Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos

DESPACHO DA PRESIDENTA DA REPÚBLICA

ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO

PROCESSO Nº 00400.000738/2007-49

INTERESSADOS: DATAMEC S/A SISTEMAS E PROCESSAMENTO DE DADOS e

EMPRESA DE TECNOLOGIA E INFORMAÇÕES DA PREVIDÊNCIA SOCIAL - DATAPREV

ASSUNTO : Definição sobre a legitimidade para firmar Termo de Ajustamento de Conduta em nome da União

(*) Parecer nº JT - 04

Adoto, nos termos do Despacho do Consultor-Geral da União nº 126/2008, para os fins do art. 41 da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, o anexo PARECER Nº AGU/RA-03/2007, da lavra do Advogado da União, Dr. Rafaelo Abritta, e submeto-o ao EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DA REPÚBLICA, para os efeitos do art. 40, § 1º, da referida Lei Complementar.

Brasília, 27 de maio de 2009.

JOSÉ ANTONIO DIAS TOFFOLI

Advogado-Geral da União

(*) A respeito deste Parecer o Excelentíssimo Senhor Presidente da República exarou o seguinte despacho: "Aprovo. Em, 27-V-2009".

Despacho do Consultor-Geral da União nº 126/2008

PROCESSO Nº 00400.000738/2007-49

ORIGEM : Ministério do Trabalho e Emprego

ASSUNTO : Definição sobre a legitimidade para firmar Termo de ajustamento de conduta em nome da União.

Sr. Advogado-Geral da União,

1. Tratam os autos de questão que merece destaque e atenção no que concerne à representação extrajudicial da União.

2. Inicialmente encaminhado para ciência desta Advocacia-Geral da União, parece-me ser ponto dos mais importantes no exercício das atribuições institucionais da AGU, cujo entendimento merece ser padronizado e disseminado.

3. Cuida-se de responder à indagação sobre qual órgão seria legitimado a firmar termo de ajustamento de conduta em nome da União, e mais, se a participação da Advocacia-Geral da União por seus órgãos de direção superior ou de execução seria obrigatória, em face do disposto no art. 131 da Constituição Federal e na Lei Complementar nº 73, de 1993.

4. Recebidos os autos com a comunicação da então Consultora Jurídica do Ministério do Trabalho e Emprego, chamou-me a atenção o fato de, dentre os signatários do Termo, não constar nenhum representante da Advocacia-Geral da União.

5. Solicitei, então, a elaboração de parecer que enfrentasse a questão de fundo, com vistas à uniformização do entendimento.

6. Distribuída inicialmente ao Consultor da União, Dr. Cleso da Fonseca, a matéria foi redistribuída ao Dr. Rafaelo Abritta, em face da posse do Dr. Cleso em outro cargo público. A manifestação do Dr. Rafaelo deu-se por intermédio do PARECER Nº AGU/RA - 03/2007.

7. Parecem-me adequadas as conclusões do mencionado Parecer quando apontam a necessidade de participação da Advocacia-Geral da União na celebração de termo de ajustamento de conduta, juntamente com o agente público titular do órgão compromissário, tendo em vista as implicações da assinatura do mencionado termo, em face do contido no texto constitucional e na LC nº 73/93. Destaco, nesse sentido, os itens 30, 31 e 37 do citado Parecer.

8. No que concerne à definição dos órgãos da Advocacia-Geral da União que deverão intervir na assinatura do termo, penso estar correta a distinção calcada na existência ou não de ação judicial sobre a matéria: se o termo for firmado durante o curso de ação judicial, caberá à unidade do contencioso responsável pelo acompanhamento do processo; se, de outro lado, o termo for firmado anteriormente ao ajuizamento da demanda judicial, a assinatura do termo, em conjunto com o agente público titular do órgão compromissário, será da competência da Consultoria Jurídica do Ministério ao qual o órgão estiver subordinado, cabendo aos Núcleos de Assessoramento Jurídico essa papel quando compromissário for o órgão público descentralizado. Sublinhe-se quanto a este ponto o contido nos itens 33 e 34 do mencionado Parecer.

9. Se a assinatura do termo de ajustamento de conduta couber ao agente público titular de autarquia ou fundação, será legitimada a firmar o termo a respectiva Procuradoria Federal vinculada, consoante o item 35 do Parecer.

