Presidência da República

Casa Civil

Subchefia para Assuntos Jurídicos

MENSAGEM Nº 632, DE 27 DE SETEMBRO DE 2005. 

        Senhor Presidente do Senado Federal,

        Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do § 1º do art. 66 da Constituição, decidi vetar parcialmente, por inconstitucionalidade e contrariedade ao interesse público, o Projeto de Lei nº 62, de 2004 (nº 3.846/00 na Câmara dos Deputados), que "Cria a Agência Nacional de Aviação Civil – ANAC, e dá outras providências".

        Ouvido, o Ministério da Fazenda manifestou-se pelo veto aos seguintes dispositivos:

Art. 30

"Art. 30. A exploração de aeródromos civis públicos será a título oneroso, constituindo o produto da arrecadação receita do Fundo Aeroviário.

Parágrafo único. O valor do ônus referido no caput deste artigo será equivalente a 50% (cinqüenta por cento) do montante da arrecadação das tarifas de embarque, domésticas e internacionais, incluindo seus adicionais, excluídas outras destinações legais."

Razões de veto

"Tal dispositivo sugere, em nosso entendimento, que poderão ser utilizados os institutos de concessão ou de permissão. Nesse sentido, poderia ser formulado, no caso da concessão, contrato entre a ANAC e a empresa exploradora da infra-estrutura aeroportuária, a fim de delimitar o período de concessão e regular os direitos e deveres entre as partes. Nesses termos, entendemos que não seria conveniente que o valor a ser pago esteja fixado em lei, uma vez que tal procedimento engessa desnecessariamente a administração pública.

Por outro lado, no caso da Infraero, que explora, em nome da União, diversos aeródromos no País, o percentual proposto pode afetar o seu desempenho e o cumprimento de metas de investimento previstos no Plano Plurianual da União, afetando, inclusive, o próprio Tesouro Nacional, caso este venha a ser chamado a realizar aportes adicionais de capital naquela empresa como forma de viabilizar seus programas de investimento."

Art. 48, caput e § 2o

"Art. 48. Os contratos de concessão em vigor relativos às outorgas de serviços aéreos cujos vencimentos se verifiquem antes de 31 de dezembro de 2010 ficam automaticamente prorrogados até aquela data.

..................................................................................

§ 2º Enquanto forem atendidas as exigências regulamentares de prestação de serviço adequado, ficam mantidos os eslotes atribuídos às empresas concessionárias de serviços aéreos."

Razões de veto

"O art. 183 da Lei nº 7.565, de 19 de dezembro de 1986 – Código Brasileiro de Aeronáutica, atribui ao Poder Executivo a regulamentação da outorga de concessões e autorizações para os serviços aéreos públicos.

Segundo o Código, os outorgados precisam observar as normas constitucionais, legais e técnicas aplicáveis ao setor em ordem para obter uma concessão ou autorização de serviço aéreo. Na medida em que o referido artigo provoca indiscriminada prorrogação do prazo de delegação desses serviços, não se atendendo em nenhum momento a tais critérios, limita sobremaneira a atuação constitucional do Poder Executivo para regular o setor, o que contraria, também, a intenção do CBA.

O § 2º, por sua vez, traz mais limitações ao poder regulador da ANAC, além de restringir a participação de novas empresas, na medida em que estabelece política de conservação de ‘slots’, tratando-os como ‘direito adquirido’ das empresas atuais. Tal fato claramente dificulta o acesso aos aeroportos pelas novas empresas, diminuindo a competitividade e a isonomia que deveria haver no setor.

Assim, é necessário que ocorra o veto ao art. 48, caput e § 2º, tendo em vista que estes estabelecem limitações desarrazoadas à competência constitucional e legal do Poder Executivo, bem como ao papel regulador da ANAC, prejudicando a concorrência, o desenvolvimento do setor e, em última instância, todos os usuários do transporte aéreo."

        Ouvidos, os Ministérios da Justiça e da Fazenda manifestaram-se pelo veto ao seguinte dispositivo:

§ 2o do art. 49

"Art. 49. ..................................................................................

...............................................................................................

§ 2º Constatando aumento abusivo das tarifas ou práticas prejudiciais à competição, a ANAC poderá estabelecer tarifas máximas ou mínimas para as linhas onde verificar irregularidade, sem prejuízo das sanções cabíveis.

.................................................................................."

