÇÃO

Capítulo I

Das Funções Institucionais

Art. 1º - A Advocacia-Geral da União é a instituição que representa a União judicial e extrajudicialmente.

Parágrafo único. À Advocacia-Geral da União cabem as atividades de consultoria e assessoramento jurídicos ao Poder Executivo, nos termos desta Lei Complementar.

[...]

DOS ÓRGÃOS DA ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO

Capítulo I

Do Advogado-Geral da União

Art. 3º - A Advocacia-Geral da União tem por chefe o Advogado-Geral da União, de livre nomeação pelo Presidente da República, dentre cidadãos maiores de trinta e cinco anos, de notável saber jurídico e reputação ilibada.

[...]

Art. 4º - São atribuições do Advogado-Geral da União:

I - dirigir a Advocacia-Geral da União, superintender e coordenar suas atividades e orientar-lhe a atuação;

[...]

X - fixar a interpretação da Constituição, das leis, dos tratados e demais atos normativos, a ser uniformemente seguida pelos órgãos e entidades da Administração Federal;

[...]

XIII - exercer orientação normativa e supervisão técnica quanto aos órgãos jurídicos das entidades a que alude o Capítulo IX do Título II desta Lei Complementar;

XIV - baixar o Regimento Interno da Advocacia-Geral da União;

XV - proferir decisão nas sindicâncias e nos processos administrativos disciplinares promovidos pela Corregedoria-Geral e aplicar penalidades, salvo a de demissão;

[...]

Art. 45. O Regimento Interno da Advocacia-Geral da União é editado pelo Advogado-Geral da Uniãoobservada a presente lei complementar.

§ 1º O Regimento Interno deve dispor sobre a competência, a estrutura e o funcionamento da Corregedoria-Geral da Advocacia da União, da Procuradoria-Geral da União, da Consultoria-Geral da União, das Consultorias Jurídicas, do Gabinete do Advogado-Geral da União e dos Gabinetes dos Secretários-Gerais, do Centro de Estudos, da Diretoria-Geral de Administração e da Secretaria de Controle Interno, bem como sobre as atribuições de seus titulares e demais integrantes.

[...]

§ 3º No Regimento Interno são disciplinados os procedimentos administrativos concernentes aos trabalhos jurídicos da Advocacia-Geral da União. (destacou-se)

14. Conquanto os dispositivos citados da Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União sejam suficientes para demonstrar a competência exclusiva conferida ao Advogado-Geral da União na definição da estrutura e do funcionamento dos órgãos da Instituição, por meio de Regimento Interno, verifica-se que o legislador infraconstitucional – ainda em vista da proeminente função e necessária autonomia estabelecidas constitucionalmente à AGU –, expressamente enfatizou essa competência ao outorgar ao Advogado-Geral da União especial poder normativo (ou regulamentar), ou seja, o dever-poder de editar e praticar atos normativos inerentes a suas funções. Confira-se, a propósito, o art. 4º da Lei Complementar nº 73/1993:

Art. 4º - São atribuições do Advogado-Geral da União:

[...]

XVIII - editar e praticar os atos normativos ou não, inerentes a suas atribuições; (destacou-se)

15. Ademais, a referida Lei Complementar estabelece, entre outras atribuições exclusivas, a competência normativa do Advogado-Geral da União para a orientação da atuação de seus Membros e de seus órgãos integrantes e vinculados (art. 4º, I, XIII e XVIII); disciplina dos procedimentos administrativos concernentes aos trabalhos da Advocacia-Geral da União (art. 45, §3º); decisão sobre sindicâncias e  processos administrativos disciplinares promovidos pela Corregedoria-Geral da Advocacia da União, além da aplicação de penalidades (art. 4º, XV).