10. Registro, assim, minha concordância com os termos do PARECER Nº AGU/RA - 03/2007.

11. Caso o presente despacho mereça a aprovação de V.Ex ª, solicito o encaminhamento de cópia do PARECER citado, deste despacho e do aprovo de V. Exª a todas as Consultorias Jurídicas, à Procuradoria-Geral da União, à Procuradoria-Geral Federal e aos NAJs, para os fins do disposto nos incisos X e XI do art. 4º da Lei Complementar nº 73, de 1993.

12. Requeiro seja o Parecer de V.Exª, que eventualmente acolha o presente despacho, encaminhado à apreciação do Exmº Sr. Presidente da República para os fins do disposto no art. 40, § 1º da Lei Complementar nº 73, de 1993.

13. Sugiro, ainda, o encaminhamento, para ciência, ao Exmº Sr. Procurador-Geral da República e ao Exmº Sr. Ministro Presidente do Tribunal de Contas da União.

            À consideração.

Brasília, 19 de março de 2008

RONALDO JORGE ARAUJO VIEIRA JUNIOR

Consultor-Geral da União

PARECER Nº AGU/RA- 03/2007

PROCESSO : 00400.000738/2007-49

PROCEDÊNCIA : MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO

INTERESSADO : DATAMEC E DATAPREV

ASSUNTO : TERMO DE COMPROMISSO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA - LEGITIMIDADE PARA ASSINATURA - ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO - PARTICIPAÇÃO OBRIGATÓRIA - SEDE CONSTITUCIONAL.

I - O Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta é instrumento extrajudicial para tutela de direitos transindividuais, podendo figurar como compromissário os órgãos da Administração Pública Federal, mesmo que despersonalizados.

II - A representação extrajudicial da União é exercida pela Advocacia-Geral da União, com exclusividade, quando se relacionar com a defesa dos interesses da União ou de seus órgãos perante as esferas extrajudiciais.

III - A Advocacia-Geral da União deve intervir obrigatoriamente na celebração dos Termos de Compromisso de Ajustamento de Conduta.

Senhor Consultor-Geral da União,

Trata-se de cópia do Termo de Ajustamento de Conduta - TAC encaminhada, para conhecimento, pela Consultoria Jurídica do Ministério do Trabalho e Emprego, por meio do Ofício s/no, de 4 de abril de 2007.

2. Referido TAC foi celebrado, no dia 4 de abril de 2007, entre o Ministério Público Federal, como compromitente, e as empresas Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência Social - DATAPREV, DATAMEC S/A Sistemas e Processamento de Dados e Unisys Brasil Ltda., e os Ministérios da Previdência Social e do Trabalho e Emprego, todos como compromissários, dispondo sobre a prestação de serviços de informática no âmbito do Ministério do Trabalho e Emprego.

3. V. Exa. solicitou, por meio de despacho, que fosse elaborado parecer sobre a legitimação para firmar compromisso de ajustamento de conduta em nome da União, consoante o disposto no § 6º do art. 5º da Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985, e na Lei Complementar no 73, de 10 de fevereiro de 1993, em razão da necessidade de se firmar entendimento uniforme sobre a questão, uma vez que, no caso em concreto, o Termo de Ajustamento de Conduta fora firmado diretamente pelos Secretários-Executivos dos respectivos Ministérios sem a participação de órgão da Advocacia-Geral da União.

4. Esses os elementos fáticos necessários ao exame do tema.

5. Inicia-se a análise da matéria pelos textos Constitucional e infraconstitucionais que se referem à presente temática, verbis:

Constituição Federal:

Art. 131. A Advocacia-Geral da União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representada a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe nos termos de lei complementar que dispuser sobre a sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo. (grifou-se)

Lei Complementar no 73, de 1993:

Art. 1º A Advocacia-Geral da União é a instituição que representa a União judicial e extrajudicialmente.

Parágrafo único. À Advocacia-Geral da União cabem as atividades de consultoria e assessoramento jurídicos ao Poder Executivo, nos termos desta Lei Complementar.

[...]

Art. 4º São atribuições do Advogado-Geral da União:

VI - desistir, transigir, acordar e firmar compromisso nas ações de interesse da União, nos termos da legislação vigente1;

[...]

VIII - assistir o Presidente da República no controle interno da legalidade dos atos da Administração;

[...]