Razões de veto

"A defesa da concorrência no País está estruturada em torno de um sistema, o chamado Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência - SBDC, cujo modelo institucional abarca, no âmbito do Ministério da Justiça, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica - CADE e a Secretaria de Direito Econômico - SDE e, na estrutura do Ministério da Fazenda, a Secretaria de Acompanhamento Econômico.

Ora, tratando-se de um sistema, como cediço – e por definição –, há de ser visto e compreendido como um todo harmônico, composto de elementos coordenados entre si e regidos por normas comuns, tendo em vista um determinado fim.

A legislação que rege o SBDC não prevê exclusões ou exceções no que se refere a seu escopo de atuação. A competência para julgar condutas anticompetitivas, em todos os setores da economia, é do Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE, inclusive em setores regulados por agências.

Observamos ainda os termos do Projeto de Lei nº 3.337, de 2004, de autoria do Poder Executivo, em tramitação no Congresso Nacional, que dispõe sobre ‘... a gestão, a organização, o controle social das Agências Reguladoras, etc.’, em cujo teor se prevê capítulo específico para tratar da ‘interação entre as agências reguladoras e os órgãos de defesa da concorrência’ (Capítulo III, do Projeto de Lei nº 3.337, de 2004), sempre no sentido de estabelecer o funcionamento harmônico entre tais órgãos.

Assim, a disposição irá acarretar conflitos de competência. Imagine-se a hipótese de a agência estipular preços mínimos para uma empresa acusada de estar praticando preços predatórios e a mesma empresa ser absolvida pelo CADE por essa prática.

Por fim, o dispositivo é contraditório com o art. 6º, o qual estabelece que se a ANAC ‘tomar conhecimento de fato que configure ou possa configurar infração contra a ordem econômica, ou que comprometa a defesa e a promoção da concorrência, deverá comunicá-lo aos órgãos e entidades referidos no caput deste artigo, para que adotem as providências cabíveis’ ou seja, não se prevê que as providências sejam tomadas pela própria ANAC."

        O Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão manifestou-se pelo veto ao seguinte dispositivo:

Art. 23

"Art. 23. A Diretoria poderá dispor sobre a alteração dos quantitativos e da distribuição dos Cargos Comissionados de Gerência Executiva, de Assessoria e de Assistência, dos Cargos Comissionados Técnicos, das Gratificações de Exercício em Cargo de Confiança e de Representação pelo Exercício de Função, observados os níveis hierárquicos, os valores de retribuição correspondentes e o respectivo custo global, estabelecidos nos Anexos I e II desta Lei."

Razões de veto

"O art. 23 contraria o disposto na alínea "a" do inciso VI do art. 84 da Constituição Federal, segundo o qual compete privativamente ao Presidente da República dispor, mediante decreto, sobre organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos."

        A Casa Civil da Presidência da República manifestou-se pelo veto aos seguintes dispositivos:

§ 1o do art. 14

"Art. 14 ..................................................................................

§ 1º Sem prejuízo do que prevêem a lei penal e a lei de improbidade administrativa, será causa da perda do mandato a inobservância por Diretor dos deveres e proibições inerentes ao cargo, inclusive no que se refere ao cumprimento das políticas estabelecidas para a aviação civil pelos Poderes Executivo e Legislativo.

............................................................................................."

Razões de veto

"Esse dispositivo trás em si, como inconveniente, a não-indicação, expressa e prévia, de quais ‘deveres e proibições inerentes ao cargo’ ensejariam a perda do cargo, parecendo deixar tal providência para decreto do Poder Executivo.

Essa vaguidade gera insegurança que pode ameaçar a autonomia desta agência reguladora. E talvez até mesmo contrarie o princípio da legalidade em matéria punitiva, que exige sejam fixadas em lei as condutas proibidas e as respectivas penas, como se depreende do art. 5º, incisos II e XXXIX, da Constituição.

Observe-se que, apesar do veto, aos diretores aplicar-se-ão a Lei de Improbidade Administrativa, o Código Penal e, no que for cabível, o Regime Jurídico Único. Logo, não parece haver a possibilidade de conduta eticamente condenável de Diretor ficar impune por falta de previsão em lei."

§ 3o do art. 36

"Art. 36. ..................................................................................

...............................................................................................

§ 3º Aos servidores da Carreira de Ciência e Tecnologia, redistribuídos na forma do § 2º deste artigo, será devida a Gratificação de Desempenho de Atividade de Ciência e Tecnologia de que trata a Lei nº 9.638, de 20 de maio de 1998, como se em exercício estivessem nos órgãos ou entidades a que se refere o § 1º do art. 1º da Lei nº 8.691, de 28 de julho de 1993."

