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Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos

DECRETO Nº 3.900, DE 26 DE JUNHO DE 1867.

 

Regula o Juizo Arbitral do Commercio.

Hei por bem, de conformidade com a autorisação concedida pelo art. 3º da Lei nº 1350 de 14 de Setembro de 1866, Decretar o seguinte:

Art. 1º Fica derogado o Juizo Arbitral necessario estabelecido pelo art. 20 titulo unico do Codigo Commercial.

Art. 2º O Juizo Arbitral será sempre voluntario, e póde ser instituido antes ou na pendencia de qualquer causa; em 1ª ou 2ª instancia e até mesmo depois de interposta ou concedida a revista.

Art. 3º O Juizo Arbitral só póde ser instituido mediante o compromisso das partes.

Art. 4º Podem fazer compromisso todos os que podem transigir.

Art. 5º O compromisso ou é judicial ou extrajudicial.

Art. 6º O compromisso judicial póde ser feito na conciliação, ou durante a demanda, perante o juiz ou tribunal, onde ella pender, e por termo nos autos.

Art. 7º O compromisso extrajudicial póde ser feito por escriptura publica, ou por escripto particular assignado pelas partes e duas testemunhas.

Art. 8º O compromisso deve conter sob pena da nullidade:

§ 1º Os nomes, pronomes e domicilio dos arbitros.

§ 2º O objecto da contestação sujeita á decisão dos arbitros.

Art. 9º A clausula de compromisso, sem a nomeação de arbitros, ou relativa a questões eventuaes não vale senão como promessa, e fica dependente para sua perfeição e execução de novo e especial accordo das partes, não só sobre os requisitos do art. 8º senão tambem sobre as declarações do art. 10.

Paragrapho unico. Esta disposição é extensiva aos estatutos das companhias ou sociedades anonymas.

Art. 10. Além dos requisitos essenciaes do art. 8º podem as partes acrescentar no compromisso as seguintes declarações:

§ 1º O prazo, em que os arbitros devem dar a sua decisão.

§ 2º Se a decisão dos arbitros será executada - sem recurso.

§ 3º A pena convencional, que pagará á outra parte áquella que recorrer da decisão arbitral, não obstante a clausula - sem recurso.

A pena convencional nunca será maior que o terço do valor da demanda.

§ 4º Autorisação para os arbitros julgarem por equidade, independentemente das regras e firmas do direito.

§ 5º Autorisação para nomeação de 3º arbitro.

Art. 11. A pena convencional estipulada no compromisso será demandada quando e como determinão os arts. 66 e 70.

Art. 12. As partes devem no compromisso nomear um ou dous arbitros e tambem os respectivos substitutos, se isto lhes aprouver.

Art. 13. E' tambem livre ás partes nomear o 3º arbitro para o caso de divergencia, ou autorisar aos dous arbitros para essa nomeação.

Art. 14. Se as partes não tiverem nomeado o 3º arbitro, nem autorisado a sua nomeação, a divergencia dos dous arbitros extingue o compromisso.

Art. 15. Podem ser arbitros todas as pessoas que merecerem a confiança das partes.

Exceptão-se:

§ 1º Os surdos e mudos.

§ 2º Os cegos.

§ 3º Os menores.

§ 4º As mulheres.

§ 5º Os interdictos.

§ 6º O analphabeto.

§ 7º O estrangeiro que não souber a lingua nacional.

§ 8º O inimigo capital.

§ 9º O amigo intimo.

§ 10. O parente por consanguinidade ou affinidade até o segundo gráo, contado por direito cononico.

§ 11. O que tiver particular interesse na decisão da causa, como socio, o advogado, o procurador e o dependente de qualquer das partes.

Art. 16. Todavia podem ser arbitros as pessoas designadas nos paragraphos seguintes, não obstante a razão de suspeição, sendo esta razão conhecida pelas partes e expressamente declarada no compromisso:

§ 1º O amigo comum.

§ 2º O parente entre os parentes.

Art. 17. Podem tambem ser nomeados arbitros:

§ 1º O Juiz de Paz no acto da conciliação.

§ 2º O Juiz de 1ª Instancia.

§ 3º Qualquer membro dos Tribunaes Superiores.

Art. 18. Tem lugar a disposição do artigo antecedente, ainda que pelo compromisso os arbitros tenhão poder, para jugar independentemente das regras e fórmas do direito.

