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Presidência
da República |
DECRETO Nº 92.688, DE 19 DE MAIO DE 1986.
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O
PRESIDENTE DA REPÚBLICA,
no uso das atribuições que lhe conferem os artigos 81, item III, e 161, da
Constituição, e tendo em vista o disposto na Lei nº 4.504, de 30 de novembro de
1964,
DECRETA:
Art. 1º Fica declarada como zona prioritária,
pelo prazo de cinco anos, para efeito de execução e administração da reforma
agrária, a área rural do Estado de São Paulo.
Art. 2º As desapropriações somente poderão recair
sobre latifúndios, como tal conceituados em lei, ou imóveis rurais cuja forma de
exploração contrarie o interesse social.
Art. 3º A quantidade de áreas a serem
desapropriadas não ultrapassará a prevista no Plano Regional de Reforma Agrária,
anexo a este Decreto.
Parágrafo único. Para os fins do
artigo 161 da Constituição, somente por decreto do Poder Executivo será
declarado de interesse social o imóvel rural que se encontrar na zona
prioritária.
Art. 4º Fica instituída a Comissão Agrária no
Estado de São Paulo integrada pelos seguintes membros a serem designados pelo
Ministro da Reforma e do Desenvolvimento Agrário:
I - um servidor do INCRA, que a presidirá;
II - três representantes dos trabalhadores
rurais;
III - três representantes dos proprietários
rurais;
IV - um representante de entidade pública
vinculada à agricultura; e
V - um representante de estabelecimento de ensino
agrícola.
Parágrafo único. Os membros a que se referem os
itens I, IV e V serão indicados pelo Presidente do INCRA; os demais serão
indicados, respectivamente, pela Federação dos Trabalhadores na Agricultura e
pela Federação da Agricultura, com base territorial no Estado.
Art. 5º Este Decreto entrará em vigor na data de
sua publicação.
Art. 6º Revogam-se as disposições em contrário.
Brasília, 19 de maio de 1986; 165º da
Independência e 98º da República.
JOSÉ SARNEY
Nelson
Ribeiro
Este texto não substitui o
publicado no DOU 21.5.1986
PLANO REGIONAL DE REFORMA AGRÁRIA (PRRA) DO
ESTADO DE SÃO PAULO
I. JUSTIFICATIVA
O Plano Regional de Reforma Agrária do Estado de
São Paulo (PRRA-SP) foi preparado sob responsabilidade da Diretoria Regional do
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária. A metodologia de elaborarão
norteou-se por três princípios básicos: perfeita adequação às diretrizes
traçadas no Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA), estrito cumprimento da
Constituição, Estatuto da Terra e legislação agrária vigente e caráter
eminentemente técnico, representado pelos parâmetros agronômicos e
sócio-econômicos adotados.
No processo de elaboração do PRRA-SP a Diretoria
Regional do INCRA contou com ativa participação de instituições estaduais com
experiência em ações de assentamento de trabalhadores sem terra no Estado, com o
a Secretaria Executiva de Assuntos Fundiários e a CESP - Centrais Elétricas do
Estado de São Paulo, bem como entidades de pesquisa e assistência técnica
vinculadas à Secretaria de Agricultura e Abastecimento. Sua execução requer
ampla integração interinstitucional, primeiro pressuposto de eficácia da ação
governamental no setor fundiário.
A agricultura paulista está longo de aproveitar
intensivamente os recursos naturais e humanos de que dispõe, apesar do dinâmico
desempenho que apresentou nas últimas décadas. Existe grande potencial de
crescimento tanto no que se refere à produção de alimentos e matérias-primas
quanto à geração de novas oportunidades de trabalho.
Para que tal potencial seja liberado é necessário
que os recursos fundiários hoje objeto de atividades inadequadas a sua vocação,
e muitas vezes mantidos como mera reserva de valor, venham a ser usados
racionalmente e cumpram sua função social. Também é necessário que se procure
tirar maior proveito dos recursos hídricos, principalmente nas áreas de
influência de grandes obras públicas como as barragens e a hidrovia
Tietê-Paraná.
São Paulo dispõe de extensas áreas de terras de
boa qualidade e clima favorável utilizadas com pastagens ultra-extensivas,
incompatíveis com os benefícios trazidos por grandes investimentos públicos que
contribuíram para que o Estado contasse com boa infra-estrutura produtiva e
adequado sistema de pesquisa e assistência técnica. Ao mesmo tempo, a irrigação
de áreas férteis às margens de rios e barragens, desde que acompanhada da
redistribuição das terras que valorizaram, poderá ensejar ponderável e rápido
aumento da produção, do emprego e de todos os benefícios sociais daí
decorrentes.