Razões de veto

"O dispositivo implica aumento de despesa e não constava do projeto de lei enviado pelo Poder Executivo ao Congresso Nacional. Logo, há inconstitucionalidade por violação do art. 63, inciso I, da Constituição da República."

Art. 38 e Tabela "A" do Anexo I:

"Art. 38. O quantitativo de servidores ocupantes dos cargos ou empregos do Quadro de Pessoal Específico, acrescido dos servidores ou empregados requisitados, não poderá exceder o número de empregos efetivos fixados no Anexo I desta Lei.

§ 1º À medida que forem extintos os cargos ou empregos do Quadro de Pessoal Específico, é facultado à ANAC o preenchimento de empregos por pessoal concursado para o Quadro de Pessoal Efetivo.

§ 2º Se o quantitativo de cargos ou empregos do Quadro de Pessoal Específico for inferior ao do Quadro de Pessoal Efetivo, é facultada à ANAC a realização de concurso para preenchimento dos empregos excedentes."

"ANEXO I

A) QUADRO DEMONSTRATIVO DOS EMPREGOS E CARGOS
EFETIVOS DA AGÊNCIA NACIONAL DE AVIAÇÃO CIVIL

EMPREGO

QUANTITATIVO

Regulador 922
Analista de Suporte à Regulação 307
Técnico de Regulação 526
TOTAL 1755

 

Procurador Federal

50

"

Razões de veto

"Houve expressivo aumento, por emenda parlamentar, do quantitativo de empregos públicos mais graduados (Regulador e Analista de Suporte à Regulação), os quais, evidentemente, terão que ser mais bem remunerados do que os empregos de nível médio suprimidos (Técnico de Regulação e Técnico de Suporte à Regulação). Logo, apesar de não ter havido aumento do quantitativo total de empregos públicos, houve claro aumento da graduação dos empregos públicos criados, acarretando inegável aumento de despesa em projeto de lei de iniciativa privativa do Presidente da República.

Assim, inafastável a inconstitucionalidade formal por violação dos arts. 61, § 1º, II, "a", e 63, inciso I, da Constituição da República, nos termos do decidido reiteradas vezes pelo Supremo Tribunal Federal, in verbis:

‘REGIME JURÍDICO DOS SERVIDORES PÚBLICOS ESTADUAIS. APOSENTADORIA E VANTAGENS FINANCEIRAS. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL. VÍCIO QUE PERSISTE, NÃO OBSTANTE A SANÇÃO DO RESPECTIVO PROJETO DE LEI. PRECEDENTES. 1. Dispositivo legal oriundo de emenda parlamentar referente aos servidores públicos estaduais, sua aposentadoria e vantagens financeiras. Inconstitucionalidade formal em face do disposto no artigo 61, § 1º, II, "c", da Carta Federal. 2. É firme na jurisprudência do Tribunal que a sanção do projeto de lei não convalida o defeito de iniciativa. Precedentes. Procedência da ação. Inconstitucionalidade da Lei nº 1.786, de 09 de janeiro de 1991, do Estado do Rio de Janeiro.’

(ADI 700/RJ. Rel. (a): Min. Maurício Corrêa. julg. 23/05/2001 - Tribunal Pleno)

Ademais, a constitucionalidade de criação de empregos públicos no âmbito de autarquia está sendo controvertida no Supremo Tribunal Federal na Ação Direita de Inconstitucionalidade nº 2135, sendo que os primeiros votos foram no sentido da inconstitucionalidade (Informativo STF nº 274).

Diante disso, se faz necessário veto ao Quadro ‘A’ do Anexo I, por estabelecer o quantitativo de empregos públicos, e ao art. 38, por conter disposições que restam sem aplicabilidade diante do veto da disposição do Anexo.

Esclareça-se que não se está requerendo o veto ao art. 21, porque este trata também de cargos nos quais não parece haver vício de inconstitucionalidade. E o veto ao quantitativo de empregos do Anexo parece bastar para atingir o resultado material de que a ANAC não tenha empregos públicos em seus quadros.

Esclareça-se também que o fato do veto também atingir o quantitativo de cargos de Procurador Federal não tem nenhuma conseqüência material, pois esta disposição está apenas repetindo o disposto no art. 41, com relação ao qual não se requer o veto.