16. Cabe assinalar, ainda, que a Lei Complementar nº 73/1993, ao dispor sobre a estrutura orgânica da Advocacia-Geral da União, contemplou a Corregedoria-Geral da Advocacia da União como órgão de direção superior da Instituição (art. 2º, inciso, I, letra “e”) e subordinado diretamente ao Advogado-Geral da União. Como órgão de direção superior, a Corregedoria-Geral integra o Conselho Superior da Advocacia-Geral da União (art. 7º), que possui as seguintes atribuições:

Art. 7º - O Conselho Superior da Advocacia-Geral da União tem as seguintes atribuições:

I - propor, organizar e dirigir os concursos de ingresso nas Carreiras da Advocacia-Geral da União;

II - organizar as listas de promoção e de remoção, julgar reclamações e recursos contra a inclusão, exclusão e classificação em tais listas, e encaminhá-las ao Advogado-Geral da União;

III - decidir, com base no parecer previsto no art. 5º, inciso V desta Lei Complementar, sobre a confirmação no cargo ou exoneração dos Membros das Carreiras da Advocacia-Geral da União submetidos à estágio confirmatório;

IV - editar o respectivo Regimento Interno.

17. Veja-se que a citada Lei Complementar conferiu à Advocacia-Geral da União uma organização e funcionamento próprios, com competências correicionais apartadas do Sistema de Correição do Poder Executivo Federal previsto no Decreto nº 5.480/2005. 

18. Ademais, o Corregedor-Geral da Advocacia da União, além de dirigir e coordenar as atividades da Corregedoria-Geral, integra também, como membro nato, o Conselho Superior da Advocacia-Geral da União, unidade interna da AGU que não possui competências disciplinar e correicional e, portanto, não estando também limitada às atividades de que trata Decreto nº 5.480/2005.  Essas competências e atribuições da Corregedoria-Geral da Advocacia da União demonstram claramente sua natureza singular, e que a diferenciam do Sistema de Correição do Poder Executivo Federal previsto no mencionado Decreto.

19. O referido Decreto dispõe que a Controladoria-Geral da União, por meio da Corregedoria-Geral da União, é o Órgão Central do Sistema de Correição (art. 2°, I) e as unidades setoriais estão sujeitas à orientação normativa e à supervisão técnica do referido Órgão Central (art. 2°, §2°).  Nos termos do art. 4°, I, do Decreto nº 5.480/2005, compete ao Órgão Central do Sistema definir, padronizar, sistematizar e normatizar, mediante a edição de enunciados e instruções, os procedimentos atinentes às atividades de correição.

20. Contudo, e conforme acima demonstrado, a Lei Complementar nº 73/1993 estabeleceu regramento diferenciado à Advocacia-Geral da União, conferindo ao Advogado-Geral da União a competência exclusiva de editar orientações normativas a seus membros, inclusive relativas à apuração disciplinar e ao funcionamento da Corregedoria-Geral da Advocacia da União.

21. Impende destacar, também, que as competências correicionais conferidas pela Lei Orgânica da AGU têm alcance conceitual mais amplo do que as atividades de correição estabelecidas no Decreto nº 5.480/2005.  

22. O referido Decreto disciplina somente aspectos relacionados à apuração de irregularidades, por meio de investigação preliminar, sindicância e processo administrativo disciplinar, culminando com a aplicação de penalidades administrativas aos infratores (art. 1° e parágrafos). 

23. Já as atribuições da Corregedoria-Geral da Advocacia da União vão além da esfera funcional/disciplinar, na medida em que – à semelhança de órgãos de corregedoria dos tribunais do Poder Judiciário –, apuram, em suas correições ordinárias e extraordinárias, a regularidade e eficácia/eficiência dos serviços jurídicos prestados pelos órgãos integrantes da AGU ou a ela vinculados, inclusive sugerindo medidas necessárias ao seu aprimoramento. Sobre o assunto, veja-se o que dispõem os arts. 5º, inciso II, 6º e 32 da Lei Complementar nº 73/1993:

Art. 5º - A Corregedoria-Geral da Advocacia da União tem como atribuições:

[...]

II - promover correição nos órgãos jurídicos da Advocacia-Geral da União, visando à verificação da regularidade e eficácia dos serviços, e à proposição de medidas, bem como à sugestão de providências necessárias ao seu aprimoramento;

[...]

