DECRETO Nº 13.658, DE 25 DE JUNHO DE 1919
Promulga o Tratado para a fixação e liquidação da divida do Uruguay ao Brasil, assignado no Rio de Janeiro a 22 de Julho de 1918.
O Vice-Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brasil, em exercicio :
Tendo sido sanccionada, pelo Decreto n. 3.620, de 23 de Dezembro de 1918, a Resolução do Congresso Nacional que approvou o Tratado para a fixação e liquidação da divida do Uruguay ao Brasil, assignado no Rio de Janeiro a 22 de Julho daquelle anno; e havendo-se effectuado a troca das respectivas ratificações, nesta mesma cidade, no dia 21 do corrente mez:
Decreta que o referido Tratado, appenso, por cópia, ao presente Decreto, seja executado e cumprido tão inteiramente como nelle se contém.
Rio de Janeiro, 25 de Junho de 1919, 98° da Independência e 31° da Republica.
DELFIM MOREIRA DA COSTA RIBEIRO.
Domicio da Gama.
Este texto não substitui o original publicado no Coleção de Leis do Brasil de 1919
DELFIM MOREIRA DA COSTA RIBEIRO,
Vice-Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brasil, em exercicio
Faço saber aos que a presente Carta de ratificações virem que, entre os Estados Unidos do Brasil e a Republica Oriental do Uruguay, pelos respectivos Plenipotenciarios, foi concluido e assignado na cidade do Rio de Janeiro aos vinte e dois dias do mez de Julho do anno de mil novecentos e dezoito, um Tratado para a fixação e liquidação da divida do Uruguay ao Brasil, do teôr seguinte:
O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brasil e o Presidente da Republica Oriental do Uruguay, animados do mais cordeal e sincero desejo de fortalecer, cada vez mais, os laços de antiga e leal amizade que ligam historicamente os seus respectivos paizes, resolveram celebrar, um Tratado para fixar e liquidar definitiva e amigavelmente a divida que o Uruguay tem pendente com o Brasil, nomeando para esse fim seus Plenipotenciarios, a saber:
Sua Excellencia o Senhor Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brasil a Sua Excellencia o Senhor Doutor Nilo Peçanha, Ministro de Estado das Relações Exteriores do Brasil;
Sua Excellencia o Senhor Presidente da Republica Oriental do Uruguay a Sua Excellencia o Senhor Doutor Balthazar Brum, Ministro de Estado do Departamento das Relações Exteriores do Uruguay:
Os quaes, depois de exhibir os seus Plenos Poderes, achados em boa e devida fórma, convieram nos Artigos seguintes:
ARTIGO I
A divida total da Republica Oriental do Uruguay para com os Estados Unidos do Brasil fica fixada, de comum accôrdo, na somma de cinco milhões de pesos moeda nacional uruguaya ( $5.000.000), equivalentes a um milhão e sessenta e tres mil oitocentos e vinte e nove libras esterlinas ( ££ 1.063.829), pagaveis na fórma prescripta pelo Atigo XV deste Tratado, cuja importancia liquida, com o proposito deliberado de que os esforços financeiros, applicados outr'ora em luctas communs pela liberdade, sejam no presente destinados a fins communs de progresso, bem estar a cultura, será applicada em obras de mutuo beneficio nas fronteiras de ambas as Nações, dentro das clausulas e fórmas que se estipulam nos artigos seguintes.
ARTIGO II
Em um ponto da fronteira brasileiro-uruguaya e como principal applicação dessa divida, será fundado e mantido um Instituto de Trabalho, no qual, sob os auspicios dos dous Governos e nas linguas portugueza e hespanhola, receberão brasileiros e uruguayos, em egual numero, instrucção scientifica e profissional sobre tudo quanto se referir ás industrias agricolas e pastoris e ás que lhe são connexas e derivadas, procurando-se systematicamente elevar o conceito e efficacia de todos os officios, industrias, artes e sciencias relacionadas com a terra, para o que serão attendidos com egual interesse os cursos de especialisação pratica applicada ao trabalho regional, e os de indole superior, profissional e technica.
ARTIGO III
Esta fundação será estabelecida sobre a linha fronteiriça, em area aproximadamente egual para cada lado, na zona de Aceguá ou em outro logar que parecer mais conveniente, e que será escolhido e mandado demarcar por dous Altos Commissarios designados por ambos os Governos, para tal fim, e para os encargos especiaes que se lhes conferem nos artigos que se seguem.
ARTIGO IV
O plano geral da Fundação, sua organisação docente ( respeitada sempre a sua essencial indole agraria), seu regimen de governo e de administração e todos os outros pontos, que devem constituir seu Estatuto basico, serão estudados de commum accôrdo e propostos ás duas Altas Partes Contractantes pelos dous Altos Commissarios, de que trata o artigo anterior, os quaes se poderão fazer coadjuvar pelos necessarios assessores e auxiliares technicos.