Art. 19. Instituido o Juiz Arbitral por compromisso judicial ou extrajudicial começará a causa perante os arbitros nomeados.

Art. 20. Se já a lide estiver pendente, junto aos autos o compromisso judicial ou extrajudicial, ou assignado o termo pelos compromittentes, o Juiz do feito ordenará ao Escrivão que devolva os autos ao Juiz Arbitral sem dependencia da intimação das partes.

Art. 21. Se a causa se achar na segunda instancia, ou interposta ou já concedida a revista, será a petição para ajuntar o compromisso dirigida no primeiro caso ao Presidente do Tribunal do Commercio; no segundo caso ao mesmo Presidente ou ao do Supremo Tribunal de Justiça, se já o recurso tiver sido ahi apresentado; e no terceiro ao Presidente do Supremo Tribunal ou o do Tribunal Revisor, se já alli estiverem os autos da revista.

Art. 22. Em qualquer dos casos do artigo antecedente os respectivos Presidentes mandaráõ autoar o compromisso e mais papeis, que acompanharem a petição, ordenando que os autos sejão devolvidos ao Juiz competente, para ter lugar o Juizo Arbitral.

Art. 23. Não havendo tempo marcado para os arbitros darem a sua decisão, será este de dous mezes a contar da aceitação expressa ou tacita dos mesmos arbitros.

Art. 24. O prazo legal ou convencional para decisão arbitral póde ser prorogado por expresso consentimento das partes, com tanto que a prorogação tenha lugar antes de expirado o primeiro prazo, sendo junto aos autos o documento respectivo.

Art. 25. Os arbitros nomeados aceitaráõ ou se escusaráõ dentro de oito dias, depois que lhes fôr notificada a nomeação, e se nesse prazo nada disserem, julgar-se-ha terem aceitado.

Art. 26. Fica extincto o compromisso:

§ 1º Divergindo os arbitros se no compromisso as partes não tiverem nomeado 3º arbitro ou autorisado a sua nomeação (art. 14).

§ 2º Escusando-se qualquer dos arbitros antes de aceitar, não havendo no compromisso substituto nomeado.

§ 3º Fallecendo ou impossibilitando-se por qualquer modo antes da decisão algum dos arbitros, se no compromisso não houver substituto nomeado.

§ 4º Sendo julgada procedente a recusação de algum dos arbitros, não havendo no compromisso substituto nomeado.

§ 5º Tendo expirado o prazo convencional, ou legal (art. 10 § 1º e art. 24).

§ 6º Fallecendo alguma das partes, sendo algum dos herdeiros menor.

Art. 27. Em qualquer dos casos do artigo antecedente reverteráõ os autos ao Juizo ordinario, se já houver causa pendente para proseguir nos termos ulteriores, ou proporão as partes as acções, que julgarem competir-lhes.

Art. 28. Depois de aceita a nomeação expressa ou tacitamente (art. 25) não poderão os arbitros escusar-se ao encargo, que recebêrão.

Art. 29. Terminado o prazo marcado para a decisão da causa (art. 26 § 5º) poderá o Juiz punir com multa de um a 5% do valor da causa e prisão de 8 a 20 dias, o arbitro que fôr convencido de conluio com uma das partes para demorar a decisão ou frustrar o compromisso.

Art. 30. Este julgamento será summario: ouvido o accusado por escripto sobre a petição e documentos da parte, dentro de tres dias improrogaveis, inquiridas verbalmente as testemunhas, se as houver, o Juiz proferirá a sua sentença por escripto, como de direito fôr.

Desta sentença compete aggravo de petição ou de instrumento.

Art. 31. Feita a nomeação dos arbitros, só por commum accordo das partes poderá ser revogada.

Art. 32. Só poderão os arbitros ser recusados pelas partes por causa legal posterior ao compromisso, salvo se della não tinhão conhecimento, e jurarem ter chegado á sua noticia depois da nomeação.

Art. 33. São causas legaes de recusação dos arbitros, todas as enumeradas no art. 15; e proposta por escripto será julgada na fórma do art. 196 do Regulamento nº 737 de 1850.

Art. 34. Aceita a nomeação (art. 25) os arbitros nomeados ordenaráõ por despacho, que as partes deduzão sua intenção nos termos, que serão marcados segundo a difficuldade e complicação do negocio, e não poderão exceder de 10 dias para cada uma.

Art. 35. O Escrivão fará os autos com vista ao Advogado de cada uma das partes, e findo o termo, os cobrará com razões ou sem ellas.