Art. 6º - Compete, ainda, à Corregedoria-Geral supervisionar e promover correições nos órgãos vinculados à Advocacia-Geral da União.

[...]

Art. 32. A atividade funcional dos membros efetivos da Advocacia-Geral da União está sujeita a:

I - correição ordinária, realizada anualmente pelo Corregedor-Geral e respectivos auxiliares;

II - correição extraordinária, também realizada pelo Corregedor-Geral e por seus auxiliares, de ofício ou por determinação do Advogado-Geral da União.

24. Ainda sob a perspectiva da amplitude de suas atividades correicionais, as competências da Corregedoria-Geral da Advocacia da União compreendem também a avaliação e a coordenação do estágio confirmatório dos integrantes das carreiras da Advocacia-Geral da União, bem como a emissão de parecer sobre o desempenho dos membros (art. 5º, IV e V, e 22, da Lei Complementar nº 73/1993), atribuições estas que traduzem, evidentemente, regras especiais de funcionamento da Advocacia-Geral da União estabelecidas por norma complementar.  Vejam-se os referidos artigos:

Art. 5º - A Corregedoria-Geral da Advocacia da União tem como atribuições:

[...]

IV - coordenar o estágio confirmatório dos integrantes das Carreiras da Advocacia-Geral da União;

 V - emitir parecer sobre o desempenho dos integrantes das Carreiras da Advocacia-Geral da União submetidos ao estágio confirmatório, opinando, fundamentadamente, por sua confirmação no cargo ou exoneração;

[...]

 Art. 22. Os dois primeiros anos de exercício em cargo inicial das carreiras da Advocacia-Geral da União correspondem a estágio confirmatório.

Parágrafo único. São requisitos da confirmação no cargo a observância dos respectivos deveres, proibições e impedimentos, a eficiência, a disciplina e a assiduidade.

25. Com efeito, tratando-se de procedimentos correicionais voltados à atividade funcional dos seus membros, à avaliação do seu desempenho, aos respectivos procedimentos de fiscalização e de responsabilização, e mais, aos procedimentos de prevenção, detecção, investigação, correção, remediação ou monitoramento de irregularidades, não cabe cogitar-se de qualquer atividade de instauração, avocação ou coordenação por órgão estranho à Advocacia-Geral da União. Sendo assim, incabível também, até por decorrência lógica, a interferência no exercício de suas competências, haja vista tratar-se de procedimentos estritamente afetos à organização e ao funcionamento da Advocacia-Geral da União.

26. Ademais, em complemento às previsões da Lei Complementar nº 73/1993, a Lei nº 13.327, de 29 de julho de 2016, estabelece que, no exercício de suas funções, os ocupantes dos cargos de Advogado da União, de Procurador da Fazenda Nacional, de Procurador Federal, de Procurador do Banco Central do Brasil e dos quadros suplementares em extinção previstos no art. 46 da Medida Provisória nº 2.229-43, de 6 de setembro de 2001, não serão responsabilizados, exceto pelos respectivos órgãos correicionais ou disciplinares (art. 38, §2º), e que a apuração de falta disciplinar desses mesmos membros compete exclusivamente aos respectivos órgãos correicionais ou disciplinares próprios (art. 38, §3º), não se admitindo, portanto, que possa haver exercício de competência instauradora por meio de autoridades diversas. Veja-se:

Art. 38. São prerrogativas dos ocupantes dos cargos de que trata este Capítulo, sem prejuízo daquelas previstas em outras normas:

[...]

§ 2º No exercício de suas funções, os ocupantes dos cargos de que trata este Capítulo não serão responsabilizados, exceto pelos respectivos órgãos correicionais ou disciplinares, ressalvadas as hipóteses de dolo ou de fraude.

§ 3º A apuração de falta disciplinar dos ocupantes dos cargos de que trata este Capítulo compete exclusivamente aos respectivos órgãos correicionais ou disciplinares.