ARTIGO V
Escolhido o ponto mais adequado para o estabelecimento do Instituto de Trabalho: planejado nos termos que melhor consultem sua realização immediata, sua bôa marcha administrativa e sua prosperidade e efficacia futura; approvados em commum pelos seus respectivos Governos os planos e projectos dos dous Altos Commissarios e adquiridos os terrenos e campos necessarios, o que tudo deverá ser feito por vontade expressa das Altas Partes Contractantes dentro dos vinte mezes seguintes à troca das ratificações deste Tratado: o Governo da Republica Oriental do Uruguay, por seus Departamentos Technicos, dará começo sob a fiscalisação dos Altos Comissarios, às construcções da Fundação que, salvo notorio motivo de força maior, deverá estar prompta para funccionar e ser entregue ás autoridades que a devem administrar, dous annos após terem sido começadas as obras, cessando então as funcções dos Altos Comissarios.
ARTIGO VI
Os planos de estudo e programmas das Escolas ou Secções em que fôr dividido o Instituto de Trabalho, bem assim os regulamentos de serviços e de aulas e o que fôr relativo à economia interna do Instituto e suas dependencias ficarão a cargo das autoridades docentes e administrativas, a cuja direcção fôr entregue a Fundação, de accôrdo com o Estatuto préviamente approvado pelos dous Governos.
ARTIGO VII
Para facilitar a acquisição dos terrenos e campos necessarios á installação do Instituto de Trabalho e de todas as suas dependencias, fica convencionada com plena força legal por ambas as Altas Partes Contractantes a autorisação eventual para que os mesmos terrenos e campos possam ser desapropriados por motivo de utilidade publica, nos territorios de ambos os paizes e de accôrdo com as leis que nelles regem a materia.
ARTIGO VIII
Os Altos Comissarios deverão dedicar especial attenção ao mechanismo directivo e administrativo do Instituto de Trabalho, estudando cuidadosamente a fórma de prevenir possiveis difficuldades futuras e, no caso de acharem que a estructura delineada para aquella Fundação nos artigos precedentes poderia trazer incovenientes de qualquer ordem, deverão formular e propor uma outra organisação para a mesma, escolhendo uma das seguintes alternativas:
1°) - dividindo em duas partes eguaes as quantias liquidas que se destinarem a esse fim na fórma dos Artigos xv e xvi, para serem fundados por ambos os paizes dous Institutos contiguos, um em cada territorio, com admnistrações autonomas;
2°) - ou entregando a Republica Oriental do Uruguay ao Brasil aquellas sommas para que elle installe e administre a Fundação no seu territorio fronteiriço, prestando o Uruguay todo o concurso technico que lhe fôr pedido;
3°) - ou, finalmente, por outra fórma que melhor convier para assegurar, conforme os altos intuitos deste Tratado, a bôa harmonia permanente e a progressiva prosperidade da Instituição.
As propostas, que em qualquer dessas hypotheses fizerem os dous Altos Commissarios terão pleno vigor, uma vez approvadas por ambos os Governos.
ARTIGO IX
O Governo da Republica Oriental do Uruguay construirá com parte da divida uma Ponte Internacional sobre o rio Jaguarão, entre a cidade brasileira deste nome e a villa uruguaya de Rio Branco ou nas suas immediações, se isso fôr de mais vantagem, a juizo de uma commissão mixta que as Altas Partes Contractantes designarão para estudar a melhor situação da ponte e para preparar, de accôrdo com os Altos Commissarios e dentro do prazo de vinte mezes de que trata o Artigo v, as plantas de contrucção dentro dos limites da importancia approximada estabelecida no Artigo xv do presente Tratado.
ARTIGO X
A ponte a ser construida é destinada a todos os fins de transito e trafego, passagem de pedestres, cavalleiros e vehiculos de qualquér classe, inclusive trens ferro-viarios.
ARTIGO XI
Para ser entregue a ponte ao trafego internacional ambos os Governos obrigam-se a estabelecer em suas respectivas jurisdicções, nas extremidades da ponte, postos fiscaes e aduaneiros habilitados para todo genero de operações.
ARTIGO XII
A utilisação da ponte será completamente livre e gratuita para toda classe de transito e trafego. Os dous paizes poderão, todavia, de commum accôrdo, impor uma contribuiçao, por um só vez ou periodicamente, ás emprezas ferro-viarias que forem autorisadas a utilisar a ponte.
ARTIGO XIII
Os dous paizes farão de commum accôrdo os regulamentos que deverão ser observados para a utilisação da ponte, quanto ao trafego geral, policia, conservação de vias-ferreas e fiscalisação aduaneira.
ARTIGO XIV
A. Republica Oriental do Uruguay compromette-se a começar a construcção da ponte seis mezes depois de approvadas as plantas e a dal-a prompta para ser entregue ao trafego vinte e quatro mezes depois de começadas as obras.
ARTIGO XV
Para a execução financeira das estipulações deste Tratado, a Republica Oriental do Uruguay emittirá, dentro do anno seguinte á troca das ratificações do mesmo, uma Divida especial de cinco milhões de pesos moedas nacional uruguaya, com cinco por cento de juros e um por cento de amortização annual, para cuja realisação em dinheiro (que irá sedo feita na medida que o exigir o successivo pagamento das obras prescriptas nas alineas a e b deste Artigo) fica de commum accôrdo fixada a cotação de oitenta e seis por cento, que o Governo Uruguayo se obriga a manter na eventualidade de ser a cotação real da Divida inferior a esse typo, na occasião ou occasiões de serem reduzidos a dinheiro os respectivos titulos.
