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Presidência
da República |
MENSAGEM Nº 752, DE 24 DE DEZEMBRO DE 2020
Senhor Presidente do Senado Federal,
Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do § 1o do art. 66 da Constituição, decidi vetar parcialmente, por contrariedade ao interesse público e inconstitucionalidade, o Projeto de Lei nº 4.458, de 2020 (nº 6.229/05 na Câmara dos Deputados), que “Altera as Leis nºs 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, 10.522, de 19 de julho de 2002, e 8.929, de 22 de agosto de 1994, para atualizar a legislação referente à recuperação judicial, à recuperação extrajudicial e à falência do empresário e da sociedade empresária”.
Ouvido, o Ministério da Economia manifestou-se pelo veto aos seguintes dispositivos:
§ 10 do art. 6º da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, acrescido pelo art. 1º do projeto de lei
“§ 10. Na hipótese de recuperação judicial, também serão suspensas as execuções trabalhistas contra responsável, subsidiário ou solidário, até a homologação do plano ou a convolação da recuperação judicial em falência.”
Razões do veto
“A propositura legislativa dispõe que, na hipótese de recuperação judicial, também serão suspensas as execuções trabalhistas contra responsável, subsidiário ou solidário, até a homologação do plano ou a convolação da recuperação judicial em falência.
Entretanto, e embora se reconheça o mérito da proposta, o dispositivo contraria o interesse público por causar insegurança jurídica ao estar em descompasso com a essência do arcabouço normativo brasileiro quanto à priorização dos créditos de natureza trabalhista e por acidentes de trabalho, nos termos do art. 186 do Código Tributário Nacional - CTN, e da própria sistemática instituída pela Lei nº 11.101, de 2005, para a proteção desses créditos.”
Art. 6º-B da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, acrescido pelo art. 2º do projeto de lei
“Art. 6º-B. Não se aplica o limite percentual de que tratam os arts. 15 e 16 da Lei nº 9.065, de 20 de junho de 1995, à apuração do imposto sobre a renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) sobre a parcela do lucro líquido decorrente de ganho de capital resultante da alienação judicial de bens ou direitos, de que tratam os arts. 60, 66 e 141 desta Lei, pela pessoa jurídica em recuperação judicial ou com falência decretada.
Parágrafo único. O disposto no caput deste artigo não se aplica na hipótese em que o ganho de capital decorra de transação efetuada com:
I - pessoa jurídica que seja controladora, controlada, coligada ou interligada; ou
II - pessoa física que seja acionista controlador, sócio, titular ou administrador da pessoa jurídica devedora.”
Razões dos vetos
“A propositura legislativa dispõe que não se aplica o limite percentual de que tratam os arts. 15 e 16 da Lei nº 9.065, de 1995, à apuração do imposto sobre a renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) sobre a parcela do lucro líquido decorrente de ganho de capital resultante da alienação judicial de bens ou direitos, nos casos especificados na Lei nº 11.101, de 2005, pela pessoa jurídica em recuperação judicial ou com falência decretada.
Entretanto, embora a boa intenção do legislador, a medida acarreta renúncia de receita, sem o cancelamento equivalente de outra despesa obrigatória e sem que esteja acompanhada de estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro, o que viola o disposto no art. 113 da ADCT, e no art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal.”
Art. 50-A da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, acrescido pelo art. 2º do projeto de lei
“Art. 50-A. Nas hipóteses de renegociação de dívidas de pessoa jurídica no âmbito de processo de recuperação judicial, estejam as dívidas sujeitas ou não a esta, e do reconhecimento de seus efeitos nas demonstrações financeiras das sociedades, deverão ser observadas as seguintes disposições:
I - a receita obtida pelo devedor não será computada na apuração da base de cálculo da Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) e para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins);
II - o ganho obtido pelo devedor com a redução da dívida não se sujeitará ao limite percentual de que tratam os arts. 42 e 58 da Lei nº 8.981, de 20 de janeiro de 1995, na apuração do imposto sobre a renda e da CSLL; e
III - as despesas correspondentes às obrigações assumidas no plano de recuperação judicial serão consideradas dedutíveis na determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL, desde que não tenham sido objeto de dedução anterior.