27. Diverso do que previsto no art. 38 da Lei nº 13.327/2016, o art. 4°, VIII e XII do Decreto nº 5.480/2005 estabelece que compete ao Órgão Central do Sistema de Correição “instaurar sindicâncias, procedimentos e processos administrativos disciplinares” (VIII), “avocar sindicâncias, procedimentos e processos administrativos disciplinares” e aplicar penalidades (XII), atividades essas não admitidas em relação a membros das carreiras da Advocacia-Geral da União e a seus órgãos vinculados. Assim, reforça-se a inaplicabilidade do Decreto nº 5.480/2005 na regulação da Corregedoria-Geral da Advocacia da União.  Vale observar, ainda, que o referido Decreto traz regra que legitima a instauração e avocação de procedimentos e processos administrativos previstos não apenas na Lei nº 8.112/1990, mas também na Lei nº 8.429/1992, “assim como outros a ser desenvolvidos” (art. 4º, §3º, do Decreto nº 5.480, de 2005).

28. Assim, vale reiterar que o art. 38 da Lei nº 13.327/2016 deixa claro que a apuração de falta disciplinar dos ocupantes dos cargos de que trata o referido Capítulo (I - de Advogado da União; II - de Procurador da Fazenda Nacional; III - de Procurador Federal; IV - de Procurador do Banco Central do Brasil; V - dos quadros suplementares em extinção previstos no art. 46 da Medida Provisória nº 2.229-43, de 6 de setembro de 2001) compete exclusivamente aos seus respectivos órgãos correicionais ou disciplinares.

29. Oportuno citar recente julgado proferido no agravo interposto contra decisão de inadmissibilidade de recurso extraordinário (ARE) nº 1.311.066/SP, no qual se discutiu a inconstitucionalidade de lei complementar municipal que instituiu o Sistema de Avaliação de Desempenho Funcional, sob a coordenação de Comissão Municipal de Serviço Civil, encarregada de realizar inclusive a avaliação de desempenho de procuradores municipais.  No caso, o Tribunal de origem (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo) conferiu “interpretação conforme, para reconhecer o direito de os procuradores municipais terem suas avaliações de desempenho realizadas por órgão próprio, formada por integrantes da própria carreira, e não por órgão diverso e subordinado hierarquicamente ao prefeito do Município”. No julgamento do referido agravo, o Relator, Ministro Gilmar Mendes, negou seguimento ao recurso da Municipalidade, por entender que a carreira da advocacia pública municipal, por ser função essencial à Justiça, possui a prerrogativa de que a avaliação de desempenho de seus membros seja realizada por órgão próprio, formada por integrantes da própria carreira, na forma do art. 132 do texto constitucional. Veja-se trecho do acórdão:

Nesse julgado, o eminente relator do processo, Min. Luiz Fux, consignou expressamente que as mesmas regras aplicadas aos procuradores estaduais e federais devem ser aplicadas aos procuradores municipais, em razão de serem todas carreiras de advocacia pública essenciais à justiça:

“De fato, nos Municípios em que existem Procuradorias organizadas, os advogados públicos municipais desempenham idênticas atribuições às de seus congêneres no âmbito da União, dos Estados e do Distrito Federal.

Com efeito, os procuradores municipais possuem o munus público de prestar consultoria jurídica e de representar, judicial e extrajudicialmente, o Município a que estão vinculados. Nesse diapasão, analisam a legalidade e legitimidade dos atos municipais, são consultados a respeito de políticas públicas de inegável relevância social, como saúde, educação e transporte, protegendo o melhor interesse do órgão administrativo e de seus cidadãos, além de atuarem perante os mesmos órgãos que a AGU e as Procuradorias Estaduais, tanto na seara administrativa quanto judicial.

Em vista disso, sendo tais atividades identificadas pela Constituição como funções essenciais à Justiça, é imperativo que todas as disposições pertinentes à Advocacia Pública sejam aplicadas às Procuradorias Municipais, sob pena de se incorrer em grave violação à organicidade da Carta Maior”

Nesse passo, depreende-se que, na espécie, o acórdão do Tribunal de origem não diverge da orientação do Supremo Tribunal Federal, ou seja, de que a carreira da advocacia pública municipal se enquadra, para todos os fins, na categoria da advocacia pública, equiparando-se às procuradorias estaduais e federais no que se refere à prerrogativas da classe, o que no presente caso restam consubstanciadas na garantia de que a avaliação de desempenho seja realizada por órgão próprio, formada por integrantes da própria carreira, na forma do art. 132 do texto constitucional.