Art. 11 - Às Consultorias Jurídicas, órgãos administrativamente subordinados aos Ministros de Estado, ao Secretário-Geral e aos demais titulares de Secretarias da Presidência da República e ao Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, compete, especialmente:

V - assistir a autoridade assessorada no controle interno da legalidade administrativa dos atos a serem por ela praticados ou já efetivados, e daqueles oriundos de órgão ou entidade sob sua coordenação jurídica; (grifou-se)

Lei nº 7.347, de 1985:

Art. 5º A ação principal e a cautelar [Ação Civil Pública] poderão ser propostas pelo Ministério Público, pela União, pelos Estados e Municípios. [...]

§ 6º Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial. (grifou-se)

6. Verifica-se nos textos legais, com relação ao tema, que: i) a Advocacia-Geral da União, por disposição expressa da Constituição Federal, representa extrajudicialmente a União; ii) é atribuição do Advogado-Geral da União acordar e firmar compromisso nas ações de interesse da União; iii) as Consultorias Jurídicas são responsáveis por assistirem aos seus respectivos Ministros de Estado no controle de legalidade dos atos por eles praticados; e iv) os órgãos públicos podem firmar termo de compromisso de ajustamento de conduta.

7. Ab initio, cumpre trazer alguns apontamentos a respeito do Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta.

8. Ao final da década de 80, a Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990 - Código de Defesa do Consumidor -, além de aprimorar a esfera judicial de tutela dos direitos transindividuais, aperfeiçoou os contornos do objeto da Ação Civil Pública, ampliando a relação dos interesses passíveis de serem protegidos.

9. O Código de Defesa do Consumidor ao acrescentar o § 6º ao art. 5º da Lei da Ação Civil Pública criou, no direito pátrio, um instituto de proteção extrajudicial de direitos transindividuais. Nessa linha, a Profa Geisa de Assis Rodrigues admite a existência de institutos análogos em outros sistemas jurídicos, mas aduz que não reconhece nenhum preceito normativo que se identifique de modo pleno com o termo de ajustamento de conduta brasileiro, especialmente quanto a sua extensão e eficácia.2

10. A autorização legal para realizar negociações e firmar acordos e/ou transações não constitui, per si, inovação no direito brasileiro, uma vez que o ordenamento nacional contempla o seu uso em diversas situações. Em sua maioria, os termos de compromisso foram inclusões que ocorreram durante a década de 90, normalmente destinadas à composição das lides individuais e aplicáveis aos mais diversos fins ou delitos.

11. Dentre os instrumentos hábeis a realizar negociações deve-se fazer menção à transação que consiste num instrumento de tutela processual pertencente ao sistema processual tradicional ou individual. A possibilidade de se transacionar no âmbito dos procedimentos judiciais é prevista no Código de Processo Civil, e pode ser definido como sendo o, in verbis:

negócio jurídico bilateral em que as partes buscam pôr fim a um litígio ou a uma situação duvidosa por meio de concessões recíprocas, classifica-se como contrato cuja finalidade é extinguir tais relações conflituosas [devendo-se destacar que] somente podem transigir aqueles que tenham disponibilidade sobre o objeto da relação.3

12. Consoante ensinamentos do Prof. Celso Antonio Pacheco Fiorillo a transação é "figura característica do direito civil e, portanto, moldada num sistema individualista, ou seja, destinada para o titular do direito (rectius = pretensão) ou o legítimo ordinário, no sentido de que só eles poderiam exercitá-la"4. A transação, assim, "é uma forma de composição amigável e pressupõe que cada uma das partes interessadas, de forma recíproca, renuncie e conceda parte de suas pretensões, como consigna o artigo 1.025 do Código Civil Brasileiro"5.

13. Por sua vez, o art. 1.035 do Código Civil estatui que "só quanto a direitos patrimoniais de caráter privado se permite a transação". Portanto, a transação somente permite a renúncia e concessão recíproca entre as partes desde que os interesses objetivados na transação sejam patrimoniais e disponíveis. Ou seja, concessões mútuas só podem ser realizadas por quem possa dispor do direito em litígio.

14. Percebe-se, assim, que os esquemas processuais tradicionais que objetivam resguardar os direitos individuais não são adequados quando empregados para tratar os conflitos emergentes da sociedade considerada como um todo e, em especial, para atender a proteção dos chamados interesses difusos, uma vez que tais interesses caracterizam-se por direitos não patrimoniais e pelos de natureza pública.