”Parágrafo único. O disposto no caput deste artigo não se aplica à hipótese de dívida com:
I - pessoa jurídica que seja controladora, controlada, coligada ou interligada; ou
II - pessoa física que seja acionista controladora, sócia, titular ou administradora da pessoa jurídica devedora.”
Razões do veto
“Os dispositivos propostos concedem benefícios tributários para hipóteses de renegociação de dívidas de pessoa jurídica no âmbito de processo de recuperação judicial, estejam as dívidas sujeitas ou não a esta, e do reconhecimento de seus efeitos nas demonstrações financeiras das sociedades, nos termos das disposições especificadas no próprio projeto.
Entretanto, e embora se reconheça a boa intenção do legislador, tais medidas ofendem o princípio da isonomia tributária, acarretam renúncia de receita, sem o cancelamento equivalente de outra despesa obrigatória e sem que esteja acompanhada de estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro, o que viola o art. 113 da ADCT, e o art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal.”
Já os Ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e da Economia manifestaram-se pelo veto ao dispositivo transcrito a seguir:
Art. 11 da Lei nº 8.929, de 22 de agosto de 1994, alterado pelo art. 4º do projeto de lei
“Art. 11. Não se sujeitarão aos efeitos da recuperação judicial os créditos e as garantias cedulares vinculados à CPR com liquidação física, em caso de antecipação parcial ou integral do preço, ou, ainda, representativa de operação de troca por insumos (barter), subsistindo ao credor o direito à restituição de tais bens que se encontrarem em poder do emitente da cédula ou de qualquer terceiro, salvo motivo de caso fortuito ou força maior que comprovadamente impeça o cumprimento parcial ou total da entrega do produto.
Parágrafo único. Caberá ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento definir quais atos e eventos caracterizam-se como caso fortuito ou força maior para os efeitos deste artigo.”
Razões do veto
“A propositura legislativa dispõe que não se sujeitarão aos efeitos da recuperação judicial os créditos e as garantias cedulares vinculados à CPR com liquidação física, em caso de antecipação parcial ou integral do preço, ou, ainda, representativa de operação de troca por insumos (barter), subsistindo ao credor o direito à restituição de tais bens que se encontrarem em poder do emitente da cédula ou de qualquer terceiro, salvo motivo de caso fortuito ou força maior que comprovadamente impeça o cumprimento parcial ou total da entrega do produto.
Embora a boa intenção do legislador, e de acordo com o Ministério da Economia, a medida contraria o interesse público, haja vista que a inclusão das hipóteses de caso fortuito e força maior, como causas excludentes da exigência da cobrança da CPR na recuperação judicial, promove a alteração de risco do crédito, fato que torna-o mais caro, minora a confiança nesse título, e reduz os negócios realizados por meio desse importante instrumento, em prejuízo ao aprimoramento das regras relativas à emissão da CPR, a fim de alavancar o crédito para o setor rural.
Ademais, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, manifestou-se exclusivamente pelo veto ao parágrafo único do artigo pois este usurpa a competência privativa de iniciativa legislativa do Presidente da República, em ofensa ao art. 61, § 1º, II, e, da Constituição da República (v.g. ADI 4288, Rel. Edson Fachin, Rel. p/ Acórdão: Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, julgado em 29/06/2020, DJe-201, D. 12/08/2020, p. 13/08/2020).”
O Ministério da Saúde opinou pelo veto ao dispositivo transcrito a seguir:
§ 13 do art. 6º da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, acrescido pelo art. 1º do projeto de lei
“§ 13. Não se sujeitam aos efeitos da recuperação judicial os contratos e obrigações decorrentes dos atos cooperativos praticados pelas sociedades cooperativas com seus cooperados, na forma do art. 79 da Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971, consequentemente, não se aplicando a vedação contida no inciso II do art. 2º quando a sociedade operadora de plano de assistência à saúde for cooperativa médica.”