Sanados os problemas fundiários que atrofiam o
desenvolvimento de algumas regiões, o Estado de São Paulo poderá acelerar ainda
mais o crescimento e a modernização de sua agricultura, atendendo plenamente aos
objetivos fixados pelo Plano Nacional de Reforma Agrária.
Uma das maiores distorções no aproveitamento dos
recursos naturais do Estado é aquilatada quando se compara o potencial de uso
dos solos paulistas com a sua utilização atual. A tabela 1 apresenta esses dados
por região, considerando apenas as áreas mais aptas para culturas (as que
suportam culturas temporárias) e as que estão sendo cultivadas, inclusive com
lavouras perenes. Observa-se assim que há diferença de 4,4 milhões de hectares,
boa parte dos quais terras de boa qualidade que abrigam pastagens
ultra-extensivas, nas quais a atividade criatória mal consegue disfarçar fim
especulativo. Trata-se muitas vezes, com efeito, de terras estocadas como
reserva de valor e mantidas em estado de semi-ociosidade.
A confiabilidade desses dados pode ser comprovada
através da utilização de terras menos aptas para culturas, verificada pelo
balanço negativo nas regiões de São Paulo-Litoral, Vale do Paraíba e Campinas.
Esta tendência está estreitamente relacionada ao
tamanho dos estabelecimentos, pois quanto maior a área total, menor a
percentagem utilizada com culturas. A tabela 2 mostra que os estabelecimentos
com mais de 1.000 hectares cultivam apenas 19% de sua área. No estrato de área
superior a 3.000 hectares essa proporção cai ainda mais, situando-se em 10%.
TABELA 1
São Paulo: Comparação entre áreas mais aptas e as
cultivadas com lavouras, por regiões (1980)
(1 mil ha)
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(*) Foram consideradas áreas mais aptas para lavouras aquelas de capacidade de uso das
classes I, II, III, IIIA, IIIs e 50% das da classe III-IV.
Fonte: Instituto Agronômico de Campinas, Secretaria de Agricultura e
Abastecimento (1972).
(**) Considerou-se o total das áreas com lavouras permanentes e temporárias.
Fonte: FIBGE, Censo Agropecuário (1980).
A prática de
pecuária extensiva em terras de boa qualidade é uma distorção que se revela mais
patente quando se tem em conta os impactos sobre a ocupação da mão-de-obra. Para
o conjunto do Estado a atividade agrícola absorve 3 vezes mais mão-de-obra que a
pecuária, apesar de ocupar área duas vezes menor. Ou seja, a substituição de
pastagens extensivas por lavouras tende a gerar 6 vezes mais oportunidades de
trabalho por unidade de área.
TABELA 2
São Paulo:
Participação da área cultivada com lavouras na área total dos estabelecimentos,
por estratos de área
(1980)
(1 mil ha)
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Fonte: FIBGE, Censo Agropecuário (1980).
No entanto, a
tendência à manutenção de terras de boa qualidade na atividade pastorial tem
sido responsável por desperdício de recursos humanos e conseqüente êxodo rural.
Em regiões onde predomina a pecuária extensiva, as quedas de pessoal ocupado
registradas na década de 70 pelos censos agropecuários, chegaram a mais de 30%,
enquanto nas regiões predominantemente agrícolas o pessoal ocupado aumentou mais
de 10%. Levantamentos mais precisos realizados pelo Instituto de Economia
Agrícola da Secretaria de Agricultura e Abastecimento mostram que, do final da
década de 60 ao início da de 80, a utilização anual de mão-de-obra decresceu no
oeste paulista cerca de 16 milhões de dias/ homem, enquanto no restante do
Estado cresceu 23 milhões.
TABELA 3
São Paulo: Estimativa de utilização de mão-de-obra na agropecuária, por regiões
(1968-70 e 1980-82)
(1 mil
dias/homem)
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Fonte: Instituto de Economia Agrícola, Secretaria de Agricultura e Abastecimento.