15. O Código de Defesa do Consumidor ao introduzir na Lei da Ação Civil Pública um instrumento que ressalta a, et litteris:

[...] conformação de uma nova engenharia jurídica, informada por valores pluralistas, consensuais e democráticos, que encontram na atuação negocial (e não mais na exclusivamente adjudicatória) uma nova expressão do conceito de justiça [...]6

deu azo ao aparecimento de dificuldades, uma vez que conceitos que haviam sido idealizados para regrar relações individuais, de caráter estritamente patrimonial, foram trazidos para proteger relações caracterizadas por sua dimensão coletiva e extra-patrimonial.

16. Tais dificuldades se mostram evidentes quando do enquadramento jurídico do novel instituto. Existem duas grandes correntes que abordam a questão. A primeira enquadra o termo de compromisso de ajustamento de conduta como uma espécie de transação especial, enquanto que segunda defende que o compromisso configura ato jurídico distinto da transação.

17. Consoante o entendimento do Prof. Fiorillo, in verbis:

não é correta a utilização do termo transação, nem dizer tratar-se de uma revisitação do mesmo, pois, se assim fosse, substancialmente estaria alterando a natureza da transação. Trata-se, pois, de um comprometimento ao ajuste de conduta às exigências legais, instituto novo, que existe per si, com suas próprias características.

18. Corroborando este posicionamento o Prof. Akaoui assevera que, apesar de o termo de compromisso ser entendido pela maioria da doutrina como uma forma peculiar de transação, et litteris:

não se trata esta figura de uma transação (que impõe necessariamente concessões bilaterais), mas sim, mero acordo, em que a liberdade do órgão público fica restrita apenas à forma pela qual se darão as medidas corretivas e o tempo, porém sempre após análise criteriosa da melhor forma, bem como do tempo mais exíguo possível.7

19. De fato, o termo de compromisso de ajustamento de conduta não pode possuir a mesma natureza jurídica da transação, uma vez que o órgão legitimado a celebrar o acordo não pode realizar concessões a respeito dos direitos que constituam o objeto do termo, tendo em vista que tais direitos são indisponíveis. Tal situação, per si, desconfigura a principal característica da transação, conforme o disposto no art. 1.025 do Código Civil. Deve-se ressaltar que a lei utilizou-se da expressão "tomar do interessado o termo de compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais", dando-se, portanto, caráter impositivo à atuação do órgão legitimado, afastando a natureza de acordo ou transação.

20. Nesse sentido, o Prof. José dos Santos Carvalho Filho ensina que o termo de compromisso pode ser definido como "o ato jurídico pelo qual a pessoa, reconhecendo implicitamente que sua conduta ofende o interesse difuso ou coletivo, assume o compromisso de eliminar a ofensa através da adequação de seu comportamento às exigências legais [...]".8

21. Feitas às considerações acima expostas, faz-se necessário aduzir, também, que a Administração Pública vem constantemente firmando termos de compromisso de ajustamento de conduta, tanto como compromitente quanto como compromissário.

22. Na presente análise, importa discorrer sobre quando a Administração Pública está no pólo passivo do termo de compromisso de ajustamento de conduta, ou seja, quando a Administração Pública é compromissária.

23. É cediço que o Ministério Público tem ajuizado inúmeras ações civis públicas em face da Administração Pública Federal. Não raro, porém, o Parquet antes mesmo de litigar em juízo, instaura inquérito civil ou procedimento investigatório no intuito de viabilizar a assinatura de um termo de compromisso, no qual, normalmente, se fixa um prazo para que as irregularidades encontradas sejam sanadas, fazendo constar do termo previsão de multa para o caso de inadimplemento dos compromissos assumidos. Destaque-se, também, que mesmo após a propositura de ação judicial pode o Ministério Público firmar termo de compromisso no intuito de por fim a demanda.

24. Independentemente do momento em que o termo de compromisso é realizado, é imperioso reconhecer que o agente público ao firmar termo de compromisso estará gerando um gravame para a União, seja em razão do cumprimento de uma obrigação de fazer ou de não fazer ou, ainda, caso ocorra o não cumprimento do compromisso firmado, implicando na penalização pecuniária do Estado.

25. De fato, o termo de compromisso de ajustamento de conduta além de versar sobre a possibilidade da reparação ou da prevenção de um determinado dano a um direito transindividual por uma conduta ou por uma omissão, prevê para o caso de descumprimento do compromisso cominações, que possuem a eficácia de título executivo extrajudicial e, portanto, implicam em oneração dos cofres públicos.