Razões do veto
“A propositura legislativa dispõe que não se sujeitam aos efeitos da recuperação judicial os contratos e obrigações decorrentes dos atos cooperativos praticados pelas sociedades cooperativas com seus cooperados, na forma do art. 79 da Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971, bem como aduz que a vedação contida no inciso II do art. 2º da Lei nº 11.101, de 2005, não se aplica quando a sociedade operadora de plano de assistência à saúde for cooperativa médica.
Embora a boa intenção do legislador, a medida contraria o interesse público, pois a previsão de recuperação judicial somente para cooperavas médicas, além de ferir o princípio da isonomia em relação as demais modalidades societárias, afasta os instrumentos regulatórios que oportunizam às operadoras no âmbito administrativo a recuperação de suas anormalidades econômico- financeiras e as liquidações extrajudiciais.
Ademais, tem-se, ainda, que a criação dessa excepcionalidade impacta nas concessões de portabilidades especiais de carências a beneficiários de operadoras a serem compulsoriamente retiradas do mercado regulado, em prejuízo ao acompanhamento econômico-financeiro das operadoras pela Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS, e submete milhões de brasileiros a riscos de desassistência.”
Ouvidos, a Advocacia-Geral da União e o Ministério da Justiça e Segurança Pública manifestaram-se pelo veto aos seguintes dispositivos:
Parágrafo único do art. 60 e § 3º do art. 66 da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, alterados pelo art. 1º do projeto de lei
“Parágrafo único. O objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor de qualquer natureza, incluídas, mas não exclusivamente, as de natureza ambiental, regulatória, administrativa, penal, anticorrupção, tributária e trabalhista, observado o disposto no § 1º do art. 141 desta Lei.”
“§ 3º Desde que a alienação seja realizada com observância do disposto no § 1º do art. 141 e no art. 142 desta Lei, o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do adquirente nas obrigações do devedor, incluídas, mas não exclusivamente, as de natureza ambiental, regulatória, administrativa, penal, anticorrupção, tributária e trabalhista.”
Razões dos vetos
“Os dispositivos propostos dispõem que, na hipótese de o plano de recuperação judicial aprovado envolver alienação judicial, o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor de qualquer natureza, incluídas, mas não exclusivamente, as de natureza ambiental, regulatória, administrativa, penal, anticorrupção, tributária e trabalhista.
Todavia, e embora se reconheça a boa intenção do legislador, a medida contraria a moldura constitucional pátria, notadamente no que tange às obrigações ambientais, nos termos do caput do art. 225 e do inciso II do art. 186, ambos da Constituição da República, haja vista que a responsabilidade pela reparação de eventual dano ambiental causado recairá não apenas sobre aquele que o houver causado, mas também sobre aquele que houver adquirido o bem que sofreu (e sofre( o dano a ser reparado, ante a natureza jurídica de tal reparação, que é objetiva e por causa da coisa (propter rem), nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal (v. g. RE 698.284, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, data de julgamento 24/06/2014, Dje 31/07/2014, p. 01/08/2014; AI 729.635, Rel. Min. Marco Aurélio, data de julgamento 21/09/2018, Dje 25/09/2018. PP. 26/09/2018; entre outros).
Ademais, os dispositivos também contrariam as obrigações de natureza anticorrupção, haja vista que a excepcionalidade criada está em descompasso com os direitos fundamentais à probidade e à boa administração pública, além de ir de encontro ao interesse público, uma vez que podem implicar insegurança jurídica, além de prejuízo ao erário e no incremento de ações junto ao Poder Judiciário no combate à corrupção.”
Essas, Senhor Presidente, as razões que me conduziram a vetar os dispositivos acima mencionados do projeto em causa, as quais submeto à elevada apreciação dos Senhores Membros do Congresso Nacional.”
Este texto não substitui o publicado no DOU de 24.10.2020 - Edição extra