Art. 36. Quando alguma das partes não tenha Advogado, poderá no prazo marcado apresentar assignadas as suas allegações com os documentos respectivos, independente de vista dos autos.

Art. 37. Se alguma das partes não allegar ou não ajuntar os seus documentos nos prazos marcados, irá por diante a causa; e não se ajuntaráõ depois, salvo se nisso convier a outra parte.

Art. 38. Quando a causa precisar de maior discussão, ou o réo com a sua contestação ajuntar novos documentos, de que o autor não tenha feito menção, poderá conceder-se ao autor para replicar e ao réo para treplicar novo prazo, que nunca excederá de cinco dias.

Art. 39. Terminados os prazos, se as partes, ou alguma dellas protestou por prova testemunhal será marcada para isso uma só dilação, que não poderá ser maior de 10 dias.

Art. 40. As testemunhas serão inqueridas pelas partes, que as produzirem, seus advogados ou procuradores na presença dos arbitros, no dia, lugar e hora marcados pelo Escrivão, com intimação das partes, ou seus procuradores.

Art. 41. No Juizo Arbitral serão admittidas todas as provas admissiveis no juizo ordinario.

Art. 42. Findo o termo probatorio serão os autos confiados aos arbitros em commum por cinco dias para os examinar, findos os quaes declararáõ por cóta se os achão em estado de ser julgados.

Art. 43. Se qualquer dos arbitros entender que a questão não está sufficientemente esclarecida, poderá mandar proceder ao exame ou diligencia que julgar conveniente, e mesmo ao juramento de alguma das partes para ajuda de prova.

Art. 44. Qualquer destas diligencias póde tambem ser feita a requerimento das partes, se alguma dellas o requerer até encerrar-se o termo probatorio.

Art. 45. Se os arbitros entenderem que a causa se acha em termos de ser julgada, assim o declararáõ por despacho, mandando que sellados os autos, se lhes fação conclusos para sentença final.

Art. 46. Os arbitros julgaráõ de facto e de direito conforme a lei, e as clausulas do compromisso; salvo se no compromisso (art. 10 § 4º) as partes os autorisarem para julgar por equidade, independentemente das regras e fórmas do direito.

Art. 47. Quando os arbitros tiverem poderes para julgar por equidade, independentemente das regras fórmas do direito, poderão prescindir do processo estabelecido nos artigos antecedentes, e darão a sua decisão ouvindo verbal e summariamente as partes e testemunhas; reduzindo a termo os depoimentos das testemunhas, e admittindo os memoriaes que as partes offerecerem.

Art. 48. A sentença dos arbitros será datada e assignada em commum, se concordarem, ou separadamente se discordarem.

Art. 49. Se concordarem em parte e em parte discordarem, poderão na mesma sentença declarar aquillo em que concordão e aquillo em que discordão.

Art. 50. Se occorrer divergencia entre os arbitros, e no compromisso as partes não tiverem nomeado 3º arbitro, ou autorisado a sua nomeação, o Escrivão fará os autos conclusos ao Juiz para declarar extincto o compromisso (arts. 14 e 26 § 1º)

Art. 51. Se pelo compromisso estiverem os arbitros autorisados para nomeação do 3º arbitro, o Escrivão fará os autos conclusos aos mesmos arbitros para a nomeação do 3º arbitro.

Art. 52. Os arbitros, conferenciando entre si, declararáõ por despacho datado e assignado em commum, ou a nomeação do 3º arbitro, ou a sua discordancia sobre essa nomeação.

Art. 53. Dada a discordancia entre os arbitros sobre a nomeação do 3º arbitro, o Escrivão procederá nos termos do art. 50.

Art. 54. Havendo 3º arbitro nomeado pelas partes, ou pelos arbitros, o Escrivão lhe fará os autos conclusos para desempatar.

Art. 55. O terceiro arbitro será sempre obrigado a conformar-se com a opinião de um dos arbitros, podendo todavia, se a decisão versar sobre questões diversas, adoptar em parte a opinião de um ou outro sobre cada um dos pontos divergentes.

Art. 56. Para decidir deverá o 3º arbitro conferenciar com os outros discordantes, que para isso serão notificados, e sómente decidirá por si não se reunindo os arbitros no prazo marcado para a conferencia.

Art. 57. Nestas conferencias poderão os arbitros discordantes modificar a sua opinião no todo ou na parte, em que discordárão, e do que se vencer entre elles á pluralidade se lavrará sentença por todos assignada.