26. Importa asseverar que no caso sob análise, o ajustamento é celebrado entre o Ministério Público, compromitente, e órgãos da Administração Pública Federal, compromissários. Nessa negociação, a legitimidade para firmar o ajuste e a titularidade do direito não coincidem, haja vista que os direitos são transindividuais e, portanto, não possuem titularidade específica.

27. Deve-se destacar que todos os entes da Administração Pública Federal possuem legitimidade para figurarem no pólo passivo do termo de compromisso, ou seja, podem figurar tanto a pessoa jurídica de direito público ou privado, quanto os órgãos públicos sem personalidade jurídica, uma vez que todos podem praticar condutas que ameacem ou prejudiquem os direitos transindividuais.

28. Ante o exposto, é necessário perquirir quem possui a legitimidade para firmar tais compromissos, uma vez que o vocábulo "órgãos públicos" possui conceito próprio de direito administrativo.

29. Consoante o Prof. José dos Santos Carvalho Filho, órgãos públicos são "centros de competência instituídos para o desempenho de funções estatais, através de seus agentes, cuja atuação é imputada à pessoa jurídica a que pertencem"9.

30. Uma vez que a celebração de termo de compromisso de ajustamento de conduta é uma atividade eminentemente extrajudicial, apesar de que pode ser firmado no decorrer de uma demanda judicial, é necessário esclarecer a questão da representação extrajudicial.

31. A questão da representação extrajudicial da União já foi objeto de manifestação desta Consultoria-Geral da União. Trazem-se excertos da Nota no AGU/MS 17/2004 por fornecerem substrato suficiente para clarificar a questão, in verbis:

        3. Agora, os autos me são encaminhados novamente para um exame mais aprofundado da expressão "representação extrajudicial da União", com o intuito de se definir sua abrangência em relação às atribuições da Advocacia-Geral da União.

[...]

        5. Outrossim, reitere-se o teor das conclusões já aprovadas quando da análise da nota precedente, no que importa para o estudo presente:

- cabe à Advocacia-Geral da União a representação judicial e extrajudicial da União, bem como as atividades de consultoria e assessoramento jurídicos do Poder Executivo;

- as atividades de consultoria e assessoramento jurídicos desenvolvidas pela AGU se destinam apenas ao Poder Executivo;

- a representação extrajudicial de todos os Poderes da União é feita pela AGU, assim como a judicial.

6. Repita-se também o que se extrai da doutrina acerca do significado semântico da expressão "representação extrajudicial", conforme já assentado na nota anterior:

        6. Resta ainda definir o que vem a ser a representação extrajudicial da União. Para De Plácido e Silva, representação "é a instituição, de que se derivam poderes, que investem uma determinada pessoa de autoridade para praticar certos atos ou exercer certas funções, em nome de alguém ou em alguma coisa"10, enquanto extrajudicial "é locução empregada para designar os atos, que se fazem ou se processam fora do juízo, isto é, sem a presidência do juiz... indica o mandato que é dado e passado para negócios ordinários, fora da ação judicial"11.

        7. Para os advogados públicos, o mandato para atuar extrajudicialmente em nome da pessoa jurídica de direito público lhes é outorgado pela lei, no caso, a própria Constituição. Não obstante, não há que se confundir a representação extrajudicial da União com a sua representação legal e política, as quais são exercidas, dentro de suas competências, pelo Presidente da República e Ministros de Estado, pelo Procurador-Geral da República, pelos Presidentes dos Tribunais da União e dos Conselhos de Justiça, pelos Presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, e pelo Presidente do Tribunal de Contas da União, ou por quem vier a recebê-las por delegação destes, nos termos da lei.

        8. Destarte, não se compreende como atribuição exclusiva da AGU definida no artigo 131 da Carta de 1988 a representação legal e política da União, as quais competem aos chefes de Poder e seus auxiliares, representados, no âmbito do Poder Executivo, pelos Ministros de Estado (CF, artigo 76). Lembre-se, todavia, que o Advogado-Geral da União também é Ministro de Estado (Lei nº 10.683/2003, artigo 25, parágrafo único), ou seja, possui representação legal e política da União em relação às atividades de administração dos órgãos e serviços da própria AGU.