O producto liquido desta Divida será applicado do seguinte modo:
a) - até um milhão de pesos nos estudos e na construcção da ponte internacional;
b) - até um milhão e setecentos mil pesos na acquisição de terras em extensão não menor de quatro mil hectares, para a fundação do Instituto de Trabalho, estudos prévios, compensações e subsidios aos Altos Commissarios e seu pessoal technico e auxiliar, construcções, mobiliario, material scientifico, machinismos agricolas, nucleos pecuarios e o necessario á installação e o funccionamento do Instituto;
c) - o saldo integral dessa nova Divida formará um patrimonio, cuja renda se applicará no custeio da Fundação docente e na conservação da ponte internacional. O producto em dinheiro do saldo deverá ser para tal fimconvertido, em partes eguaes em titulos de renda publica brasileiros e uruguayos, de juros não menos de cinco por cento.
ARTIGO XVI
O Patrimonio instituido, no Artigo xv, alinea c, para o custeio da Fundação docente e a conservação da ponte internacional será accrescido:
1°) - com os juros provenientes da nova Divida, de que trata o mesmo Artigo, contados desde a data da sua emissão até ficarem concluidas as obras e entregues ao serviço publico a ponte e o Instituto;
2°) - com as sobras que porventura se apurarem das sommas consignadas nas alineas a e b do mesmo Artigo xv;
3°) - com o lucro que se obtiver de uma possivel collocação dos titulos da nova Divida a uma cotação melhor que o typo de oitenta e seis, fixado no Artigo precedente;
4°) - com as contribuições das emprezas ferro-viarias de que trata o Artigo xii;
5°) - com a renda da producção agricola, pecuaria e industrial do Instituto;
6°) - com as doações que forem feitas ao Instituto.
ARTIGO XVII
Si depois de realisados os estudos technicos e feitos os planos e orçamentos das obras da ponte internacional e do Instituto de Trabalho, e calculadas as rendas indispensaveis á conservação daquella e ao custeio deste, acharem os Altos Commissarios conveniente modificar ou transpor parcialmente as importancias consignadas nos Artigos xv e xvi, poderão essas modificações ou transposições parciaes ser effectuadas, desde que sejam propostas de pleno e commum accôrdo pelos dous Altos Commissarios e approvadas por ambos os Governos.
§ Unico - O Patrimonio constituido na fórma do Artigo xv, alinea c, será entregue pelo Governo da Republica Oriental do Uruguay, para ter a devida applicação, quando as obras da ponte e do Instituto de Trabalho ficarem concluidas.
ARTIGO XVIII
O Patrimonio, de que tratam os Artigos xv e xvi, ficará sob a guarda dos Governos brasileiro e uruguayo, que, de commum accôrdo, determinarão o modo de administral-o.
§ Primeiro - O custeio da Fundação docente e a despeza com a conservação da ponte serão determinados annualmente pelos dous Governos, mediante approvação dos orçamentos propostos pelos encarregados da superintendencia de uma e outra.
§ Segundo - No caso de haver logar qualquer das alternativas do Artigo viii, os dous Governos contractantes ficam desde já autorisados a providenciar pela melhor fórma que julgarem, de accôrdo com o espirito do presente Tratado, não podendo, porém, desistir da construcção da ponte internacional, nem da reserva de um patrimonio, cuja renda garanta a conservação da mesma.
ARTIGO XIX
Solvida pela fórma estipulada no presente Tratado, a Divida Publica da Republica Oriental do Uruguay para com os Estados Unidos do Brasil, os respectivos Governos dão como findas quaesquer reclamações relacionadas com a mesma Divida.
ARTIGO XX
O presente Tratado, depois da sua approvação pelos Congressos de ambos os paizes, será ratificado e as ratificações serão trocadas no Rio de Janeiro, no mais breve praso possivel.
Em testemunho do que, os referidos Plenipotenciarios assignam o presente instrumento, escriptos em portuguez e castelhano, e lhes appõem os seus respectivos sinetes, na cidade do Rio de Janeiro, aos vinte e dous dias do mez de Julho de mil novecentos e dezoito.
(L.S.) Nilo Peçanha.
(L.S.) Baltasar Brum.
E tendo sido o mesmo Tratado, cujo teôr fica acima transcripto, approvado pelo Congresso Nacional, o confirmo e ratifico e, pela presente, o dou por firme e valioso, para produzir os seus devidos effeitos, promettendo que elle será cumprido inviolavelmente.
Em firmeza do que, mandei passar esta Carta, que assigno e é sellada com o sello das armas da Republica e subscripta pelo Ministro das Relações Exteriores.
Dada no Palacio da Presidencia, no Rio de Janeiro, aos dezotio dias do mez de Junho de 1919, 98° da Independencia e 31° da Republica.
(L.S.) DELFIM MOREIRA DA COSTA RIBEIRO.
Domicio da Gama.