Por fim, registre-se que o veto não condenará a ANAC a ficar sem servidores efetivos ou, muito menos, a restar inviabilizada, pois em curto espaço de tempo se estará apresentando proposta de norma visando a criação de cargos efetivos para a ANAC. E a criação desses cargos poderá ser realizada dentro do período previsto no art. 7º, bem como a realização de concurso público e a nomeação dos aprovados poderá se dar muito antes do prazo previsto no art. 39."

§ 1o do art. 39

"Art. 39. ..................................................................................

§ 1º A contratação de pessoal temporário poderá ser efetivada à vista de notória capacidade técnica ou científica do profissional, mediante análise de curriculum vitae.

.............................................................................................."

Razões de veto

"O veto impõe-se posto que a redação do dispositivo contraria o interesse público ao permitir a contratação temporária de pessoal, na ANAC, à luz de simples análise de curriculum vitae. É necessário salientar que a contratação temporária, para essa hipótese, inclui o atendimento de todas as situações de necessidades decorrentes da implantação da agência, inclusive aquelas em que a contratação não envolve alto grau de qualificação técnica ou experiência profissional.

Assim, a situação a que se dirige não pode dispensar, como regra, o atendimento ao princípio da impessoalidade, o que deve ser assegurado mediante a realização de processo que inclua, obrigatoriamente, prova escrita e, facultativamente, análise de curriculum vitae sem prejuízo de outras modalidades que, a critério da entidade contratante, venham a ser exigidas.

Essa é, inclusive, a regra aplicável às demais agências reguladoras, nos termos do art. 30, § 1º, da Lei nº 10.871, de 20 de maio de 2004, que disciplinou a contratação temporária de pessoal para agências reguladoras."

Art. 44

"Art. 44. Fica o Poder Executivo autorizado a remanejar, transpor, transferir e utilizar as dotações orçamentárias, aprovadas na Lei nº 10.407, de 10 de janeiro de 2002, em favor dos órgãos do Ministério da Defesa, para a ANAC, relativas às funções por ela absorvidas.

Parágrafo único. As autorizações previstas no caput deste artigo deverão manter a mesma classificação orçamentária, expressa por categoria de programação em seu menor nível, conforme definida nos arts. 4º e 5º da Lei nº 10.266, de 24 de julho de 2001, inclusive os títulos, descritores, metas e objetivos, assim como o respectivo detalhamento por esfera orçamentária, grupos de despesas, fontes de recursos, modalidades de aplicação e identificadores de uso."

Razões de veto

"O dispositivo remete para normas orçamentárias aplicáveis apenas ao ano de 2002. Assim, perdeu o objeto durante o trâmite parlamentar e se torna conveniente o veto para evitar problema de interpretação."

As seguintes linhas do Anexo III
PEDIDO DE NADA CONSTA DE MULTAS

5,00

 

PEDIDO DE NADA CONSTA DE TARIFAS

5,11

 

EMISSÃO DE QUALQUER OUTRO ATO PELA COMISSÃO DE COORDENAÇÃO DO TRANSPORTE AÉREO CIVIL – COTAC NÃO PREVISTO ANTERIORMENTE

91,33

 

MULTA POR FALTA DE TRANSFERÊNCIA DE PRAZO DE 15 (QUINZE) DIAS

1.006,00

 

ANÁLISE DE PROCESSOS NOVOS

100,22

"

Razões de veto

"A cobrança de taxa para fins de expedição de certidão negativa de débito contraria a prática dos demais órgãos e entidades da administração pública federal e parece violar o disposto no art. 5º, inciso XXXIV, da Constituição da República (‘são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas: (...) b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal’).

Já as hipóteses de incidência ‘emissão de qualquer outro ato pela CONTAC’ e ‘análise de processo novos’ são extremamente vagas, violando, com isso, a legalidade tributária (art. 150, inciso I, da Constituição da República).

Por fim, a hipótese de incidência ‘multa por falta de transferência de prazo de quinze dias’ não se caracteriza como serviço público ou como exercício do poder de polícia, violando o art. 145, inciso II, da Constituição da República."

        Essas, Senhor Presidente, as razões que me levaram a vetar os dispositivos acima mencionados do projeto em causa, as quais ora submeto à elevada apreciação dos Senhores Membros do Congresso Nacional.

Brasília, 27 de setembro de 2005.

Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de  28.9.2005