Art. 58. O terceiro arbitro dará a sua decisão na fórma determinada nos artigos antecedentes dentro do prazo de 20 dias, contados da publicação da sentença dos outros arbitros, se não fôr outro prazo marcado para este fim no compromisso, ou se não fôr renovado por mutuo accordo das partes.

Art. 59. A sentença arbitral só póde ser executada depois de homologada.

Art. 60. A sentença arbitral proferida pelo Juiz da 1ª instancia ou por qualquer membro dos Tribunaes do Commercio, quér como arbitro unico e commum das partes, quér intervenha qualquer delles sómente como arbitro nomeado por uma dellas, será executada independentemente de homologação.

Art. 61. A sentença arbitral não aproveita nem prejudica a terceiro, que não assignou o compromisso; mas os herdeiros e successores dos que o assignárão respondem pelos seus resultados, e são obrigados a cumprir tudo a que serião obrigados aquelles a quem succedem, ainda que sejão menores, ou outras quaesquer pessoas sujeitas á euratella.

Art. 62. Se o compromisso não contiver a clausula - sem recurso - appellando alguma das partes será a causa decidida em 2ª instancia pela fórma e modo por que são julgadas as causas da jurisdicção ordinaria.

Art. 63. E' livre ás partes sob sua responsabilidade appellar da sentença arbitral, não obstante a clausula - sem recurso -.

Art. 64. Ao tribunal superior compete decidir se o caso é de appellação, não obstante a clausula - sem recurso -.

Art. 65. A clausula - sem recurso - não obsta a appellação:

§ 1º Sendo nullo ou extincto o compromisso.

§ 2º Excedendo os arbitros os poderes conferidos pelo compromisso.

§ 3º Preterindo os arbitros as fórmas essenciaes do processo.

Art. 66. Decidindo o Tribunal superior que não houve algum dos casos referidos no artigo antecedente, não tomará conhecimento da appellação.

Art. 67. Decidindo, porém, o Tribunal que o compromisso é nullo ou extincto, julgará nulla a decisão arbitral e mandará que se proceda na fórma do art. 27.

Art. 68. Outrosim, decidindo o Tribunal superior que os arbitros excedêrão os seus poderes, julgará nulla a decisão arbitral e mandará que os arbitros decidão de novo a causa, salva a disposição dos arts. 24 e 26 § 5º

Assim se procederá tambem quando o Tribunal decidir que houve preterição das fórmas essenciaes do processo.

Art. 69. Em qualquer dos casos dos arts. 67 e 68 a pena convencional ficará sem effeito.

Art. 70. A pena convencional no caso do art. 66 será demandada por acção de 10 dias.

Art. 71. Se a causa já pender em Juizo ordinario continuará a escrever no Juizo Arbitral o Escrivão que era do Feito.

Art. 72. Se a causa começar logo no Juizo Arbitral escreverá no feito qualquer dos Escrivães do civel a, quem tocar por distribuição a requerimento do autor.

Art. 73. Ao Juiz que presidir o Juizo Arbitral compete:

§ 1º Proceder ás diligencias que lhe forem requeridas para instituição do Juizo arbitral. (Art. 19 e seguintes).

§ 2º Impôr a pena marcada no art. 29.

§ 3º Conhecer da recusação dos arbitros. (Art. 32 e seguintes.)

§ 4º Homologar e executar as sentenças arbitraes.

§ 5º Providenciar sobre todos os incidentes que dependerem de jurisdicção.

Art. 74. O Juiz de 1ª instancia do domicilio das partes compromittentes, ou de uma dellas, quando fôr diverso, qual fôr por ellas escolhido, será o competente para presidir ao Juizo arbitral.

Art. 75. Continuaráõ a ser julgados conforme o Codigo do Commercio os processos do Juizo Arbitral necessario, começados antes deste Regulamento, estando já os arbitros nomeados e tendo aceitado.

Art. 76. Ficão revogadas as disposições em contrario.

Martim Francisco Ribeiro de Andrada, do Meu Conselho, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Justiça, assim o tenha entendido e faça executar. Palacio do Rio de Janeiro em vinte seis de Junho de mil oitocentos sessenta e sete, quadragesimo sexto da Independencia e do Imperio.

Com a rubrica de Sua Magestade o Imperador.

Martim Francisco Ribeiro de Andrada.

Este texto não substitui o publicado na CLBR, de 1867

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