Existem também no
Estado mais de um milhão de hectares de terras agricultáveis que não estão sendo
utilizadas com culturas, pastagens ou florestas. O levantamento mais objetivo
destas informações - a cobertura aerofotogramétrica do Estado - revela a
existência de 4,8 milhões de hectares de terras "sem ocupação agropecuária ou
florestal definida". A parte desse total que corresponde a terras potencialmente
agricultáveis supera 1 milhão de hectares e está mais concentrada na região
Sudeste.
Sabe-se ademais que
metade das áreas completamente ociosas mas aproveitáveis do Estado situam-se em
imóveis com área total superior a 500 hectares, conforme indicações tanto do
Censo Agropecuário quanto do Cadastro de Imóveis Rurais.
Verifica-se,
portanto, que boa parte das terras aptas à agricultura do Estado de São Paulo
não está cumprindo a sua função social. Muitos proprietários visam apenas, ou
principalmente, à valorização fundiária que decorre de grande obras públicas ou
do influxo indireto de outras atividades da iniciativa privada. Mantendo terras
inativas ou mal-aproveitadas esses proprietários vedam o acesso dos
trabalhadores rurais ao meio de que necessitam para viver e produzir,
dificultando o progresso do Estado e da Nação.
Assim, a aplicação
do Plano Nacional de Reforma Agrária no Estado de São Paulo é tão necessária
quanto oportuna, pois permitirá à agricultura paulista manter e aprofundar seu
dinamismo atendendo, ao mesmo tempo, aos princípios de justiça social.
Ressalte-se que não
se tem em mente considerar como parâmetro absoluto de uso racional da terra a
transformação de pastagens em lavouras anuais. A pecuária ocupa e deve continuar
ocupando lugar de destaque no meio rural paulista e brasileiro, e as iniciativas
de reforma agrária não pretendem contrariar esse dado. O que se torna
indispensável, como se depreende das informações aqui apresentadas, é corrigir o
desperdício de recursos (fundiários, humanos, financeiros) representado pela
excessiva destinação ao criatório (e criatório extensivo, que na verdade deixa a
terra semi-ociosa) de áreas nobres, que se prestam a culturas anuais e, mais que
isso, são vitais para a consecução dos objetivos de desenvolvimento econômico e
justiça social no campo.
Ademais disso há,
como se referiu, grandes extensões em que a ociosidade nem mesmo se tenta
mascarar com introdução de criação bovina extensiva.
II. OBJETIVOS E METAS
É objetivo geral
deste PRRA promover melhor distribuição da terra, mediante modificações no
regime de sua posse e uso, de modo a permitir o incremento da produção e
produtividade, atendendo aos princípios de justiça social e ao direito de
cidadania do trabalhador rural. Assim a estrutura agrária, através da eliminação
progressiva do latifúndio e do minifúndio, adequar-se-á às exigências de
desenvolvimento do país.
São seus objetivos
específicos:
a) melhor
distribuir os benefícios sociais proporcionados pelas inversões públicas direta
ou indiretamente relacionadas com o desenvolvimento do setor rural;
b) aumentar a
oferta de alimentos e matérias-primas, visando atender prioritariamente ao
mercado interno;
c) utilizar mais
eficazmente as terras férteis, próximas dos grandes mercados, hoje subutilizadas
em grande parte com pastagens ultra-extensivas;
d) criar novos
empregos no setor rural, de forma a ampliar o mercado de trabalho e diminuir a
subutilização da mão-de-obra;
e) diminuir o êxodo
rural, atenuando a pressão populacional sobre as áreas urbanas e os problemas
dela decorrentes;
f) promover a paz
social no meio rural, mediante erradicação dos focos de tensão,
O PNRA fixou como
meta para o Estado de São Paulo o assentamento de 106.900 famílias até o ano de
1989, das quais 11.400 famílias em 1986.
III. ÁREA ZONA PRIORITÁRIA E ÁREAS DE AÇÃO
O
§ 2º do artigo 161 da
Constituição Federal e o inciso I
do artigo 34 da Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964 (Estatuto da Terra)
determinam sejam delimitadas zonas ou áreas prioritárias para fins de reforma
agrária.
Tendo em conta a
gravidade e dimensão dos problemas gerados peIa estrutura de posse e uso da
terra - os quais tenderão a assumir caráter ainda mais agudo se medidas
concretas não forem adotadas pelo poder público -, considera-se zona prioritária
para reforma agrária toda a extensão territorial rural do Estado.