(ARE 1.311.066/SP, Recurso Extraordinário com Agravo, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 01/10/2021, publ. DJe nº 198/2021, divulgado em 04/10/2021, publ. 05/10/2021, pág. 152/153). (destacou-se)

30. Vale dizer, a Advocacia Pública submete-se a regime jurídico diferenciado, tendo em vista que suas atividades foram consideradas pela Constituição como funções essenciais à Justiça.  Tanto é assim a Lei Complementar nº 73/1993, ao dispor sobre a organização e o funcionamento da Advocacia-Geral da União, criou órgão de Corregedoria próprio, a quem reservou a competência (art. 5º) para fiscalizar as atividades funcionais dos Membros (I); promover correição nos órgãos jurídicos, visando a verificação da regularidade e eficácia dos serviços (II); apreciar as representações e denúncias relativas à atuação dos Membros (III); coordenar o respectivo estágio confirmatório, por meio da avaliação de desempenho (IV); emitir parecer sobre o desempenho dos integrantes das Carreiras da AGU, para fins de confirmação no cargo ou exoneração (V); e instaurar sindicâncias e processos administrativos disciplinares (VI).

31. Assim, pode-se concluir que as atividades de correição reservadas pela Lei Complementar nº 73/1993 à Corregedoria-Geral da Advocacia da União constituem verdadeiro Sistema Especial, porquanto alcançam não apenas órgãos integrantes (arts. 2º e 5º, da Lei Complementar), mas também órgãos vinculados à Instituição (art. 6º), a exemplo dos órgãos jurídicos das (mais de 150) Autarquias e Fundações Públicas Federais, incluindo a Procuradoria-Geral do Banco Central do Brasil.

32. Além disso, o Decreto nº 5.480/2005 estabelece outras competências que, se fossem aplicadas ao órgão de correição da Advocacia-Geral da União, afrontariam a Lei Complementar nº 73/1993. O art. 4º do referido Decreto estabelece, por exemplo, a competência do Órgão Central do Sistema de Correição para aprimorar os procedimentos relativos aos processos administrativos disciplinares e sindicâncias (II);  gerir e exercer o controle técnico das atividades correcionais (III);  coordenar as atividades que exijam ações conjugadas (IV), requisitar servidores para compor comissões disciplinares (IX); bem assim o art. 5º estabelece ao mesmo Órgão Central a competência para definição, padronização, sistematização e normatização dos procedimentos operacionais atinentes à atividade de correição das unidades setoriais do Sistema de Correição (I).

33. É de se ver que as atribuições acima mencionadas, no âmbito da AGU, foram outorgadas exclusivamente ao Advogado-Geral da União, a quem compete organizar, disciplinar, coordenar e supervisionar seus órgãos, a demonstrar, uma vez mais, a inaplicabilidade do Decreto nº 5.480/2005 ao regime jurídico estabelecido pela Lei Complementar n° 73/1993.

34. Além disso, nos termos do art.  49, §1º, da Lei Complementar nº 73/1993, os cargos de Corregedor-Geral e de Corregedor Auxiliar são privativos de membros efetivos da Advocacia-Geral da União, não podendo ser ocupados por outras categorias de servidores. Contrariando tal disposição, o art. 8° do Decreto nº 5.480/2005 atribui a titularidade de unidades setoriais de correição a servidores e empregados de carreiras diversas, como, por exemplo, integrantes da carreira de Finanças e Controle ou ex-servidores e ex-empregados permanentes aposentados, bem como condiciona a indicação à apreciação do Órgão Central do Sistema de Correição. 