        9. Assim, quando da assinatura de contratos, acordos, convênios e termos, ou quando da participação em assembléias por exemplo, em que as Casas do Legislativo, a Corte de Contas, os Tribunais, a Presidência da República, os Ministérios e seus órgãos representem, dentro de suas competências legais, a União, não se faz necessária a ação exclusiva da Advocacia-Geral da União, cuja atuação, nesses casos, em verdade, especificamente em relação ao Poder Executivo, precede à formalização desses atos, pois se direciona à prévia consultoria jurídica do administrador público a ser feita pelo respectivo órgão jurídico responsável, o que se aplica também aos Poderes Legislativo e Judiciário, dotados de órgãos próprios para a realização desse fim. Como visto, esses atos somente precisam ser da competência da AGU, em caráter excepcional, quando digam respeito à administração da própria AGU ou dos serviços jurídicos da União em sentido amplo, ou quando lhe tenham sido delegados.

        10. Logo, via de regra, as funções reservadas com exclusividade à Advocacia-Geral da União pela Constituição quanto à representação extrajudicial da União se limitam, até por sua finalidade institucional, apenas às questões jurídicas relacionadas à administração pública federal, não incluindo as atividades de administração ordinária afetas a cada Poder, Ministério ou órgão em sua área de atuação legal.12 (grifou-se)

32. Para complementar a análise, traz-se trecho do Despacho do Consultor-Geral da União no 204/2005 que aprovou a Nota suso transcrita, et litteris:

        5. [...] Assim, independentemente de possuírem ou não personalidade jurídica própria que os habilite a irem a juízo, os diversos órgãos ou entidades dos diferentes poderes podem relacionar-se mutuamente e diretamente nos limites da sua competência administrativa e através de seus representantes legais, devendo estes responderem pelos encargos respectivos e comprometerem-se com as conseqüências correspondentes. Por tal razão, tais órgãos ou entidades têm agentes que exercem representação extrajudicial perante outros, embora essa não seja a representação extrajudicial da União a qual só se revelará quando a União, como entidade e independentemente dos seus órgãos e instituições - ou perante terceiros particulares ou perante Estados, Municípios e o Distrito Federal, ou tribunais administrativos ou organismos respectivos e até mesmo perante organismos públicos ou privados ou assembléias e conselhos públicos ou privados de que participe com capital ou interesse - tenha de se fazer presente ou manifestar a sua vontade como Estado nacional ou como Federação fora dos juízos do Poder Judiciário.

[...]

        7. Para tanto, parece possível assentar que a atuação extrajudicial da União pela AGU não prescinde da prévia atuação dos representantes legais dos diferentes órgãos ou instituições dos três Poderes, dentro das suas respectivas atribuições e competências enquanto órgãos públicos.

        8. Assim, porque, repita-se, o dirigente de instituição ou órgão integrante da Administração dos três Poderes da União tem, legalmente a representação respectiva no âmbito de sua atribuição e competência sem prejuízo da posterior representação judicial e extrajudicial da União pela Advocacia-Geral da União quando for o caso. Daí a peculiaridade de que, entre uns e outros ou entre administração direta dos Poderes e indireta, a relação é entre órgãos representados por seus representantes legais, só surgindo espaço para a representação extrajudicial da União (pela AGU) quando a pessoa jurídica de direito público tiver de manifestar-se como tal. Enquanto pendentes diligências, ou instrução de processo administrativo, atua a Administração assim entendidos os órgãos do Poder Executivo, Legislativo e Judiciário como estabelece o art. 1º e § 1º da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999. Aliás, essa lei, que disciplina o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal lança evidente esclarecimento sobre o assunto, de modo a deixar patente que são os respectivos órgãos ou administração própria por seus diretores que imediatamente defendem os respectivos interesses, pedindo o assessoramento jurídico (se do Poder Executivo) à AGU, quando verificada a hipótese de comprometimento da União ou entidade Autárquica como tal.

        9. Parece certo, portanto, que a representação extrajudicial da União (tal como prevista nos arts. 131 da Constituição e 1º L. C. 73/93) não compreende a representação legal de órgãos ou entidades que se vejam envolvidos em processo administrativo para o que contam com seus próprios assessores técnicos ou o assessoramento jurídico das Consultorias Jurídicas dos Ministérios ou Núcleos de Assessoramento Jurídico para o Executivo, ou assessores jurídicos junto aos órgãos do Legislativo e Judiciário. A representação extrajudicial da União, pela AGU, fica reservada para a defesa dos interesses dela ou de seus órgãos perante Tribunais (Tribunal de Contas, por exemplo) ou Conselhos de contencioso administrativo ou quando o interesse de parte é da União não do órgão.13 (grifou-se)

33. De todo o exposto verifica-se que a Advocacia-Geral da União é representante extrajudicial da União. Entretanto, esta representação pode não ser exercida de forma exclusiva e, dependendo da situação em concreto, pode até mesmo não ser necessária, podendo ser exercida nestas situações diretamente por agentes públicos titulares dos seus respectivos órgãos ou que detenham poderes delegados para tanto.