Atingirão cerca de
250.000 hectares as áreas a serem desapropriadas no Estado para atender às metas
fixadas para 1986. As áreas de ação e a localização das áreas desapropriáveis
são determinadas em consonância com as diretrizes do Plano Nacional de Reforma
Agrária, aprovado pelo
Decreto nº 91.766, de 10 de outubro de 1985.
IV. PROGRAMAS DE AÇÃO
O processo de
execução da reforma agrária consubstanciar-se-á mediante conjunto de programas
com funções e graus hierárquicos diferentes, mas que apresentam
complementaridade e interdependência.
A ação do Estado
circunscrever-se-á à aplicação de medidas previstas no Estatuto da Terra, como o
uso dos instrumentos legais e ações de política agrícola necessárias para
melhorar as condições de vida dos beneficiários.
Como estratégia de
ação governamental, o Plano Nacional de Reforma Agrária preconiza participação
solidária, em termos decisórios, dos governos federal, estadual e municipal. Uma
ampla integração interinstitucional impõe-se como primeiro pressuposto de
eficácia, redundando em nível adequado de comprometimento que engloba não só a
participação orçamentária, mas também concepção e execução de serviços de apoio
necessários à consolidação do processo. Tal integração é indispensável sobretudo
no trabalho de implementação dos projetos específicos, na medida em que serão
exigidas ações complementares e coordenadas que possam assegurar a realização
econômica, política e social dos novos agricultores.
O Estatuto da
Terra, inclusive, prevê essa ação conjunta quando estabelece "prioridade
absoluta para atuação dos órgãos e serviços federais já existentes nas áreas
escolhidas", o que quer dizer que os locais em que se desenvolverem projetos de
reforma agrária serão, necessariamente, espaço catalizador do conjunto de ações
governamentais relacionadas com a mudança da estrutura fundiária.
A execução da
reforma agrária, contudo, bem como a desapropriação de imóveis rurais para fins
que impliquem modificação de seu uso e posse, constituem matéria de competência
da União. Prevê-se, pois, articulação nos projetos específicos de assentamento,
que se traduzirá no estabelecimento de acordos e convênio que viabilizem ou
agilizem sua implementação; entre outros os sistemas estaduais e locais de
infra-estrutura de produção e de comercialização, educação, saúde empreenderão
esforço conjunto com os órgãos federais.
Nesses termos, os
projetos de assentamento de trabalhadores rurais no Estado de São Paulo serão
coordenados pelo INCRA e executados, mediante convênio, com a Secretaria
Especial de Assuntos Fundiários, que dispõe de equipe técnica com vários anos de
experiência no assentamento em terras públicas estaduais.
A União deve
propiciar apoio aos programas estaduais de aproveitamento de terras públicas e
às ações de regularização fundiária, de modo a evitar superposições e
desperdícios de recursos.
4.1 -- Programa
Básico: Assentamento de Trabalhadores Rurais
A Reforma Agrária
está voltada para o assentamento dos excedentes populacionais e pretende, ao
mesmo tempo, reverter a tendência de remanejamento de populações para justificar
abertura de novas fronteiras agrícolas e ocupação do território nacional em
continuada ação paternalista do Estado.
Implica, pois, não
desagregar a família do trabalhador rural, tirando-a do seu meio, da sua
cultura, removendo-a para locais longínquos, como já se fez anteriormente com
gravíssimos, dramáticos efeitos.
A concepção do
programa de Assentamento de Trabalhadores Rurais leva isso em conta, prevendo
ademais, em todos os níveis e fases, participação direta, dos beneficiários, em
particular no que se refere às decisões sobre as formas de posse e uso da terra.
Suas diretrizes
básicas são listadas a seguir:
a) garantia de
rápido acesso à terra após imissão de posse nas áreas desapropriadas, mediante
processo seletivo expedito;
b) utilização,
sempre que conveniente, do instituto da concessão de uso como forma temporária e
experimental de acesso à terra nos projetos de assentamento, até que se defina
maneira definitiva de sua apropriação;
c) na medida do
possível, nas terras já ocupadas ou com ocupação rarefeita, respeito às
situações existentes, desde que não caracterizem privilégio em relação às
demais;
d) orientação das
ações para a implantação, desenvolvimento e consolidação do Programa mediante
organização sócio-econômica dos beneficiários e atendimento dos serviços básicos
de assistência técnica, crédito rural, infra-estrutura econômica e social, entre
outros;
e) promoção de
ações que objetivem capacitar os beneficiários através de processo de reflexão
participativa que envolva, também, o pessoal técnico e administrativo das
instituições governamentais que atuarão na área de assentamento.