35. Constata-se, também, que as competências conferidas à Corregedoria-Geral da Advocacia da União, pela Lei Complementar nº 73/1993, tampouco podem ser consideradas "atividades auxiliares comuns a todos os órgãos da Administração" ou de suas corregedorias, e muito menos "atividades de pessoal, orçamento, estatística, administração financeira, contabilidade e auditoria, e serviços gerais", estas sim passíveis de estruturação sob a forma de sistema (art. 30 do Decreto-Lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967)  para os órgãos e entidades de Ministérios, que não foram constitucionalmente qualificados como função essencial à Justiça.

36. Assim, uma vez mais, se constata que a Corregedoria-Geral da Advocacia da União não integra o Sistema de Correição do Decreto nº 5.480/2005, aplicável aos órgãos correicionais do Poder Executivo, tendo em vista que toda sua disciplina e funcionamento foi estabelecida na Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União (Lei Complementar nº 73/93). 

37. Com efeito, não encontra amparo na Constituição Federal e na mencionada Lei Complementar a interpretação de norma legal ou infralegal de que resulte interferência de outros órgãos ou agentes públicos do Poder Executivo na organização e no funcionamento da Advocacia-Geral da União, tendo em vista que a Carta Magna, concedendo o mesmo tratamento ao Ministério Público, à Advocacia Pública e à Defensoria Pública, definiu que seus tais instituições possuem prerrogativas próprias decorrentes de suas funções consideradas essenciais à Justiça.

38. Em suma, diante dessas considerações, verifica-se que, seja pelo critério hierárquico (Constituição Federal), seja pelo critério da especialidade (Lei Complementar nº 73/93), não há como atribuir, por meio de norma infralegal (Decreto nº 5.480/2005), competências correicionais relativas à Advocacia-Geral da União a órgão diverso da respectiva Corregedoria-Geral da Advocacia da União. Desse modo, entende-se correta a revogação do parágrafo 4º do art. 2º do referido Decreto, que vinculava tecnicamente a unidade de correição da Advocacia-Geral da União, ou seja, a CGAU, ao Sistema de Correição do Poder Executivo Federal.

39. Dito de outro modo, concordar com a aplicação do Decreto nº 5.480/2005 às atividades correicionais e disciplinares da Advocacia-Geral da União e de seus órgãos vinculados, significaria anuir com o afastamento das determinações da Constituição Federal (art. 131) e da Lei Complementar nº 73/1993 (art. 4º, 5º, 6º, 32, 33, 45 e 49, §1º), de que derivam tanto a competência exclusiva do AGU para tratar da estrutura e do funcionamento dos órgãos da Instituição, quanto a de editar atos normativos inerentes às suas funções – situação jurídica que inevitavelmente colidiria com os citados princípios da hierarquia e da especialidade das normas.

40. Em abono às considerações de antinomia jurídica acima, cite-se doutrina tradicional e abalizada da eminente professora Maria Helena Diniz sobre os referidos princípios:

"Os critérios normativos para solução de antinomias de direito interno são (BOBBIO, p. 237-58. FERRAZ JR., 1978b, p.14):

a) hierárquico ("lex superior derogat legi inferiori") previsto na CF - 59, baseado na superioridade de uma fonte de produção jurídica sobre a outra. O princípio lex superior quer dizer que em um conflito entre normas de diferentes níveis, a de nível mais alto, qualquer que seja a ordem cronológica, terá preferência em relação à de nível mais baixo. Assim p. ex. a norma constitucional prevalecerá sobre uma lei;

(...)

c) o da especialidade ("lex specialis derogat legi generalis"), que visa a consideração da matéria normada, com o recurso dos meios interpretativos. Uma norma é especial se possuir em sua definição legal todos os elementos típicos da norma geral e mais alguns de natureza objetiva ou subjetiva, denominados especializantes. Há uma diversificação do desigual. Tratamento desigual ao desigual, (segunda parte do princípio da isonomia, CF art. 5º) fazendo as diferenciações exigidas fática e axiologicamente. Realmente se, em certas circunstâncias, uma norma ordena ou permite determinado comportamento somente a algumas pessoas, as demais, em idênticas situações, não são alcançadas por ela, por se tratar de disposição excepcional, que só vale para as situações normadas."