34. Todavia, para firmar termo de compromisso de ajustamento de conduta, uma vez que o objetivo deste instrumento é evitar demanda judicial ou, caso já proposta, por termo a contenta judicial e que, como dito, implicará em um gravame para a União, faz-se necessário que haja a intervenção da Advocacia-Geral da União, concomitantemente com o agente público titular do órgão compromissário, para que sejam antevistas todas as implicações e repercussões que a assinatura do referido instrumento implicará.

35. Faz-se necessário esclarecer que sempre deverá firmar o termo de compromisso de ajustamento de conduta a autoridade máxima do órgão compromissário ou o agente público a quem se tenha delegado poderes expressos para tal múnus.

36. Cabe agora definir qual o órgão da Advocacia-Geral da União incumbirá intervir.

37. Se o termo de compromisso de ajustamento de conduta for firmado em momento anterior ao do ajuizamento de demanda judicial, a Advocacia-Geral da União deverá participar por intermédio da respectiva Consultoria Jurídica que estiver vinculada ao órgão compromissário ou, se for o caso, pelo respectivo Núcleo de Assessoramento Jurídico.

38. Se, entretanto, o termo de compromisso de ajustamento de conduta for firmado durante o trâmite de demanda judicial, a Advocacia-Geral da União deverá estar presente por intercessão da unidade contenciosa que for responsável pelo o acompanhamento do processo.

39. Por fim, em se tratando de termo de compromisso de ajustamento de conduta que tenha a participação de alguma entidade ou órgão da Administração Pública Indireta a intervenção, em relação a estes, dar-se-á pela participação da respectiva Procuradoria Federal vinculada.

40. Deve-se destacar, conforme assinalado no Despacho do Consultor-Geral da União no 204/2005, que a defesa dos interesses da União ou de seus órgãos perante a Corte de Contas dar-se-á por intervenção da Advocacia-Geral da União.

41. Em conclusão, o termo de compromisso de ajustamento de conduta deve ser assinado pela autoridade máxima do órgão compromissário ou por agente público com delegação de poderes expressos para tal exercício, tendo a intercessão obrigatória da Advocacia-Geral da União em cumprimento ao comando constitucional.

Estas, Excelentíssimo Senhor Consultor-Geral da União, são as considerações, s.m.j., que me pareceram pertinentes a respeito do tema.

À consideração superior.

Brasília, 29 de agosto de 2007.

Rafaelo Abritta

Advogado da União

1 Lei nº 9.469, de 10 de julho de 1997.

2 RODRIGUES, Geisa de Assis. Ação Civil Pública e Termo de Ajustamento de Conduta: Teoria e Prática. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

3 STUCCHI, Gisele Beltrame. Revista Direito do Consumidor: v. 6 - Transação relativa aos direitos decorrentes do Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Editora RT, 1993.

4 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco; RODRIGUES, Marcelo Abelha & NERY, Rosa Maria Andrade. Direito Processual Ambiental Brasileiro. Belo Horizonte: Del Rey, 1996.

5 GUERRA, Isabela Franco apud LOPES, Syglea Rejane Magalhães. O ajustamento de conduta como instrumento pré-processual e a tutela do meio ambiente. Movendo Idéias, Belém, v. 5, n.8, p. 83-92, dez. 2000.

6 PASSOS apud Rodrigues, Geisa de Assis. Ob. cit. p., 133.

7 AKAOUI, Fernando Reverendo Vidal. Compromisso de Ajustamento de Conduta Ambiental. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.

8 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Ação civil pública: comentários por artigo. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1995.

9 Ob. cit., p. 135-136. Grifou-se.

10 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 704.

11 Idem, ibidem. p. 340.

12 Nota no AGU/MS 17/2004, Dr. Marcelo de Siqueira Freitas. Brasília, 3 de novembro de 2004.

13 Despacho do Consultor-Geral da União no 204/2005, Dr. Manoel Lauro Volkmer de Castilho. Brasília, 4 de março de 2005.

Este texto não substitui o publicado no DOU de 9.6.2009