Essas diretrizes
gerais já estão sendo em boa parte aplicadas pela Secretaria Especial de
Assuntos Fundiários, incumbida de executar os assentamentos, envolvendo
interação de técnicos e beneficiários nas fases de planejamento, seleção de
beneficiários, gestão dos empreendimentos, formas de transferência e exploração
das terras. Enfim, toda uma filosofia de ampliação da participação dos
beneficiários no processo de assentamento.
Se, para atingir os
objetivos dos projetos, os beneficiários precisarão participar de todas as suas
fases, parece óbvio que deverão também participar das decisões quanto às
modalidades de transferências das terras.
Este princípio não
pode, porém, ser aplicado no vazio, mas em função de uma realidade concreta. E
esta realidade mostra que, em decorrência de secular processo de marginalização
econômica e cultural, muitos trabalhadores rurais não dispõem, atualmente, de
informações adequadas para escolher com pleno conhecimento de causa.
Coloca-se, desse
modo, a questão seguinte: ou a administração pública substitui-se à consciência
dos próprios trabalhadores e define unilateralmente a forma de transferência das
terras, ou delega essa definição aos beneficiários; no primeiro caso, além de
reduzir a participação, corre-se risco de que a modalidade definida de modo
unilateral e tecnocrático choque-se com as aspirações e possibilidades concretas
dos beneficiários; no segundo, é provável que estereótipos culturais e até
manipulação de terceiros determinem modalidades de transferência econômica e
socialmente incompatíveis com os objetivos de progresso econômico e
desenvolvimento social; em ambos os casos frustrar-se-iam os objetivos básicos
do programa.
Para fugir ao
dilema a transferência das terras deverá dar-se em duas etapas. Na primeira, com
duração prevista de 5 anos as terras serão cedidas, mediante concessão de uso,
preferencialmente a grupos de trabalhadores rurais que se organizem
voluntariamente em algum tipo de associação (sociedade civil ou cooperativa). Na
segunda, as terras serão transferidas aos beneficiários em caráter permanente,
através de alienação e na modalidade que democraticamente decidirem.
Tais diretrizes
permitem definir, com bastante clareza, as funções de administração nos projetos
de assentamento. Trata-se, essencialmente, de proporcionar estímulo econômico e
apoio técnico às associações de trabalhadores rurais que vierem a formar-se para
explorar as terras, sem contudo substituir a iniciativa desses trabalhadores e
reduzi-los à condição de assalariados de empresa estatal.
Assim, o INCRA e a
Secretaria Especial de Assuntos Fundiários de São Paulo negociarão com os
representantes do grupo associado (comissão de representantes), só
excepcionalmente envolvendo-se com o conjunto de seus integrantes (quando, por
exemplo, trata-se de decidir sobre investimento importante) e com os sócios
individualmente.
A determinação da
forma de organizar o trabalho no interior de cada grupo (parcelas individuais,
exploração conjunta etc.) e a operação financeira da sociedade (compras, vendas,
contabilidade, remuneração do trabalho etc.) serão supervisionadas e orientadas
pelo INCRA, mas estarão entregues à deliberação e responsabilidade dos
associados.
Tratando-se de
transferência provisória, de caráter nitidamente experimental, não haverá
inconveniente em admitir várias modalidades de organização e de gestão, pois
isso permitirá verificar mais facilmente qual delas, na prática, adapta-se
melhor às aspirações de realização pessoal dos trabalhadores e exploração
racional das terras.
Essa é a
metodologia de assentamentos que vem sendo desenvolvida pela Secretaria Especial
de Assuntos Fundiários. Sua eficácia pode ser avaliada pelo sucesso dos onze
projetos em execução, com quase mil famílias beneficiadas. Com base nessa
experiência, o INCRA-SP está implementando, desde julho de 1985, trabalho de
recuperação do assentamento da Fazenda Primavera (realizado em 1980), cujas
falhas de implantação levaram cerca de 20% dos assentados a estado falimentar.