 (DINIZ, Maria Helena. A antinomia real e a polêmica do diálogo das fontes. Curitiba, Revista Jurídica Unicuritiba. 2019, V. 03, n. 53, p. 228-247) (destacou-se)

41. Enfim, considerando que a Constituição Federal (art. 131), a Lei Complementar nº 73/1993 e a Lei nº 13.327/2016 estabeleceram um regramento próprio à Advocacia-Geral da União, o Decreto nº 5.480, de 30 de junho de 2005, não se aplica às atividades correicionais e disciplinares da Advocacia-Geral da União e de seus órgãos vinculados.

III - DA CONCLUSÃO

42. Diante de todo o exposto, conclui-se que a organização e o funcionamento das atividades correicionais e disciplinares da Advocacia-Geral da União e de seus órgãos vinculados não se submetem às disposições do Decreto nº 5.480/2005, com redação dada pelo Decreto nº 10.768/2021, não integrando o Sistema de Correição do Poder Executivo Federal, em especial, pelos seguintes fundamentos jurídicos:

(i) incidência dos princípios da hierarquia e da especialidade das normas;

(ii) a Advocacia-Geral da União - AGU foi inserida em capítulo específico da Constituição Federal de 1988, denominado “Das Funções Essenciais à Justiça” (art. 131, CF), demonstrando o Constituinte importante preocupação em fixar as competências da Instituição;

(iii) o art.131 da Constituição Federal determina que a organização e o funcionamento da Advocacia-Geral da União são disciplinados por Lei Complementar;

(iv) o art. 4º, XIV e XVIII, e 45, §1º, da Lei Complementar nº 73/1993, que confere ao Advogado-Geral da União competência exclusiva para definir a estrutura e funcionamento dos órgãos da Advocacia-Geral da União, entre os quais se encontra a Corregedoria-Geral da Advocacia da União;

(v) a Lei Complementar nº 73/1993 conferiu à Advocacia-Geral da União uma organização e funcionamento próprios, com competências correicionais apartadas do Sistema de Correição do Poder Executivo Federal previsto no Decreto nº 5.480/2005;  

(vi) a Lei Complementar nº 73/1993 estabelece, dentre outras atribuições exclusivas, a orientação normativa da atuação de seus Membros e de seus órgãos integrantes e vinculados (art. 4º, I, XIII e XVIII), a disciplina dos procedimentos administrativos concernentes aos trabalhos da Advocacia-Geral da União (art. 45, §3º), a decisão de sindicâncias e  processos administrativos disciplinares promovidos pela Corregedoria-Geral da Advocacia da União (CGAU/AGU), além da aplicação de penalidades (art. 4º, XV);

(vii) nos termos dos arts. 5º, inciso II, 6º e 32 da Lei Complementar nº 73/1993, as atribuições da Corregedoria-Geral da Advocacia da União vão além da esfera funcional/disciplinar, competindo-lhe também a verificação da regularidade e eficácia/eficiência dos serviços jurídicos prestados pelos órgãos integrantes da AGU ou a ela vinculados, inclusive sugerindo medidas necessárias ao seu aprimoramento; e

(viii) a Lei nº 13.327/2016 no exercício de suas funções, dos ocupantes dos cargos de que trata o referido Capítulo (I - de Advogado da União; II - de Procurador da Fazenda Nacional; III - de Procurador Federal; IV - de Procurador do Banco Central do Brasil; V - dos quadros suplementares em extinção previstos no art. 46 da Medida Provisória nº 2.229-43, de 6 de setembro de 2001) não serão responsabilizados, exceto pelos respectivos órgãos correicionais ou disciplinares, e que a apuração de falta disciplinar desses mesmos membros compete exclusivamente aos respectivos órgãos correicionais ou disciplinares próprios (art. 38). 

À consideração superior.

Brasília, 17 de novembro de 2021.

(assinado digitalmente)

JOSÉ AFFONSO DE ALBUQUERQUE NETTO

Advogado da União

Consultor da União

Este texto não substitui o publicado no DOU de 25.11.2021