4.2 - Programa
Complementar: Regularização Fundiária
O Programa de
Regularização Fundiária no Estado de São Paulo já está sendo implementado no
Vale do Ribeira, tendo como finalidade a execução dos procedimentos de
discriminação e arrecadação de terras visando à imediata adjudicação,
legitimação ou incorporação ao patrimônio público estadual, para a realização de
assentamentos, onde for conveniente. A execução deste Programa está sendo
efetuada desde outubro de 1985 mediante convênio estabelecido entre o INCRA e o
Governo Estadual através da Secretaria Especial de Assuntos Fundiários.
O Programa é
composto por 4 projetos: Discriminação de Terras Devolutas e Legitimação de
Posses, Assistência Jurídica a Posseiros Envolvidos em Litígios de Terras,
Regularização do Domínio do Estado nos Parques Estaduais e Apoio aos Municípios
para Regularização do Domínio de Terras Devolutas Municipais. Visa-se à
concessão de cerca de 10 mil títulos de propriedade aos pequenos posseiros do
Vale, abrangendo área a ser discriminada de 700 mil hectares de terras. Até o
momento já foram concedidos 1.000 títulos.
Além das atividades
em curso - legitimação das posses, assistência jurídica e regularização dos
parques - serão promovidos assentamentos nas áreas arrecadadas.
Ainda dentro do
convênio, está sendo executado mapeamento de toda a área a ser discriminada,
pela empresa pública Terrafoto, envolvendo aerofotogrametria e amarração de
coordenadas geográficas em campo. O cadastramento dos ocupantes e demarcação dos
parques estão a cargo da SUDELPA, com colaboração da Procuradoria-Geral do
Estado.
V. INFRA-ESTRUTURA BÁSICA, AÇÕES DE APOIO E ESTIMATIVA DOS CUSTOS
A infra-estrutura
necessária aos assentamentos compreenderá, basicamente, estradas de acesso,
habitações e obras comunitárias. Os serviços de apoio à produção e bem-estar
social incluem ações nas áreas de crédito rural, assistência técnica, difusão de
tecnologia, saúde e educação.
As terras serão
obtidas principalmente por desapropriação por interesse social, aproveitando-se
também a disponibilidade em terras devolutas. No primeiro caso, por imposição
constitucional, o poder público deverá prover indenização do valor das terras
desapropriadas mediante títulos da dívida agrária (TDA). A fixação do valor a
ser indenizado depende de laudos e avaliações e, no mais das vezes, envolve o
pronunciamento final do Judiciário, razão pela qual se torna virtualmente
impossível definir a priori o volume exato de recursos (em TDA)
requeridos.
Por isso os
recursos estimados para execução do PRRA-SP no exercício de 1986 limitam-se às
necessidades para dispêndios com indenização das benfeitorias em áreas
desapropriadas, ações de redistribuição de terras (seleção de imóveis,
vistorias, perícias, demarcações, assentamentos, administração), infra-estrutura
básica (estradas de acesso, habitações, obras comunitárias), saúde, educação,
assistência técnica, extensão rural, armazenagem, crédito rural (investimento e
custeio).
O MIRAD
implementará iniciativas que assegurem disponibilidade de TDA para cumprimento
das metas estabelecidas.
As necessidades de
recursos são apresentadas na Tabela 4.
Tabela 4 - PRRA-SP - ESTIMATIVA de CUSTOS(*) - (1986)
(Cz$ mil)
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(*) Excluídos custos de obtenção de terras via desapropriação.
Com base nos dados
apresentados, tem-se custo total, excluída indenização das terras a serem
desapropriadas, da ordem de Cz$916,0 milhões. Chama-se a atenção para o volume
requerido para crédito de investimento e custeio aos novos produtores rurais, da
ordem de Cz$186,7 milhões.
VI. SITUAÇÕES EMERGENCIAIS
O PRRA-SP, assim
como todos os planos regionais de reforma agrária que conformam o PNRA, tem a
característica de incorporar situações previsíveis, planejáveis. Os planos
operativos - que traduzem o que efetivamente será realizado no campo - tomam por
base essas ações e baseiam-se nas informações, dados e conhecimentos existentes.
No âmbito da reforma agrária, contudo, os eventos podem tomar cursos
imprevisíveis, razão pela qual pode-se vir a necessitar de ações rápidas do
poder público na busca das soluções adequadas.
É nesse contexto
que as metas e os volumes de recursos estimados neste PRRA poderão sofrer
Alterações no curso de sua implementação. Situações Emergenciais deverão ser
examinadas no tempo e contexto apropriados.